Deslavados.

+O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse nesta quinta-feira que o grande volume de recursos movimentados no esquema de desvios e fraudes em contratos da Petrobras coloca o escândalo político “em outra galáxia” e leva o julgamento do mensalão, o maior escândalo já analisado pela Suprema Corte, a um “juizado de pequenas causas”.

Brasil, o país da superação! E do desfavor da semana.

SOMIR

Depois de uma investigação local sobre uma rede de postos e lavanderias usada para lavar dinheiro de doleiros, a Polícia Federal acaba com um caso de possíveis dez bilhões de reais de dinheiro afanado dos cofres públicos. Não, sério, dessa vez escolheram um nome apropriado para a operação: Lava-Jato.

E para ajudar, o governo reeleito e chancelado pela população brasileira média está enfiado até os joelhos nesse lamaçal todo. Afinal, não teria graça se não fosse assim. Não seria o jeitinho brasileiro. Todo mundo que faz negócios com o governo sabe: propina é parte integrante do processo e não se coloca uma placa de “não pise na grama” num parque público sem molhar a mão de alguém.

Não existe o senso de bem público, apenas o interesse pessoal. Somos péssimos para construir estradas, mas extremamente proficientes na implementação dos pedágios: cada etapa de cada contrato tem alguém ávido por fazer valer seu pequeno poder de cobrar pelo acesso aos vastos cofres públicos.

Quem não aceita as regras desse jogo jamais participa das oportunidades legítimas de trabalhar para o Estado. As construtoras que procuraram a Petrobrás para executar seus grandiosos projetos nunca tiveram a escolha de não corromper. Não estou dizendo que os podres de ricos donos dessas empresas são santos, longe disso, estou dizendo que a ‘seleção natural’ só deixou eles disponíveis para tocar os projetos.

E isso é fato sabido tanto dentro quanto fora da Petrobrás. O mínimo de experiência nessa área de contratos com o governo já ensina que a corrupção é só mais uma etapa casual do serviço. Todos sabem que funcionários públicos cobram para liberar os serviços, todos sabem que os contratos são superfaturados para agradar as empresas.

Todos. Dilma sabia, Lula sabia… não estou nem reforçando o coro da ‘elite branca’ e suas revistas semanais, estou apenas dizendo o óbvio. Sempre falamos aqui do pior dos dois mundos: ou sabiam e fizeram vistas grossas, ou não sabiam e demonstram ser incapazes de compreender o mundo ao seu redor. Mas isso é só pelo prazer de argumentar: o que faz sentido de verdade é saberem e não fazerem nada para impedir.

Afinal, no país da propina, silêncio vale ouro. Quantos aliados e doações não conseguiram fingindo que a Petrobrás não estava sendo pilhada? Cúmplice silencioso também é cúmplice. Ainda mais se levou vantagem com tudo isso. Muita gente do alto escalão do governo e seus aliados está sendo acusada de receber essa dinheirama toda.

Agora, se todo mundo sabia e se roubar é a regra… como exatamente apontamos o dedo para essas empresas corruptas? Poderiam fazer várias outras coisas, é claro, mas se queriam ocupar o mercado dos mega contratos, o que poderiam ter feito de diferente? Desistido? Denunciado? Ambos os casos significam perder muito dinheiro.

Mas eu não estou falando de bem comum na frente de vantagens pessoais? Bom, isso é muito válido para o governo, mas é meio fantasioso no mundo corporativo. Empresa que não fatura não sobrevive. A propina acaba virando só mais um dos custos inerentes ao processo. Não é função da empresa privada regular o sistema no qual está inserida, isso é trabalho para o governo. A empresa simplesmente se adapta.

Se quem deveria impor as regras impõe regras erradas, quem vai nos proteger? Ninguém colocou uma arma na cabeça desses empresários para obrigá-los a pagar propina, mas ninguém também deu qualquer chance deles fazerem de forma diferente. Num sistema desses o país para todas suas construções se der um surto de honestidade no setor privado.

Muitos falam que o país não será o mesmo depois disso. Espero que seja verdade mesmo, porque o escândalo do Lava-Jato não só faz o Mensalão parecer dinheiro de pinga como também escancara como o sistema todo está podre. Imagine as farras acontecendo nas outras estatais brasileiras?

E o que nos resta é mesmo uma estrada esburacada onde se paga pedágio a cada quilômetro. Está na cara porque esse país não vai para frente… somos corruptos. O sistema não funciona e aceitamos isso. Trabalhar para e no governo significa sujar as mãos e não existem alternativas viáveis em grandes escalas.

Um país continental com necessidade de gigantescas obras de infraestrutura vai ser sempre um terreno fértil para o desenvolvimento de esquemas de desvio de verbas públicas. O Brasil não vai encolher e ficar mais fácil de fiscalizar, vamos ter que encarar a situação como ela está por muito tempo ainda.

Mas não dá mais para ter a corrupção basicamente oficializada em todas as esferas do poder público. Não é possível que o único caminho seja a propina. Ou nos indignamos o suficiente com isso e nunca mais deixamos essa gente voltar ao poder, ou estamos condenados a rolar essa pedra morro acima sabe-se lá por quantos séculos ainda.

Para dizer que eu estou sendo pago pelas construtoras, para dizer que eu só escrevo isso porque sou contra os pobres, ou mesmo para dizer que cada povo tem o país que merece: somir@desfavor.com

SALLY

Mais um mega-escandalo de corrupção. Só que desta vez, bem maior do que os outros. Uma roubalheira sem proporções. Uma roubalheira sem proporções que veio à tona antes das eleições e, ainda assim, a Chefe de Estado responsável pelo comando de instituições envolvidas se reelegeu.

O brasileiro parece tão acostumado com a corrupção que quando ela se apresenta, ainda que de forma monstruosa, é facilmente digerida. O país tolera TUDO em matéria de corrupção, tratando como um “mal necessário”. É como aceitar que você vai sair na rua e ser estuprado, só que em termos financeiros.

Não há revolta, só o bom e velho discurso reclamão. Não há atitude, não há indignação e reação. É só mais uma roubalheira, que em pouco tempo será ofuscada pelo combo Natal, Ano Novo, Carnaval. Verdade seja dita, a maior parte do povo não consegue nem conceber a quantidade de dinheiro que foi roubada.

Chegamos ao ponto onde um Ministro do STF, uma corte composta majoritariamente por pessoas indicadas pelo partido da situação, vai a público falar sobre um processo que está analisando e diz que o até então maior escândalo de corrupção, o mensalão, fica pequeno quando comparado a este. É quase que um médico olhando para o paciente e dizendo “Não tem salvação, você vai morrer”.

A falta de reação diante de algo desse porte é ainda mais grave quando pensamos que a reação não deveria necessariamente ser ativa. Este ano as pessoas foram obrigadas a votar. Bastava ir até uma urna e votar em qualquer outra pessoa que não estivesse promovendo, tolerando ou aceitando um esquema desses. Mas não. O escândalo já tinha estourado, o PT se saiu com a desculpa de sempre (se fez de desentendido) e colou.

Este país é incorrigível. Não tenho nem ao menos vontade de continuar escrevendo sobre o assunto. Sério mesmo, é o maior desaforo político que eu consigo me lembrar em todos meus anos de vida. E o povo inerte, no máximo comentando que é assim mesmo, que é tudo ladrão. Onde está aquela ira, aquelas sanha dos tempos de campanha eleitoral? Onde está aquela raiva toda, aquela energia? Gastaram batendo uns nos outros? Uma pena.

Os valores desviados são cifras. Morrem no plano da abstração. Ninguém mensura quantas vidas poderiam ser salvas, quantas pessoas não morreriam por falta de médico ou até de fome. O Brasileiro Médio tem um bug mental e não consegue fazer esse link. É simplesmente vergonhoso. Reclamam, reclamam, reclamam e quando aparece algo significativo, não dão importância.

É isso. Continuem batendo recorde de votação para eliminar vilão do BBB mas na hora da urna votem no PT. TÁ SERTO, TÁ SERTINHO. Quem quer ter alguma esperança de existência digna (para si e para os seres humanos que estão à sua volta) tem que sair do país. Esta sociedade está doente e não há esperanças de melhora.

Para reclamar que o texto só reclama, para se indignar de forma inútil ou ainda para dizer que optou por ser alienado em nome da sua sanidade mental: sally@desfavor.com

Desfavores relacionados:

Ética móvel.

Ladrões de galinha.

Corruptofobia.

Herança maldita.

PEC Eleitoral.