As pedras do meu caminho – Parte 13

CAPÍTULO 25 – ACUSAÇÃO DE SEQUESTRO E PRISÃO

Para evitar a overdose de Pilha no Desfavor, já que em abril tem Power Pilha o mês inteiro, resolvi adiantar a coluna de abril e colocar no final de março. Vamos continuar a saga do nosso herói!

Paramos com o sucesso das clínicas de reabilitação para viciados. O capítulo começa contando que o Pilha estava enfrentando uns… probleminhas com a Vigilância Sanitária. O livro não conta os detalhes, mas o amor verdadeiro nos faz ter memória eidética e lembrar coisas das quais até o diabo duvida. A clínica funcionava sem alvará, na clandestinidade, de forma irregular. A clínica não atendia exigências mínimas de infraestrutura, inclusive foi autuada sob o argumento “incorrer em infração que põe em risco a saúde pública”. Mas isso não vem ao caso, né?

Pilha conta que trabalhou dia e noite por dez dias na obra para reabrir a clínica. Curioso, não conhecia esse lado pedreiro dele. No meio dessa correria, um amigo seu (muy amigo) chamado Pedro (mas que deveria se chamar Judas) ligou desesperado dizendo que sua ex-mulher Karina estava se afundando em drogas e pedindo para o Pilha intervir. Pedro contou que sua ex o estava traindo com um policial viciado e implorou para Pilha ajudar a interna-la.

Pilha relutou, disse que sem ninguém da família autorizando não tinha como, mas o amigo o manipulou: “Ela está viciada em crack e cocaína, maltratando meus filhos”. Ele contou que a mulher espancava uma criança de três anos. Aí fodeu. Aí pisou no calo do Pilha. Segundo ele conta, diante de uma denúncia tão grave, ele decidiu conversar com Karina para checar a situação. E por conversar, entenda-se imobilizar, jogar na mala da Hylux e aplicar um sedativo. Tenho certeza que não seria por mal, é que o Pilha é um homem muito intenso, é o jeito dele de fazer o bem. Mas, que fique claro, ele nega, diz que não foi nada disso, que foi apenas um mal entendido. Vamos ouvir a versão dele, tenho certeza de que é muito coerente e crível.

Pedro/Judas tinha chamado a ex para a casa dele com uma desculpa qualquer e combinou que o Pilha a esperaria na portaria, para abordá-la. Quando ela chegou, estava saudável e usando roupa de academia. Os deixo com o relato do Pilhão, pois eu jamais poderia escrever melhor: “de dentro do carro, vi a menina se aproximando da portaria e não acreditei: estava usando roupa de academia e com uma aparência muito saudável, nada a ver com quem anda mergulhado nas drogas. Eu já fui viciado em crack e cocaína, então eu sei o que é a dependência. Nenhum desses dois vícios permite que a pessoa vá à academia ou tenha uma vida saudável”. Ou seja, ele tinha a clara noção de que o amigo tinha mentido para ele. O que uma pessoa normal faria? Iria embora e mandaria o amigo tomar na olhota do cu, certo? Mas o Pilha não é normal, ele é extraordinário, e é por isso que nós o amamos tanto.

Ele desceu do carro e foi atrás de Karina, mesmo tendo a convicção de que ela não era uma viciada. O que ele conta: só teve tempo de dizer “Oi Karina, tudo bem? Posso conversar com você?” e ela teria reagido um pouco mal. Novamente, nas palavras do Pilha: “Ela começou a me arranhar. Consegui segurar o braço dela e disse `calma, só quero conversar com você para…´ mas ela me arranhou inteiro. Nisso, um senhor negro que estava ao telefone em um orelhão perguntou o que estava acontecendo e ela respondeu `ele está me sequestrando´. Aí ele veio para cima de mim na base da porrada. Nessa hora, não sei de onde apareceu um cara altão, careca, de mão na cintura, também perguntando o que estava acontecendo e ela gritou de novo `Ele está me sequestrando!”. Aí o cara começou a berrar `Vou chamar a polícia´ e veio me bater também. E eu, apanhando e respondendo `chama, pode chamar! Eu não devo nada para ninguém, você está me agredindo, ela está me agredindo, este outro está me agredindo´”.

Realiza a cena: Pilha apanhando de dois homens e de uma mulher (Karina realmente deu uma surra nele) e gritando “Pode chamar a polícia! Chama! Pode chamar!” enquanto apanha. Isso só reforça meu ateísmo, se Deus realmente existisse, ele daria um jeito de me colocar no caminho do Pilha para que eu pudesse ver essa cena. Entraria na porrada na hora para defende-lo. Foi nesse momento que ele gritou a famosa frase que sempre divulgamos: “Me respeita!”, que mais tarde ele teria repetido, aos berros, na delegacia também.

Talvez algumas pessoas de coração ruim estejam achando essa história um pouco estranha ou mal contada. Como poderia Karina ter inventado do nada algo relacionado ao que o Pilha e o marido dela conversaram? Muita coincidência Pilha combinar um resgate com o marido e ela justamente inventar da cabeça dela que estava sendo sequestrada. Por qual motivo ela faria isso? Calma, o Pilha dá uma explicação plausível. Na data do evento, ele passou o dia todo na clínica “lixando e pintando paredes” depois de ter “tomado sol e tomado chuva”. Como o pedido do amigo era urgente, ele nem se trocou, nem tomou banho, foi do jeito que estava procurar Karina. Então, essa aparência (e quiçá o cheiro) deve ter assustado a moça, que imediatamente ao ouvir um “bom dia” inventou, deliberadamente, do nada, que estava sendo sequestrada.

Não vejo problema algum em alguém virar laje com o uniforme do DENARC, inclusive, eu mesma quando faxino a casa me visto como um soldado do BOPE. Mas as pessoas são maldosas e preconceituosas, imediatamente a opinião pública condenou o Pilha. Realmente chamaram a polícia e ele acabou preso. Pilha nega que estivesse com a camiseta do DENARC, afirma que ela estava no carro. Ah bom, então não há qualquer problema, assim como não há qualquer problema em ter uma arma com numeração raspada. E sedativos. E amarras. 50 tons de Pilha.

Os policiais contam que quando chegaram viram o Pilha apanhando (sim, apanhando) dos dois homens e da Karina também. Na verdade, em vez de prendê-lo, em um primeiro momento o salvaram, pois ele apanhou pra caralho e ninguém ali estava disposto a parar. Mais de 20 pessoas se juntaram para olhar o Pilha apanhar e ninguém se meteu para ajuda-lo, muito pelo contrário, populares gritavam incentivos para continuassem porrando o Pilha. Se um dia sua vida estiver muito ruim, releia isto e pense que poderia ser pior.

Quando os policiais conseguiram tirar os três de cima do Pilha, ele foi conduzido à delegacia e acusado dos mais diversos crimes, entre eles tentativa de sequestro. Lembro como se fosse hoje, o Jornal Nacional noticiando: “Rafael Pilha faz um passeio pelo Código Penal”.

Pilha conta sua versão: “Fiquei na porta da delegacia até a chegada dos repórteres. Estava tranquilo, mas na hora em que a imprensa começou a chegar, o tratamento mudou. Foi então que me algemaram e me colocaram no xadrez. Infelizmente o trabalho feito foi falho, um trabalho de exibicionismo, que acabou me prejudicando”. É Pilha, trabalho bom foi o seu abordando a Karina, né? Eu lembro do Pilha entrando na delegacia com um sorriso debochado, enquanto eu agarrava os braços do sofá e gritava “NÃO! NÃO! SEU BURRO! PARA COM ISSO!”. Em determinado momento, o delegado disse algo a ele e ele levantou o dedo e começou a berrar “ME RESPEITA! ME RESPEITA!”, todo estropiado e descabelado. Ali eu soube que ele jamais sairia da cadeia no dia seguinte, que amargaria um tempinho de prisão.

No livro, é relatada a versão da vítima também. Achei justo. Vamos ouvir Karina: “Rafael veio e tentou me levar em um´resgate`. Falou que eu estava drogada e que ia me levar. Chegou a falar que era policial e, mesmo com a chegada da polícia, continuou me segurando. Graças a Deus tiver a ajuda das pessoas (…) Essa acusação de que eu uso drogas era para tirar meus filhos de mim, iam me colocar no carro, iam me dopar, tinha uma seringa lá dentro. Me levariam para a clínica, não tenho família aqui, sou de Belém. Ia sumir do mapa”. Fica aqui minha indignação contra essas pessoas ruins, que julgam os demais pelas roupas e inventam esse tipo de mentira.

Novamente, Pilha falou demais na delegacia e acabou se complicando. Duas semanas depois, ainda preso, deu sua primeira entrevista para um programa de TV, com as mãos e os pés algemados. É uma entrevista sensacional, porém muito longa. Vou ter que citar apenas alguns momentos, como este onde o Pilha fala das injustiças da vida: “Você vê como são as coisas, o careca que me deu bordoada, disseram que foi até convidado para posar para uma revista gay, enquanto isso, eu que fui quase linchado, estou preso!”. Pilha, não seja ingrato, você teve sua chance de posar para uma revista gay, mas optou por fugir com o cachê. Ceda a vez para os colegas!

Pilha continua: “Eu soube que jornais e revistas estamparam fotos minhas em que eu estava rindo, e nos piores ângulos possíveis, no momento da prisão. Só quero que fique bem claro que eu estava rindo do circo que armaram (…) estava rindo de toda aquela palhaçada da qual eu era a vítima”. Uma frase que nunca saiu da minha memória foi o Pilha dando uma soluçada marota e dizendo “E eu, mais uma vez, sendo perseguido e injustiçado, como pode?”. Sabe o que é, Pilha? Normalmente as pessoas não conseguem achar graça depois de levarem uma surra de três pessoas e serem presas. Seu senso de humor é evoluído demais para este país.

Daí você se pergunta, como pode, Brasil, como pode? Um inocente preso tanto tempo? Bem, injeções de Haldol, Dormonid e Fenergan (substâncias que dopam até rinoceronte) foram encontradas na Hilux do Pilha, no dia da abordagem. Também acharam equipamentos imobilizantes. Pronto, bastou para a polícia prender o Pilha. Não tem lei neste país, NÃO TEM LEI! Basta uma pessoa dizer que você estava tentando sequestra-la, acharem tranquilizantes e amarras no seu carro no mesmo dia que a polícia já presume coisas. Triste, Brasil. Muito triste. Como bem disse o Pilha, “É muito fácil as pessoas criticarem, tacharem de sequestrador. Só se eu for um sequestrador porque tiro vidas valiosas das mãos das drogas e da morte”. Pilha, eu te amo. Sequestra meu coração!

Perguntado sobre andar com tranquilizantes fortíssimos no carro, Pilha esclareceu: é normal que existam substâncias tranquilizantes e equipamentos imobilizantes em um carro que era usado para atendimento de dependentes químicos. Ok. Acho super normal que um leigo promova a anestesia de um viciado e o amarre. Alguém tem algum problema contra isso, fora a lei? Sobre o uniforme do DENARC – Departamento Estadual de Repressão ao Narcotráfico, ele também explica que teria sido um presente que recebeu quando esteve preso por porte ilegal de arma. Normal, super normal. Assim como jogadores de times de futebol que se enfrentam troca de camisa, preso também pode trocar de camisa com policial.

Mas, infelizmente o Leôncio da vez acabou afundando o Pilha. Vejam o que seu adEvogado declarou, tentando provar que a versão de Karina era mentirosa: “Ele jamais poderia se passar por um agente, é conhecido por todos, uma figura pública”. Dotô, pufavô, nem eu que amo o Pilha acima de todas as coisas teria coragem de usar isso como um argumento jurídico de defesa. Assim, Pilha amargou sua sexta prisão, por um período bem mais longo do que realmente precisava. O lado bom é que ele reencontrou velhos amigos: “Tive uma surpresa: encontrei uns 50 caras que eu conhecia da época em que vivia na rua e usava drogas. Encontrei também 5 ex-pacientes meus, até me assustei ao vê-los, mas eram pessoas complicadas mesmo, que vinham de famílias problemáticas” – disse Pilha, O Simples.

Claro que sem o Pilha tudo começou a desmoronar. Dotô Leônico ficou encarregado de cuidar das duas clínicas. Resultado: em vez da que estava fechara ser regularizada e reabrir, a que estava aberta foi fiscalizada fechou também. A vigilância sanitária interditou as duas. Mas o pior dano não foi para a clínica, foi para o Brasil. Pilha era candidato a vereador pelo PTB (nós inclusive já estávamos fazendo vasta divulgação dele com o slogan “Bote Pilha na política”, que é das antigas lembra), mas sua candidatura foi cassada. Pensar que Pilha podia ter feito uma carreira política e hoje estar na Presidência da República. Não ria, se Trump se elegeu, o Pilha também poderia.

17 dias depois da prisão, Pilha conseguiu um Habeas Corpus e saiu da prisão, para aguardar o julgamento em liberdade. Deu uma bela entrevista reforçando sua inocência e dizendo que Deus o ajudaria, pois sabia que ele era inocente e seria absolvido. Só que não. Foi condenado, porque até deus tem inveja e persegue o Pilha, mas felizmente permitiram que cumpra a pena em liberdade. Porra Deus! Pisou na bola!

Obviamente, depois de tudo isso, Pilha ficou abalado. Duas clínicas fechadas, sua credibilidade destruída, dívidas acumulando. Ele já estava na beira do abismo, quando, dois meses depois de ser solto, levou mais uma pancada. Morreu em suas mãos um ex-paciente da clínica do qual havia ficado amigo. Os pais do paciente ligaram dizendo que ele precisava ser resgatado, ele foi levado até a clínica (ainda fechada pela vigilância sanitária) e quando chegou, Pilha constatou que não tinha pulso. Ele resolveu intervir para tentar salvar o paciente e amigo, realizando… procedimentos. Eu gosto de acreditar que foi apenas RCP. Vamos nos apegar a esta versão.

Infelizmente o paciente acabou falecendo, o que gerou mais repercussão negativa, mais escândalo com o nome do Pilha, além da dor de perder um amigo. Pronto, foi a gota dágua, era demais até mesmo para um semideus como o Pilha aturar. Pilha colapsou e tempos muito difíceis estavam chegando.

Para dizer que quer Plantão Pedras e Power Pilha, para dizer que quando for parado em uma blitz vai rir da cara do guarda ou ainda para dizer que ainda é tempo do Pilha entrar para a política: deixe seu comentário.

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