Corredor – Conclusão

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O soldado F281 segura aberta uma enorme ferida nas paredes vivas do ambiente, os outros se aproximam. F281 está coberto de sangue, que jorra livremente de uma enorme artéria exposta com o corte. Os dois outros soldados posicionam-se um em cada lado da abertura, S0822 rapidamente atravessa para o outro lado, faca de osso apontada para frente.

S0822: O cheiro…
F281: F1188, mantenha a passagem aberta! Vou entrar.

Um dos dois soldados tomar o lugar de seu superior debaixo da cachoeira de sangue. O outro segue F281 ferida adentro. O salão que adentram é mais escuro que o anterior, mas ainda suficientemente iluminado para reconhecer a silhueta de S0822, ajoelhado no chão, aparentemente passando mal pelo cheiro terrível que toma o ambiente. Os soldados reagem com caretas, mas manteem a compostura.

F281: Ele está aqui?
S0822: Urgh… eu… eu preciso de um momento…
F281: 822, não temos tempo pra isso!
S0822: O alvo… o alvo parece estar naquela bolha amarelada. Não… não sei porque isso… esse cheiro…

F281 volta-se para o soldado ao seu lado e cochicha alguma coisa. Os dois seguem então em direção a uma espécie de pústula infectada que adorna uma das paredes de carne do local. Após ter a confirmação de seu superior, F1190 espeta a fina camada de pele, causando uma explosão de pus que por pouco não sufoca ambos. Da substância terrivelmente malcheirosa emerge o corpo do funcionário da manutenção carregado para lá por S0822. Em poucos segundos, ele quebra o silêncio com uma pesada tosse, expelindo sangue pela boca.

S0822: Ele quase… quase conseguiu conter.
F281: Precisamos ativar a próxima fase do plano agora. Para onde?
S0822: Eu… estou fraco. Acho que vou deitar aqui e…
F281: Só aponte a direção. F1190, carregue o alvo. Eu levo o 822.

F1190 levanta o homem moribundo do chão, F281 faz o mesmo com o segurança. Os dois passam de volta pela ferida, F1188 finalmente liberando a abertura para se retrair. S0822 parece extremamente enfraquecido, mas ainda tem energia para apontar para uma direção, a qual todos seguem. Por alguns minutos, F1188 vai fazendo cortes nas paredes para criar passagens, sempre seguindo as instruções de S0822, que as passa num tom cada vez mais debilitado. Com o avanço, eles notam que a iluminação fica cada vez mais forte, assim como o som de batidas ritmadas como um coração.

Quase desmaiando, S0822 aponta mais uma parede, que pulsa com as batidas do ambiente. F1188 faz um grande corte, e ela cede com uma facilidade muito maior que as anteriores. Através da abertura, eles podem enxergar um gigantesco coração, vermelho vivo e brilhante. O salão é o maior de todos até ali, com enormes artérias conectadas pelas paredes até o coração. F281 olha ao redor e com um gesto aponta para o coração. F1190, sem titubear, corre na direção apontada carregando o homem da manutenção. A poucos passos de alcançar o imenso órgão, ele perde o equilíbrio e desaba.

Pode-se notar um calombo no chão, que vai crescendo rapidamente.

VOZ: Então era isso que você tinha pra mim, 822? Uma infecção generalizada espalhada a partir do meu coração? Esse é o seu grande plano para acabar comigo?

F281 olha para S0822, que começa a recobrar os sentidos em seus braços.

S0822: Você sempre soube que o seu grande coração seria a sua ruína…
VOZ: Hahaha… você é mais interessante que os outros, 822, isso eu não posso negar. Eu te subestimei, achei que a doença do Marcos… ou seja lá o nome real dele… era apenas uma coincidência.

S0822 recupera-se rapidamente e deixa o apoio dos braços de F281.

S0822: M2207. Pobre rapaz, apenas alguns dias no trabalho. Foi fácil conquistar a confiança dele.
VOZ: Às vezes eu me pergunto por que criei vocês assim.
S0822: Porque as árvores não tinham a menor graça.

Nesse meio tempo, F1190 tentar erguer M2207 e continuar com sua missão. Mas logo sente algo segurando sua perna: uma mão que emerge do calombo recém criado no chão. Usando F1190 como apoio, um homem se arrasta de dentro dele. É S9134, mas só o rosto é facilmente reconhecível. O resto do corpo do outro segurança está coberto de novas fibras musculares, sem pele alguma para protegê-las. Eles são especialmente notáveis nos braços, ombros e peito, tal qual um fisiculturista esfolado vivo. F1190 usa sua faca para fazer um furo na mão de S9134 que segurava sua perna, mas não gera reação nenhuma do homem.

VOZ: Eu estou vivo há mais tempo que a estrela que esquenta este planeta. Quando eu cheguei aqui, essa terra estava morta e coberta de veneno. Eu trabalhei sozinho por eras. Eras. Você só está aqui pela minha vontade, pelo meu desígnio, seu inseto!

S9134 começa a agarrar mais e mais do corpo de F1190, que começa a gritar desesperado enquanto pode-se ouvir o som de seus ossos quebrando, esmagados pelos músculos de seu agressor. F1188 dispara na direção dos dois, aplicando facadas e mais facadas em S9134. Sem reações. Poucos segundos depois, ouve-se o último grito de F1190, seguido dos de F1188, que é agarrado na sequência. M2207 parece desmaiado a poucos metros do coração.

VOZ: 822, seu plano não passa de um passatempo para mim. Você realmente achou que eu não teria defesas para isso? Enquanto estamos conversando, meu corpo já tem defesas para essa doença. Eu não poderia ter passado o dom da evolução para vocês sem ter eu mesmo, não? Deveria ter me concentrado mais no cérebro… patético.

F281 olha para S0822, que parece concordar com algo num aceno de cabeça.

S0822: Meu nome é…

S0822 emite um som estranho, não parecendo com nada já emitido por cordas vocais humanas. O som é extremamente grave, desaparecendo e voltando por alguns segundos.

VOZ: Você… eu? Não, não faz sentido…
S0822: Nós não aguentamos mais esse existência. Nós não aguentamos mais esvaziar nossas mentes só para forjar surpresas ao conhecer novamente o que já cansamos de ver. Nós não queremos mais viver. Nós só criamos eles por esse motivo. Nós somos incapazes de acabar com esse pesadelo sozinhos, mas eles podem.
VOZ: Eu não quero mais isso. Eu não quero morrer.
S0822: Já passamos por isso antes. Eu cansei de ser um fragmento da sua mente que sempre é ignorado na hora de nos matarmos. Você é covarde. Por isso eu saí.
VOZ: Eu não preciso de você, e você fracassou com esse plano ridículo.
S0822: Eu sou uma parte de você, ignorada por tempo demais. Agora você sabe meu nome, agora você não pode mais me ignorar. Eu estou voltando.

S0822 volta-se para o soldado F281 e aponta para si mesmo. F281 rapidamente se coloca atrás de S0822 e com um movimento rápido, corta seu pescoço. O sangue começa a jorrar antes mesmo de S0822 cair de joelhos no chão.

VOZ: ARGH!

F281 corre na direção de M2207, desfalecido no chão. S9134 está lá com os corpos dos dois outros soldados sem vida ainda presos aos seus membros, mas parece perdido, com movimentos desconexos e olhar distante.

VOZ: Ele… ele está… me deixando confuso, mas eu já sou imune a essa doença, humano. Me deixe em paz agora e… e eu te darei uma morte rápida.

F281 não dá atenção, mas ao invés de se aproximar de M2207, agarra S9134 pelo braço e começa a arrastá-lo em direção do coração.

VOZ: O que… que é isso?
F281: A verdadeira doença. 822 te conhecia muito bem… agora que você já se mesclou ao corpo e a mente dele para criar um soldado, seu sistema imunológico não vai conseguir mais diferenciar as coisas. Mas agora chega, que eu não gosto tanto assim do som da minha própria voz como vocês.

F281 corta através dos músculos expostos de S9134 até chegar numa artéria, misturando o sangue que jorrava com o da Voz.

VOZ: Não… não… eu não quero mais isso… eu… eu…

O coração vai falhando batidas até que para completamente. F281 vai voltando pelas câmaras abertas, agora sem vida. Eventualmente encontra um salão muito mais escuro que os outros, pelo qual vaga até sentir uma parede rugosa, agora muito mais dura. Com a faca, vai cortando seu caminho até enxergar uma luz. Sente o ar frio entrando, e sons de máquinas e vozes preenchendo o ambiente. Está no 10º subsolo do laboratório novamente. Dezenas de pessoas estão esperando por ele, todas com roupas protetivas. O andar todo parece marcado por uma explosão, mas sem nenhum dano estrutural óbvio.

O militar que passara os dados da missão para F281 alguns dias antes está entre elas, ele é o primeiro a se aproximar.

MILITAR: Ele está morto?
F281: Sim, o plano foi um sucesso com a exceção da morte dos meus dois soldados. Eles entraram em pânico.
MILITAR: Missões dessas não acontecem sem casualidades. Eles eram bons homens. Você será examinado e assim que for liberado pelos médicos, temos que conversar sobre sua promoção e umas boas férias, soldado.
F281: Senhor… eu tenho uma dúvida.
MILITAR: Diga.
F281: Por que nós ajudamos essa coisa a se matar?
MILITAR: Porque era a coisa humana a se fazer.

Para ficar em dúvida sobre essa última frase, para dizer que sempre caga no final, ou mesmo para dizer que eutanásia é mesmo uma questão muito complicada: somir@desfavor.com

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