Dia: 9 de abril de 2011

Nunca neste país...

Desfavor da semana.

SOMIR

Boa parte das teorias da conspiração se baseia em informações conseguidas logo nas primeiras horas após um evento. É justamente aí onde os boatos tem o mesmo peso que os fatos. Agora, com a maioria das suposições insanas já derrubadas, podemos fazer uma análise do assunto.

Não sou de entrar na onda de comoção popular, mas é difícil não se sentir mal quando um maluco invade uma escola e mata garotos e garotas entre 12 e 15 anos de idade. É o tipo de coisa que TEM que doer numa sociedade minimamente civilizada feito a nossa.

Embora não se possa ignorar que adolescentes (e chamar pessoas dessa idade de crianças vende mais jornal) morram todos os dias de forma violenta, dessa vez não dá para simplesmente jogar na conta do sistema. Se um moleque de 13 anos morre baleado no meio do morro, chamam ele de “bandidinho”. Se morre numa escola, é “brasileirinho”.

E não estou cedendo ao cinismo novamente. É mais a questão de que perder pessoas para a violência urbana já está arraigado na nossa mentalidade como uma espécie de morte natural. Quando é um cretino executando meninas numa escola, após perguntar se elas eram virgens, parece uma morte acidental; algo que não encaixa na nossa visão de casualidades de uma guerra alheia.

É nesse ponto onde ressurge, com força, a nossa noção de impotência. O brasileiro se resignou a aceitar que pouco pode contra uma sociedade tremendamente desigual, mas a ferida que o assassino de Deus cutucou continua aberta. Não só aqui como na maioria do mundo.

A verdade é que traçar longos perfis psicológicos e tentar prever a mente de quem possa perpetrar uma atrocidade dessas pouco ou nada faz em prol de tornar nosso mundo mais seguro. Como SEMPRE após um tiroteio em escola, começam com a história de “bullying” e isolamento social. Se fosse tão fácil determinar quando um dos INCONTÁVEIS seres humanos que se sentem injustiçados vai estourar, a discussão não estaria tão baseada em achismos como é agora.

Adianta alguma coisa fazer um banco de dados sobre as pessoas que sofreram na escola? A maioria AVASSALADORA desses párias jamais toma alguma atitude violenta do tipo. Pode até deixar um trauma na vida adulta, mas o padrão não é pegar armas e sair atirando por aí.

Malucos como o Wellington são a exceção. São a probabilidade imprevisível. E é isso que deixa as pessoas “nos cascos”. A impotência diante de atitudes de outras pessoas. O medo de que alguém faça mal para você ou alguma pessoa querida sem que você tenha qualquer aviso.

Não é a falta de sociabilidade que desencadeia o processo de violência nesse grau. O buraco é mais embaixo. Genética, criação, companhias, ambiente, situação social, reforço externo… Combinações pra lá de específicas de fatores que influem na vida de qualquer um geram essa fórmula explosiva.

E boa sorte para conseguir separar esses elementos antes deles detonarem. Sociopata tem o péssimo hábito de parecer inofensivo até o último segundo.

Mas como eu sou eu, não posso deixar passar em brancas nuvens o fato de que a loucura de Wellington estava fortemente APOIADA pela sua religiosidade. Não estou dizendo que ele matou porque era crente, mas esse foi mais um dos elementos que formou a mentalidade do assassino. A “vontade de Deus” é uma das desculpas clássicas para apagar a noção de responsabilidade pelos próprios atos.

As igrejas, principalmente as evangélicas, trabalham sem a menor regulação em cima das mentes da parcela mais miserável da população. Malucos preconceituosos e pessoas sem a menor capacidade de aconselhar outros seres humanos ganham discurso de autoridade e presunção de iluminação com uma bíblia debaixo do braço.

A sociedade brasileira não tem a menor coragem de confrontar os irresponsáveis que enfiam na cabeça de quem não tem nada a perder que o mundo está acabando e que um ser imaginário vai recompensá-los se eles fizerem sua vontade valer. E eu não estou pedindo intervenção do governo, Estado laico também significa defender com unhas e dentes a liberdade de crença e expressão.

A questão é social. Pouca gente tem coragem de dizer que as igrejas evangélicas estão apinhadas de analfabetos funcionais EXTREMAMENTE preconceituosos empurrando lixo ideológico goela abaixo de gente sem capacidade de pensamento crítico. Os pastores são assustadoramente despreparados para sequer compreender o mundo ao redor, imagine só para explicar.

Mas é tabu dizer isso. Eu já escuto sirenes de alerta quando alguém solta discursinho fundamentalista, mas o povo desse país acha que é algo positivo. Que fé nunca é demais.

Não vi ninguém ficar PUTO com os milhares perfis evangélicos do Twitter (acompanhei também por lá dessa vez, por isso o título) vomitando mentiras e desinformação descarada em postagens combinadas. Tudo para tirar o próprio da reta. Muçulmano? HIV? Puta que pariu!

Não foram os crentes que fizeram Wellington matar adolescentes dessa forma cruel e covarde, mas o discursinho dele enquanto matava está na conta deles SIM. Eu não prego que posso salvar pessoas, eles pregam.

Obrigado por nada. Péssima forma de entrar para o Primeiro Mundo.

Para dizer que se assustou por um momento achando que eu não ia falar da parte religiosa, para dizer que adolescente virgem já sofre o suficiente, ou mesmo para reclamar que não sacaneei o choro do Dilmão (achei digno, juro!): somir@desfavor.com

SALLY

Columbine é aqui! Rio de Janeiro adere ao assassinato estilo Hemisfério Norte! Quem foi que disse que nós não aprendemos nada com os países mais desenvolvidos?

O que é que eu falei pra pouco tempo atrás? Religião e preocupação com animais são atestado social de boa pessoa e geralmente querem dizer justamente o contrário! BINGO! O assassino de Realengo era um homem religioso que citou Deus e Jesus o tempo todo em sua cartinha de despedida e seu último desejo foi que sua casa seja utilizada para abrigar animais abandonados. UMA FLOR de pessoa. Quer abrigar animaizinhos abandonados… Tão bonzinho ele.

A falta de segurança nas escolas públicas não é novidade. Aliás, a falta de segurança não é novidade. Tiro em escola pública não é novidade. Morte por ferimento a bala no Rio de Janeiro não é novidade, cito aqui vários casos com a maior facilidade. Nem precisa ser em instituição de ensino público, já teve até aluna da Estácio de Sá premiada com uma bala perdida. Então porque tanta comoção, tanta manchete no jornal? Porque conseguimos a proeza de importar um dos poucos comportamentos errados e bizarros de americanos e europeus que ainda não tínhamos: o massacre em locais públicos sem fins lucrativos.

Este não é o primeiro Desfavor da Semana sobre massacre e tiros em um colégio. Em 14 de março de 2009 citamos um caso na Alemanha onde o atirador fez vítimas em uma escola e acabou se suicidando quando foi encurralado. Desde 2009 eu venho criticando essa babaquice de usar bullying para justificar tudo. Bullying é a nova enveja (vai lá nos comentários dizer que eu escrevo errado). Bullying é o novo “a culpa foi dos remédios”. Só que até então, este tipo de crime era mais popular no hemisfério norte. Era.

Poderíamos ter importado o padrão de vida, a cultura ou a gastronomia destes países… mas não. Importamos logo o que eles tem de pior: este crime sociopata cometido por desajustados de forma covarde e insensata. Massacrar crianças a tiros. Não dou nem três dias para se comece a culpar o bullying, o vídeo-game ou as drogas. A questão é: nada justifica isso. Não é todo mundo que sofre bullying que sai matando. Não é todo mundo que joga Carmagedon que sai matando. Não é todo mundo que usa drogas que sai atirando em crianças. A resposta não está aí.

Provavelmente o assassino sofria de sérios transtornos psiquiátricos e estava no meio de um surto psicótico ou algo do tipo. Provavelmente ele tinha este problema faz tempo mas graças a nosso sensacional sistema público de saúde não teve oportunidade de ser diagnosticado nem tratado. Nessas horas lembro de uma música do Rogério Skylab chamada “Carrocinha de Cachorro Quente” (imperdível): “Ele era tão quietinho, um idiota comentou”. É isso. Um rapaz com sérios problemas foi visto pelos olhos da ignorância como apenas “quietinho”. Não sei dizer exatamente qual era o problema psiquiátrico dele, mas que tinha, isso tinha.

Eu não sei dizer, mas todo o resto do mundo vai saber. Quer apostar que agora cada brasileiro deixa nascer em si o psicólogo interior, mesmo sem ter estudado para isso, e esboçar uma série de certezas sem fundamento? Psicólogos, se preparem, vocês vão ver o que eu sinto na pele com o direito, como é desesperador ver gente proclamando certezas sem nunca ter sequer estudado o assunto. E é claro que vai sobrar para a lei também, vai começar aquele papo de que Brasil dá muito mole para bandido e até quem sabe uma discussão infrutífera sobre pena de morte. Pena de morte só se RASGAR a Constituição da República, base de toda nossa legislação, e fizer uma nova. Mas as pessoas não querem saber, as pessoas querem achar.

Sem querer ser cruel, faz uma estatística sobre quantas crianças ou pessoas morrem no bairro de Realengo por causa de violência urbana. Faz da Zona Norte do Rio toda. Porque devemos nos comover com estas pessoas também. Tudo bem que é preocupante saber que estamos importando até crime típico dos EUA, (decadência! até nossos crimes estão americanizados!), mas não vamos também tratar a morte de crianças como algo raro e inédito no nosso dia a dia, porque não é. Infelizmente NÃO É.

Até na escola estão metendo o pau. Ora, que escola barra na porta um ex-aluno? Difícil, né? Eu entro nas escolas em que estudei se quiser. Nossa duplinha dinâmica Cabral + Paes se apressou em dizer que serão tomadas providências para garantir mais segurança. HAHAHAHAHAHAHA. CALEM A BOCA! VOCÊS NEM SABEM MAIS O QUE FALAM! FALAM NO PILOTO AUTOMATICO O QUE AS PESSOAS QUEREM OUVIR! Vão fazer o que? Vão colocar detector de metais nas escolas? Por favor… Até pouco tempo atrás NEM NO FORUM tinha detector de metais! Não conseguem tornar o aeroporto do Galeão um lugar decente, vão garantir segurança em todas as escolas públicas? Imagina! Nem as particulares tem conseguido! Não tem material escolar, não tem material hospitalar, não tem FUCKIN´MEDICO nos hospitais, mas eles vão assegurar a segurança nas escolas? ALOOOU? APROVEITA E GARANTE MINHA SEGURANÇA NAS RUAS TAMBÉM, que só essa semana fui assaltada duas vezes!

Estão tentando fazer o metrô chegar na Barra faz anos e nada! Não conseguem entrar na Rocinha, o Nem manda e desmanda ali e vem tirar onda de garantir a segurança? Pelamordedeus, bueiro explode na cara de pedestre e nada acontece. Parem de bravatear que o povo não é bobo. Paes, não é por nada não, Minha Nega, mas a Tia Sally tá sentindo que a tua reeleição está indo para a casa do caralho, viu? Avisa pro teu futuro vice, Leonardo Picciani (oooohhhnn, ninguém sabia!) que o gato subiu no telhado e deixa o PT emplacar um vice no lugar dele que é o melhor que você faz. Começa aqui a minha campanha: EDUARDO PAES NÃO! TUDO MENOS EDUARDO PAES! E você, Serginho Cabral, tem muita água para rolar debaixo dessa ponte, sinceramente, não sei se você chega a Vice-Presidente não. ASSASSINA EU! ASSASSINA EU! Nova coluna do Desfavor!

Voltando ao assassino… quero dizer, aquele que efetivamente pegou na arma: Repito o que eu disse no texto de 2009: não tenho pena. É doente? Sofreu abusos? Foi vítima de bullying? Quis fazer na finesse e matar que nem europeu? Não sei o que foi, só sei que não justifica o ato. Se tivesse sobrevivido teria que ser punido, ainda que com uma medida de segurança por ser dodói da cabeça. Falando nisso, CADÊ O SEU DEUS?

O que me desespera é que as soluções que vem sendo apresentadas não resolvem porra nenhuma. Criar leis dificultando a compra de armas? Sabe o que isso vai fazer? Dificultar a vida de quem compra armas LEGAIS. Dããããr. Quem comete um crime geralmente não o faz com uma arma legalizada e documentada aqui no Rio de Janeiro! Quem quer comprar uma arma ilegal sabe onde tem que ir e só precisa de um papel para consegui-la: dinheiro.

Espero que este caso seja apenas o reflexo de um transtornado mental que absorveu por osmose de tanto ver Jornal Nacional e filme americano esta forma européia de assassinato. Espero que não estejamos fabricando este tipo de conduta e que ela não vire moda. Espero que crianças e adolescentes no auge de sua revolta não achem bonito, heróico ou grandioso fazer uma porra dessas. Espero que não achem que vale a pena. Porque acesso a arma é o que tem de mais fácil no Rio de Janeiro e enquanto não se mexer na raiz do problema isso não vai mudar!

Mas a mídia não entende isso. A mídia está dando um glamour involuntário ao caso. O assassino fico famoso, virou subcelebridade. Pronto, fudeu! Um misto de mártir com bandidão. A cara dele tá na capa da revista. Para sair na capa da revista neguinho topa até morrer! (Cibele Dorsa? Oi?). Vai ficar ainda mais tentador para um revoltado qualquer que não tem nada a perder repetir a façanha. Precisava? Sério, PRECISAVA tratar o caso assim?

Obs: Dilmão me surpreendeu positivamente. Dilmão se emocionou e chorou ao discursar sobre o ocorrido. Se fosse Çilva I já tinha feito uma piada inconveniente envolvendo crianças e balas. Dilmão tem coração. Só falta agora arrumar um cérebro pra ela.

Para dizer que esta era a única modalidade criminosa que podíamos importar porque para ser serial killer precisa de inteligência, para dizer que se eu não calar minha boca posso encontrar uma bala perdida em breve e para dizer que inveja se escreve com “i”: sally@desfavor.com