Somir Surtado: O futuro preguiçoso.

Gosto de pensar que estou à frente do meu tempo. O vício em informação que minou meu status social na adolescência agora é norma entre as gerações mais recentes. A mania de elitismo cultural de “obscuridades” virou moda! O perfil de conhecedor de muitas coisas e especialista em poucas pouco a pouco vai se tornando bem mais vantajoso no mercado de trabalho do que era quando eu comecei. Acreditem em mim quando eu digo: O futuro é de quem só faz o que gosta e caga solenemente para toda essa coisa de disciplina profissional.

Trabalho como conhecemos está com os dias contados. Não vai ser amanhã ou nas próximas décadas, mas o caminho está cada vez mais traçado. A evolução tecnológica atual JÁ é uma singularidade. Pessoas vivendo, por exemplo, no começo dos anos 90 já seriam totalmente incapazes de prever o mundo que vivemos atualmente. Mas tem um padrão que vem se desenvolvendo de vento em popa desde a Revolução Industrial: A substituição do trabalho humano pelo mecanizado/eletrônico/virtual.

Tenho certeza que previsões desse tipo já foram feitas incontáveis vezes, até mesmo por pessoas que nem sonhavam com um computador. Mas ao fazê-la nos dias de hoje, tem um fator que muda demais o resultado: A relativa “fraqueza” do cérebro humano. Sempre se imaginava um futuro com robôs fazendo trabalhos braçais e repetitivos, mas a parte da criatividade e inovação ainda era monopólio da inteligência biológica.

Seguindo o padrão de evolução da inteligência artificial, e com um pouco de otimismo, em algo em torno de 2030 computadores já serão capazes de se passar por seres humanos numa conversa casual. Passando pelo Teste de Turing: O teste consiste de um juiz humano conversando com dois participantes, um humano e um computador. Se o juiz não conseguir distinguir um do outro apenas pela conversa, o computador ganha. Nenhum conseguiu até hoje (basta fazer uma pergunta cretina ou mudar de assunto do nada para perceber a inteligência artificial).

E quando (não SE, mas QUANDO mesmo) a inteligência artificial conseguir se parecer com uma humana, as coisas mudam demais. O mercado de trabalho atual demonstra uma tendência de transferência de vagas do setor de produção para o de serviços. As pessoas estão saindo das fábricas para ocupar vagas em atendimento de clientes.

A evolução considerável da capacidade robótica e as taxas de erro absurdamente pequenas de computadores vão tornando cada vez mais obsoleto o trabalho humano nessa área mais… física. Robôs e máquinas avançadas ainda são caras, mas não o suficiente para que muitas empresas façam essa transição nos próximos anos. E a tendência é o abismo entre trabalho humano e automatizado aumentar cada vez mais.

Digo isso para demonstrar que já existe uma demonstração desse padrão de obsolescência do trabalho humano. As máquinas VÃO ficar mais baratas e mais hábeis. Nós não vamos. O aspecto intelectual e criativo parecia nosso porto seguro, mas novamente… seguindo o avanço tecnológico atual, computadores com a mesma capacidade de processamento de uma mente humana BRILHANTE já serão vendido a preço de banana antes mesmo do final deste século. E quando esses computadores começarem a projetar novos computadores, possivelmente já quânticos, já vai ser complicado até prever algum limite para eles.

Importante ressaltar: O cérebro humano é impressionante, eu acho o pináculo da evolução biológica conhecida, mas de um ponto de vista mais frio, é relativamente fácil de bater com evolução artificial. Teoriza-se que nossa memória seja capaz de armazenar um petabyte de informação. E que todo o conhecimento humano não passe de alguns milhares deles. É MUITA coisa, mas atualmente, só os servidores do Facebook conseguem armazenar 100. E se você não sabe o que é um petabyte, assuste-se: São 1000 terabytes. Os HDs mais vendidos na atualidade armazenam um ou dois teras.

É muita coisa, mas ao mesmo tempo, já estamos muito próximos disso. Você provavelmente vai viver para comprar um aparelho com pelo menos um petabyte de memória. E se não acontecer nenhuma desgraça, esse aparelho provavelmente vai ser capaz de simular uma mente humana.

Quando isso acontecer, adeus funcionários de telemarketing, adeus caixas, adeus técnicos de TI, adeus toda e qualquer função que exija apenas a habilidade de clicar e teclar. As empresas vão cortar custos assim que puderem, e essa desoneração na cadeia de comércio deve baixar preços a um ponto onde as pessoas mal vão reclamar dos empregos perdidos.

Mas aqui eu não estou sendo lá muito inovador na abordagem. Esse crash no mercado de trabalho convencional está previsto há muito tempo e vai acontecendo lenta e consistentemente há várias décadas. Ou você acha que desemprego em alta no mundo todo é PURA problemática das bolsas de valores? O meu ponto aqui é bem mais dramático…

A sociedade humana vai ser capaz de se manter numa boa sem uma única gota de suor, e não vai demorar tanto assim. Dependendo dos avanços na medicina, podemos até vivenciar essa era. Imortalidade é uma busca que só está começando “na prática”, mas tende a gerar frutos saborosos nas próximas décadas. Mesmo que não dê para ser eterno, existem chances de nós mesmos começarmos a passar de cento e cinquenta anos de idade.

A tendência mais razoável para um mundo onde máquinas e inteligência artificial cuidam de basicamente tudo é a do direcionamento para a parte mais artística de nossos cérebros. O caminho que começou na produção e atualmente está na fase dos serviços tende a virar foco em arte e criatividade. E mesmo esse foco não deve acabar como a última grande fase da organização socioeconômica humana… A inteligência artificial vai ser capaz de criar obras de arte únicas sim. Não precisa de mágica, só de um algoritmo de aleatoriedade poderoso.

A busca pelo conforto nos levará até uma era de vagabundagem. Não PRECISAREMOS mais dessa ética e disciplina de trabalho… Tudo o que fizermos, um computador vai eventualmente conseguir fazer melhor. E a partir dessa previsão, um ditado antigo: Se não pode vencê-los, junte-se a eles. É garantido que vamos acabar nos mesclando com a tecnologia que ajudamos a criar. O cérebro humano é limitado e nosso corpo frágil demais. Só vai sobrar a curiosidade, a sede de conhecimento… e provavelmente, a vontade de “fugir” para realidades menos exigentes.

Claro que não escrevo este texto para defender que viremos um bando de vagabundos AGORA, mas com o caminho suficientemente delimitado, ganha mais quem começar a se adaptar agora: Seja se dedicando a construir esse futuro (que não é utópico, vai ter seus problemas e vai ter gente reclamando, sempre), ou mesmo entendendo que cada vez mais fazer o que quer da vida tende a ser mais lucrativo, tanto no aspecto financeiro como no de realização pessoal.

Criar filhos para “ter uma profissão segura” é cada vez mais irresponsabilidade e futurologia furada. A maioria das profissões em ascensão no mercado de trabalho atual sequer existiam há CINCO anos atrás. Essa é a realidade dos dias de hoje. Não se apegar demais ao conhecimento acumulado e entender que a era de se estabilizar e se aposentar fazendo a mesma coisa está com os dias contados.

O mercado virava de ponta cabeça numa velocidade muito menor do que hoje em dia. Gente que cisma com uma ideia maluca e leva em frente tem muito mais chances de ficar rica nos dias atuais do que em qualquer outra era da história humana. Criatividade está virando o novo esforço. Bem afortunados os que conseguirem unir uma mente antenada e disciplinada nos dias atuais.

Se matar de trabalhar para viver a vida nos intervalos é um conceito terrível. Sempre foi. Mas a nossa marcha (como espécie) em busca do conforto e da realização criativa existe justamente para acabar com essa aberração. Sei que não vai ser festa e que quem tem o poder de usar a humanidade como gado não vai abrir mão dessa vantagem por pura bondade, mas não adianta teimar contra o tempo.

Essa paranoia golpista de trabalho duro instilada na cabeça das pessoas depende demais de condições precárias de vida e de falta de alternativas mais simples e baratas para realizar essa manutenção básica da humanidade. Esforço desagradável só é válido numa sociedade onde ele é essencial. Com braços e mentes robóticas para tirar esse fardo das nossas costas, a construção social do trabalhador abnegado começa a se aproximar mais de mero masoquismo.

O futuro é de gente preguiçosa, mas criativa. Gente com tempo de passar a vida fazendo só o que é agradável e recompensador. E mesmo que esse futuro robótico ainda esteja muito no campo teórico, o mesmo não se pode dizer da tendência do aproveitamento do talento humano disponível. A internet, por exemplo, pode estar apinhada de imbecis mais preocupados em mendigar atenção no Facebook do que aprender, mas também conseguiu conectar os sonhos e planos de muita gente boa. Gente animada com o prospecto de seguir seus projetos pessoais e explorar o conhecimento acumulado da espécie.

As máquinas e inteligências artificiais estão mesmo aí para nos substituir, e só quem entender como isso é uma coisa boa vai se dar bem daqui para a frente. Não perca seu precioso tempo de pensar e fazer o que quer se tem alguma máquina feita para fazer seu trabalho. A humanidade chegou onde chegou por ser exímia na arte de se adaptar. Abram alas para o futuro!

Mesmo que isso signifique relaxar um pouco. Adoraria poder nascer só daqui a uns 50 anos, essa coisa de trabalhar por trabalhar é muito velha para mim…

Para dizer que foi a desculpa mais esfarrapada para preguiça que já leu, para fazer suas próprias previsões sobre o futuro da espécie, ou mesmo para perguntar se quando eu furo as postagens eu estou “à frente do meu tempo” também: somir@desfavor.com

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Comments (43)

  • Lá vou eu de novo – discordar atrasado…simplesmente não consigo acompanhar postagens diárias.

    Acho que ficar fazendo previsões para um futuro distante é deveras inútil, especialmente quando tenta ser específico. Mas já que a brincadeira é essa vamos lá…

    Concordo que certas capacidades do cérebro humano são substituídas de maneira vantajosa por máquinas, mas não sei se todas. O único dado mencionado no texto é a capacidade de armazenagem de informações que é UMA das características absurdamente estonteantes da mente humana.

    Acho que para funções básicas de atendimento as máquinas vieram pra ficar, mas isso sempre foi assim. Os livros em certo momento da história substituíram mestres ou contadores de histórias. Uma tecnologia nova substituiu o trabalho do homem.

    Em inúmeras outras áreas a interação humana é necessária e desejada e aposto que será assim por muito tempo ainda. Não vejo esse futuro de ócio e preguiça e se ele acontecer fatalmente resultará em guerras e conflitos pois o ser humano quando fica sem ter o que fazer só faz merda.

    E por conta disso o trabalho braçal odiado por alguns não vai desaparecer também. Precisamos dele, nossos cérebros primitivos se desenvolveram assim, e e isso não vai mudar em 100 ou 200 anos de computadores mais rápidos. Muitos distúrbios psicológicos surgem da falta de trabalho, do tédio. Será que é o cérebro dando tilt por falta de trabalho?

    Vou fazer a minha previsão usando as premissas do Somir. O trabalho braçal básico continuará perdendo força, a subsistência básica estará praticamente garantida. Uma fatia considerável da população se entregará a realidades virtuais onde eles podem ser quem quiserem, de estrelas do rock a um elfo em Senhor dos Anéis. Enquanto isso, um grupo de poderosos irá manipular essa massa em seu favor, ampliando seus poderes e lutando uns com os outros. A massa irá assistir anestesiada essas brigas sem querer se meter. Com suas necessidades básicas satisfeitas não haverá razão para se estressar. O Brasil finalmente será uma potência mundial.

  • Isso me fez lembrar de uma história em quadrinhos do Juiz Dredd. Naquele futuro, o trabalho era tão automatizado e as máquinas tão eficientes que muitas pessoas entediadas por não ter como ocupar o tempo seqüestravam robôs, como os da limpeza, para poder ficar trabalhando no lugar deles. O objetivo final era pegar uma pena de trabalhos forçados, para poder ficar anos trabalhando sem se entediar.

    Em Admirável Mundo Novo também tem uma parte onde é relatado como uma redução no trabalho normal aumentou o consumo de soma (droga legalizada e incentivada pelo governo) e os suicídios, porque as pessoas ficavam entediadas e acabavam tendo outros problemas psicológicos por falta do que fazer.

    Resta saber se essa necessidade de trabalhar por trabalhar realmente existe. Será que, depois de tantos milênios em que a maioria da humanidade quase sempre trabalhou regularmente, o trabalho não teria se tornado quase uma necessidade biológica? Será que essa transição relatada no texto vai ser algo fácil e pacífico?

    • Não sei se o correto é dizer que o trabalho se tornou uma necessidade biológica, acho mais certo dizer que ele é parte da humanidade. Nossa mente evoluiu ao longo de milênios na mais absoluta escassez. Por conta disso o trabalho duro é uma realidade que a nossa mente reconhece como a condição padrão.

      O trabalho duro nos trouxe até aqui. Só ele nos levará mais longe. Pode ser outro tipo de trabalho, mais mental e menos físico, mas não consigo enxergar nossa evolução sem trabalho. Sem trabalho o ser humano só faz merda. São pouquíssimas as pessoas capazes de funcionar adequadamente sem uma atividade constante.

      Isso não é uma construção cultural dos capitalistas malvados, ao contrário, é uma contrução evolutiva da natureza malvada. Trabalhar pra sobreviver é nosso destino. E isso é bom.

  • A fase de transição que seria complicada. Geral foi contra catracas eletrônicas, meteram tanto o pau na atendente virtual da Oi que acabaram tirando. Sei lá… as pessoas gostam de lidar com pessoas, mas se for tudo assim como no texto, seria muito positivo.

  • Escravo de Call Center

    Outro dia eu li no Google que até mesmo os teleoperadores no futuro serão substituidos pelos programas de computador. Pensando bem é melhor, imagine aqules clientes paunocu que ficam ligando pro SAC pra fazer as perguntas óbvias, pra cada pergunta tem uma resposta de acordo com a intranet da empresa e isso seria facilmente substituido por um robô. Não precisa manter um escravo pra fazer esse trabalho pagando uma mixaria já que pelo programa de computador os lucros da empresa multiplicariam e o desemprego também.

    • Eu não mencionei, mas outra das previsões é o mundo virtual.

      Muita gente vai ficar plugada em realidades virtuais podendo fazer o que bem entender sem consequências. A sacanagem com certeza vai estar por lá…

  • Somir…
    essa semana vc está realmente inspirado em seus textos, todos ótimos!!
    Até salvei pra reler (temo que o blog saia do ar…um dia…num futuro nada distante)
    Abção

  • A primeira palavra que veio à mente ao ler seu texto foi “Outsourcing”. Sou fã da aplicação dessa expressão na forma que foi exposta aqui, até porque remonta, com as devidas proporções, ao sucesso das economias capitalistas mais avançadas do século XVI e XVII, que nos trouxeram muita inovação e criatividade, redundando em conceitos e fórmulas até hoje utilizados.

    Mas o que me preocupa nessa delegação de responsabilidades é deixarmos de ter a capacidade de ação e de intelecto para atuar de forma subsidiária caso algo dê errado, como W.O.J. muito bem comentou. Fiquei traumatizada com as circunstâncias do acidente do vôo AF 447 como perspectiva para esse mundo maravilhoso que espero estar viva para curtir…

    • Como sempre, tem o lado positivo e negativo…

      E a sua preocupação tem muito sentido: Isso já acontece. Principalmente no que tange à velocidade da tomada de decisões. Algorítimos já “mandam e desmandam” nas bolsas de valores.

      Temos um limite biológico na capacidade de tomar as rédeas das tecnologias que nos mantém, e ele está chegando. Nem puxei o tema porque daria muito pano para a manga, mas precisaríamos colocar máquinas dentro de nossos corpos para acompanhar o ritmo. Com apoios do tipo, os pilotos de um vôo como o AF 447 poderiam ter baixado o guia de instruções antes de tentar a manobra que derrubou o avião.

      Não dá para a humanidade continuar na versão pré-alpha enquanto os computadores já estão na versão comercial.

  • O conhecimento de ponta desenvolvido pela humanidade deve estar a patamares assustadores pra uma pessoa comum como eu. O problema está no tempo de prioridade de aplicação em massa sobre tudo o que já está em mãos de cientistas que lidam com processos mais avançados. Como o Phil citou nos comentários, coisas como ética e a capacidade de adaptação (e porque não alma?) é algo humano, que no fim das contas está por trás de todo esse quiprocó, e não tenho notícias de algo que emule essas características humanas. Furacões e tsunamis são rascunhos de eventos conhecidos, mas fora do comum, que botam em cheque as ferramentas de previsão e sua forma de lidar com eles. O ponto mais interessante é a questão sobre a “ética do trabalho”, que é possível comprovar a olhos vistos desde agora. O salto dado pela humanidade dos anos 90 pra cá dá uma noção de que outro mundo nasceu. Quem diria que a internet notearia as nossas vidas tanto assim. Pra uma cabeça dos anos 80/90 isso seria impossível (mesmo que embriões do que seria a internet já estivessem por lá, mas pra poucos). Coisas assim refazem a forma das pessoas encararem suas ocupações e, por que não? suas vidas, já que uma carreira no sentido padrão e o aperto de mão do chefe em reconhecimento de algo é menos relevante do que antes.

    • Toda evolução tecnológica passa por essa fase meio obscura antes de cair no gosto popular. É essa coisa de “necessidades básicas que ninguém sabia que tinha”. Tem muita gente correndo atrás de tecnologias que viram o nosso mundo de ponta-cabeça atualmente… bioengenharia, nanotecnologia… Vem aí uma era “micro”.

      E sobre a questão da ética, da “alma”… No texto da Teoria dos Jogos eu já tinha levantado a lebre de que muitas dessas noções “nobres” do comportamento humano tem sim sustentação lógica e probabilística. Não vai ser da noite para o dia, mas a inteligência artificial tem como aprender a ser… humana. Até porque um dos caminhos mais prováveis é o da fusão. Nós seremos as máquinas.

  • Somir, conhece as idéias do Domenico de Masi, cujo livro O Ócio Criativo toca nesse assunto?
    Toda essa enervante, escravizante, alientante engrenagem de trabalho está mesmo com os dias contados e os medíocres, os que se agarram na ilusão de posto de comando para descarregar suas frustrações, esse vão penar nas mãos do demo! Pena que não estarei vivo para gozar das delícias de trabalhar em casa, sem ter que aturar esse povinho dos infernos aqui do meu trabalho.

    • Sim, foi uma das inspirações. Mas como a nerdice é mais forte, tinha muita coisa sobre tecnologia que eu andava lendo e estudando recentemente que valia a pena usar.

      E não desista tão cedo de presenciar este futuro. Estamos numa singularidade.

  • Somir, discordo e muito de você aqui, pois você está exacerbando em muito uma tendência atual na tentativa de construir um mundo utópico como projeção para o futuro.

    A evolução não se faz apenas na direção do avanço como também do retrocesso, sendo que você está minimizando demais as tendências que põem a sua colocação em xeque.

    Um HD de um Petabyte é perfeitamente viável, dado que já se tem Pendrives de 512 GB em oferta por ai a um preço bem baixo, mas de resto, há muita mitificação tecnológica. Acho pessoalmente que é bem mais provável que tais dispositivos fiquem enfocados mais em armazenar vídeos do que em funcionar com sistemas avançados de inteligência artificial.

    Ah, sim… Tem também a tendência da nivelação por baixo e de uma “humanização” das pessoas no sentido de mostrá-las como algo mais complexo que a máscara social que temos delas hoje, sendo que o mercado da imagem tem prosperado a reboque desta “revolução” no campo tecnológico.

    Só que com a notável exceção de alguma ou outra subcelebridade instantânea, tendem a ser poucos os que vão aproveitar o melhor do potencial de sua exposição, sendo que é por isso mesmo que a Sally fica sempre apitando no ouvido quanto a questão da “Evasão de Privacidade”.

    Não se tocou no calo que dá sustentação ao “admirável mundo novo” que você tanto idealiza, que está justamente na questão dos recursos, seja em termos de suprimentos, de conhecimento ou mesmo de sua posição em meio ao jogo do poder.

    É pertinente lembrar que o fato de se ter uma tecnologia muito avançada disponível que ela vai ser vantajosa a nível financeiro a ponto de substituir totalmente o “trabalho” humano, sendo que pode ser mais vantajoso manter uns “china” em semiescravidão do que investir em maquinário para automatizar o trabalho feito por eles.

    Desculpe-me dizer, mas o mundo não é nem de longe a maravilha que você quer acreditar. A ditadura da imagem e das aparências continua firme e forte e questionar isso é uma coisa que pode render sérias represálias.

    • Correção: É pertinente lembrar que o fato de se ter uma tecnologia muito avançada disponível NÃO QUER DIZER que ela vai ser vantajosa a nível financeiro a ponto de substituir totalmente o “trabalho” humano, sendo que pode ser mais vantajoso manter uns “china” em semiescravidão do que investir em maquinário para automatizar o trabalho feito por eles.

    • Marciel, você transformou o cinismo em base da sua visão do mundo. Suas premissas contaminam demais suas previsões. O problema dessa base é que ela não se sustenta realisticamente no decorrer da história humana.

      Antes da virada do século 19 para 20, chegaram a sugerir o fechamento do escritório de patentes porque “não tinha mais o que inventar”.

      Os desafios de uma sociedade viciada em “junk tudo” (comida, informação…) num planeta onde os recursos estão ficando cada vez mais escassos com certeza não podem ser ignorados, mas o rumo da tecnologia sugere o NECESSÁRIO foco em eficiência e miniaturização.

      O futuro não é utópico, vai ter uma cacetada de problemas, principalmente ambientais, mas problemas diferentes dos atuais. E a partir de um certo ponto de fusão entre inteligência biológica e artificial, mesquinharia e limitação intelectual vão deixar de ser vantajosas, mesmo para quem tem posição de poder.

      2050 vai ser o pico da reprodução humana na Terra. A tendência a partir dali é recuar…

      • Já no curto prazo se abre uma guerra nas questões relacionadas a marcas, patentes, direitos autorais, controle de acesso e do uso da tecnologia em si, onde uma série de indivíduos, empresas e corporações brigam entre si defendendo os seus próprios interesses no jogo, com o objetivo de tirar o máximo de vantagem possível de sua posição.

        Não se pode desconsiderar a tendência do cerceamento a informações relevantes (com o objetivo de manter relativamente intocado o status quo) e da consolidação do público em geral ora como mero “consumidor” de tecnologia, ora produzindo conteúdo com ganhos apenas marginais no processo.

        A depender do andar da carruagem, a dita “internet” pode ficar cada vez mais e mais parecida com a TV, onde os hotspots tendem a concentrar grande parte da audiência em detrimento dos canais ditos “alternativos”.

        Alguns poucos, por sua posição dentro do jogo, tendem a sair em vantagem na posição ora do desenvolvimento tecnológico, ora no que diz respeito ao desenvolvimento de “conteúdo”, mas estes serão exceção em um meio onde a maioria das pessoas deverá continuar ganhando a vida em “subempregos” em áreas pouco relacionadas a “alta tecnologia”.

        Quanto a estrutura corporativa, bem… Ela deve permanecer firme e forte, ainda que com um razoável número de baixas provocadas pelos ciclos recessivos, sendo que os “felizardos” que ainda conseguirem se manter sob esse guarda-chuva poderão ter uma razoável vantagem sobre quem está de fora dele.

        Não vejo para os próximos dez ou vinte anos um futuro muito diferente em relação ao momento que vivemos hoje, assim como as diferenças entre o hoje e o momento de dez ou vinte anos atrás são relativamente sutis, a despeito do desenvolvimento ocorrido em áreas específicas, como a informática, a telefonia, a internet e a genética por exemplo.

        Por mais importante que seja o conhecimento em si, não podemos ignorar a importância da aplicação de tais conhecimentos em nosso cotidiano, sendo que este é o principal gargalo no que diz respeito ao avanço de nossa sociedade na direção de uma vida mais produtiva e menos penosa.

  • Raciocínio perfeito com relação a forma de reconhecimento. Mas a minha grande descrença não se baseia na premissa de que o computador poderá reconhecer padrões… apenas na premissa de que, para um computador funcionar igual ou melhor que um ser humano, pelo menos com questão a comportamentos sociais, é necessária uma “vivência”. Nesse caso, estaríamos falando de computadores “vivos”, que sentem e pensam independentemente de circuitos. Isso, para mim, é o mais inviável… seria como criar novas pessoas do zero.

    • Mas aprender por meio de experiências, sejas as identificadas pela IA ou através de dados em sua base, programadas, esse é o objetivo.

    • Nem mesmo os seres vivos independem de circuitos. A máquina biológica ainda é uma máquina… Simular a estrutura do que é ser humano tende a gerar um ser humano. Programe “ilusão de escolha” numa máquina com capacidade de armazenamento e processamento próximas de um ser humano e ela VAI agir de forma basicamente igual a qualquer um de nós.

      Nós somos programados pelos nossos pais e pelos estímulos da sociedade. Basta emular isso.

  • Bruno Vasconcelos

    Ótimo o texto. Me identifiquei bastante: Tenho 16 anos, curso dois técnicos(estou terminando um) e já me inscrevi ainda essa semana para fazer automação industrial, a automatização de processos, justamente tratada no texto. A rápida substituição do homem pela máquina sempre me causou arrepios! Mas acho que é tempo de se juntar a ela.

    Arrisco uma previsão: Com a automatização de quase tudo, muita gente e pouco emprego… As pessoas vão cumprir espécies de “cota” de trabalho. Algo como trabalhar em algo por uma semana, a cada três meses para o estado. As técnicas de plantio vão ser aprimoradas, com a ajuda da máquina, e não faltará comida para ninguém. A maior parte do tempo vai ser lazer (alguém limpa por uma semana, depois outro. Alguém faz manutenção por uma semana, outro opera… e assim vai)

    • É isso que a humanidade faz: Se adapta.

      Eu acredito que a própria noção de emprego vai começar a perder o significado. Imagine só quando trocar de profissão significar apenas “baixar” um novo conjunto de conhecimentos e habilidades? As “profissões relâmpago” dos dias atuais são uma espécie de ensaio para isso.

  • Eu gostaria muito de ser congelado e acordado daqui 50 anos, mas muito mesmo.
    Hoje vejo coisas com as quais sonhei quando criança… Sonhava com celulares, tablets, assistindo Star Trek quando moleque. Se falassem para muitos adultos na década de 80 sobre isso ser possível, provavelmente eles iriam rir, hoje é tão normal e corriqueiro.

    A Lei de Moore continua sendo válida. É verdade que a velocidade dos processadores não aumentaram como eu imaginava mesmo que aconteceria, uma questão de lógica, mas as formas como processam, outras tecnologias agregadas ainda evoluem… Fico pensando no quão fantástico vai ser o mundo daqui 5 décadas de evolução nesse passo, e talvez em determinado ponto ainda acelere mais.

    Costumava dizer que todo bom programador é preguiçoso, claro que poucos entendem o que quero dizer com isso… Mas tenho certeza que você entende Somir.

    Na faculdade com amigos desenvolvi um sistema que usa inteligência artificial para identificar tentativas de invasão, criando regras dinâmicas no firewall, adicionando novos cabeçalhos ao IDS, respondendo ao ataque em tempo real. E ainda enviava sms para o adm da rede. (Claro que rodava no Linux)

    E funcionou. Só foi abandonado.

    Hoje vivo trabalhando para viver nos intervalos, um trabalho chato…Mas que paga bem, por isso estou acomodado. Mas cansado disso, preciso ser mais que um Space Monkey e trabalhar com a criatividade.

    (ótimos textos essa semana, sobre teoria das cordas e agora esse…)

    • A preguiça é fundamental. A preguiça nos tirou das cavernas… Preguiça não é inércia, é motivação! “Aproveitar intervalos” é um modelo cruel e espero que mais e mais gente comece a lutar pelo fim disso.

      Aliás, bacana a ideia do sistema de defesa… sempre achei estranho porque essa resposta “orgânica” a ataques não era mais implementada. A natureza faz isso há bilhões de anos… É falta de interesse do mercado ou falta de conhecimento para aplicá-la em larga escala?

      • Junta as duas coisas com uma terceira que é a preocupação com o eventual custo dessa “brincadeira” e você vai ver porque as empresas se enfocam pouco nisso.

      • Na verdade ninguém se interessou e a o projeto acabou morrendo… Não tenho explicação, muitos ficaram empolgados na época, ficaram com nossos contatos, mas nenhum retorno.

        Acho que também não basta uma boa idéia, é preciso algum empreendedorismo, e nisso eu nunca fui bom. Não sou uma pessoa ‘comercial’.

        Praticamente foi isso.

  • Interessante o seu ponto de vista, Somir. Também vejo essa situação mais ou menos do mesmo jeito, mas… Você também não teme que a humanidade passe a um dia ser extremamente dependente dos robôs a ponto de não conseguir mais “se virar” sem eles após algum inesperado acontecimento cataclísmico? Continuando com as tentativas de prever o futuro, imaginemos que esse “mundo da preguiça” que você anteviu aqui realmente seja realidade daqui a algumas décadas. Imaginemos também que isso perdure por várias gerações, até que ninguém mais lembre ou saiba como era fazer as coisas sem ajuda de robôs. Com isso, muito do conhecimento sobre “trabalho braçal” acumulado por séculos pode se perder simplesmente por falta de uso. Agora, imagine se algo totalmente imprevisto e devastador acontecesse e mudasse tudo de novo no mundo. A história humana é cheia de viradas, reviravoltas loucas e ciclos. Poderia ser uma guerra maior que todas as anteriores, excesso de poluição, invasão alienígena, apocalipse zumbi, Skynet dominado o planeta, Matrix escravizando a humanidade… Qualquer coisa dessas que já tenham sido aventadas em ficção científica ou algo em que ainda não pensamos. O que aconteceria depois? Se os robôs simplesmente não existissem mais ou se se voltassem contra os humanos? Os humanos estariam fragilizados, com sua capacidade de trabalho independente embotada, atrofiada por anos de dependência das máquinas… Mais ou menos como já acontece hoje com jovens mimados superprotegidos pelos pais e que chegam à idade adulta sem saber fazer coisas triviais por terem sempre quem fizesse tudo por eles… Será que a humanidade também poderia ficar como no filme Wall-E? Todos gordos, sedentários e incapazes de qualquer coisa física mesmo em momentos de necessidade? Trabalho físico realmente não é agradável e tampouco é uma tendência para o futuro, mas não sei se é realmente bom que desapareça de todo… Alguma capacidade de se virar sem um robô que faz tudo pela gente ainda é – e acho que talvez sempre seja – necessário. E mais: essa situação que você prevê pode ainda ter outros “efeitos colaterais” sobre os quais não tenhamos pensado…

    • Futurologia é tudo menos uma ciência exata. Podem acontecer muitas coisas nesse caminho que eu transcrevo/sugiro no texto, mas por incrível que pareça, estou me baseando numa ideia até que conservadora de relação com as máquinas:

      Simbiose. O ser humano não vai entregar todo o controle de bandeja, somos bélicos demais para isso. Mas nada impede que comecemos a integrar essa tecnologia nos nossos corpos, possivelmente até substituindo o cérebro por completo. Para não perder a corrida evolutiva, temos que virar máquinas.

      E quanto mais a tecnologia avança, menor parece esse abismo entre inteligência artificial e “natural”. Pode acontecer algo horrível como a primeira leva de humanos robóticos escravizar os biológicos, até desconfio que vai ser mais ou menos assim por um tempo, mas mentes MUITO inteligentes não tendem a ser tão sedentas por poder.

      “There’s no free lunch”, é claro. Entendo sua preocupação, mas acho que não vai ter uma separação tão clara assim entre eles e nós.

      • E tb não sei o quanto o ser humano reagirá com “retornos” em outros quesitos.

        Por exemplo: dado que teremos muito tempo livre, muita tecnologia à disposição e coisas semelhantes, pode ser que as pessoas comecem a valorizar coisas “antigas” como jardinagem, plantação, vida no campo, vida saudável, etc. Pode ser que ao invés de engordar, teremos uma geração de pessoas super saudáveis…

  • Não entendo o suficiente de neurologia para contestar essa afirmação, mas não parece meio furado que máquinas poderão realizar o conceito de ética assim como o ser humano? Ética, que é “experiência de vida” raciocinada com sentimentos pessoais e adequamento social vivenciado… será que uma inteligência artificial poderia realmente reproduzir isso?
    Sei que, trocando em miúdos e colocando de maneira grosseira, nosso cérebro nada mais é do que um processador gigante… mas a capacidade de criar e se adaptar sempre foi 100% humana. “Viver” ainda é uma qualidade de nós, seres biológicos. Não existem, ao meu conhecimento, previsões de uma máquina que consiga reproduzir isso. Será que é, de fato, possível?

    • Não é ainda. Mas certamente será.
      Pense em coisas simples de hoje mas que eram utopia até tempos atrás.
      Por exemplo, você fala em um microfone e o google te devolve um texto digitado, com uma acurácia interessante. O interessante é que ele reconhece diferentes tipos de voz e sotaques. Não é uma coisa totalmente pré-programada, necessita de certo improviso e adaptação do software e das máquinas envolvidas.
      Eu comprei um tablet com caneta e fiquei espantado com o reconhecimento de escrita do software dele, que tem um potencial muito maior que sua capacidade atual. Parece algo trivial, mas é interessante analisar que ninguém escaneou minha letra manuscrita. Funciona tudo na base de reconhecimentos de padrões e relação com um determinado tipo de conhecimento acumulado (nesse caso, um dicionário em língua portuguesa).
      E quem funciona predominantemente dessa forma? Voilá!

      • Marok, eu dei uma resposta a esse comentário ali em cima. Começa com “Raciocínio perfeito”.

        Sim, eu sou extremamente desatento.

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