Dia: 25 de abril de 2011

Noça Lingua PortuguezaMUITA gente fala errado. Reflexo de um país com um sistema de educação público pra lá de deficitário e a ruim e velha exaltação da mediocridade cultural que tanto nos define como nação. Mas não pretendemos discutir as causas do fenômeno, hoje Sally e Somir discordam sobre como uma pessoa deve reagir ao lidar com os sintomas. Ou, de forma resumida…

Tema de hoje: É pertinente corrigir uma pessoa próxima que fala errado?

SOMIR

Sim. E enfiem qualquer manualzinho de boas maneiras no rabo. O desenvolvimento da comunicação humana é infinitamente mais importante que noções de elegância no trato social.

Se você está imaginando que eu saio corrigindo qualquer pessoa que fala errado perto de mim, não é bem assim que a banda toca. Uma coisa é considerar pertinente, outra completamente diferente é fazer disso uma cruzada incansável. Sou chato, mas não dessa forma intrusiva.

Meu domínio da língua pátria está bem acima da média, mas mesmo o meu ego doentio não consegue fazer disso uma grande qualidade; a média é baixa demais. Vivo tendo oportunidades de fazer essas correções, mas assim como trato uma conversa normal, há de haver alguma relevância na abordagem.

Acho babaquice interpelar um estranho na frente de outras pessoas para corrigir um erro, soa como projeção de insegurança. Não precisa ser um cretino inconveniente para corrigir o português alheio.

Digamos que você está conversando com um amigo e ele diz que vai comprar um disco da Preta Gil. Você não tenta ao menos dizer que aquilo é um erro? Informar outra pessoa sobre algo que você percebe como errado denota ao menos alguma preocupação. No caso, com os ouvidos do pobre coitado.

Porra, uma das partes mais importantes da sociedade humana é a transmissão de conhecimento. Uma pessoa acumula uma informação útil e divide com outras. Explicar, ensinar e corrigir são partes integrantes desse processo. Impressionante que o anti-social do blog tenha que explicitar que frescura na hora de corrigir outra pessoa é contraproducente para seres sociais como nós.

Quando você ensina outra pessoa a não falar errado, está ajudando-a a se comunicar melhor. Uma das maiores pragas recentes na comunicação é o encolhimento do vocabulário médio. As pessoas aprendem e utilizam cada vez menos palavras nas suas conversas (na escrita então, é de cortar o coração que eu não tenho). De tanto deixarmos passar erros e mais erros (oi, internet!), não há mais preocupação com o aprofundamento das idéias expressas. A outra pessoa “entende”, e isso já está de bom tamanho para as antas que passam a vida toda se comunicando com vocabulários de poucas centenas de palavras.

Se as pessoas perderem completamente sua “vaidade vocabulária”, tendemos a virar uma espécie que se comunica por grunhidos e emoticons. Corrigir pessoas próximas é manter a chama de preocupação com a relevância do que é dito acesa.

Como eu acho ótimo quando sou corrigido, enxergo o ato de corrigir como uma gentileza, até porque eu vivo discutindo com os outros e erro de português vira munição para o adversário. Sim, eu compreendo que existem pessoas que se sentem constrangidas quando alguém aponta um erro, mas isso não é importante, sabem por quê?

Porque ficar chateado com uma correção de português e ter direito de ter sua opinião levada em consideração NÃO SÃO COMPATÍVEIS. Que gentinha mais BUNDA essa. Não compartilho desse mimimi de respeitar a opinião alheia apenas por ser alheia. Se não tem estrutura emocional para lidar com outro ser humano dizendo que você também erra, que vire autista e fique enfiado num canto escuro o resto da vida.

E mesmo quando é uma pessoa mais simples, que não teve acesso ao estudo, não é arrogância oferecer uma dica sobre como se falar de forma mais correta. Oras, se ela não teve chance de aprender, eu tive. Escroto mesmo é ter “peninha” e tratar pobre como retardado. A capacidade de aprender é a mesma, e se o sistema não é justo, nós podemos ser. E se a pessoa ficar ofendida… Bom, foda-se ela. Babacas existem em todos os níveis sociais.

Ao chegarmos em relações mais próximas, como amigos, namoradas e família, eu tenho ainda menos problemas se acontecer uma situação dessas. E a palavra-chave é consistência. Se esse ambiente de troca de conhecimento fica bem definido, não há lugar para insegurança irracional. E como gente babaca que se ofende por bobagem se entrega rápido, não tem muito risco de manter um relacionamento duradouro com alguém como… eu.

Não respeito quem se ofende com uma correção pertinente, não me seguro por gente que não respeito. Meritocracia linguística. Correção CERTA é sempre pertinente, azar de quem não concorda.

Correção CERTA, é bom repetir. Dói a minha inexistente alma quando alguém cisma de corrigir errado outra pessoa. No meio escrito é até compreensível, mas no falado é atestado de limitação.

Mesmo que você seja daquelas pessoas que só sabe corrigir uma palavrinha ou expressão comum, faça isso. Os frescos que se ofendem por isso só tem algum poder de defender sua ignorância porque pouca gente corrige. É só não fazer da situação algo maior do que realmente é, tem sim um bando de babacas que tenta diminuir os outros com correções, mas eles são… babacas. Eles seriam pedantes fazendo qualquer outra coisa.

Sério, é bem fácil fazer isso de forma educada: Assim que a pessoa disser a palavra errada, diga a CERTA na sequência. Só isso. Não contextualize, não repita a palavra errada, simplesmente diga a palavra certa sendo simpático. Eu sempre fiz desse jeito e ninguém (que valha a pena) se sentiu ofendido.

É fácil, útil para a humanidade e ainda pode servir para afastar gente que você não gostaria mesmo de ter por perto. Quer mais pertinente do que isso?

Para apontar todos os meus erros de português no texto (agradecido!), para dizer que aceitar dica de trato social minha configura o fundo do poço para você, ou mesmo para dizer que as árvres somo nozes: somir@desfavor.com

SALLY

É pertinente corrigir uma pessoa próxima que fala errado?

Eu acho meio escroto, meio constrangedor. A menos que a conseqüência da não correção seja ainda mais escrota e constrangedora, como por exemplo deixar a pessoa soltar um erro grosseiro em uma reunião de trabalho e se queimar com o chefe e com toda a equipe, eu faço de conta que nem escutei o erro se for uma pessoa bacana pela qual eu tenha carinho.

Claro que se for uma pessoa escrotinha que está tirando onda faço questão de corrigir e se tiver oportunidade, corrigir debochando. Ser escroto não é para quem quer, é para quem pode. Um nobody que fala errado não merece ficar tirando onda impunemente. Se vier tirar onda com português errado vai tomar correção sim. Mas, sendo uma pessoa pela qual tenho algum carinho, me sinto meio que humilhando a pessoa se corrigir seu português.

Curioso que eu mesma não me importo quando as pessoas me corrigem, e eu erro bastante porque o português não é minha língua materna. Mas acho muito chato corrigir os outros. Principalmente se for na frente de terceiros. Parece que você está querendo bancar a inteligentona e ressaltar o erro alheio. É duro, viu? Tem horas que dá vontade de guardar as orelhas dentro da bolsa, porque é duro ouvir o mesmo maldito erro por meses e meses. Mas vale o sacrifico. Nada me irrita mais do que gente magoada, acho um saco. Gente magoada é um pau no cu, me dá vontade de cobrir gente magoada de cacete.

Um exemplo que mostra até onde chega meu constrangimento: uma pessoa que trabalhava comigo, uma ótima pessoa por sinal, não era uma mente brilhante. Mas era um amor de pessoa. Nunca tive coragem de corrigir seus erros – muitos por sinal. Sua única função que demandava escrita era dar início aos processos. Para isso, bastava escrever “Autue-se” e assinar. Pois bem, comecei a ver que estão chegando vários processos com “Altue-se” assinados por esta pessoa. Isso começou a me envergonhar profundamente. Fiz correções manuais em um por um e semana após semana continuam vindo processos iniciados por “Altue-se”. Dei todas as dicas e indiretas, mostrei a palavra sutilmente para a pessoa na esperança que lendo ela compreenda e assimile a grafia correta. Nada.

Fui intimada a falar com a pessoa. Sabem o que eu fiz? Mandei fazer um carimbo escrito AUTUE-SE e dei para a pessoa, dizendo que era para evitar tanto trabalho de escrever em cada processo, assim dali pra frente ela só precisava carimbar e assinar. Frouxa? Otária? Sei lá, fico constrangida de corrigir uma pessoa que teve menos oportunidade de estudar do que eu se ela for realmente uma boa pessoa. Além disso me conheço e sei que se a pessoa se magoar não vou me agüentar e vou mandar tomar na tarraqueta. Melhor evitar esse tipo de situação!

Acho que a auto-estima destas pessoas que falam errado já é bombardeada demais da conta e não tem como falar sem magoar. Eu sei que, em tese, é para o bem da pessoa, que ela vai aprender e vai melhorar, mas acho que não tenho a delicadeza e o cuidado com as palavras que a ocasião exige, então, melhor não falar nada.

Sem contar que muitas vezes as pessoas sabem o correto mas erram por pressa, distração ou até mesmo porque herrar é umano (vai lá dizer que eu não sei escrever). Daí se você corrige, dá uma importância grande a esse erro que poderia ter passado em branco. Chama a atenção para algo ruim de forma desnecessária porque a pessoa sabe a forma correta, apenas errou porque se distraiu. Nesses casos, não há ganho em fazer a correção. Pensem comigo: se não dá para corrigir os burrinhos porque você vai danificar a auto-estima deles e ele se magoam, mas também não há benefícios em corrigir quem realmente sabe e errou por distração, quem sobra? Corrigir subordinado é humilhar, corrigir chefe é insolência. Corrigir uma minoria é bullying + racismo. Tá difícil.

Tudo piora quando estamos falando de relacionamentos amorosos. No caso da mulher corrigindo o homem, nem acho tão ruim, mas o homem corrigindo a mulher é meio deselegante. Parece uma tentativa de mostrar que é mais inteligente ou algo assim. Não é assim que se ajuda alguém a crescer ou a melhorar, existem recursos de maior sutileza para fazer com que a pessoa se toque de que aquela palavrinha FUCKIN´ NÃO EXISTE, PORRA! (tá vendo porque eu não posso corrigir ninguém? Controle emocional zero).

Não posso negar que quando você corrige a pessoa ela aprende (até porque o constrangimento é tamanho que ela nunca mais vai esquecer da correção), só que acho que o preço que se paga, o mal estar que isso causa e o risco da pessoa se magoar não compensam. Sobretudo quando você corrige várias vezes a mesma pessoa. Parece sim que está pegando no pé, tripudiando, que está jogando na cara o quanto você é melhor do que ela, mesmo que não seja essa sua intenção. Isso pode despertar sentimentos ruins e acabar por estremecer uma amizade, um sentimento de coleguismo e até mesmo um namoro. A gente nunca sabe o quanto as pessoas são sensíveis. Ou melhor, sabe sim: para fazer com os outros, a sensibilidade é zero, para quando fazem com eles, é sensibilidade máxima. Ahhh… a sensibilidade seletiva! Ainda escrevo um texto sobre isso!

Eu sei que não é regra que a pessoa se ofenda com uma correção, mas sei que EXISTE O RISCO. E dependendo do quanto a pessoa é importante para mim ou do quanto essa mágoa vai paunocuzar minha vida (ofenda sua secretária como eu fiz uma vez e veja o inferno se materializando na sua frente), prefiro ficar calada. Existem pessoas que tem o dom de dizer as piores barbaridades de forma leve, como se fossem flores.

Acredito que estes possam corrigir sem tanta preocupação. Infelizmente eu tenho o dom bizarro de dizer flores de forma pesada, como se fossem as piores barbaridades. Logo, melhor só falar o estritamente necessário quando se trata de questões polêmicas que possam ofender pessoas próximas.

De boas intenções o inferno está cheio. Não vou me arriscar à pessoa ficar super magoada comigo por achar que estou fazendo um bem a ela. É algo que não raro causa problemas e ofende, é algo delicado. Melhor não arriscar. Não quando você é uma pessoa grossa que não sabe mensurar o que fala.

Mas podem me corrigir, viu? Vira e mexe eu solto um “mais grande”. Eu gosto do “mais grande”, o “mais grande” é plenamente permitido no espanhol. Porque temos “Mais gordo”, “mais magro”, “mais alto”, “mais baixo”, “mais escuro”, “mais claro” mas não podemos usar o “mais grande”? Injustiça.

Para corrigir meus erros, para dizer que você erra porque foi alfabetizado em inglês quem nem a Sacha ou ainda para dizer que errar é humano, mas repetir o erro é lusitano: sally@desfavor.com