Não pode!

Desde o começo desta semana, está liberada a campanha eleitoral para os cargos de prefeito e vereador. Provavelmente ainda não com muita força, especialmente se você estiver numa cidade pequena, mas logo logo vai ser difícil ignorar o processo. Nesta, a Justiça Eleitoral colocou uma série de restrições para reduzir o incômodo e a poluição sonora/visual causada pelas campanhas. Resolvi escrever um texto explicando para vocês o que pode e o que não pode acontecer nos próximos dias.

Pra começo de conversa, vamos falar de dinheiro. Duas decisões que se aplicam a esse ciclo eleitoral mudam consideravelmente o funcionamento de todo o processo. A primeira é que empresas não podem mais doar dinheiro para candidatos ou partidos. Qualquer valor declarado como doação deverá vir de uma pessoa física, ligada a um CPF. E o valor que essa pessoa doar não pode ser maior do que 10% dos rendimentos dela na declaração anterior de imposto de renda. O que com certeza não impede que empresas montem esquemas de doação disfarçados, mas pega de calças curtas muita gente ainda. Na próxima eu já tenho certeza que vão estar muito mais bem programados e vários funcionários e sócios vão ter rendimentos recorde em 2017.

A outra nessa mesma linha é o limite de gastos. Um candidato de eleição majoritária, ou, nesse caso, candidato a prefeito, só pode gastar 70% do valor que o que mais gastão da eleição passada. Exemplo: se na última eleição pra prefeito da sua cidade o que mais gastou teve uma verba de um milhão (pausa para rir), o limite para qualquer candidato nessa é de R$ 700.000,00. Não tenho certeza por quanto tempo a Justiça Eleitoral vai manter essa regra, mas o objetivo é forçar as campanhas a gastar menos e menos com o passar dos anos.

O truque para ambas as restrições é o mesmo de sempre: caixa dois. Dinheiro entrando sem registro e sendo gasto sem declaração posterior. Tenho que tirar o chapéu para nossos legisladores dessa vez, porque por mais que o certo seja evitar o dinheiro não declarado de vez, fechar a porta para doações legais de empresas e colocar tetos de gastos complicam tudo para quem quer fazer errado, e até punem retroativamente: o dinheiro que foi maquiado na eleição anterior não serve para calcular os 70%, fazendo campanhas artificialmente baratas aplicarem efeitos reais na atual. Com certeza um comitê vai estar no pescoço do outro procurando as falhas na parte de doações de empresas e limites de gastos, mas se essa informação for só dos que estão dentro do processo, podem ter certeza que algum acordo vai ser feito de acordo com os interesses momentâneos. O melhor fiscal é o franco-atirador, aquele que só quer ver os candidatos sofrendo, e no caso, nada melhor do que nós mesmos…

Desconfiou, denuncia. Bota no deles mesmo. Nem precisa confiar no sistema, pode só confiar na competição: se você der qualquer munição, um começa a atirar no outro sem dó. Os candidatos e partidos começam a fazer acordos lá pro final da eleição, neste momento eles todos se odeiam. Use essa informação com sabedoria. Desde que eu aprendi sobre a legislação, já consegui arranjar dores de cabeça para alguns candidatos. A sensação é boa, acreditem.

Apesar da linha do financiamento e gastos de campanha ser efetivamente a mais importante para todos nós, como nação democrática, tem outra parte que realmente parece ter sido feita com nosso bem estar em consideração: a limitação na onipresença das imagens de candidatos e partidos durante a campanha eleitoral. Existem várias regrinhas sobre o que pode e o que não pode fazer. Algumas são bem antigas, outras acabaram de sair do forno. Vou passar pelas principais.

O básico é que candidatos tem uma limitação severa sobre gastar dinheiro para se promover na mídia. Cidadão não pode fazer propaganda em TV ou Rádio pagando por ela, só no horário político, que é cedido gratuitamente para ele. Não pode colocar Outdoor ou nenhuma placa que dependa de pagamento pelo espaço nas ruas. Na mídia impressa, a única coisa que podem é colocar um certo número de anúncios em jornais locais, e nunca maiores que um oitavo do tamanho da página. Se você vir qualquer propaganda de candidato na mídia que não seja essa de jornal, e nesse tamanho, pode denunciar sem dó.

E sobre placas em bens particulares (terrenos, muros e até mesmo carros), tem um limite de tamanho: meio metro quadrado. Qualquer coisa maior do que isso e o candidato tem que tirar. E não adianta usar o truque de colocar várias placas uma do lado da outra, a lei prevê essa esperteza e diz que se estiverem próximas o suficiente, vão ser somadas. Via de regra, se você vir uma placa ou adesivo de candidato que pareça maior que uma TV de 40 polegadas, vale a pena prestar mais atenção. E se tiver a disposição, medir para ver se dá pra denunciar. Dá até pra trollar colocando você mesmo uma placa grande, porque no final das contas, vai dar dor de cabeça para a campanha tirar ou provar que não tem nada a ver com aquilo. Atenção nos carros: não pode adesivar inteiro. Respeita a mesma regra.

O material impresso entregue nas ruas, ou jogado no chão para deixar as cidades ainda mais imundas, também tem limite de tamanho. Isso é mais raro de acontecer, porque o tamanho máximo é bem grande e normalmente preferem fazer milhares de pequenos do que centenas de grandes. Se parecer maior que um cartaz aberto, pode estar fora do limite.

Mas eu escrevo este texto muito pela parte digital: do jeito que a lei se configurou, a internet é quase terra de ninguém nas limitações impostas. Quase, porque tem algumas coisas que não podem: nenhum site de empresa pode fazer propaganda de candidato, paga ou de graça. Só o candidato (no caso o CNPJ da campanha dele) pode lançar materiais no site dele ou em redes sociais, desde que não pague para anunciar. O que isso quer dizer: se você vir uma postagem de candidato no Facebook com aquele aviso de “Patrocinado” no topo, você pode e deve denunciar. Não só para o Facebook (que vai derrubar o mais rápido que puder) como também para a Justiça Eleitoral.

Aposto que suas redes sociais já estão começando a ficar abarrotadas de caras e números, é difícil evitar isso completamente, até porque em tese precisamos conhecer os candidatos, mas isso não significa que alguém pode ser esperto e burlar a regra de não usar dinheiro para pagar por propaganda. Fiquem espertos com o aviso de patrocinado ou pago em cada uma das propagandas eleitorais que virem, fiquem espertos com sites de empresas fazendo propaganda para candidatos. São chances valiosas de botar de volta neles.

O problema do brasileiro é falta de fiscalização, talvez até por desconhecimento do que deveria estar fiscalizando. Pode ser que você não use este texto para nada nos próximos dias, mas se por um acaso a possibilidade surgir, você vai ter a informação. Concordo muito com a maioria das restrições e vou fazer questão de pentelhar os candidatos da minha cidade se vir algo de errado, convido quem mais estiver lendo este texto a fazer o mesmo.

Para denunciar, você pode usar o formulário online da Justiça Eleitoral do seu estado (exemplo a de São Paulo), ou mesmo fazer o melhor de tudo: passar a informação para uma campanha concorrente, anonimamente. Eles não vão largar o osso, pode apostar.

Para dizer que acho chato mas útil, pra dizer que achou útil mas chato, ou mesmo para dizer que finalmente achou algo interessante pra fazer nas eleições: somir@desfavor.com

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