Um mago sem destino. (8)

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Desfavor Convidado: Um mago sem destino

Capítulo 3 – Flecha do tempo Parte 2

Raul abriu a porta e entrou na casa, sendo seguido pelos homens de preto que estavam na rua. Mesmo sabendo que sua versão mais jovem estava no quarto, ele comandou que os homens fossem procurar em outros lugares da casa. Quando todos os lugares foram revistados, só então ele permitiu que os homens de preto entrassem no quarto, mas ele e sua irmã já haviam fugido.

_O que fazemos agora? – perguntou um dos homens de preto

_Vamos atrás deles.

Nas ruas Raul tentou despistar os homens de preto mais uma vez, enviando-os em buscas sem resultados, mas ele logo percebeu que uma lembrança não pode ser modificada e os homens encontraram rastros dos dois adolescentes em fuga.

_Eles foram naquela direção. – gritou um dos homens.

Todos correram na direção apontada e logo chegaram no descampado à beira do precipício. Os homens estavam sacando armas, mesmo sabendo que os jovens não iriam oferecer grande perigo e atiraram.

_Não! Não!! Não!!! – gritava Raul. _O que vocês fizeram?

_Calma senhor, são apenas tranquilizantes. Sabemos que precisamos dela viva, no máximo eles estão atordoados.

Raul se adiantou e abraçou os dois corpos. Os homens de preto ficaram intrigados com a cena e já se aproximavam prevendo algum tipo de traição:

_Senhor, por favor, nos entregue a menina.

_Por que ela é tão importante, afinal de contas? – perguntou Raul.

Nesse momento o tempo parou, como se a lembrança estivesse congelada no tempo. Do meio dos homens de preto, saiu Mister Crowley:

_Como pode perceber, naquele dia não houve nenhuma intervenção alienígena e esses homens de preto definitivamente raptaram sua irmã, que foi entregue pelo seu pai.

_Isso é mentira!

_Ela possui um dom raro, que é o de poder abrir portas definitivas entre as infinitas realidades. Com o poder dela, eu poderia ter um corpo físico novamente e me tornar imortal sem ficar preso no plano psíquico. Por isso preciso que você me entregue ela e se torne meu braço direito.

_Nunca!

_Bem, então terei que pegá-la à força.

Mister Crowley bateu a bengala no chão e a lembrança de Raul começou a desmoronar. Pedaços de chão, casas, árvores, tudo ia sumindo aos poucos e Raul começou a sentir uma imensa dor de cabeça. Sua vontade era largar os dois corpos ali mesmo, mas não largou e a dor de cabeça foi se intensificando. Raul estava quase no limite, sentindo que ia desmaiar, quando sentiu uma mão em seu ombro. Com esforço ele abriu os olhos e viu que Paulo estava ali, com metade do corpo dentro da lembrança e a outra metade para fora, dividido por uma espécie de fenda.

_Segure minha mão. – falou Paulo.

Apesar de surpresa, Mister Crowley continuou destruindo as lembranças de Raul, que conseguiu segurar a mão de Paulo sem soltar os dois corpos que segurava. Paulo puxou os três pela fenda e no instante seguinte eles estavam de volta ao bar, local do primeiro encontro entre Paulo e Raul. Raul olhou ao redor e não encontrou os corpos de sua irmã e de sua versão mais jovem:

_Calma, eles estão bem agora. – disse Paulo. _Pelo menos em uma realidade o Mister Crowley não ganhou, o que já é um grande feito.

Raul ainda sentia muita dor de cabeça quando finalmente conseguiu se levantar e a primeira coisa que fez foi olhar para um espelho, vendo seu antigo reflexo:

_Meu corpo ficou na caverna. – comentou.

_Isso agora não importa mais, você passou pela provação do ego.

_Provação do ego?

_Sim, quando você olhou para as sombras na caverna, na verdade estava olhando para dentro de si mesmo, à procura de sua memória mais negra. Se você tivesse entregado os corpos de sua irmã e de sua versão mais jovem, você voltaria de lá como escravo de Mister Crowley, mas como resistiu, você venceu a si mesmo e não cedeu aos encantos do lado negro da força.

_Ele disse que meu pai entregou minha irmã.

_Essa parte infelizmente é verdade, mas seu pai não sabia aonde estava se metendo. Porém sua irmã conseguiu se libertar da dominação da Fraternidade Negra.

_Como?

_Ela abre portais, não foi tão difícil assim.

_Então tudo o que acontecia na minha lembrança não era real? Eu não fui realmente para o passado?

_Sim e não. As lembranças são fragmentos do passado, mas não podem modificá-lo. Porém, o seu ego poderia ter mudado de acordo com sua decisão final. Isso, de certa forma, modificaria o seu futuro.

_E como você abriu a fenda?

_Mister Crowley não foi o único presente no dia que o roqueiro tentou abrir o portal, eu também estava lá.

_Então você conheceu o roqueiro?

_Claro que sim e ele era um dos meus melhores amigos naquela realidade. Juntos fizemos muito sucesso e ao mesmo tempo vimos nossa decadência por causa da magia.

_Afinal de contas, quem era esse roqueiro?

_Ele era você, oras.

Capítulo 4 – Cafa Samaghi Parte 1

Raul dormiu profundamente e quando finalmente acordou, sentia que não era mais aquela mesma pessoa de antes, aquela pessoa assustada diante de lembranças de pessoas que haviam morrido. Raul agora sabia que aquela névoa misteriosa na verdade eram falhas no tempo chamadas de déjà vu, sabia também que diferentes realidades trocavam informações entre si e que sua irmã estava desaparecida em algum local entre essas diversas realidades. Enquanto refletia sobre tudo o que havia acontecido, Paulo entrou no quarto aonde ele estava, trazendo uma grande jarra de água e um pedaço de pão:

_Ah, finalmente você acordou! – disse Paulo.

_Por quanto tempo eu dormi?

_Por umas 36 horas, mais ou menos.

Mesmo sem vontade, Raul mordeu um pedaço do pão e tomou um gole de água:

_E o que faremos agora? – perguntou

_Não sei, mas tenho a impressão que uma hora ou outra teremos que enfrentar Mister Crowley frente a frente.

_Sim…

_Então a melhor coisa a fazermos é consultar os oráculos anciões.

_Oráculos anciões?

_Sim, são os três magos mais antigos e rabugentos deste mundo. Seus nomes são Somir, Chester e Velho MacFadden.

_Não me parece muito animador.

_E realmente não é. Acredite, se tivéssemos outra opção, com certeza não iríamos ver esse três velhos caducos.

_Eles são da Fraternidade Branca?

_Não, eles são antigos demais para aceitarem participar de um grupinho de engravatados. Esses três fazem parte da velha escola e praticam a magia pura mermão.

_Bem, se não temos mesmo mais opção, vamos encontrá-los então.

_É assim que se fala jovem, me acompanhe.

Raul se levantou e seguiu Paulo até um banheiro próximo que tinha apenas uma privada, uma pia e um espelho que também servia de armário. Paulo abriu o espelho e tirou de lá uma vela e uma caixa de fósforos:

_Preste bem atenção, quando eu acender esta vela, quero que você tire sua roupa e olhe para esse espelho piscando o mínimo possível. Também não desvie o olhar e se concentre o máximo possível no seu próprio reflexo. – disse Paulo.

_Entendi, é só isso?

_Sim, se fizer tudo der certo você abrirá um portal para o mundo dos espelhos, que é aonde moram os oráculos anciões. Boa sorte.

_Você não vai comigo?

_Claro que vou, mas não pelo espelho. Prometi para mim mesmo que nunca mais abriria este tipo de portal.

_Porquê?

_Não vamos estragar a surpresa, você verá por si mesmo. – dizendo isso, Paulo acendeu a vela e saiu do banheiro, deixando Raul sozinho.

Raul olhou demoradamente o banheiro, que era iluminado apenas pela vela, fedia urina e não devia ser limpo há muito tempo. Apesar do nojo que sentia, ele tirou a roupa do corpo e a colocou de qualquer maneira dentro do armário do espelho. Após isso, ele fechou o armário e se posicionou em frente ao espelho, fazendo conforme Paulo havia ensinado.

Raul se sentia estranho parado ali no meio do banheiro, olhando para um espelho sem piscar. Ele também sentia muito frio e a luz da vela, além de não aquecê-lo, deixava aquele ambiente muito sinistro. Apesar de várias tentativas, ele sempre acabava piscando e não via resultado algum naquele exercício. Estava quase desistindo quando viu que algo estava mudando na imagem do espelho, mas acabou piscando e tudo voltou ao normal. Porém, a cada nova tentativa, as mudanças iam ficando mais bruscas e macabras. Seu rosto ia se deformando no espelho e o que ele via agora mais parecia um demônio do que ele mesmo, além disso, o espelho não refletia mais o banheiro ao fundo e o cenário refletido era pura escuridão.

Mesmo com medo, ele encarava o rosto demoníaco do outro lado, que já não era mais um reflexo e parecia ter vontade própria. De repente, aquela versão demoníaca começou a tocar o espelho, deformando sua superfície e começou a sair. Primeiro as mãos, depois os braços, a cabeça e finalmente o tronco. Ele agitava os braços e tentava agarrar Raul, que se desvencilhava como podia, mas acabou sendo pego e puxado para dentro do espelho. Ao cruzar o espelho, Raul sentiu um calafrio e teve a sensação de estar se afogando. Desesperado, ele começou a se debater, percebendo que estava mesmo se afogando em algum tipo de líquido viscoso. Ele estava quase desmaiando quando sentiu uma mão agarrá-lo e tirá-lo daquele líquido. Já na superfície, ele vomitou e se deitou no chão, que era frio e liso:

_Maldito, você espantou o meu reflexo. – disse a voz de seu misterioso herói, que estava agachado olhando para o líquido.

Raul se levantou e viu que o líquido estava contido em um formato retangular, como se fosse um lago. Ele se aproximou e olhou na direção do lago, mas ao invés do fundo, ele viu o sujo banheiro em que havia estado. Com sua visão periférica, ele percebeu que o outro homem havia se levantado e pulado naquela água.

_Não! – ele gritou, mas já era tarde demais e o outro afundava na direção do banheiro, saindo do outro lado. Raul continuou olhando e esperou o outro se levantar.

Apesar de parecer atordoado, o outro começou a encará-lo do fundo do lago e finalmente Raul percebeu que aquele homem na verdade era sua versão demoníaca do mundo dos espelhos. Para sua surpresa, após olhar para o espelho do banheiro o demônio virou uma estátua de pedra.

_Bem, agora entendo porque Paulo não quer mais abrir esse tipo de portal – disse Raul para si mesmo.

Tentando se orientar Raul olhou para os lados, mas não havia nada além do lago e daquela superfície fria e lisa em que pisava. Mesmo assim, ele saiu sem direção, tentando manter aquele lago como ponto de referência para não se perder. Após andar alguns metros, ele finalmente viu uma luz iluminando o que parecia ser uma pequena casa e foi naquela direção. Quanto mais andava, mais ele tinha a sensação de que a casa estava se distanciando.

Continua…

Chester Chenson

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Comments (7)

  • Cara, capítulo absorvente!. Fiquei surpreso em saber que o roqueiro era o Raul! Isto nunca passou pela minha cabeça.

  • Até que enfim saiu mais um capítulo! Eu até ia pedir pra Sally pra fazer VC também ter MSE por conta da não postagem. Já pensou Somir e Chester tendo que comentar postagem de BM? Hahaha

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