O fim está próximo.

Relacionamentos começam, relacionamentos acabam. Quando um deles chega ao seu final, Sally e Somir discordam sobre o que torna a experiência ainda pior. Os impopulares terminam de dar sua opinião.

Tema de hoje: qual a pior parte de um término?

SOMIR

Tecnicamente, o pior é não querer terminar. Mas esse é um caso específico, considerando um quadro mais geral, a pior parte na minha visão é o estranhamento pós-término. Aquela sensação de lidar com a outra pessoa subitamente num contexto novo onde… onde ela não é mais nada sua.

Porque tristeza, brigas e todo aquele pacote mais passional do processo, esses são previsíveis. Pra essas coisas dá pra procurar um ombro amigo, escutar conselhos, até mesmo distrair a cabeça com outras coisas. Mas, o estranhamento? Esse está lá e é até difícil de explicar pra si mesmo o que está acontecendo. E seja lá o que aconteça na relação entre as duas pessoas dali pra frente, ele nunca mais vai embora. No final das contas, você criou uma possível situação confusa e constrangedora para o resto da vida (bom, pelo menos da que durar menos).

Um fantasma que pode te assombrar por muitos anos ainda, um fantasma que nem sempre abre o jogo sobre suas intenções e pode até te criar armadilhas no futuro, abusando da confiança construída naquela relação para dinamitar suas próximas. Um risco constante de sabotagens e dúvida sobre intenções.

Mesmo na hora do término, com a coisa acontecendo, o estranhamento é horrível, nem o corpo entendeu ainda o que está acontecendo, o “direito” ao uso do corpo alheio cortado numa pancada só, a necessidade de mandar sinais claros de tudo ao contrário do que tinha se acostumado a fazer antes daquilo. Tirando casos de extrema putez, daquelas que você tem certeza de serem imperdoáveis, a cabeça acaba esfriando. E aí tem uma nova camada de estranhamento sobre quão definitiva é aquela situação… mesmo que na cabeça pareça a coisa mais correta a se fazer, é raro estar num estado de paz e certeza suficiente para se livrar dessa situação estranha.

E nos dias seguintes? Porque ninguém se programa para resolver tudo num golpe só, sempre fica alguma coisa pra resolver, ainda mais em relacionamentos mais longos onde até mesmo as rotinas estão entrelaçadas. Seja naquela hora bizarra de decidir se devolve, joga fora ou guarda o que ganhou de presente, seja pra devolver coisas que estavam emprestadas ou deixadas na sua casa, desfazer planos e projetos que estavam em andamento, todas coisas que precisam de alguma forma de interação com quem, há pouco tempo, você estava se relacionando, e há pouquíssimo tempo, não estava mais.

As conversas pós-término? Terríveis… com aquela sensação bizarra de não ter mais sua naturalidade, e seja como for: se você tiver tomado pé na bunda, tem que manter um mínimo de orgulho enquanto presta atenção para uma possível brecha; se você deu o pé na bunda (e não odeia a pessoa o suficiente) tem o cuidado com o que fala e expressa para não esfregar mais sal na ferida… ou, mesmo se foi de comum acordo, ainda tem o risco de demonstrar alívio ou arrependimento demais. Tudo muito estranho, forçado…

Sem contar as situações seguintes, tendo que resolver alguma coisa complexa ou mesmo vendo a pessoa numa situação social simples, o constrangimento de não saber como lidar com aquilo, de não entender se o correto é notar ou não a presença dela, se deve ser gentil ou seco, se existe um risco de dar impressões erradas ou mesmo se controlar para não se colocar numa situação vexatória caso você seja a pessoa com esperanças. Muitas variáveis, muita complicação, ainda está tudo muito recente.

E aí o tempo passa, você acaba encontrando essa pessoa de novo, seja lá qual o motivo. E daí, a naturalidade sai pela janela na hora. Mesmo que você já tenha passado por todo o seu processo, é uma pessoa que você não tem mais tanto contato, com a qual já foi muito íntimo em algum ponto, e… pode até já ter outro relacionamento acontecendo na hora. Aquela pessoa com quem você terminou sempre tem algum efeito em você, por mais leve que seja. E isso vem de duas raízes: você namorou aquela pessoa por algum motivo (que não costuma desaparecer por mágica), e você terminou com ela por outro motivo (que também não deve ter desaparecido).

Terminar um relacionamento é criar uma pessoa estranha e íntima ao mesmo tempo, que pode cruzar seu caminho a qualquer momento. E ao cruzar seu caminho, tudo pode acontecer… inclusive essa pessoa ter algum objetivo secreto que pode te causar um grande problema em novos relacionamentos. Uma necessidade impossível de entender de não estar com você ao mesmo tempo que não quer ninguém estando com você. Afinal, são as duas sensações: o por que ficou junto e o por que separou. Numa dessas, você pode cair numa grande armadilha e se afundar seriamente nesse estranhamento.

O que só repete o ciclo, criando uma nova pessoa estranha e íntima para aparecer no seu caminho futuramente. Brigar e se sentir mal são coisas péssimas sim, mas elas passam. Elas se transformam em coisas novas e sua vida segue em frente. O estranhamento, esse, depois de criado, é um risco constante na vida. É como se depois de criado um estado de intimidade e parceria suficientes, tem algo que nunca mais vai embora, seja lá o que se lembre daquela relação.

É estranho. Estranho e perigoso.

Para dizer que pra autista tudo é estranho, pra dizer que ainda acha que o pior é levar pé na bunda, ou mesmo para dizer que cada um planta o que colhe: somir@desfavor.com

SALLY

Qual é a pior parte de um término de relacionamento? Tudo. Términos são uma grande pior parte da vida. Mas se tivesse que escolher uma pior parte, seria todo o estresse que envolve o fim: brigas, mágoas, sensação de perda de tempo, decepção, saudade, sofrimento, enfim, esse combo que vocês devem conhecer bem.

Mesmo quando acabam de comum acordo, é impossível não sentir falta em algum nível da pessoa e sofrer com sua ausência. E, convenhamos, é muito difícil, eu diria quase impossível, que se termine um relacionamento de total comum acordo. Geralmente um não quer terminar e, em alguns casos, ninguém quer terminar, as pessoas apenas não conseguem fazer aquilo funcionar mais e o término acaba sendo inevitável. Então, além da dor da ausência, ainda vem todo o estresse e sentimentos ruins que esse atrito de vontades envolve.

Quem quer continuar se sente traído, rejeitado e sacaneado por aquele que está pulando fora do barco, o que são sensações horríveis. Quem coloca o ponto final se sente um escroto, ingrato e também com medo de se arrepender depois e perder alguém importante. Igualmente ruim. Ninguém sai de boa de um término, a menos que seja psicopata ou que o relacionamento tenha a superficialidade de uma colher de chá.

É impossível pedir que se reaja bem quando um ser humano que, até então, era peça fundamental da sua vida, porto-seguro, confidente, amigo, parceiro, passa a ser, por força de convenção social, um estranho com o qual você não pode mais ter intimidade alguma. É humano que, diante desta situação tenebrosa, independente de ter dado ou levado um fora ou de ser de comum acordo, derive um grau de estresse absurdo e cada um de nós mostre o que tem de pior. Eu tenho medo, muito medo de pessoas em fase de término de relacionamento.

Mulheres frequentemente se entregam a uma intensidade de sofrimento preocupante: choram, ficam sem comer, perdem vontade de fazer tudo e quase que se tornam disfuncionais. Talvez em parte por carência ou talvez porque às mulheres lhes é permitido socialmente sofrer de forma aberta e receber algum conforto por isso. Mulheres sofrem, choram, se entregam à dor, mas ao menos recebem consolo por isso. As amigas abraçam, dizem que ele não a merecia, que virá coisa melhor. E assim segue esse espetáculo deprimente de auto piedade e evasão de sofrimento público.

Os homens não podem sofrer, pois os amigos não consolam, chamam de viadinho. Em pleno anos de 2016, homem que sofre visivelmente por amor é considerado fraco por outros homens. Por isso, homens tendem a se anestesiar em términos de relacionamento: bebem, pegam todo mundo, fazem o que for preciso para varrer a dor para debaixo do tapete. Quando ela é inevitável (pois dor apenas se adia, um dia a conta chega), aí eles tem que suportar a pancada na nuca sozinhos: 1) porque a sociedade não lhes permite sofrer em público e 2) porque quando a dor vem com delay, a mulher já superou a dor dela e já virou a página.

E isso, meus amigos, é no caso de um término civilizado. Se for com brigas, Gezuiz nos proteja, porque sobra para todo mundo, inclusive para os amigos. Não importa a razão pela qual um deles (ou ambos) se sinta injustiçado, nasce um ódio que eu nunca vi ter tanta força. É uma raiva lá do funda da alma, que vem com uma disposição para mover montanhas na intenção de “fazer justiça”, o que quer que isso signifique (geralmente, fazer o outro sofrer). Aí soma-se o estresse de estar em modo vingança ou, pior, de saber que tem alguém em modo vingança te perseguindo.

Faz tempo que meu último relacionamento sério terminou, e terminou civilizadinho. Mesmo assim, não gosto nem de lembrar o sofrimento que foi. Nem se compara ao eventual estranhamento de cruzar com a pessoa depois. O estranhamento é efêmero, tem ali um minutinho de mal estar, depois passa. Dura o quanto dura a presença da pessoa na sua vida depois do término e é evitável. Além disso, acreditem, seu olhar para a pessoa nunca mais é o mesmo, mas com o tempo você se acostuma. Já o estresse, o sofrimento e a dor do término, esses te acompanham por muito tempo, por meses, independente da presença ou não da pessoa na sua vida.

O estresse do final de relacionamento é tão poderoso que muitas vezes ele começa antes do relacionamento terminar. O medo que termine, a dúvida sobre terminar (ou deixar terminar) e todos os monstros que ele desperta: medo de nunca mais encontrar ninguém tão compatível, medo de ficar sozinho, medo de se arrepender, medo de tudo. Basicamente, medo de ver sua vida mudar sem saber o que te espera. O desconhecido desestrutura e assusta o ser humano a um ponto que meio mundo prefere o conhecido de merda a arriscar um desconhecido. Se esse estresse do término não fosse tão monstruoso, não veríamos tantos casais acomodados por aí.

E esse estresse todo, seja medo do desconhecido, seja saudade, seja sensação de injustiça, demora a passar. Sair de um relacionamento de verdade, que tenha durado um tempo significativo, gera um estresse que demora, no mínimo, meses para cicatrizar. Não consigo pensar em nada mais doloroso do que uma situação de estresse que demore meses a passar. Talvez eu seja muito apegada à minha paz de espírito, mas toda a dor e estresse experimentados em términos de relacionamento traduzem uma forma de inferno em vida para mim.

Independente do grau de civilidade e comum acordo de um término, ficar do dia para a noite sem alguém que era muito importante para você é sim uma fonte de sofrimento tenebrosa. É como se fosse uma pequena morte, socialmente falando, o papel que aquela pessoa ocupava na sua vida morreu para você. Não o luto do término de relacionamento se assemelha muito ao luto pela morte de um ente querido. A pessoa fica sensível. Jogue por cima disso brigas, stalkeamento, oversharing, raiva e revolta e veja a desgraça que dá.

Para desabafar por estar passando por essa situação e estar com seu discernimento comprometido, para posar de fodão e dizer que não sofre por ninguém ou ainda para perguntar por qual motivo começamos a semana te deprimindo: sally@desfavor.com

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Comments (8)

  • Duas piores coisas : 1 aquela falsa sensação de que virá um alívio depois de sair da relação que não traz mais felicidade. Vem culpa, dúvidas do tipo será que foi melhor assim, se devia mesmo ter começado com isso, se devia ter tentado mais, vem tudo isso menos alívio.

    2 A Bad que vem depois que tudo acaba, é infinitamente pior quando vc leva um fora. A bad fudida desgraçadamente devastadora, um atentado a dignidade que leva o que sobrou da autoestima ao fundo do poço. Mas passa, demora mas passa.

    É inevitável encontrar o ex por acaso, mas por outro lado, vingança mesmo é o ex (que só te procurava quando tava sozinho) encontrar vc por acaso e te ver feliz sem ele, sorrindo e acenando like a diva, seja sozinha ou com outra pessoa.

  • “Uma necessidade impossível de entender de não estar com você ao mesmo tempo que não quer ninguém estando com você.”

    Pra quem você escreveu isso, Madame? Não cansou de merdar e quer mais?

  • Ai… esse é mais um texto que eu começo concordando com o Somir, mas quando chega o da Sally eu passo a concordar é com ela, principalmente depois desse trecho: “Além disso, acreditem, seu olhar para a pessoa nunca mais é o mesmo, mas com o tempo você se acostuma. Já o estresse, o sofrimento e a dor do término, esses te acompanham por muito tempo, por meses, independente da presença ou não da pessoa na sua vida.”

    De fato, tu se encontrar com a pessoa depois rola lá um estranhamento, rola um climão, tu não sabe bem o que dizer e fica toda aquela coisa… Agora o estress e todo o combo de dor acompanha sim a pessoa atééé… dias, meses, semanas, até passar. É complicado o processo.

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