Quase todos nós tínhamos, temos ou teremos animais de estimação. É algo quase que inerente ao ser humano, mas Sally e Somir discordam sobre quais tipos são realmente aceitáveis, os impopulares criam suas opiniões.

Tema de hoje: Vale a pena ter animais de estimação que não sejam cães e gatos?

SOMIR

Claro que vale. É só você gostar de ter aquele animal. Se você tiver condições de dar uma existência digna e estiver disposto a assumir o risco, vale a pena até ter um leão de estimação. Antes de qualquer coisa, vamos definir algo muito importante: sabe o que peixes, tartarugas, girafas, cachorros e gatos tem em comum? Não são humanos e nem nunca serão. Ou você é homo sapiens sapiens ou você não tem a menor condição de interagir com outros seres humanos na complexidade que realmente exigimos.

Invariavelmente qualquer animal irracional vai ficar devendo, e muito, se tentarmos colocá-los no mesmo nível que nós. E por mais alguns animais sejam mais inteligentes que os outros, cães, chimpanzés e golfinhos continuam abaixo em escalas de magnitude de complexidade intelectual em relação a nós. Bacana que o cão e o gato sabem alguns truques a mais e reconheçam mais reações nossas, mas estão no mesmo barco de irracionalidade que peixes… dito isso, nada contra preferir gatos e cachorros pela maior familiaridade das espécies com a condição de animais de estimação, mas daí a cagar regra que outros não podem ser recompensadores? Menos, bem menos.

Vale lembrar também que cães e gatos entraram na rotina humana por motivos utilitaristas, cães pela companhia na caça e pela segurança, gatos pela sua excelente capacidade de controlar populações de roedores. Com o tempo que fomos nos afeiçoando à presença deles e permitindo que sejam completos inúteis em nossos lares. Não digo isso com maldade não, é que hoje em dia praticamente não precisamos das funções originais deles, não ativamente. Então, sobra espaço para criar raças defeituosas (mas que muitos acham bonitas) que não sobreviveriam uma semana na natureza. Muito bonito dizer que são nossos melhores amigos, mas se você tem uma das raças deformadas em sua casa, é efetivamente um objeto de decoração que caga.

E objeto de decoração que caga por objeto de decoração que caga, às vezes é melhor ter um que caga dentro de um aquário, não? Melhor lá do que no seu tapete. Atualmente boa parte da população urbana está presa em apartamentos, locais absolutamente nojentos para se ter um animal que vaga livremente. Então, se vai enfiar o pé na lama, qual o problema de ter outro bicho? Lembrando que caso você não seja maluco e tenha um porco de estimação, a maioria dos outros animais mais exóticos ou é pequena o suficiente para não fazer muita merda (literal e não literalmente) ou vive dentro de uma caixa, facilmente identificável e limpável.

E vamos pensar em outra coisa: cães precisam de muito exercício, gatos precisam de muito espaço. Você pode privá-los disso, é claro, mas nunca vai ser o ideal para os bichos. Peixes, tartarugas, e até mesmo aranhas e outras coisas do tipo estão de boa com uma vida sedentária e pouco espaço. Pode ser até mais humano ter um bicho diferente desses do que ter um gato ou cachorro presos no seu apartamento. E mesmo se você tiver casa, temos outra coisa para considerar: a quantidade de atenção que você pode dispensar.

Cães e gatos exigem muito mais atenção, gatos até se viram melhor, mas como são seres muito ligados à evolução humana recente, são os descendentes dos animais mais carentes que fizeram mais sucesso conosco. E considerando que normalmente (e desculpa falar essa verdade) a maior parte da relação entre humanos e cães ou gatos está na mente do humano, até por falta de complexidade deles para sequer entender isso além de uma relação benéfica para eles, faz tanta diferença assim outro tipo de bicho?

Animais são divertidos quando estão fazendo as coisas deles, e essa lógica não muda muito: ver um gato brincando pode ser tão interessante para uma pessoa quanto ver uma tartaruga comendo uma alface, quem disse que tem uma escala absoluta de quanto vale a diversão gerada por um bicho. O comportamento animal gera curiosidade e é interessante por si só. Sem contar que o fato estético conta muito: preferimos animais que achamos bonitos. Um cachorro de raça é tão diferente de um peixe ornamental nesse ponto? Se não fossem bonitos, não estariam lá. E uma parte do interesse é ter algo estético na sua casa.

A parte de formar relacionamentos pode até ser muito importante se você achar que um animal irracional te vê como algo além de uma prateleira infinita de supermercado, mas mesmo assim, quem consegue se enganar que um cachorro ou um gato realmente gostam de você como um humano gostaria, consegue se enganar facilmente que um lagarto consegue… só falta o esforço para distorcer a realidade. E muitas pessoas tem essa capacidade estendida, é mais aceitável socialmente simular amor em cachorros e gatos, mas nada impede que a pessoa crie isso para outros igualmente incapazes de raciocínio humano.

Faz diferença? Claro. A diferença que você inventar. Vale a pena de acordo com a sua vontade de momento, e essa pode servir para qualquer animal irracional. Animais não são gente, por mais bonitos que te pareçam…

Para me chamar de insensível, para dizer que odeio animais (não, só não acho que são humanos), ou mesmo para dizer que eu só corresponderia o amor de uma samambaia: somir@desfavor.com

SALLY

Vale a pena ter animais de estimação que não sejam cães e gatos?

Não. Se forem animais domésticos, não interagem, apenas dão trabalho e consomem dinheiro ou são inapropriados para confinamento. Se não forem animais não domésticos, é uma puta sacanagem manter um animal silvestre como pet.

Entre os animais domésticos, apenas cães e gatos interagem de forma minimamente significativa com seres humanos. Peixe apenas existe, enclausurado em uma caixa de vidro que custa caro, dá trabalho para limpar e consome energia elétrica. Hamsters levam uma vida infeliz engaiolada comendo sementes e correndo no mesmo lugar sem nem ao menos atender pelo nome e também dão trabalho e cheiro ruim. Passarinhos então, nem comento, crueldade ímpar engaiolar um bicho que voa.

Outros animais, como furões, macacos, papagaios, calopsitas, iguanas e cia não funcionam bem como pets. São animais que sofrem com qualquer tipo de confinamento e, se deixados soltos, grandes chances de saírem e nunca mais voltarem ou morrerem no meio do caminho. Não há qualquer utilidade em mantê-los por perto, a não ser para deleite do dono. Mas esse nem é meu ponto, acredito que comer o pão que o diabo amassou para ser o topo da cadeia alimentar nos confira alguns privilégios, como por exemplo aprisionar animais menores. O ponto é: não vale a pena por ser caro, trabalhoso e dar pouco retorno.

Se quer adornar sua casa, compre esculturas de animais em mármore ou em madeira, não faz o menor sentido pagar caro e ter uma manutenção trabalhosa apenas para ter um bicho ornamental dentro de casa e, de quebra, ainda deixar o animal extremamente infeliz. Mais: se é ornamental, então eu nem acho que seja um animal de estimação.

Há uma variedade infinita de decorações e objetos de arte que podem ser utilizados para embelezamento da sua casa e, olha que boa notícia: nenhum deles caga! Não é ótimo? Se você é um privilegiado que consegue (pelo poder aquisitivo e pelo desprendimento do que isso significa) pagar outro adultinho para limpar sua casa, lavar suas roupas, cozinhar para você e arrumar tudo, imagino que nem tenha ideia do trabalho que um bicho dá e até entendo se dar a esse luxo. Mas, se você assim como nós se responsabiliza por suas tarefas da vida adulta, acredite, um animal tem que proporcional uma troca espetacular para valer o trabalho que dá.

A razão de ser de um animal de estimação, como o próprio nome diz, é ter um animal que te estime, interaja com você, uma troca de afeto, alguma reciprocidade. Se por um lado você limpa merda, dá banho, corta unha, vermifuga e vacina, por outro recebe carinho, resposta a estímulos. Não compreendo quem opta por ter apenas o ônus, ter que cuidar de um bicho, sem ter de volta o lado bom, que é algum tipo de afeto e interação. Me parece um acordo um tanto quanto burro de se fazer. No meu entendimento, não vale a pena.

Se forem animais selvagens ou silvestres ainda tem o agravante de incorrer em crime ambiental (se forem animais nativos) ou outros tipos de infração, pois, salvo raríssimas exceções (que custam pequenas fortunas), a lei proíbe que se crie um animal selvagem como pet, algo que, em tese, nem deveria ser necessário se as pessoas tivessem um mínimo de bom senso.

Além disso, em alguns casos, não contente em não interagir, o bicho ainda dá prejuízo: destrói coisas, suja tudo e até ataca o dono. Quem aqui não conhece histórias de animais que deveriam estar na vida selvagem e tiveram um comportamento inesperado quando colocadas como pets? Já contei em outro texto do macaco que estava pleiteando o mingau que a dona estava comendo e, diante da recusa, pegou uma vassoura e a surrou. Essas coisas acontecem. É por algum motivo que existe a divisão de animais de estimação e animais selvagens.

Não custa lembrar que existe uma infinidade de estudos e cuidados com cães e gatos, que se traduzem em vacinas, vermífugos e outros remédios criados para impedir que doenças deles passem para humanos. O mesmo não se pode dizer desses pets alternativos, que muitas vezes nem mesmo veterinários sabem cuidar. Vai saber o tipo de pereba que você ou sua família podem pegar, a troco de muito pouco ou nada. Já vi hamster com sarna, peixe com fungos e tartarugas transmitindo salmonela.

Outra categoria que me revolta é a de animais domésticos de grande porte (animais de fazenda) que são colocados para dentro das casas. Gente que cria porco, cabra e outros quadrúpedes em confinamento não tem um pingo de noção de higiene. Sim, estes animais podem interagir com seres humanos, dar afeto e podem ser muito inteligentes, mas ter um cavalo ou uma vaca do lado de dentro da casa é um sinal para se repensar a saúde mental da pessoa.

Não adianta querer inventar moda, por algum motivo cães e gatos são maioria esmagadora em casas do mundo todo, principalmente em zonas urbanas, com carência de espaços abertos para animais. Eles foram os que melhor se adaptaram, os que melhor retribuíram a atenção e o alimento fornecido, por isso ganharam espaço nos lares humanos. O resto gera muito trabalho para muito pouco retorno e, salvo algum modismo de época (que faz com que brasileiro se submeta a praticamente qualquer coisa), quem testa outro pet acaba concluindo que não vale a pena e não compra um segundo do mesmo tipo quando o seu morre.

Animais não são enfeites. Enfeites não são acompanhantes. Cada coisa no seu lugar. Se é para adorno, que seja um que não cague, não faça barulho, não danifique a casa e não demande despesa mensal. Se for para pet, que seja um que dê carinho, compreenda minimamente reações humanas e interaja. Bicho que não me dá nada em troca em matéria de interação eu não banco a ração. Faça a sua parte como animal de estimação e eu faço a minha como dona.

Para me chamar de insensível, para dizer que tem um búfalo dentro de casa e sua casa é muito limpa (donos de bicho sempre acham que sua casa é muito limpa e sem cheiro) ou ainda para dizer que bicho dentro de apartamento é porcaria e ponto final: sally@desfavor.com

Se você encontrou algum erro na postagem, selecione o pedaço e digite Ctrl+Enter para nos avisar.

Etiquetas: ,

Comments (4)

  • Embora meu argumento possa ser facilmente refutável, vou usá-lo ainda assim. Meu ponto é: interação com o animal. Por mais que vocês digam que essa coisa de amor do animal é coisa “da nossa cabeça”, que a gente inventa, ainda assim prefiro acreditar que um cãozinho abanando o rabo ou um gatinho se esfregando em tuas pernas é uma forma de demonstração de carinho do que um simples ato mecânico. Nesse sentido, eu preferiria muito mais ter um gatinho mesmo do que um animal exótico, já que dificilmente este pode oferecer interação ou demonstração de carinho a nós humanos.

    Tenho uma amiga – a título de exemplo – que cria uma cobra em casa, daquelas não venenosas, mas que estrangulam lentamente. O problema é que essa cobra cresce, e uma hora a coisa tende a complicar. E poxa, que trabalheira danada ter que arrumar rato morto e outras coisas pra essa cobra comer e ainda manter o cativeiro limpo lá pra ela ficar se arrastando no fundo de casa! Ahh claro, e ainda tem a trabalheira também de isolar bem o local pra ela não fugir. Eu não consigo imaginar que aquela cobra ofereça amor e carinho pra sua dona, aliás, acho até um tanto asqueroso quando ela fica se esfregando no pescoço e no braço dela. Definitivamente não é a mesma coisa de um gatinho peludo se esfregando em tuas pernas.

      • Cobras são literalmente incapazes de ter sentimentos. O máximo que dá pra fazer é criar um hábito condicionado nela, como se fizer movimento X com o dono, vai ganhar comida.

        E minha opinião: acho que TALVEZ um animal diferente que possa valer a pena é um papagaio. Cobras, lagartos e outros bichos exóticos são status, e só.

Deixe um comentário para Lacertile Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Relatório de erros de ortografia

O texto a seguir será enviado para nossos editores: