Des Contos: Ozon – Parte 6

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O corredor até o setor C-9 estava iluminado apenas pelos resquícios das luzes da Fábrica. Com as baterias já em estado crítico, o andróide médico não podia oferecer sua potente lanterna como apoio na caminhada. Ambos reeditavam a jornada às cegas de anteriormente, mas dessa vez com os sons dos impactos do tiroteio que acontecia ao lado tornando tudo ainda mais desorientantador.

HEITOR: Quantos metros até lá?
ANDRÓIDE MÉDICO: Zzznap… *sons incompreensíveis*
HEITOR: Sua caixa vocal deve ter falhado de vez. Mande suas mensagens para meu visor.

No visor de seu capacete, Heitor enxerga uma chuva de caracteres desconexos. Depois de três tentativas com o mesmo resultado, pede para o andróide cessar a comunicação. Enquanto avança pelo corredor, os arredores ficam cada vez mais escuros, até que finalmente as duas pequenas luzes em seu capacete e a pequena luz vermelha pulsando no topo da cabeça do robô são as únicas coisas visíveis ao redor. Os sons da batalha na Fábrica vão ficando cada vez mais raros e distantes.

Depois de alguns minutos, os caracteres aleatórios começam a ocupar sua visão. Heitor pede para o andróide parar; o que acontece por apenas alguns segundos… mais e mais letras e números sem sentido cobrem sua visão. Heitor dá a ordem para o andróide cortar a comunicação. Além de não obedecer, a robô médico ainda acelera o passo e para bem na frente de Heitor, cena reconhecível apenas pela iluminação que emanava do avariado crânio metálico. Heitor para também.

HEITOR: O que foi? Você… você não trocou de lado, né?

Heitor prepara o rifle. O andróide continua imóvel.

HEITOR: Chega! Se eu não chegar lá logo o Piloto vai morrer… Sai da frente!

Ele avança mais um passo. O andróide aproxima-se. Heitor tenta desviar, mas é impedido por seu guia até ali. Com um empurrão, desequilibra o já fragilizado robô e acelera o passo. O som do andróide caindo é logo seguido de passos metálicos rápidos. Heitor começa a correr, mas não é páreo para a máquina, que o alcança e ultrapassa em poucos segundos. Ele estranha quando o robô ganha uma grande distância na frente e para novamente bloqueando o caminho.

HEITOR: O QUE VOCÊ QUER?

O andróide manda mais alguns caracteres para o visor de Heitor. Ainda incompreensíveis. Tenta emitir um som, mas continua incapaz de formular qualquer palavra com sua caixa vocal. Heitor começa a andar novamente.

A resposta do andróide é dar um passo para trás. A luz em sua cabeça, único elemento visual no breu absoluto do túnel, cai em alta velocidade. Heitor finalmente percebe o que acontecia enquanto acompanhava a luz desabar num fosso aparentemente sem fundo. Ele se ajoelha onde está e começa a engatinhar apontando suas pequenas lanternas para o chão do túnel. Vários buracos dando diretamente na área de mineração; transformando o solo numa armadilha mortal, ainda mais nessa escuridão.

HEITOR: Seu imbecil… era só ter apontado o chão… mas você é BURRO demais para fazer isso, né? LATA-VELHA! LATA-VELHA! AGORA EU ESTOU SOZINHO! Sozinho! Lata velha…

Com o punho em riste firmemente plantado no chão e já sentindo o gosto salgado de uma lágrima, Heitor lembra-se do Piloto. Depois de um longo suspiro, recompõe-se o suficiente para navegar pelo esburacado solo. Agora de forma bem mais lenta. À frente percebe também buracos nas paredes, por onde consegue enxergar a distante entrada da Fábrica, agora bem mais calma. Robôs de mineração novamente postados em formação.

Cada vez menos túnel e mais vazio por seu caminho. Alguns metros á frente, enxerga uma fraca luz amarelada e intermitente vazando pelo o que sobrara da porta de entrada do setor C-9. Com um ponto focal mais bem definido, as dificuldades de navegar pelo túnel ficam bem menores. Em pouco tempo ele finalmente chega à ante sala do reator, onde apenas uma débil luz pulsa de um painel de comando mecânico avariado. O resto do lugar está em frangalhos: é difícil até navegar pelo entulho espalhado pelo chão.

Após escalar uma pequena montanha de ferro retorcido, fiação e compostos eletrônicos, Heitor chega até a chave de controle manual do sistema, logo abaixo da luz. Uma alavanca metálica protegida por uma caixa translúcida de nanoplásticos ultra resistentes, com um botão logo ao lado para liberá-la. Heitor aperta o botão. A proteção da caixa se abre ao mesmo tempo em que o sistema de seu traje desliga-se. Os reforços mecânicos que conferiam a ele força suficiente para aguentar o peso de todo o material utilizado em sua proteção deixam de funcionar também. Heitor desaba no mesmo segundo, como se estivesse preso num grande imã.

O ar dentro do traje esquenta por alguns segundos por causa de sua respiração desesperada, mas começa a esfriar logo em seguida pelo término das funções de aquecimento interno. Com enorme esforço, consegue virar a cabeça o suficiente para ver que até a luz do painel apagara-se. Heitor não se lembrava de nenhum mecanismo de pulso eletromagnético protegendo a alavanca. Pelo menos nunca o avisaram sobre isso no treinamento. Seu traje estava “frito”, assim como quase tudo ao seu redor que estava ligado durante o pulso, sabe-se lá por qual extensão.

Mas não havia tempo para contemplar a extensão dos danos, se Heitor quisesse ter alguma chance, teria que puxar aquela alavanca e torcer pelo melhor. Tirar o traje não era uma opção, Heitor congelaria ou sufocaria em poucos minutos. Com um grito de esforço que ecoou dentro do traje, Heitor levanta o braço direito, que deveria pesar umas cinco vezes mais que o normal dentro do extremamente denso traje. Com dois dedos esticados no limite de sua resistência consegue finalmente puxar a alavanca. Os sons de máquinas religando ao seu redor é seu último alento antes do esforço cobrar sua dívida e sua consciência se esvair no cada vez mais rarefeito ar restante no capacete.

Já acostumado com a experiência, Heitor recobra os sentidos em estado de alerta, procurando entender logo onde está. Embora não a tivesse visitado até agora, lembra das luminografias de seu treinamento para reconhecer o setor MB-1. Deitado numa maca, uma forma conhecida o dá as boas vindas.

ANDRÓIDE MÉDICO: Funções vitais estabilizadas. Deseja reportar algum desconforto físico?
HEITOR: Você me encontrou! Mas eu achei… Você caiu? Não, espera… te consertaram?
ANDRÓIDE MÉDICO: Paciente demonstra confusão. Aplicando sedativo.
HEITOR: Não! Não! Estou bem! Sem sedativo. Mas me diz como…

Outro andróide médico aproxima-se. Logo Heitor percebe mais três idênticos parados numa estação de carga na parede. Eram os outros. Sentindo-se envergonhado pela esperança sentimentalista, trata de se sentar na maca e pedir espaço para o robô à sua frente com um gesto, expressão fechada. O outro andróide segue até uma das comportas do setor, que se abre para mostrar a Heitor outro paciente local: o Piloto.

Heitor salta da maca mesmo com as pernas ainda um pouco bambas, não sem uma repreensão vocal do médico robótico ao seu lado. Sem dar atenção, ele acelera o passo e atravessa a porta antes do outro andróide. O Piloto parece desacordado sobre a maca, peito aberto protegido apenas por um campo estático. Dentro de sua caixa torácica, algo assustador: No lugar de órgãos e sangue, estruturas metálicas escuras tais quais vira no ciborgue militar que o ajudara na Fábrica.

HEITOR: O que aconteceu com ele?
ANDRÓIDE MÉDICO: Status do paciente Ahaz Marcov 02T52… pressão arterial 14 por 9, temperatura corporal 39 graus, seis órgãos danificados, dois ausentes e infecção nanorobótica desconhecida. Estável. Procedimento atual: Retirando elementos não orgânicos do corpo. 26% completo.
HEITOR: Hã?
ANDRÓIDE MÉDICO: Status do paciente Ahaz…
HEITOR: Chega! Cadê o sistema geral?
VOZ ROBÓTICA: Heitor Zordo 12R33, seja bem vindo à Mina Ozon-C Alfa. Favor definir a forma de tratamento predileta.
HEITOR: O que está acontecendo aqui? Alguém me responde direito!

Uma voz sôfrega pega Heitor de surpresa.

PILOTO: Me… tira daqui… o… a lata-velha vai… vai… vai me matar!
HEITOR: Piloto! O que aconteceu?
PILOTO: O código… fala… o… maldito… código e tira essa porcaria… de cima de mim.
HEITOR: HG93D! Parar procedimento!

O andróide continua com a cirurgia, retirando pequenos pedaços do metal dentro do corpo do Piloto.

ANDRÓIDE MÉDICO: Impossível. Ordem em direta violação da primeira diretiva. Procedimento atual: Retirando elementos não orgânicos do corpo. 19% completo.
HEITOR: Como assim o procedimento está menos completo agora?
PILOTO: É o metal… o metal está me deixando vivo. Eu acho… cada vez que ele tira… eu fico mais fraco.
HEITOR: Já sei! Sistema geral… solicito andróide de segurança imediatamente.
VOZ ROBÓTICA: Modo de emergência ativado. Andróide de segurança 8832-K chegando em T menos 5… 4… 3…
HEITOR: Os andróides de segurança não seguem a primeira diretiva em caso de ordem do gerente.
PILOTO: Vai logo! Argh.

Atravessando a porta como um raio, um grande segurança metálico posiciona-se com seu rifle de pulso logo ao lado de Heitor.

ANDRÓIDE DE SEGURANÇA: Aguardando ordens.
HEITOR: HG93D! Remova aquele andróide médico de perto do paciente e não deixe mais nenhum deles se aproximar.

O segurança empurra o médico com facilidade, que tenta voltar para sua posição, mas sem demonstrar agressividade. Um dos robôs médicos na parede é ligado na mesma hora, e começa a se aproximar. Heitor corre até o Piloto e o ajuda a se levantar da maca. O campo estático no peito do Piloto fecha-se, e com ele também a abertura no peito. O Piloto grita de dor, mas não deixa de acompanhar Heitor para fora da sala. A cada passo, o homem parece mais e mais recuperado do estado crítico no qual fora encontrado.

Logo ambos estão seguindo pelos corredores da Mina em direção ao Cofre mais próximo. No caminho, mais andróides de segurança passam por eles em direção ao setor médico. Já protegidos sob as pesadas paredes do Cofre, o Piloto senta-se numa das camas disponíveis e começa a falar.

PILOTO: Nós temos que desligar o sistema geral.
HEITOR: Hã? Eu quase morri para religar!
PILOTO: E eu agradeço. De verdade… Mas precisamos desligar!
HEITOR: Nós vamos morrer… Você não bateu com a cabeça? Aliás, como é que você ficou? Sua nave não passou pela tempestade?
PILOTO: Não sei… pra falar a verdade eu não sei de muita coisa. Só sei que preciso desligar o sistema geral para não acabar com a tempestade…
HEITOR: Você não está falando nada com nada. O que que tem a tempestade?
PILOTO: Ela não protege Ozon-C do Universo, ela protege o Universo de Ozon-C…

Fim da primeira temporada.
Não vou continuar só ano que vem, mas vou dar um tempo para escrever outras coisas na sexta por algum tempo.

Para dizer que eu não tenho mais moral para reclamar do roteiro de LOST, para dizer que está feliz por não ter mais essa nerdice por enquanto, ou mesmo para me xingar de mil nomes diferentes por essa coisa de temporada: somir@desfavor.com

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