Fogo amigo.

+Em rota de colisão com o Planalto desde que assumiu a Presidência da Câmara, no início do ano, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) oficializou na manhã desta sexta-feira (17) o seu rompimento com o governo da presidente Dilma Rousseff.

Ver alguém brigando com a Dilma e o PT não é um desfavor, longe disso. Mas Eduardo Cunha sendo herói é demais para a cabeça, é desfavor da semana.

SALLY

Pautar a sua opinião sobre uma pessoa com base em um ato dela que te agrada: um erro comum no Brasil. “O inimigo do meu inimigo é meu amigo”, os mediocres dirão. Péssimo, mas verdadeiro. E esta semana tivemos um ótimo exemplo disso, graças ao “rompimento” de Eduardo Cunha com o Governo. Cunha, um evangélico corrupto homofóbico e escroto ganhou a simpatia de muita gente.

Uma dica: quem é um corrupto escroto hoje fode a Dilma (sim, é divertido) mas amanhã fode você. Não se apoia, prestigia ou se aplaude um corrupto escroto, pois seus atos nunca são motivados pela busca do bem estar coletivo e sim de interesses próprios. Aplaudir Eduardo Cunha é demonstrar uma visão limitada da vida. Mesmo psicopatas, assassinos e estupradores eventualmente fazem alguma coisa boa, mas nem por isso merece aplausos.

Cunha responde a vários processos por corrupção e já colou em pessoas questionáveis como Collor e a hedionda família Garotinho. Eu lembro de Cunha quando presidia a Companhia Estadual de Habitação, no Rio de Janeiro. Ele favorecia empreiteiras de amigos em licitações superfaturadas para a construção de casas populares e não sou eu quem diz, é o Tribunal de Contas do Estado. Ficou poucos meses e foi enxotado. Saiu mal, trocando ofensas com Garotinho em redes sociais. Na hora de se defender, seu advogado usou documentos falsos para tentar inocentá-lo, mas uma perícia realizada no processo atestou a falsidade dos documentos.

Não é de hoje que Cunha está enfiado na merda até o pescoço. Nos tempos de Collor na presidência ele foi nomeado para presidir a TELERJ, a pedido de PC Farias, aquela pessoa super honesta. Adivinha? O Tribunal de Contas constatou irregularidades na prestação de contas da TELERJ, mais precisamente contratações irregulares e serviços superfaturados. Acabou não sendo punido pois seu processo prescreveu, o que significa dizer que ele era culpado mas não o condenaram dentro do prazo estipulado, fazendo com que o Estado perca o direito de punir. Sim, tem disso no Brasil.

Cunha está envolvido em muitos escândalos vastamente documentados: um rombo de 850 milhões no esquema de corrupção ligada a combustíveis, a venda de uma casa no valor de 800 mil ao traficante Juan Carlos Abadia, desvio de recursos da CEDAE para o Mensalão, participação no escândalo Lava Jato e muitos outros. Como se tudo isso fosse pouco, foi graças a ele que o Feliciano acabou na Comissão Nacional de Direitos Humanos. Eu poderia passar dez páginas detalhando tudo de sórdido que ele fez em matéria de ilegalidade.

Como ser humano, Cunha também é questionável. Já disse que aborto legalizado no Brasil só por cima do cadáver dele. Bem que eu gostaria, seriam dois ganhos para o país, a legalização do aborto e a faxina social que seria a morte dele. Ligado à igreja evangélica Assembléia de Deus (uma das piores), não se furta de comentários homofóbicos, provavelmente na intenção de desviar os olhos do muitos processos de corrupção que responde. É contra a união homoafetiva e já emitiu opiniões dignas de náuseas. Sabe o que é pior? FUNCIONA. Não se fala em outra coisa que não seja sua homofobia e seu machismo, com isso ele mascara os rombos financeiros e a população não cobra punição por corrupção. Brasil…

Voltando ao assunto central deste Desfavor da Semana, se você está feliz por ver alguém finalmente fazendo frente à Dilma, bem, eu também estou, mas nunca se esqueça que Eduardo Cunha é um crápula ainda pior do que Dilma. Não torça para Cunha com muita vontade apenas por odiar Dilma, pois se ele ganhar, o país fica ainda pior. Não aplauda Cunha por ele peitar Dilma, ele não está preocupado com o bem do país (até porque estava de mãos dadas com ela faz pouco tempo), ele está preocupado com seu próprio rabo (e com o rabo dos outros, fiscalizando quem dá o cu).

Chega a ser risível um elemento corrupto, sujo e com uma vida pregressa tão vergonhosa dizendo que vai se afastar do Governo com lição de moral. Infelizmente isso cola no Brasil: se você bater em quem todo mundo está batendo, consegue uma presunção de bondade, de pessoa correta. Bater na Dilma virou aval. Uma pena que um ato isolado, destacado de uma história sórdida e asquerosa absolve Cunha dessa forma. Não importa o que ele faça, nunca merecerá aplausos. Se você aplaude alguém só porque a pessoa detona seu inimigo, bem, você é medíocre e manipulável.

Que fique claro o quanto eu quero que a Dilma e o PT se fodam. Não estou de forma alguma defendendo essa corja. Só estou dizendo que atacar o PT não significa que quem o faz seja boa pessoa. Politicamente falando, pensando de forma estratégica, acho que Cunha tem o seu valor. Faz tempo que o PT precisa de predadores para colocarem algum limite. Agora encontraram uma oposição eficiente, nos termos em que isso é necessário no Brasil: baixa, vil, suja. Ou seja, alguém que pode lhes fazer frente. Acho graça e desejo que todos se matem. Aplaudir Cunha, entretanto, jamais.

Vestir a camisa de Cunha é ser um linchador: se você acha que vale cometer crime para punir criminoso, então você pode defender Cunha. Se você se sentiria à vontade para pegar alguém que roubou seu celular, amarrá-lo em um poste e matá-lo na porrada, então faz sentido defender Cunha, um criminoso que apenas por estar voltando sua artilharia para outros criminosos começa a ser aclamado.

Pode achar graça, pode pegar um saco de pipoca e assistir aos canalhas jogando merda uns nos outros, pode extrair o que vem de mais divertido nesse espetáculo grotesco que acaba de começa, mas não pode defender, exaltar ou elogiar Cunha. Ninguém presta. NIGUÉM PRESTA ali, a maior prova disso é que durante muito tempo andaram todos de mãos dadas. Só agora Cunha se revoltou com a asquerosidade que o PT se tornou? Não dá, né?

Chega de polarizar tudo, chega de escolher um dos lados cada vez que tem um confronto. É hora de começar a pensar diferente. Não somos obrigados a escolher um lado quando há um embate ou uma polêmica, hora de abrir a cabeça e aprender a funcionar diferente. Cunha quer foder o PT e o PT quer foder Cunha. Eu torço para que ambos consigam.

Para dizer que você também torce para que ambos consigam, para dizer que se Cunha fosse bom não começava com CU ou ainda para dizer que já desistiu de acompanhar a política brasileira: sally@desfavor.com

SOMIR

Com uma situação dessas, quem precisa de oposição? Bom, eu já argumento há algum tempo que é o que mais precisamos, mas enquanto isso, vamos caçando com gato: o desastre que é o segundo mandato de Dilma (o primeiro foi a preparação) vai criando brigas internas que com alguma sorte trarão resultados positivos para o país.

Ênfase no “alguma sorte”. É surreal que dependamos de picuinhas pessoais entre notórios corruptos para ter algum senso de consequência nos atos de nossos governantes. Claro que é divertido ver os chacais se atacando, acaba de sair a notícia que Eduardo Cunha botou em movimento 11 pedidos de impeachment para a Dilma. Eu quero ver o circo pegar fogo e que o último deles morra enforcado nas tripas do penúltimo, mas calma lá… ainda está tudo errado.

Do jeito como a coisa se desenrola agora, prova mais que os acordos escusos por governabilidade são o que realmente funciona e existem sérias consequências para quem se desvia do padrão. Desde que a Operação Lava-Jato começou a jogar lama no ventilador, o que temos visto é um desastre nas relações entre aqueles que detém o poder. Dilma com sua habitual inabilidade de negociar além de índices de aprovação abissais, sua base aliada completamente bêbada com o poder de barganha, e tudo isso no meio de uma crise econômica.

O que estamos vendo não é uma operação de limpeza, é um acerto de contas entre dois cartéis cujo poder é inversamente proporcional aos escrúpulos. Só teremos algum alento durante a batalha, porque quem quer que ganhe, nós todos perdemos. Eu lembro do tempo onde ainda havia a ilusão que se a oposição ganhasse as coisas poderiam ser diferentes, mas o império lulista surgiu para destruir de vez qualquer ideia nesse sentido. As maiores forças políticas do país então em guerra por interesses pessoais, e assim que os caciques se sentirem mais seguros, voltaremos à nossa programação habitual.

Eduardo Cunha nem para anti-herói serve, é no máximo um vilão útil. E considerando a forma como está agindo desde que se declarou oposição ao Planalto, nem se pode afirmar que isso vai dar em alguma coisa. É mais provável que ele se exploda sem trazer danos maiores para o governo petista. Pudera: o cidadão está tão sujo que basta só um empurrão para fazê-lo perder qualquer relevância que ainda acredita ter. O próprio partido está sinalizando que vai deixá-lo explodir sozinho, são muitos cargos, verbas e propinas para se preocupar com uma cruzada solitária de um corrupto sentindo-se traído.

Mas apesar de parecer um maluco nas suas atitudes, eu aposto que numa coisa ele acertou: tem o dedo do governo na sua possível derrocada. Ele bancou a aposta de provocar o PT na sanha de acumular poder, e agora está recebendo o troco. Se ele tivesse sido menos confiante e jogado um pouco mais com o sistema, talvez tivesse escapado de tantas menções sobre sua ficha-corrida de serviços prestados contra a população.

E qual é a lição que aprende-se aqui? Não faça inimigos poderosos. O que acontece é um reforço do estilo conciliador-negociante que norteou os presidentes de Câmara antes de Cunha. Não é sobre ética ou qualidade dos serviços prestados à população, é sobre negociações desastradas e as consequências de seguidas tentativas de sabotagem. O país, para variar, está em segundo plano. Somos expectadores de uma briga, e só.

Eduardo Cunha é nosso inimigo, mas por sorte está com suas armas apontada para outro deles. Torçamos para que ele consiga fazer um grande estrago antes de sua provável queda (seja pelas mãos da Justiça ou pelo ostracismo político). Nem mesmo a base evangélica – que ajudou a defender evitando a cobrança de impostos para os líderes das igrejas – será suficiente para desfazer o estrago.

A única coisa que se pode dizer com mais segurança é que isso foi apenas um erro dos corruptos na análise da situação. E é triste que a única forma de oposição minimamente eficiente nos últimos tempos seja mero subproduto de um sistema podre. Toda essa gente era amicíssima há pouco tempo atrás. Farinha do mesmo saco.

Seja o que acontecer, o PMDB vai continuar sendo situação roxo! Nada de bom pode sair disso.

Para dizer que pelo menos é divertido de acompanhar, para se espantar que esse cidadão poderia assumir a presidência, ou mesmo para dizer que o BM vai continuar votando nele: somir@desfavor.com

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