Injudiciário.

Vamos lá?

+A Justiça de Sergipe mandou as maiores operadoras de telefonia do país bloquearem o acesso dos brasileiros ao aplicativo de mensagem instantânea WhatsApp por 72 horas a partir das 14h desta segunda-feira (2).
+Condenada a 39 anos de prisão por matar os pais, Suzane von Richthofen deixou a Penitenciária (…) para a saída temporária de Dia das Mães.
+Os (…) julgados pela morte de Rafael Mascarenhas, filho da atriz Cissa Guimarães, considerou que “a justiça foi feita” após seus clientes terem a pena revista em decisão de segunda instância (…) para quatro anos de serviços comunitários cada um.
+Uma esponja de lavar louça, no formato de um boneco negro com black power, (…) virou processo do Ministério Público Federal (MPF) (…) contra a Rede Globo.

Não é de hoje que falamos das loucuras do Judiciário brasileiro, mas, com tantas notícias, conseguiram mais um desfavor da semana.

SALLY

Alguns anos atrás, eu escreveria este texto com muita frustração e raiva, quando eu ainda acreditava no direito brasileiro, quando eu achava que tinha salvação ou que, ao menos, eu sozinha com força de vontade e criatividade, poderia fazer o bem de forma individual. Hoje eu confesso que, egoisticamente, só consigo sentir alívio por ter antevisto o monstro que estava nascendo e ter me afastado a tempo. Numa boa, se a pessoa consegue ganhar a vida dialogando com ESSE Judiciário, eu questiono ou seu caráter, ou sua sanidade mental.

Esta semana o Judiciário brasileiro merdou mais que o Rafael Pilha. Tanto, mas tanto, que não conseguimos escolher qual foi a merda pior para estrelar a coluna. Decidimos que todas são dignas de menção, por isso vamos fazer uma compilação dos grandes toletes que a (in)justiça brasileira fez esta semana. Não dá para falar em profundidade de todos os vexames, porque são tantas emoções… Mas vamos dar um passeio breve pela desmoralização e incompetência do Judiciário brasileiro.

Comecemos falando da desproporcionalidade da lei brasileira. Enquanto tem gente (indevidamente) encarcerada por roubar pão, se você trafega em uma via que está interditada e acaba matando uma pessoa, sua pena é prestação de serviços comunitários. Veja bem, nós não somos a favor da vitimização seletiva, tanto que à época da morte do filho da Cissa Guimarães fizemos um texto bem polêmico dando uma trava nessa comoção toda. Ele também estava em uma via interditada, onde ninguém deveria estar.

Não é por ser filho de global. É por uma pessoa ter perdido a vida por uma imprudência do caralho de um escroto que não prestou socorro e ainda subornou a polícia para se safar e isso acabar em prestação de serviço comunitário. Percebam que a coisa está tão degringolada que nem com a pressão da vítima ser filho de global conseguiram aplicar uma pena condizente. É aquilo que eu sempre explico desde 2009: crimes com pena inferior a quatro anos não geram prisão no Brasil. Agora me diz se dirigir feito um demente, acima da velocidade, em uma via interditada, matar uma pessoa, fugir sem prestar socorro e subornar a policia para se safar mereciam uma pena de três anos e seis meses?

Só para vocês terem uma ideia de como as punições são desproporcionais: se você rouba, apenas rouba, sem encostar em um fio de cabelo de alguém, pode pegar dez anos de prisão. Se mata alguém atropelado, agindo da forma mais errada possível, e não pega nem quatro. Mas, esqueçamos por um segundo o Código de Trânsito, que é permissivo demais, e vamos focar no Código Penal. A desproporcionalidade das penas é tanta que pode acontecer de uma pessoa matar alguém deliberadamente, de propósito, e ser condenada a seis anos, enquanto que outra que falsificou dinheiro pega o dobro, doze anos. O que isso te diz? Entre vida e patrimônio, patrimônio vale muito mais! Não sou uma leiga falando, passei mais de dez anos lidando com isso. Nojento. Nisso que dá colocar leigo para fazer lei.

Também tivemos mais um aborto jurídico mandando derrubar o whatsapp. Não vou me estender pois da última vez que aconteceu ficamos tão putos que fizemos um texto só sobre isso, expondo ponto a ponto a bizarrice que é fazer uma coisa dessas. Só quero mandar um caloroso abraço para todos os idiotas que defenderam o Marco Civil, pois é graças a ele que atrocidades como essas estão sendo cometidas. Leigo (sobretudo artistas hippies) tem que aprender a calar a boquinha sobre direito em vez de ir a público defender uma bosta que nem ao menos entende. Jurista não se mete a opinar sobre técnica de interpretação, se mete?

No quesito ridículo, teve o Ministério Público entrando com uma ação contra a Globo por “dano moral coletivo e discriminação racial” (nunca dá para saber ao certo o que está acontecendo com essa imprensa idiota que insiste em não contratar uma assessoria jurídica competente para dar a notícia certa!). Tudo por conta de uma esponja que foi usada no BBB, em formato de uma pessoa, onde o cabo era o corpo e a esponja era o cabelo black power.

Se você achou a atitude por si ridícula, espera até ouvir a douta explicação: “A representação do cabelo ‘black power’ como esponja de pia faz uma clara alusão ao estereótipo racista do ‘cabelo para ariar panela’ ou ‘cabelo Bombril’, servindo apenas para reforçar o preconceito, ainda intrínseco a muitos setores da sociedade, desde a abolição da escravatura”. Olha, o Judiciário está igual ao PT: louco varrido, desonesto e sem sentido. Quem ainda não desistiu dele é porque ou leva dinheiro sujo usando-o ou é um negador.

Para coroar esta semana teratológica, Suzane Von Richthofen teve concedido um benefício para sair da prisão… no dia das mães! Ela realmente deve ter muito que comemorar, talvez um almoço de família, um piquenique no túmulo da mãe que ela mesma planejou a morte. Ela preenchia os requisitos? Sim. E é justamente isso que assusta. Que merda de requisitos são esses, minha gente? A razão dessa saída temporária, assim como a de natal, é conceder um benefício para que a pessoa passe o dia com a mãe, com a família. Quando a pessoa matou sua família, faz mesmo sentido conceder este direito?

O Judiciário é o principal pilar de uma democracia. O Legislativo cria as leis, o Executivo cria mecanismos para executá-las. Ambos só andam na linha se tiver um Judiciário firme, justo e vigilante para mantê-los na linha. O poder que o Executivo e o Legislativo tem é enorme, é muito fácil se perder, se corromper. O freio desse povo é o Judiciário. O freio do lado animalesco que cada um tem dentro de si é o Judiciário (e o brasileiro tá de parabéns, bicho puro). Ele é o pilar essencial do controle, da contenção da barbárie e no Brasil, está ruindo. Não tem democracia no mundo que sobreviva com um Judiciário cagado. A evolução de uma sociedade depende de um Judiciário saudável e funcional.

Quando seu guardião, aquele que deveria te proteger e te vigiar, faz as piores merdas, você pode ter certeza que está tudo perdido. É como se o guarda-costas de uma celebridade, pago para mantê-la em segurança, a esfaqueasse. Eu sei que os leigos estão acostumados com o Judiciário não ser confiável, ser tudo uma zona, mas não pode. Um Judiciário patético e sem coerência é uma sentença de morte para uma sociedade civilizada.

O Judiciário brasileiro hora é digno de pena, outra de risos e outra de raiva. Anota aí: o Judiciário brasileiro que deveria nos proteger, impor ordem, fiscalizar, é hoje o principal câncer da sociedade. Muito orgulho de ter rompido com essa merda antes de me contaminar e começar a ceder.

Para se indignar, para se indignar ou ainda para se indignar: sally@desfavor.com

SOMIR

Hoje é dia da Sally brilhar. Sigo a relatora, com o conhecimento de causa que ela tem. Confesso que às vezes precisa dela apontar o que de maluco aconteceu para que eu comece a ter ideia do problema. Todos deveriam conhecer as leis, mas a verdade é que a maioria não tem nem ideia do que acontece, é como se fôssemos crianças esperando uma decisão do adulto, incapazes de entender porque ela aconteceu.

E bons pedagogos vão te dizer que mesmo entendendo que a criança não tenha o alcance necessário para compreender a totalidade da decisão que seus pais tomaram, faz muito bem pra ela tentar explicar, na medida do possível. Quem tem que obedecer e não entende – nem que rudimentarmente – o que lhe foi imposto tende a não agir de forma consistente em relação ao que obedeceu daquela vez.

Às vezes nem por mal, é que se você entende uma ação como errada sem entender o contexto no qual ela é considerada errada, qualquer variação que desemboque em resultado parecido não vai soar como “crime”. É como se a criança entendesse que é errado bater num irmão, mas não que é errado sair batendo em geral.

Outra coisa que ajuda bastante a criança a respeitar as decisões do adulto é a coerência. Sempre que tal situação acontece, o resultado, punitivo ou não, obedece uma mesma lógica. Punir uma vez e liberar duas pode ser até pior do que punir as três ou liberar as três. Com o padrão começa a surgir a compreensão do contexto da ação. E padrões sólidos até ajudam a pessoa a começar a prever relações entre ações parecidas.

Estou fazendo esse desvio para chegar no meu ponto: a melhor lei é aquela que as pessoas entendem. O melhor juiz é aquele no qual se pode confiar. E no Brasil, esse ponto está cada vez mais desbotado. Vivemos com imensa ignorância e até mesmo desinformação sobre as leis que nos regem, e quando olhamos para o que o Judiciário está fazendo, não há padrões ou mesmo lógica para se extrair dali.

Nos exemplos dessa vez: mais uma decisão autoritária e circense do mesmo juiz sergipano que prendeu o presidente do Facebook no Brasil nem tão pouco tempo atrás. Ao invés de aprender o que realmente acontecia com a incapacidade do Whatsapp de fornecer as informações pedidas, bateu o martelo e deixou milhões de pessoas sem uma das ferramentas mais utilizadas para comunicação no país, por mais de um dia. E nem novidade foi mais, tínhamos vindo de outro bloqueio recente. O Judiciário não entende o que acontece, não vai aprender, mas mesmo assim decide mexer com a vida de todos nós para manter alguma pose. Como a criança vai obedecer o adulto que sabe que está errado e a pune mesmo assim?

A falta de tato do juiz que me libera a Richthofen para o dia das mães? Se o sergipano parecia ter tempo demais nas mãos, esse aí provavelmente estava enterrado debaixo de processos (atrasados) e decidindo tudo com mais pressa que juízo… a criança vai entender que esse adulto está prestando atenção no que acontece com ela?

A pena ridícula para ter matado alguém, filho de global ou não, escancara como as regras nem sempre estão bem planejadas. E também como no frigir dos ovos, os juízes vão simplesmente seguir o que tem de fazer para poder continuar trabalhando, seja justo ou não. É como dizer para a criança que a pena para bater no irmão é passar mais 10 minutos no banho. Se não há lógica, se não há peso e consequência, como entender a gravidade?

E, claro, depois da internet ter mais um chilique inútil, o ministério público vai processar a Globo por uma esponja de cozinha! Estamos ensinando que basta chorar bastante para ter o que quer? Complicado mimar essa criança com a impressão que ela vai ser ouvida toda vez que se ofender por algo, tendo mérito ou não. Onde está a linha? Regras arbitrárias como punir quem faz uma piada e não punir quem mata uma pessoa realmente confundem a cabeça.

Porque, no final das contas, o Judiciário meio que age como o adulto responsável da nossa sociedade. E quando o adulto parece que bateu a cabeça com força antes de cuidar de nós, as coisas tendem a ficar confusas até mesmo no contexto do que é certo ou errado. Terreno fértil para o jeitinho brasileiro e todos os problemas que temos com a lei por aqui.

Mas percebam que eu disse que “meio” que age. Porque na verdade, quando esse adulto responsável fica abandonado, quando não é cobrado de verdade por nada que decide, acaba sendo infantilizado junto. Vemos muitos juízes com complexo de criança mimada, dando showzinhos de carteirada onde estiverem, com a certeza de sua divindade…

Essa relação de adulto e criança é doentia, pra falar a verdade. O Judiciário não deveria ser visto assim… que absurdo! Somos todos adultos! Mas, admite aí… enquanto você lia meu texto, fazia bastante sentido, não fazia? Bom, aí vamos cavar um pouco mais fundo na mentalidade do brasileiro: o Estado como papai, não como uma empresa na qual você tem uma ação. Tratamos o governo assim, todos os seus braços.

A verdade é que temos funcionários incompetentes na nossa empresa. E ninguém para cobrá-los… papai foi embora, faz tempo.

Para dizer que pareceu des contos com essa virada, para dizer que agradece o esforço mas só o da Sally importava aqui, ou mesmo para dizer que eu não posso falar nada de gente incoerente: somir@desfavor.com

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Comments (25)

  • Tarde demais pra mudar de curso. Sou FIES e vou ter que desembolsar uma grana alta pra mudar pra Jornalismo. Vou ter que arcar com as consequências.

    Gosto de Direito, mas sua experiência, Sally, reflete a realidade. Lamentável!

  • Pensando bem, a OAB ter me negado inscrição foi a melhor coisa que pôde acontecer. E quando me aposentar, não pegarei mesmo a carteirinha.

  • Aqui na Bahia, o berço do pior tipinho de BM, ainda acham que ser juiz é “status”. Claro, ser um BOM juiz, advogado (assim como um bom profissional de qualquer área) é um motivo de honra, mas por aqui, certas profissões ainda têm uma certa aura idolátrica. Pois bem, com esta decadência do judiciário tupiniquim, fica patente que não dá mais pra colocar no pedestal uma profissão que virou motivo de zombaria por tantos vexames… E com tudo isso, vivem uma vida de marajá (e reclamam, querem mais do que já tem) e ainda por cima vivem querendo aparecer (como fez o juiz de Lagarto – Sergipe – ou seja, um juiz da puta que pariu querendo holofotes, coisa bem típica de BM). Dá é muita vergonha de ter nascido nesta Banânia sem cultura e ainda por cima na região mais coronelista e autoritária da Banânia.

    • Aqui no Rio deixou de ser status, só para o pessoal bem baixa renda, que se admira com as “autoridades” no geral. Cabeças mais refinadas entendem que é vergonhoso fazer parte do Judiciário.

  • Oh que consolo este texto de vcs! Parabéns, mais uma vez! Pois é… E já vi gente que teceu loas ao bloqueio do whatsapp (um programa de mensagens que é sim, muito útil para o trabalho) com aqueles pretextos demagógicos como “sai do zap zap, vai conversar olho no olho”, que o judiciário está correto porque o whatsapp guarda sim as mensagens e tem que mostrar pra polícia” e chegou até a escrever algo como “ah, as pessoas usam o aplicativo pra brincar, o mundo pode viver sem isso”, chegando inclusive a insultar pessoas que “usam o aplicativo de graça e depois reclamam quando bloqueiam”. Vejam só como certas mentalidades funcionam… E com um judiciário destes, o Brasil só pode piorar cada vez mais.

    • Não consigo demonstrar nada além de nojo de pessoas limitadas e desinformadas que vem falar essas merdas, passando um verdadeiro atestado de que nem sabem o que estão falando. É o que vem sendo o costume da moda do BM: ser especialista em tudo nas horas vagas. Os gurus da fodacidade

      • Depois que o aplicativo passou a ser por criptografia as mensagens entram no sistema por códigos impossíveis de ler. Nem que fosse o FBI a empresa teria as mensagens. Mas não da pra exigir que juízes a.c entendam isso. Muito menos o BM.

  • Queria mesmo falar com alguém entendi a respeito. É que eu comecei a me interessar por direito processual e decidi fazer direito depois que me formar no atual curso. Apesar de estar animada com a ideia, fico meio assim… Primeiro porque o Judiciário brasileiro ta essa merda que a gente ta vendo. Segundo porque o mercado me parece um pouco saturado. Conheci um cara formado em direito com carteira da OAB e tudo e o máximo que ele conseguiu chegar no negócio até o momento foi office boy de luxo de uma desembargadora. Juro que é verdade, ele vai de terno e gravata buscar o cachorro da mulher no pet shop.

    • Eu acredito. Eu super acredito. Recomendo abandonar direito se o atual esquema das coisas te incomoda, pois só vai piorar e você não vai conseguir mudar nada nem ser reconhecida pela sua inteligência, só por malandragem, esperteza e social.

        • Você não para de falar no Danilo, não é mesmo? Tem um forte componente homossexual aí. Recomendo parar, antes que eu conte a ele o que está acontecendo e você seja ridicularizado no The Noite para o Brasil inteiro ver.

          • Sally, tenho outra duvida que esqueci de comentar. Eu queri fazer direito pra ser promotora, sabe. A promotoria ta tão cagada quanto o resto? Tem área que se salve? Li que pra fazer o concurso tem que ter 3 anos de atividade jurídica. Eu não teria ideia do que fazer nesse tempo. Pelo menos não agora.

  • Alô, justiça? Tudo bem que já perdi a fé em você faz tempo, mas não precisa ficar o tempo todo me fazendo lembrar o porquê…

  • Discordo das críticas nos casos penais. Os juízes ali agiram de acordo com a lei. Se as leis são brandas e permissivas, culpe o Congresso e não os juizes que a elas devem se adstrir.
    Já o MP, tá fazendo papel de palhaço e o juiz sergipano age com nítido abuso de autoridade, como vcs bem colocaram.

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