Chegando nela…

Com o passar do tempo, os papéis de homens e mulheres na sociedade vão sofrendo alterações que em tese deveriam positivas, mas na prática fazem Sally e Somir começarem mais uma discussão. Na hora da conquista, os dois discordam sobre o valor das tradições. Os impopulares chegam com suas opiniões.

Tema de hoje: homem tem obrigação de chegar na mulher?

SOMIR

Não. As obrigações do ser humano estão definidas nas leis da sociedade. Respeite a propriedade e a integridade física das outras pessoas, o resto é questão de acordos implícitos ou explícitos entre as pessoas. Sim, a tradição é que homens tenham a iniciativa na hora da conquista, mas daí a transformar tudo isso em obrigação? Uma sociedade saudável deve saber como se autorregular sem regras morais arbitrárias.

E eu usei “moral” no sentido estrito da palavra: moral nada mais é do que repetição de tradições sem obrigação de compreensão dos seus motivos. A obrigação do homem de chegar na mulher é moral… faz-se pelo hábito. E esse hábito tem raízes que não abonam muito a mulher como ser humano. A sociedade humana desenvolveu-se com a ideia de que a mulher é propriedade, algo que se escolhe de uma prateleira e mantém-se guardado em casa para não sair fazendo filhos com estranhos.

Essa passividade feminina na hora de escolher parceiros nada mais é do que a aceitação do modelo. Ela se aceita como produto, o que até explica o foco na embalagem atraente. Mulheres evoluíram para serem escolhidas porque era isso que o mundo pedia delas. Mas o tempo passa, paradigmas sociais que nos definiam começam a fazer menos e menos sentido. Tanto que num curto espaço de tempo o papel da mulher em sociedades mais civilizadas mudou radicalmente. A opressão ainda existe, mas se voltarmos um século que seja no tempo, mulheres nem podiam votar em sociedades que hoje consideramos muito igualitárias! A coisa mudou, e mudou muito rápido.

A obrigação do homem chegar na mulher também era papel dessa visão de “mulher-produto” tão comum no nosso desenvolvimento como espécie. Homem escolhia, mulher era escolhida. O modelo funcionou sim, tanto que estamos aqui para contar essa história, mas já que vivemos num mundo que pode começar a abrir mão desse costume, vamos enxergar o lado positivo: a redução de aberrações na formação de casais. Ao invés da mulher depender apenas do “homem certo” calhar de escolhê-la, agora ela tem a liberdade de ir procurar por um par que julgue valioso o suficiente.

Sim, assumir em conjunto uma responsabilidade que historicamente foi do outro gênero gera seu lado negativo, como a possibilidade de rejeição para a qual mulheres são menos treinadas. Mas todo avanço social traz incômodos, é o clássico de nada ser de graça nessa vida. Mas sim, eu sei que estou falando só da possibilidade da mulher chegar no homem e não exatamente da desobrigação dele de fazer seu papel clássico de cortejar.

É que não somos ilhas. Cada pessoa que muda de atitude começa a mudar a atitude das que estão ao seu redor. Aumente a liberdade das mulheres e a vida dos homens começa a se alterar. Com mulheres tendo menos tempo e disposição para fazer seu papel clássico de “cuidadora” do homem, o homem também passa a assumir responsabilidades que lhe eram alheias no passado. Homens se tornaram mais vaidosos (foco na embalagem, já que agora podem ser escolhidos) e muitos começam a assumir responsabilidades que jamais assumiriam no passado. Você encontra cada vez menos homens adultos incapazes de cozinhar e cuidar de uma casa, por exemplo. É muito mais comum ver homens cuidando dos seus filhos ativamente.

O que eu acredito que gere a sensação de injustiça que a Sally com certeza vai tratar no seu texto é que estamos apenas vendo a ponta desse iceberg, sendo que as mulheres aceleraram tanto seu processo de igualdade social que ainda não deu tempo do homem entrar de vez na dança. Pudera, quem estava na vantagem tende a demorar bem mais para abrir mão de seus poderes. Temos sim uma aberração de mulheres que tentam fazer de tudo numa proporção bem maior da do que a de homens. Estamos vendo a sociedade se equilibrar, lentamente.

Mas não é assim que as mudanças funcionam, não dessa forma controlada de dois grupos trocarem figurinhas na mesma velocidade e um esperar o outro para dar o próximo passo. Mulheres tomaram uma iniciativa poderosa de mudança social e correram muito na frente. Isso não é de graça, porque agora os homens tem que acelerar o passo para alcançar. Ok, é injusto que as mulheres tenham que ficar esperando os homens pegarem no tranco, mas isso não muda o fato de que eliminar o sistema de “mulher-produto” é sim um enorme avanço que deve ser conquistado.

E retirar dos homens essa visão de que são sempre eles os obrigados a escolher uma mulher faz parte do processo. Não há igualdade se um dos lados não tem escolha. Um mundo justo considera que homens e mulheres tem a mesma liberdade de fazer suas escolhas na hora de procurar parceiros, e que nenhum dos gêneros tenha mais poder. A obrigação defendida pela Sally faz o sexo da pessoa ter mais peso do que a pessoa em si. Homens tem que fazer algumas coisas, mulheres tem que fazer outras, não por vontade, mas pelos cromossomos com os quais nasceu.

Onde fica a conexão entre duas pessoas? Como essa lógica de obrigação de quem vai chegar funciona se o casal for do mesmo sexo? Ou há um padrão que se aplique para seres humanos em geral, ou concordam que é tudo meio arbitrário? Muitas vezes a gente tem que botar o que é mais ideal na frente do que parece prático para ter uma evolução de longo prazo. O ideal é que homens e mulheres tenham liberdade de ir procurar quem bem entenderem, que os papéis de gênero sejam transformados em algo compreensível e melhor adaptado à dinâmica de duas pessoas. E daí que a sociedade acha que uma coisa é de homem e outra é de mulher? E se a mulher quiser cobrar do homem um papel que historicamente nunca foi dele, como ajudar a cuidar da casa e dos filhos? Só é ofensivo se é o homem querendo mexer na dinâmica dos papéis de gênero?

Não é a relação saudável entre dois seres humanos que tem que prevalecer? Se cidadão não quer ter a obrigação de chegar em mulher, escolha e problema dele. Tem custos. A maioria das mulheres não está preparada para assumir esse papel e ele vai escolher de um pool menor de possibilidades, mas, e o direito dele de querer pescar ali? E outra, se a mulher não quer ficar esperando, por que vai esperar? O casal se forma entre duas pessoas que querem estar juntas, e que se exploda a forma como elas fazem isso. Relações humanas tem que ser muito mais do que uma dança coreografada.

Obrigação é não beber e dirigir. Chegar no sexo oposto é escolha.

Para dizer que assim eu não vou pegar ninguém, para dizer que adoraria concordar comigo, ou mesmo para dizer que a analogia da embalagem te doeu: somir@desfavor.com

SALLY

Atenção para o tema de hoje, é traiçoeira e cheio de sutilezas: HOMEM TEM QUE CHEGAR EM MULHER?

Sim, HOMEM TEM QUE chegar em mulher, o que não quer dizer que mulher não possa chegar em homem. Pode. Pode sim. Mas não é sua obrigação. A obrigação é do homem! Cago baldes para o discurso politicamente correto da Madame que divide esta postagem comigo, muito cômodo para ele (e para todos os homens) empurrar mais essa responsabilidade nas costas da mulher. Não aceito, a sociedade já me fodeu demais. NÃO ACEITO!

“Mas Sally, e se ninguém tivesse a obrigação? Se quem quisesse chegar, chegasse?”. Em um universo civilizado e igualitário, seria lindo, o melhor dos mundos: cada um faz o que quer, sem cagação de regra. Seria lindo cada qual fazer o que tem vontade sem papéis definidos, sem obrigações e sem pressão social. Porém, no atual contexto, não me parece possível. Em um país lotado de brasileiro médio, seria um inferno.

Experimenta dividir essa responsabilidade com o homem brasileiro para ver se esses acomodados, descansados, preguiçosos de merda não empurram todo o trabalho para a mulher! Fodeu, nunca mais um homem chega em uma mulher na vida: “ela se quiser que chegue em mim”. Só não falam isso hoje porque seriam socialmente execrados com uma frase dessas. A trava social deve continuar! Para o bem das mulheres, eles tem que sentir essa obrigação!

Não basta ter que ser bem informada, inteligente, culta, magra, bonita, se cuidar, ser boa esposa, ser boa mãe, depilar a virilha, ser profissional de sucesso e ter que dividir a porra da conta para não parecer uma interesseira. TÁ POUCO! MANDA MAIS QUE TÁ POUCO! Agora a responsabilidade de chegar vai cair nas mulheres também! Não, não mesmo. A sociedade já me fodeu o bastante, eu queria estar em casa lavando as cuecas do meu marido e em vez disso trabalho 12h por dia. Tá de bom tamanho, podem parar por aí, que eu já estou exausta com minhas obrigações atuais.

Tem mais mulher do que homem no mundo. Se esse jogo vira e a mulher passa a ser a responsável por chegar no homem, vai sair briga de navalhada na cara. Mulher, esse bicho inseguro e competitivo, vai chegar cada vez mais desesperadamente em homem, banalizando ainda mais a classe. Depois de um tempo, isso vai virar a regra e quem não chegar de uma forma totalmente explícita e vulgar, nem ao menos será compreendida ou será acusada de fazer “cu doce”. Parem de pensar que vocês são referência mundial, o brasileiro médio é bem diferente de vocês.

Homens, tenham piedade da minha alma e me deixem os poucos privilégios que eu tenho. Vão fazer xixi em pé, vão fazer sexo com a vizinhança toda e ganhar status positivo por isso. Eu vou morrer lutando para que a balança não se inverta e mulher continua tendo que ser conquistada por homem. Chega de facilitar a vida desses acomodados. Deixa eles ralarem um pouquinho, deixa!

Aí Somir vai começar com seus devaneios temporais e dizer que com o tempo a coisa se autorregula. Observem eu não me importar. Não me serve de nada Somir achar que em 500 anos a coisa fica equilibrada, eu não quero mais responsabilidades para mim AGORA. Eu não vou deixar filhos nesse mundo, estou pouco me fodendo com o desenrolar dele. Indifere para mim se em 500 anos as pessoas estiverem comendo carne de unicórnio e cagando arco-íris. Eu sou pé no chão, pensamento prático.

Mas claro, para a Madame é muito cômodo pensar em várias mulheres tomando a iniciativa e partindo para cima dele. Até parece que o Rei da Forçação de Barra na Argumentação não ia encontrar milhões de recursos antropológicos, sociológicos e embromáticos (não existe, tô sabendo) para defender essa canalhice covarde que é jogar mais uma responsabilidade para o colo da mulher, a pretexto de dividi-la. Já não basta a mulher cuidar do relacionamento todo, ainda tem que se responsabilizar pelo pré? Vai dar meia hora de cu para esses amigos campineiros viados que você tem, Somir!

Mulher é mais sensível que o homem, se abala com mais facilidade no que diz respeito a autoestima, tem mais oscilações de humor em decorrência de hormônios. Será que alguém em sã consciência acha que vai dar certo para a sociedade colocar a mulher em condição de constante rejeição? Sério mesmo? Querem o que? Ver o numero de homicídios dispararem? Observem como a mulher média reage quando leva um fora em final de relacionamento, agora imagina ISSO praticado por centenas de mulheres em noitadas regadas álcool por todo o país. Vocês são loucos, são dementes!

Somir é um mal acostumadinho do cacete, sempre teve mulher dando em cima dele, fazendo todo o trabalho por ele. E, vejam só que pessoa maravilhosa que ele virou: um intratável que só faz o que quer, quando quer e como quer. Jura que vocês querem ver um processo de somirização do Homo Sapiens? Homo Somiris. Não, obrigada, basta um no mundo.

Mulheres tiveram seus privilégios ceifados por décadas. A cada ganho social nos tomam alguma coisa. Será que não dava para, uma vez na vida, ganhar a possibilidade de fazer algo sem perder nada? Custa que a responsabilidade inicial seja do homem, já que todo o resto da relação acaba caindo nas costas da mulher? Custa, custa sim, o bacana é essa paumolescência de camuflar funções delegadas com igualdade. Mas eu não aceito perder mais um bônus. É o homem tem que chegar em mulher, se a mulher quiser, chega no homem, mas a obrigação masculina tem que continuar.

Graças a essa paumolescência temos aquele problema sobre o qual já conversamos em outro texto, onde 20% dos homens pegam 80% das mulheres. No meio de Betas, Metrossexuais, Emos e Goys é alimentar o espírito bunda mole compartilhar o ônus de chegar com as mulheres. Podem parar por aí. Daqui a pouco mulher está pagando motel, pagando conta de restaurante e indo buscar marmanjo em casa. NÃO ACEITO!

Definitivamente, eu queria estar em casa lavando as cucas do meu marido… Basta, já me foderam bastante.

Para dizer que adorou o Sally Surtada, para dizer que prefere pagar a conta do que lavar as cuecas ou ainda para me chamar de machista: sally@desfavor.com

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Comments (13)

  • Realmente, ficou parecendo um Sally Surtada. Mas você tem razão, pra variar. A obrigação deveria continuar sendo do homem. Ficaria esquisito se fosse ao inverso

  • Eu não sou obrigado a nada, não li a postagem pq achei a pergunta em si ridícula e a resposta mais do que evidente, se a pergunta fosse “mulher é obrigada a se manter virgem até o casamento” diriam que é machismo, é exatamente a mesma coisa que vcs estão fazendo só que com os papéis invertidos

  • Nessa vou ter que ficar com o Somir. A argumentação da Sally me pareceu muito rasa, cheia de ad hominen e reduções ao absurdo, ao passo que os argumentos do Somir são muito mais lógicos e racionais.

    Acredito que a tendência natural da sociedade, ao concretizar a igualdade entre homens e mulheres, é evoluir para esse quadro em que nem o homem nem a mulher tem papéis definidos, seja a obrigação de chegar em alguém, seja a obrigação de se preservar para arrumar bom casamento. Não se trata de um jogar as responsabilidades para o outro, mas sim abolir todas essas responsabilidades impostas por uma moral do século passado, por uma norma social anacrônica.

    Ao mesmo tempo, não vejo esse cenário apocalíptico pintado pela Sally. Nos países nórdicos, entre as gerações mais jovens, já é tão normal uma menina chegar num menino quanto o contrário. Não me parece que esse cenário seja tão impossível para nós como pensa a Sally. O mundo está mudando, e mudando rápido.

  • Wellington Alves

    Na época da corrida do ouro em Serra Pelada, o repórter perguntou a um simples minerador: “pra quê você quer tanto ouro?” A resposta não poderia ser mais eloquente, profunda e reveladora da nossa existência: “Pra comê muié ué””
    A mulher sempre foi, e continuará sendo, a principal motivação para que o homem acumule riquesa, fama e poder. No fim das contas, tudo o que o homem visa é poder impressionar as mulheres para que possa obter êxito em suas investidas. Claro que não é a única motivação, óbvio que há exceções, mas imagine se retirarem de nós a principal motivação para vencermos na vida!
    ? Não há nada que irrite mais uma mulher do que um homem sem atitude. Agora imaginem se tiarem dele a mola motriz, o elemento de motivação primária, o liberador de testosterona, o instinto de caçador?!
    Se o homem não puder chegar na mulher, por que se empenhará em sair da zona de conforto já que não dependerá dele a conquista?
    Não me refiro apenas a sucesso financeiro, há mulheres que valorizam um homem com dinheiro, mas outras enxergam diferentes habilidades que os destaquem dos demais.
    É inegável o poder que a mulher tem de fazer com que o homem saia do lugar e faça de tudo para chamar sua atenção. Mulheres gostam de estar com homens que elas admiram, não com bundas-moles.
    Estamos falando aqui do risco de se retirar o principal alicerce, o ponto de partida, com desdobramentos em outras áreas, o qual pode abalar de maneira irreparável a sobrevivência humana!

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