Poder virtual.

Uma notícia me chamou a atenção há alguns dias. O caso de Poison Ivy, o codinome de uma uma adolescente de 17 anos da Nova Zelândia que supostamente usa seus charmes para controlar e humilhar homens vulneráveis na internet. Até coloco o link, mas já aviso que é do Daily Mail, um tabloide britânico sem grandes compromissos com a verdade. Tem todo o cheiro de sensacionalismo, daquelas histórias que quem não entende de internet conta sobre a internet. Mas, do que parece real, dá pra tirar muitas ideias sobre o mundo que vivemos.

Segundo a reportagem, a garota busca por homens em comunidades de games na internet, e quando encontra um que parece especialmente carente e isolado, começa um jogo de sedução/atenção pra cima dele, com o objetivo de fazê-lo degradar-se para seu divertimento. Sim, eu também sinto o cheiro daquelas histórias dos “predadores da internet” usados para assustar as pessoas, mas a verdade é que a jovem, chamada Hanna, tem diversos troféus em suas redes sociais, homens e mais homens desesperados por sua atenção, postando fotos com seu nome desenhado no corpo e pedindo desesperadamente por perdão/atenção.

O que não me surpreende. Hanna, pelas imagens, tem a aparência necessária para prender a atenção da maioria dos homens, mas pelo visto especializou-se nos emocionalmente vulneráveis. Então, multiplique esse poder muitas vezes. Segundo ainda a matéria, ela tem paciência para cultivar essa relação de dependência e esperança nos homens por meses (o que é meio estranho ela tendo 17 anos de idade, mas vá lá, a veracidade dessa história específica nem é o ponto aqui), para depois escrever mensagens glorificando o suicídio e dizendo que isso seria uma prova de amor. Um pouco de pensamento crítico já é capaz de diminuir o drama da manchete sobre ela tentar fazer os homens se matarem, mas realmente ela fala bastante do tema.

Como vocês percebem, eu tendo a ser muito cético com esse tipo de artigo, ainda mais falando sobre o ecossistema da internet e suas peculiaridades. Jamais escreveria este texto se estivesse apenas chocado com essa notícia, afinal, custa acreditar nela toda. Mas, na hora que li, havia sim uma característica da história que fazia muito sentido com o a realidade que vivemos: os homens cada vez mais vulneráveis e as mulheres cada vez menos sob controle (TRIGGER ALERT!).

Porque se essa história de uma adolescente incentivando homens adultos a se matarem na internet soa sensacionalista, versões mais brandas da mesma ideia abundam por aí. Há um mercado (cada vez menos informal) para mulheres suficientemente atraentes explorarem a carência de homens na internet. E as mais espertas não precisam fazer nada além de se manterem atraentes sentadas numa cadeira jogando um jogo para se beneficiar desse mercado. Onde tem uma mulher razoavelmente jovem e atraente transmitindo sua imagem na internet, há uma legião de desesperados acotovelando-se pela sua atenção. É meio que a lei da vida, pensando bem, mas a forma como isso se montou na internet parece um tanto mais perversa e desvantajosa para os desesperados da vez.

Na vida real as mulheres podem sim navegar na esperança masculina de conseguir sexo até mesmo se não derem nenhuma abertura para tal, mas na internet a coisa fica ainda mais hardcore. Cidadão que nunca vai ver a mulher ao vivo dedica seu tempo e dinheiro para agradá-la, muitas vezes sendo apenas mais uma gota no oceano de fãs embasbacados. Sim, a maioria desses homens tem dificuldades de relacionamento em geral, são escapistas e vulneráveis a amores platônicos. Mas eles são homens, então, há pouco ou nenhum interesse público ou privado de protegê-los dessa mentalidade.

Na verdade, nos últimos anos o que parece acontecer é justamente o incentivo desse comportamento. Homens cada vez mais solitários e medrosos por causa da internet e praticamente nenhuma repressão às mulheres que ganham a vida explorando esses otários. Aliás, muito pelo contrário: se no começo da internet era tranquilo criticar esse tipo de mulher que fica jogando com o decote para ganhar dinheiro “fácil”, hoje em dia você é um machista nojento se falar algo sobre o tema. “Mulheres podem jogar videogame tão bem quanto homens!” Claro que sim, mas normalmente os homens que ganham a vida jogando algum jogo na frente de uma plateia online são excelentes no que fazem… normalmente as mulheres que tem a mesma profissão são atraentes. Ok, até entendo que é meio que um equilíbrio da regra da mulher admirável ainda precisar ser bonita para conseguir homem, ao contrário do homem; mas claramente temos um problema quando fica tão na cara como está nos dias atuais e é repreensível falar a verdade.

A verdade é que estamos vendo uma “virtualização” das relações numa escala tão grande que gerou-se um desequilíbrio no mercado de relacionamentos quando falamos de internet. Meio como quando uma espécie não nativa invade um ecossistema e começa a se reproduzir fora de controle, matando as outras espécies. A mulher atraente com o desprendimento necessário para se expor para esse público nerd invadiu um sistema onde nenhuma das espécies locais é capaz de lidar com a situação. Ela cresce sem controle. O tipo de homem que gasta dinheiro que não tem para paparicar uma mulher que nunca vai ver na vida é justamente o que nem consegue ter alternativas na realidade.

Eu sei que pega mal defender homem nos dias de hoje, ainda mais esses párias sociais, mas… está na hora de começar a proteger esse público. Até porque isso pode ser um choque para a imagem mental que a maioria de nós temos, mas a verdade é que esse tipo de homem socialmente inepto e dependente de internet não é necessariamente mais inteligente do que a média. Sim, o tipinho que escreve o nome de uma mulher “virtual” na testa e posta a foto em público para conseguir um suposto perdão dela tem a inteligência emocional de uma esponja marinha, mas ele pode ser absolutamente medíocre em outros tipos de inteligência também.

Não falamos de mulheres que são exploradas por homens controladores e abusivos na vida real? Bom, no ecossistema virtual as coisas podem estar se invertendo. O problema é que estamos vivendo uma fase tão exagerada nessa história de politicamente correto que criticar uma mulher por explorar um homem é imediatamente taxado de machismo ou mesmo de frescura (a tática é: se quem fala isso parece ter poder, é chamado de machista; se parece inofensivo, é ridicularizado). E estamos tão acostumados a tratar homens como “vítimas engraçadas” que eu aposto que a primeira coisa que você pensou é que se um Zé Ruela daqueles se mata por causa das palavras de uma menina de 17 anos, o mundo ficou um lugar melhor.

Mas o que esse Zé Ruela estava fazendo na prática para piorar o mundo antes disso? E se invertêssemos a história, com um homem seduzindo e manipulando mulheres vulneráveis até que alguma se matasse? A sensação é de “bem feito”? Muito respeito por quem acha bem feito em ambos os casos (como um lado meu também acha), mas o que dá errado é esse padrão duplo de comoção. Esse homem emocionalmente frágil que cai no conto do próprio instinto de concentrar sua atenção e recursos para uma mulher pela qual se interessa, mesmo ela sendo virtual (e nem comecemos a falar sobre como o cérebro masculino tem o mesmo bug com personagens realmente imaginárias em casos mais sérios de desajuste social), ele merece ficar preso nessa situação? Sinto que perdemos a capacidade de nos regular como sociedade nesse aspecto. Aliás, já que estou indo longe hoje: será que a internet não vai ser a ferramenta que faltava para as mulheres assumirem o poder?

Pensem bem: a internet mantém muitas das vantagens sociais da mulher, e ainda a protege do seu ponto fraco no físico. Não parece coincidência que no mundo atual vejamos cada vez mais feministas dando chilique nas redes sociais e cada vez mais homens enfraquecidos por culpa difusa e falta de poder nas suas relações com o mundo. Era o que faltava. Não acho mais que o mundo evoluiu o suficiente para as mulheres começarem a ganhar poder, mas que a tecnologia criou um ambiente perfeito para o sexo feminino impor sua força no mundo. Tanto que a maioria de nós aqui no desfavor concordamos que esse feminismo “empoderamento” está fora de controle e ficando cada vez mais longe do conceito de igualdade.

Não escrevo isso de forma alarmista, pedindo para os homens se unirem para derrubar o “plano maligno” das mulheres, na verdade, mesmo se der uma merda muito grande para os homens no futuro, não vai ter sido de graça. Mas eu acho que já está fazendo hora no mundo a ideia de que mulheres são o sexo frágil até mesmo na internet. Começo a achar, cada vez mais, que numa configuração de mundo com internet por todos os cantos e participação maciça da população mundial, o pêndulo balança para o outro lado. A mulher sofre na internet, é claro, mas nesses pontos a sociedade parece estar prestando mais atenção.

Mas, e os homens? Eu tenho uma teoria que os nerds/desajustados sociais são na verdade os primeiros da mentalidade das gerações seguintes. Posso dizer por experiência própria: com a cabeça que eu tinha na minha adolescência, eu jamais chamaria a atenção por ser nerd nos dias de hoje. Cultura pop, games e interesse em tecnologia? Isso é o básico de um adolescente atual. Mas estou divagando: o meu ponto aqui é que se a teoria estiver correta e os nerds atuais realmente forem a base da mentalidade da população masculina média em algumas gerações, o futuro é sombrio para o sexo masculino. O poder vai virar, e vai virar de forma assustadora. Mulheres foram subjugadas por milênios através da vergonha de serem mulheres, de acharem-se fundalmentalmente fracas e culpadas pelo que sentiam e queriam. O que está acontecendo com o homem moderno? Sendo chamado de estuprador e insensível o tempo todo? Não é vergonha do que se faz, é vergonha de ser homem, ponto. Isso destrói a autoestima de uma pessoa e a faz ainda mais vulnerável ao controle.

Gezuiz, eu sinto que acabei de prever o futuro. Juro que não comecei o texto com toda essa ideia na cabeça. O jogo vai virar e não sei se aviso algum vai servir para evitar isso… o único cenário onde as mulheres não se tornam a força dominante do planeta é o onde a internet desaba e todas as relações voltam a ser ao vivo. E ninguém planejou isso, apenas um bando de nerds deram a arma mais poderosa da história para as mulheres e ficaram distraídos vendo peitos e bundas na tela… a internet não para, a virtualização não para se não acontecer um desastre enorme. Não tem volta! Poison Ivy não é um caso isolado. Ela é um aviso.

Sério, estou em choque. Só eu estou vendo isso? O engraçado é que lá no começo de tudo, era comum dizer que internet não era lugar de mulher. O futuro é delas… o futuro é delas! E nem adianta dizer que a maioria é muito idiota para fazer uso desse poder, a maioria dos homens sempre foi muito idiota também. Isso não altera nada a dinâmica de poder. Eu sempre soube que tinha algo muito errado com essa história de meninas invandindo nosso clubinho nerd…

Para dizer que eu estou ficando cada vez mais maluco, para dizer que eu preciso desenvolver melhor essa teoria sem estar em choque, ou mesmo para dizer que é muito drama por causa de um par de peitos: somir@desfavor.com

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Comments (7)

  • Quanta desenvoltura em meio de argumentos tão bem esclarecidos ! Sua visão sai da caixinha de um modo fantástico, parabéns !

  • Num futuro utópico cheio de homens nerds eu não vejo outra alternativa que não seja uma revolta em massa contra o feminismo e a destruição do mesmo.

  • (e nem comecemos a falar sobre como o cérebro masculino tem o mesmo bug com personagens realmente imaginárias em casos mais sérios de desajuste social)

    Poderia comentar um pouco esse ponto?
    Ah, obrigado.

  • Essa questão do texto é um ponto agravante. Bom, temos ainda a cultura do funk – o banal, trazendo uma considerável taxa de fecundidade, a respeito do atual declínio, se contrapõe. Os latinos poderão ser um dos últimos países afetados, mas não antes dos árabes e insulares. Um futuro estilo “Mad Max” é provável (inversão do poder), ainda que com um pequeno atraso de algumas políticas paliativas de Estado, vide Japão, mas é por aí…

  • Isso porque ela é só bonitinha. O ser humano é assim escroto mesmo, sempre teve essa coisa de lobos, cães e cordeiros. Dura até um babaca desses descobrir onde ela mora e jogar ácido na cara… a selva é assim mesmo, tem sempre um predador maior.

  • Somir, Fugindo completamente do tema que tu tratou no texto. Ou nem tanto…

    Qual tua Opinião sobre esse poder que a internet oferece? essa comunicação instantânea – e principalmente a possibilidade de o destinatário da informação responder com outra mensagem – (algo muito próximo do que to fazendo aqui).

    Pra onde tu acha que a internet vai evoluir? Vai descentralizar como o TB-Lee pediu? Vai voltar a ser algo p2p? Vai ser tomada por grandes empresas (mais do que agora)?

    Acha que os movimentos sociais tem mais força quando são online?

    Voltando um pouco pro assunto da postagem…
    Tem mulher que faz isso. Dá pra dizer que é da natureza humana fazer merdas e se humilhar por um saco de atenção.
    Tem muito tempo, na época do Orkut. Casei em um tópico… Uma Paraibana se encantou na foto do meu avatar, um loiro, alto, sorridente, com olho verde e cara de estrangeiro. Acho que o cara era nadador ou algo assim. Avisei a menina que era um perfil fake e que ela não precisava se apaixonar. Que eu não ia prosseguir com a “relação”.
    Ela imundou minha caixa de e-mail com fotos pelada. Em algumas, o nome do meu fake escrito no corpo. O nome do meu fake escrito em um vibrador….E eu queria arrancar meus olhos fora. Apaguei os videos. Quando a coisa ficou feio e achei que tinha saído completamente fora de controle, consegui achar o telefone da mãe dela em um guia telefônico. Avisei.
    A última vez que ouvi notícias dela, estava casada com um PM paraibano. Grávida do terceiro filho.
    Dá pra dizer que as pessoas conseguem fazer muita merda (e a internet é só uma ferramenta pra potencializar essas merdas – E dar visibilidade)

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