Publiciotários: Patrocínio Doloso.

Acompanhando as notícias esportivas, pude ler várias menções sobre o suposto novo acordo de patrocínio do abad… uniforme do Corinthians. Ainda tem muita coisa no ar, mas a própria diretoria do time levanta a possibilidade de cobrar mais de cinquenta milhões de reais por ano da empresa que quiser estar estampada ali.

O número impressiona no mercado brasileiro, mas não chega a ser uma impossibilidade, considerando que o acordo anterior do mesmo time mordia trinta e cinco milhões de reais por ano da Hypermarcas. Pode ser que saia, pode ser que não, mas para este texto, só importa a disponibilidade de uma empresa de investir quantias tão superlativas no patrocínio de um time de futebol. E é melhor sair logo desse foco futebolístico para controlar o ímpeto da pobralhada intelectual (sim, seu time é o melhor e os outros são todos horríveis… parabéns, agora volta pro seu canto e tanta não sujar nada…). Hoje falamos sobre patrocínios.

Pois bem, mesmo para quem já está mais acostumado com publicidade, pode parecer difícil assimilar a forma como alguém pode investir milhões e milhões numa logomarca pintada numa camisa e ainda sim achar vantajoso. Uma propaganda tradicional mostra alguma coisa que a empresa vende e ainda tenta “argumentar” que essa coisa é importante para sua vida. Um patrocínio como o do exemplo inicial é basicamente “estar lá”.

A empresa mostra seu logotipo para todo mundo que tem acesso (pelo menos visual) ao que ela patrocina, com certeza é fácil entender que no mercado de massa é melhor ser visto do que não ser, mas como definir se essa visibilidade vale déi real ou dez milhões?

Eu não gosto quando explicam patrocínio dizendo que a exposição alcançada por mídia espontânea (uma Globo da vida não pode mostrar o jogo do time sem mostrar a marca no uniforme dele) é muito mais econômica do que pagar pelo horário como se faz em propagandas. Evidente que ficar aparecendo por uma hora e meia para milhões de pessoas é positivo, mas não é como se a empresa pudesse fazer de outro jeito. Uma propaganda com a mesma duração seria tortura.

Principalmente porque uma propaganda quer te chamar a atenção, e via-de-regra vai apelar para tudo o que puder apelar nessa missão. Tentar fazer divulgação assim com a mesma duração e repetição de um patrocínio é mais ou menos como colocar uma criança hiperativa carente do seu lado no sofá. Não funcionaria.

Dizer que patrocínio é economia em relação à divulgação por propagandas nada mais é do que uma tática de distração do ponto real: Patrocínios existem para que você decore cada centímetro quadrado do logo da empresa, para que você tenha o nome dela tão firme na sua cabeça que jamais a confunda com qualquer outra coisa. Patrocínio é uma arma de “costume”.

E esse costume com a marca em questão serve muito bem para as vendas. Principalmente porque te pega com as calças curtas, no meio de uma loja, lembrando daquela marca enquanto decide se e o que vai comprar. Mas eu já falei disso no texto dos Pôneis Malditos, não vou ficar me estendendo.

Um outro argumento comum sobre patrocínios é que a empresa acaba tendo a chance de ligar sua marca com a noção das pessoas sobre o que ela patrocina. E que isso também vale muito na hora de decidir se o investimento vai ser bom ou não. E isso é uma meia verdade. Ênfase no meia.

Patrocinar a instituição, grupo ou ideia ERRADA pode causar dores de cabeça e retorno menor, mas a regra é clara, povão: A empresa quer se ligar com algo que dê muita exposição e que não respingue negativamente nela. E essa definição do que é errado não funciona da forma… tradicional.

Lembro que Suellen mencionou o caso da Varilux, que estava patrocinando a camisa da escola de samba do maluco que invadiu e rasgou os votos na apuração do carnaval paulista… Embora tenha sido sim uma sacanagem com a empresa, não é como se a marca fosse ser lembrada como “a escolha de quem não sabe perder”. Perde a “beleza” da ação, mas exposição é exposição. Não vai atingir o consciente de forma positiva, mas vai para o inconsciente sem nenhum arranhão.

O que realmente pode foder uma empresa patrocinadora é se ela for vista como FINANCIADORA do mau-comportamento (padrão politicamente correto sustentável atual), estar ligada a algo polêmico não é exatamente o problema. Tanto que tem empresa que paga milhões para patrocinar essas máquinas de fazer gente passional como os times de futebol.

Seria suicídio patrocinar uma torcida organizada barra pesada, porque a empresa seria vista como financiadora da violência, mas o time de futebol é suficientemente neutro (teoricamente tudo o que faz é entrar em campo e chutar uma bola) para valer, mesmo numa fase meio ruim.

Analisando da forma mais imparcial possível: Se o povo realmente se importasse em ligar imagem do patrocinado com patrocinador, nenhuma grande empresa pagaria para estar na camisa do Corinthians, por exemplo. Isso vale para todos os times que tem rivais… Um clube de futebol, mesmo um de massa, vai ter muito mais gente contra do que a favor. Sempre. O “time do outro” deveria respingar na marca que o patrocina, mas ninguém anda perdendo dinheiro e vendas botando seu logo em uniforme de time popular. (Ei, mesmo os menores valem a pena por causa da transmissão na TV)

É tudo questão de quanto se investe e quanto se retira. Se tem empresa disposta a enfiar tanto dinheiro assim em camisa de futebol, TEM lucro aí sim. Valor de marca é uma coisa muito bonita na teoria, mas não serve pra nada se não mantém o caixa em dia. (Do fundo do baú: Mappin e Bamerindus já foram duas das marcas mais fortes e reconhecidas no Brasil… ajudou?)

Quando a Coca-Cola usa sua marca, é para que mais pessoas escolham o seu produto. Quando a Apple usa sua marca, é para cobrar mais pelos seus produtos. Quando o Google usa sua marca, é para empregar credibilidade ao que vende.

Ninguém está pagando só para você saber que a empresa existe. Isso tem que render, afinal, negócios são negócios. A base de divulgar marca é colocar um gatilho na sua memória que possa ser disparado na hora de botar a mão no bolso (ou sugerir para outra pessoa botar a mão no bolso).

Pode até parecer que estou simplificando demais o assunto (ei, para os meus padrões, está simples…), mas na base é assim mesmo: Que muita gente veja a sua marca e que você tenha como extrair dinheiro delas por causa dessa visibilidade. Todo o resto são táticas para fazer isso funcionar melhor.

O que também significa se adequar a públicos diferentes. A Ferrari não vai vender mais se estiver na camiseta do Flamengo… Mesmo que todo mundo fique com a marca na cabeça quando pensa em carro, quase ninguém vende e menos gente ainda pode comprar. Vai gastar dinheiro para não lucrar mais.

É tudo a mesma lógica, da tubaína ao champanhe. Muda a escala. E quando o seu produto serve para milhões de pessoas, faz sentido gastar milhões para que fiquem lembrando da sua marca constantemente. O possível patrocínio insano do Corinthians vai valer para a empresa se o time aparecer muito. Se ganhar algum título, bacana. Se não ganhar, que caia perto das finais e pelo menos dê mais audiência… A ligação entre patrocinador e sucesso do patrocinado é fria e calculista.

Se o esquema de patrocínios não fosse expressamente numérico, uma medida de lucro óbvio, podem ter certeza que o esquema de “naming rights” de estádios não estaria tão horrível no Brasil. Como o brasileiro tem uma cultura muito arraigada de apelidos populares e como a maior empresa de mídia (plim plim) se recusa a dizer nome de patrocinador de estádio, nunca decolou. A prática é muito comum no resto do mundo, mas aqui não pega. É um cu vender o nome dos estádios. Continuando no exemplo corintiano, o Diferenciadão/Itaquerão está ouvindo vários nãos por causa disso.

Foda-se todo o resto, se não vai gerar divulgação, não serve. Não importa ligar sua marca com um grupo de pessoas, não importa usar atributos de marca alheia, só importa se o investimento vai se recuperar no prazo desejado.

Me arrisco a dizer que mais importante ainda do que se ligar a um time que vai ganhar vários jogos é se ligar a um que faça alarde de como é caro comprar espaço em seu uniforme. Percebem que empresas adoram uma cláusula de confidencialidade quando gastam qualquer coisa QUE NÃO SEJA patrocínio? Sempre vaza quanto estão gastando. É a famosa lógica falaciosa do “doutor no carrão”, famosa entre o povão…

“Se pessoa ou empresa X pode gastar uma fortuna com divulgação, quer dizer que ganha muito, o que quer dizer que vende muito, o que quer dizer que é melhor que os concorrentes.”

O que nem sempre é o caso. Uma empresa desesperada também pode gastar uma fortuna em divulgação, para tentar vender mais produtos toscos encalhados. Evidente que a maioria das pessoas não segue por essa linha, até porque a ideia de que mesmo empresa bagunçada pode fazer muito dinheiro por um período de tempo limitado (ou pode ser um banco, que mesmo mal administrado pode lucrar muito e por muito tempo.) foge do escopo de conceitos mercadológicos do cidadão comum.

“Se está de terno e o carro custa mais que sua casa, só pode ser o melhor no que faz…”

Em patrocínios, isso funciona muito bem também. Parecer próspero é lucrativo. Pro povão, grandes merdas se a empresa paga dezenas de milhões para onze marmanjos correrem atrás de uma bola e alguns milhares para financiar um programa de alfabetização (feito meio que por “obrigação social” e usado basicamente nas propagandas de final de ano…). O status vende mais.

Muitos dos conceitos mais difundidos de publicidade são cortina de fumaça para o plano real. Uma das partes mais importantes desse jogo é continuar agindo LONGE da consciência e racionalidade das pessoas. Quanto mais você presta atenção nas mensagens publicitárias, MENOS elas funcionam. Sério.

O movimento do setor nesses últimos anos é te distrair da propaganda o máximo possível. Já cansou, já esgotou o valor de simplesmente dizer que é melhor, mais barato ou mais bonito. Tem que se misturar com entretenimento de vez para continuar funcionando. Cada vez mais o segredo é se esconder na multidão.

Não se assuste com os patrocínios absurdamente altos, a tendência é aumentar, com mais e mais empresas disputando a tapa essa chance de ouro de te pegar de surpresa. Rende, rende muito.

Não tem mais bobo no futebol…

Para me irritar transformando os comentários em conversa vazia de bar (pelo menos faça isso comigo tendo chance de encher a cara primeiro), para dizer que eu só falo mal de publicidade para me promover, ou mesmo para dizer que só respeitaria meu texto se eu estivesse de terno e gravata: somir@desfavor.com

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Comments (18)

  • Me impressiona o BMG patrocinando tudo quanto é time, até pouco tempo o São Paulo… mas ainda um monte de clubes.

    Minha última camisa do São Paulo número 02 é limpa, sem propaganda alguma. O SPFC usou assim por um tempinho em 2010. Assim eu compro.

  • “Uma empresa desesperada também pode gastar uma fortuna em divulgação, para tentar vender mais produtos toscos encalhados”- os bichinhos da Parmalat que o digam…

    Ou então serviços toscos e/ou duvidosos: Hicks-Muse-Tate-Furst, Boris Berezovski, Kia Joorabchian, Banco Panamericano, Banco Excel-Economico…

    • O bacana é que da primeira vez a Parmalat estava por cima e arrebentou com a campanha. Mesmo que estivesse sendo administrada por um bando de inconsequentes… Era a Super Parmalat que derramava milhões no Palmeiras.

      Mas quando voltou, foi meio… broxante. Claro, foi melhor do que não fazer nada, mas o povo já não sentia tão compelido assim. Como a empresa já tinha sido vista como fraca das pernas, não rolou a “identificação com o sucesso” que tanto ajuda nesses casos…

      O doutor chegou de fusca na reunião.

      • Mas eu ainda lembro com “carinho” daquelas propagandas de bebês fantasiados de animais da Parmalat. Eram adoráveis! Até o bigodinho de leite fazia a diferença…

        Acho que essa lembrança me remete à infância. Não seria uma prova do “poder” da publicidade em nossas vidas?

  • Logo que me mudei pra Curitiba comprei um mapa da cidade, e fiquei com cara de “????” quando vi a “Arena Kyocera”.
    Quem diria que justo com o Somir eu aprenderia o motivo disso, hein?

    • A Kyocera deve ter ficado muito feliz ao descobrir que a Globo exigia dinheiro para falar o nome do estádio… E muita gente deve ter ficado desempregada por não ter avisado isso para a direção da empresa.

      E, ei, estranho mesmo seria aprender algo sobre cultura popular, humildade ou interações humanas comigo…

  • Paulo César Nascimento

    Como vocês andam didáticos e edificantes! Os desfavorenhos (é esse o gentílico? ou seriam os desfavoráveis? Desfavorenses? Tudo, menos desfavoranos, em nome da sonoridade) reclamaram que os impostos não estavam revertendo em Educação e Saúde?

    • O gentílico é “impopulares”. Não gostou? Ha.

      Eu acho bacana essas fases construtivas, sempre dá uma limpada nos leitores mais “KKK GRIPE SUÍNA”.

    • Falando em champanhe, acho que vou falar sobre aquelas porras de propaganda de perfume na TV a cabo na próxima edição da coluna.

      Aquilo é o cúmulo da falsa elitização…

      • Olha, agora que não tenho mais TV a cabo em casa, admito que sinto falta dessas propagandas, elas são tão bonitas…
        E assim, antes elas do que a Xuxa usando Monange.

        • Ou a Galisteu usando Jequiti… Sério, disputar com Xuxa e Monange e acabar ainda mais brega é um FEITO! Parabéns para o Grupo Sílvio Santos.

          Sim, as propagandas são bonitas. Adoraria ter os recursos para fazer um desbunde visual desses nas minhas (aliás, só uma propaganda de TV sem colocar número de telefone e “ligue agora” já me deixaria tão feliz…).

          Mas, que é uma babaquice, é. Se ser rico é ser semi-retardado, as campanhas de perfume estão acertando no alvo.

          • Somir, o foco da propaganda televisiva é mais no “popular” e essa estratégia de “ligue agora” é um bom exemplo disso.

            A estratégia por detrás dessa jogada de compras por telefone (internet ainda é vista como pouco confiável pelos mais “conservadores” que em geral não tem a mesma parcimônia com o telefone) é justamente a redução nos custos logisticos.

            Manter lojas fisicas é um custo, cujo resultado nem sempre é o desejado, sendo que muitas vezes a equipe de uma terceirizada de telemarketing (com assalariados ganhando na faixa de 1 mínimo) dá melhores resultados que lojistas que além do salário ainda muitas vezes tiram uma boa comissão em cima da eventual superação das metas de venda.

            Para terminar, Jequiti não é uma coisa pra “rico”, sendo que as vezes me dá a impressão de ser uma opção no meio-termo entre a Avon (mundialmente conhecida pela sua linha de catálogo low-cost) e a Natura (que faz sua marca e agrega valor a seus produtos em cima do apelo “ecológico”), mas sem o nível de experiência das duas empresas em seus devidos nichos.

            O único trunfo da Jequiti sobre as duas empresas é no espaço que a empresa tem no marketing televisivo. Se não fosse por isso, Jequiti não teria nem condições de entrar nesse páreo.

            • Natura é uma “miopia ecológica”. Só uma parte (bem pequena) da produção usa matéria-prima sustentável. E eles fazem testes em animais.

              Serve para quem acha que comprar carro a álcool resolve os problemas do mundo. Em compensação é uma excelente empresa para se trabalhar.

              • Cara Carol,

                Sustentabilidade absoluta é uma utopia e se você diz da questão dos testes de animais (alvo da ira da turma do PETA), bem, lamento dizer que em nossa sociedade antropocêntrica, há a criação de animais justamente para a satisfação de tais necessidades.

                Antes que diga qualquer coisa, a agricultura e a criação de animais foi um avanço e tanto sobre a sociedade primitiva, que vivia basicamente as custas da difícil lida com a caça e a coleta extrativa.

                Tais criações foram muito úteis a nós, seja no que diz respeito a alimentação, seja no que diz respeito a outras formas de suporte, como no caso dos animais hoje criados em laboratório para fins de pesquisa por exemplo.

                Cabe esclarecer que os integrantes de grupos como o PETA se utilizam basicamente do apelo emocional que tem eco sobre o apego das pessoas aos animais de estimação (pets) para trazer subsidios em prol dessa organização e das duvidosas causas defendidas por ela.

                É importante separar o trigo do joio aqui, até porque o PETA hoje em dia vem fazendo muito pouco em prol da ecologia como um todo… Pra falar a verdade, a ecologia hoje sofre a sua crise da meia-idade.

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