As pedras do meu caminho – Parte 9

CAPÍTULO 20 – FAUSTÃO PAGA CLÍNICA EM SEGREDO E SALVA A VIDA DE RAFA

Confesso que senti um pouco de vergonha ao escrever sobre este capítulo. Me senti uma fraude, porque este texto se escreve sozinho. Reparem que ele é basicamente um apanhado de citações entre aspas. Até pensei em escrever com as minhas palavras, fazendo piada, mas meu senso de humor nunca alcançaria a versão original, fora que ainda seria provável que muita gente pense que eu estava inventando ou aumentando. Segue um dos capítulos mais negros da história da vida do Pilha.

Paramos com o nosso Pilhão decepcionado por gravar um CD e vê-lo morrer sem a devida divulgação. Gugu diz que não investiu por descobrir que o Pilha começava a ter recaídas. Pilha jura que não e diz que Gugu é um muquirana que apenas o explorou sua desgraça quando ele estava na merda. Fato é que o impacto dessa decepção contribuiu para que nosso herói mergulhe de cabeça nas drogas mais uma vez.

O capítulo começa bem ilustrativo “O sangue espirrou no teto quando Rafael enterrou de um golpe só a agulha da seringa com cocaína injetável na veia”. Fiquei pensando, assim como colocaram Cid Moreira para fazer a narração em áudio da Bíblia, seria bacana contratar o Datena para fazer o áudio do livro do Pilha. Neste ponto Pilha injetava cocaína, fumava crack e maconha. Estava mais viciado do que nunca. Os familiares esperavam que ele morra a qualquer momento. A imprensa continuava em cima, noticiando tudo.

Dona Sylvia estava sem dinheiro para arcar com mais uma internação e o Pilha se afundava cada vez mais nas drogas. Um dia recebeu um telefonema de um repórter da Globo e desabafou. Contou que o filho estava próximo da morte, que estava usando várias drogas ao mesmo tempo. Comovido, o repórter contou ao Faustão sobre a situação, que resolveu ajudar. Faustão imediatamente providenciou a internação do Pilha em uma clínica cara e chegou a ceder seu próprio carro para que o ele fosse levado à clínica. Em troca, pediu apenas uma coisa: que não viesse a público que ele estava bancando essa internação, que poderia durar até dois anos para um tratamento completo. Bom trabalho, Dona Sylvia!

Infelizmente parece que o Pilha não tinha condições psicológicas de aproveitar essa oportunidade. Insistia em ir embora antes do tempo e implorava para a mãe tirá-lo de lá. Apesar de estar em instalações confortáveis (era uma clínica de luxo onde vários famosos já haviam se internado) ele teimava em sair de qualquer jeito. Quando percebeu que era uma instituição séria e que as regras não seriam burladas, partiu para uma atitude extrema: comeu uma pilha e um pedaço de uma escova de dentes, assim foram forçados a leva-lo para o hospital. Há muito a ser dito, mas eu não consigo parar de pensar como alguém engole um pedaço de escova de dentes. Vocês já tentaram partir uma escova de dentes ao meio? Eu tentei. Pelo visto eu sou mais fraca do que um drogado debilitado.

Essa internação obviamente gerou polêmica e repercutiu na imprensa. Rendeu o apelido Rafael Pilha e inúmeras piadas envolvendo pilhas. Foi realizada uma cirurgia para retirar os objetos do estômago do nosso herói e ele retornou à clínica, mas agora com o recado dado: quando ele pedisse para sair, era para sair, caso contrário estava disposto a fazer qualquer coisa. Assim, um tratamento que deveria durar dois anos foi interrompido: em dois meses Pilha tanto fez que saiu da clínica, jurando que nunca mais usaria drogas. Adivinha se ele cumpriu? Novamente o vício, novamente outra internação conturbada (agora em outro local): Pilha subiu no telhado e ameaçou se jogar. Novamente fuga. Novamente internação. Nessa rotina ele foi criando várias modalidades de escapada McGyver: desde tocar fogo nos próprios sapatos até se apoderou de um facão e sair na marra.

Depois de cavar diversas expulsões de clínicas, se afundou no vício mais uma vez. Acabou preso novamente, quando voltava de comprar droga (cocaína) e se deparou com uma blitz. Fugiu em alta velocidade para não ser parado “porque na época era crime”. Pilha, querido, continua sendo crime andar em um carro recheado de cocaína. No desespero de fugir, bateu em outro carro e acabou pego. Isso porque estava respondendo em liberdade a dois processos. Mais problemas.

A história se repete. Pilha é solto com a condição de se internar em uma clínica. Graças à fama adquirida, Pilha era visto como o Everest dos psiquiatras. Um deles, dono de uma famosa clínica se ofereceu para cuidar dele de graça, apenas para provar ao mundo que ele seria o médico que daria jeito no Pilha. Assim, nosso herói virou “garoto propaganda” desta clínica cinco estrelas, com uma condição: o regime teria que ser aberto, ou seja, ele poderia sair da clínica a hora que quisesse.

Saía, se drogava e voltava. Segundo relato do próprio Pilha, “eu usava crack até no meu quarto” e “pagando, qualquer paciente tinha acesso ao que quisesse: massagistas, drogas, garotas de programa… só não tinha tratamento”. Sobre o médico, uma lembrança igualmente carinhosa: “Era um louco, um mercenário”. Muito boa a clínica. Anota aí o nome do lugar e do médico: Comunidade Terapêutica Maxwell e Dr. Sabino Ferreira de Farias Neto. Curiosamente esta clínica tratou de muitos famosos, gente como Maurício Mattar.

Pilha conta que o médico chegava ao cúmulo de lhe dar dinheiro para comprar drogas, de modo a mantê-lo na clínica, assim ele continuava rendendo publicidade para o local. Com isso sua dependência piorava mais e mais. Usou tanta droga que surtou. Um dia, muito doido, queria que o psiquiatra conseguisse mais crack para ele (ênfase na palavra “mais”). Diante da negativa, baixou o Exu Karatê e quebrou uma vidraça com um golpe. Depois pegou os cacos de vidro e começou a mastigar. Pilha conta o desfecho da história: “Fiquei com a boca toda machucada, cortei a língua, mas não fui ao hospital, acabei conseguindo o que queria”.

Se a intenção deste médico era divulgar sua clínica, ele deve ter se arrependido amargamente. Um belo dia, Pilha se emputeceu por não conseguir o que queria e resolveu que era uma boa saída engolir uma pilha, três isqueiros. Reparem que é a segunda vez que ele ingere pilhas. Logo depois ameaçou perfurar a barriga com uma caneta bic na frente dos funcionários, mas acabou engolindo a caneta também. Bic, a mesma caneta da qual foi garoto propaganda quando tinha 9 anos de idade. Fica a dica para quem acha que pode controlar ou manipular o Pilha.

O psiquiatra o levou para o hospital e tentou abafar o caso, para preservar sua clínica. Mas uma história dessas não se abafa. Vazou e virou notícia em todo o país. Sem ter o que fazer, ele admitiu o ocorrido e ainda compartilhou mais algumas informações desnecessárias, como o fato de Pilha fugir para se drogar em um terreiro de Candomblé e de ter trocado seu documento de identidade por cocaína. Depois, muito canalhamente, jogou a culpa no coitado do Gugu, dizendo que o Pilha tinha feito isso para chamar a atenção do apresentador, pois estava chateado por não ter recebido uma visita dele.

Apesar deste acidente gástrico, ele continuou tratando do Pilha. Decidiu que a melhor coisa seria fazê-lo voltar aos holofotes, com uma nova banda, apesar do resto do mundo desaconselhar este plano. Outros médicos, amigos e inclusive Dona Sylvia diziam que não faria bem ao Pilha voltar à vida artística. O Dr. Sabino conseguiu investidores e uma gravadora para lançar o Pilha em uma nova banda, chamada Los Lokos. Nome apropriado. Além de lançar o Pilha de volta no complicado meio artístico, ainda lhe deu dinheiro. Duplamente perigoso.

Pilha recebeu um adiantamento e a primeira coisa que fez foi comprar um Honda Civic. Prioridades, né? Começou a compor e aos poucos foi voltando aos holofotes. Foi procurado pela revista G Magazine, uma revista com público gay que publicava foto de homens pelados. Ofereceram 60 mil para que ele pose sem roupa e ele aceitou. Assinou o contrato, mas quando chegou na hora posar houve um pequeno contratempo: foi preso com drogas. A revista segurou o ensaio e disse que não cabia a eles julgar, não quebraram o contrato. Muito pelo contrário, deixaram o Pilha escolher onde queria posar e do que precisava. Pilha fez várias exigências, entre elas duas mulheres para “ajudar” no processo e bebidas mas acabou fugindo com o dinheiro. Pensa que ele se arrependeu? “Ainda bem que não fiz o ensaio. Nunca fez o ensaio. Tenho certeza de que teria me arrependido pelo resto da vida”. Senhoras e Senhores, Pilha fez de tudo nessa vida, inclusive dar calote na G Magazine.

Daí você deve ser perguntar onde estava Dona Sylvia no meio de tanta confusão. Ela mesma conta: “O tratamento do médico maluco era ficar passeando em São Paulo com meu filho por bares, restaurantes e boates de putas, pegando mulheres. Entrei em sérios atritos com o Dr. Sabino e resolvi me afastar. Eu não podia fazer nada, meu filho era maior de idade (…)”. Ela decidiu ir a Salvador, cuidar de seu pai que estava com câncer. Vamos ouvir as doces palavras do Pilha sobre o avô: “Ele tinha muito dinheiro, mas quando eu estava desesperado por ajuda e pedi para que ele pagasse minha internação, riu da minha cara e disse que meu lugar era atrás das grades ou sete palmos debaixo da terra. Foi cruel, mas teve seu castigo. Logo depois descobriu um câncer irreversível e morreu definhando, sofrendo (…)”. O Ministério da Saúde adverte: não ajudar o Pilha causa câncer. E ele vai achar bem feito.

A família estruturada continuava rendendo frutos. Com a partida de Dona Sylvia para Salvador, a avó do Pilha, Yolanda, foi morar com sua tia. Não durou muito, a tia do Pilha (ou seja, filha de Yolanda) a expulsou de casa quando descobriu que ela ainda mantinha contato com o neto. Sem ter o que fazer, ela foi morar na clínica com o Pilha, onde ficou por mais de um ano. Segundo ela “Só pedi para sair porque não aguentava mais ver aquele médico levando o Rafa para as boates, deixando que consumisse drogas e que se envolvesse com mulheres”. Dona Yolanda foi embora e o Pilha optou por continuar morando na clínica.

Calma que fica mais bizarro. No meio das noitadas com o médico, Pilha se apaixonou por uma moça. Começaram a namorar e ela ia até a clínica ficar com ele. Fabiana fazia belos discursos sobre como existe preconceito contra dependentes, como todos merecem uma segunda chance e como o Pilha tinha um bom coração. Mas, rapidamente o esquema do relacionamento mudou.

Um dia Pilha apareceu para buscar a moça na casa de seus pais, com um traficante com o qual estava consumindo drogas. Ruim, certo? Fica pior. Quando o traficante foi embora, Pilha achou que tinha consumido pouca droga e decidiu que era hora de mais: “Eu pedi que me arrumasse dez reais mas ela se negou. Vi que ela estava usando um anel de ouro com brilhantes que eu tinha dado de presente. Pedi de volta para trocar por crack e ela me disse não novamente. Começamos a discutir e parti para a ameaça: se você não me der o anel agora vou assaltar alguém! Foi nessa hora que vi um automóvel entrando numa vila em frente. Não pensei duas vezes, embiquei na calçada, desci rapidinho, meti a mão na cintura fingindo que era um revólver e peguei a bolsa da mulher”.

Fabiana, obviamente, ficou assustada, pegou o carro e fugiu, deixando o Pilha a pé. Só que em vez de voltar para sua casa, achou que era uma boa ideia voltar para a clínica. Quando Pilha descobriu que ela estava na clínica, ficou um tanto quanto chateado. Nas palavras dele: “Foi o tempo de entrar em um táxi, chegar e agarrar a Fabiana pelos cabelos!”. A coisa virou UFC, segundo narra o próprio Pilha: “Eu a arrastei pelos cabelos do meu quarto até o corredor. Ela começou a gritar e eu dei uns tapas nela. Ela conseguiu escapar e pulou o muro. Pulei atrás e o alarme disparou. No meio da perseguição chegou a polícia, em pouco tempo estava cheio de viaturas na porta da clínica. Fomos parar na delegacia”.

Na delegacia, Fabiane resolveu negociar: não denunciaria o Pilha se ele fosse transferido da Clínica Cata Puta, lembrando que além de ter assaltado uma mulher, ele tinha agredido sua namorada e consumido drogas, estes crimes somados dariam uma pena de respeito. Sem alternativa, tiveram que aceitar seus termos e Pilha foi levado a outra clínica, pois era isso ou ser preso. O que nos leva à constatação de que o Pilha deveria ter ainda mais processos nas costas, muitos ficaram impunes.

Provavelmente por vingança do dono da clínica, Pilha foi levado a um lugar muito, muito escroto chamado Sanatório Ismael. Era um manicômio judiciário, com muros de dez metros de altura, onde ele ficava cercado por pessoas com problemas mentais. Usavam apenas um avental sem nada por baixo, os pacientes brigavam entre si e comiam fezes. Os enfermeiros batiam e ridicularizavam os doentes. Obviamente Pilha queria sair dali a qualquer custo. Começaram suas táticas pouco convencionais.

Primeiro tentou bater com força na própria cabeça com um cinzeiro pesado. Não deu certo. Partiu para abordagem tradicional, que já lhe havia rendido liberdade em outras duas ocasiões: tirou as pilhas do discman, mostrou aos enfermeiros para garantir que eles pudessem ver o que ele ia fazer e as engoliu. Tricampeão, terceira vez que ele engolia pilhas. Nem assim aceitaram tirá-lo de lá. Foi preciso que ele simule fortes dores na barriga para que aceitem leva-lo a um hospital e, segundo o Pilha, só o fizeram por ele ser famoso, com medo da repercussão que sua morte causaria.

No hospital, percebeu uma oportunidade de fuga e saiu correndo, ainda com as pilhas no estômago. Foi para a casa de um traficante consumir drogas. Acabou sendo encontrado por policiais e conduzido à delegacia. As pilhas? Foi operado, mas assim que retornou ao quarto, mesmo com a barriga cheia de pontos, mesmo com a presença dos pais no quarto, roubou as chaves do carro deles e saiu correndo pelas escadas em direção ao estacionamento. Fugiu dirigindo em alta velocidade. Não poderia voltar para a Clínica Cata Puta por aquele probleminha com a ex, então foi se alojar no haras do dono da clínica. Não demorou para surtar mais uma vez: pegou um facão e ameaçou o Dr. Sabino, exigindo as chaves do carro e dinheiro. Fugiu no carro do psiquiatra levando 8 mil reais.

A polícia imediatamente foi acionada e rolou uma perseguição cinematográfica. Quando Pilha viu que as viaturas estavam chegando perto do seu carro, resolveu parar e fugir a pé, pulando os muros das casas e se escondendo no meio das plantas. Obviamente foi alcançado. Os policiais estavam com o filho do Dr. Sabino e queriam recuperar o dinheiro. Pilha, bom negociador que é, devolveu 7 mil e ficou com mil para ele. Depois dessa sua entrada na clínica e seus laços com o dono foram cortados de vez. O infeliz que achou que seria lucrativo ter o Pilha como garoto propaganda saiu totalmente desmoralizado.

Depois de tantos escândalos ganhou o apelido de “Rafael Pilha”. Ele diz que não se incomoda: “Passei por tantas coisas piores na minha vida que estou blindado. Não ligo, levo na brincadeira, na boa. Afinal, foi uma coisa que eu vivi. Muita gente me chama assim quando cruza comigo na rua e eu dou um oi e sigo em frente”. Porém, se alguém usa o apelido com agressividade ele fica puto. Logo, se você pretende chama-lo de Pilha, seja fofo. Não se sabe quantas hepatites você pode pegar se ele resolver te socar ou te morder.

Curiosidade: ele foi registrado como “Rafael Pilha” em um boletim de ocorrência em 2015 e atribuiu o fato à “falta de seriedade da polícia”. Vamos ouvir o Pilha fazendo mais amigos: “O delegado assinou o depoimento e depois deu entrevista dizendo que foi uma brincadeira idiota de algum policial, quando foi ele quem tinha feito isso, então, idiota era ele!”. No livro ele posa putão com o documento na mão, onde se pode ver que ele não foi registrado com esse nome, esse nome foi colocado como apelido, “Vulgo: Rafael Pilha”, um espaço destinado aos nomes pelos quais cada bandido é conhecido.
Mês que vem tem mais!

Para dizer que o nome do capítulo deveria ser “Pilha joga dinheiro de Faustão no lixo”, para dizer que Dr. Sabino deve ter ficado muito feliz com esse livro ou ainda para dizer que está explicado o atual estado do Maurício Mattar: deixe seu comentário.

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