Ofendidinhos.

Pesquisa do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) mediu o comportamento online de jovens. Os dados revelam que, de cada quatro crianças e adolescentes, um foi tratado de forma ofensiva na internet, o que corres o que corresponde a 5,6 milhões de meninos e meninas entre 9 e 17 anos. O porcentual cresce ano a ano. LINK


Vem aí uma geração ainda mais traumatizada, e a culpa não é da internet. Desfavor da semana.

SALLY

Tambem trago uma estatistica, 100% das pessoas já foi xingada, desrespeitada ou esculhambada na internet. É inerente ao meio. Justamente por isso as redes sociais explicitam a restrição etária: se você tem menos de 18 anos não pode ter uma rede social. O erro do sistema foi achar que todos os países do mundo respeitariam uma restrição sem uma sanção correspondente. Brasileiro só deixa de fazer algo que quer quando o risco é muito, muito grande. Caso contrário não se sente na obrigação de respeitar regras.

Para começo de conversa, estas crianças nem deveriam estar na internet, muito menos em redes sociais, onde a restrição etária é 18 anos. Presume-se que pessoas com menos de 18 anos não estejam aptas a utilizar redes sociais por algum motivo, certo? Provavelmente por não ter estrutura para ser jogada nesse mundo cão, ao alcance de todas as pessoas do mundo, nem ter maldade ou maturidade para se defender dele.

Daí vai Papai e Mamãe e fazem uma conta para a filha. Ou, se for o caso, erram por omissão, sem fiscalizar o que as crianças andam fazendo online. Nem ao menos precisam ser pais presentes, observando fisicamente o filho de perto, existem programas que te permitem saber o que seu filho está aprontando online. Mas não, Papei e Mamãe, ratazanas de rede social, consentem e às vezes até estimulam os filhos a criarem perfis nessas favelas virtuais. A criança foi xingada? Lamento, a culpa não é das redes sociais, é dos pais.

Todo mundo sabe que em rede social tem de tudo, de tudo mesmo (até pedófilos tentando caçar crianças, olha que apropriado deixar seu filhos pequeno frequentar!). Seria como levar uma criança de dez anos a um puteiro e reclamar que a criança viu mulheres seminuas. Porra, não quer que a criança seja exposta a uma série de situações nocivas? Respeite a política de uso da caralha da rede social e não permita que ele tenha um perfil! Ou, se optar por permitir, avaliando que a exclusão social da criança vai ser mais danosa do que a rede social em si, não venha choramingar no ouvido dos outros depois. Foi uma escolha.

Mas não… as Mamães, irracionais como sempre, querem que os filhos possam ter a experiência da rede social sem passar pelo seu lado negro. Olha que desejo mais irracional e infantil: elas esperam que toda a rede social se adapte para gerar um ambiente propício para seus filhos. Deixa eu contar um segredinho: seu filho não é importante para mais ninguém além de você e da avó. Sabemos que pessoas usam redes sociais para perpetrar todo tipo de covardia que não teriam coragem de dizer ao vivo. Também sabemos que nas redes sociais vale a lógica do bando, onde, quando um ataca, todos partem para cima. Então, seu papel como pai/mãe não é criticar ou querer mudar as redes sociais, é se encarregar de manter seu filho longe delas ou de blindar a criança para que ela não se importe com as agressões que vai sofrer.

Difícil, pois as Mamães são as primeiras a se importar com opinião de internet. O brasileiro, no geral, é muito ofendido, como já tivemos chance de constatar inúmeras vezes aqui nos últimos nove anos. #Mágoa. Fica impossível que uma retardada emocional que leva a sério o que é dito em redes sociais ensine uma filha a não fazê-lo. Essa mania infantil de reconhecer seu valor através do olhar do outro passa de geração para geração. Além disso, é muito cômodo culpar sempre terceiros quando algo dá errado com o filho: más influências, a internet, um filme violento ou um jogo de videogame. A culpa é de todo mundo, menos de quem realmente é: dos pais.

Na reportagem vemos a história de Laura, 13 anos, em rede social, esculhambada pelas amigas segundo a mãe, por inveja, já que Laura é muito bonita (é sempre inveja, impressionante). Laura estaria “traumatizada” com o que fizeram e tão triste que, segundo a mãe, já nem sente mais vontade de postar vídeos. Oi? Uma criança de 13 anos postando vídeos? A culpa, é claro, é das amigas malvadas de Laura, e não da mãe que consentiu que ela esteja em um ambiente selvagem ou não acompanhou bem de perto sua filha nessa jornada, blindando-a e ensinando a não se importar com o que os outros pensam dela. A culpa é sempre dos outros.

Em breve veremos crianças batendo com o carro dos pais na rua, em uma tentativa de dirigir, e os pais culpando o trânsito. Sabemos que só se pode dirigir com mais de 18 anos, já pensou se os pais começassem a desrespeitar essa regra e ainda reclamassem quando ocorresse um acidente envolvendo seu filho de 12 anos ao volante? Pois é, é esse o grau de ridículo que passa quem reclama que seu filho não recebeu o tratamento adequado na internet. Crianças não devem ser expostas a nada na internet sem a supervisão dos pais. Não tem tempo para controlar o que seu filho faz? Lamento, suas prioridades estão erradas. Botou filho no mundo? Faça um favor: cuide, ou, se não quiser cuidar, não venha encher o saco quando der merda.

Esperar bom senso de internet, de redes sociais ou de qualquer atividade que envolva massivamente a maior parte dos seres humanos do planeta é de uma burrice irritante. É óbvio que em um ambiente assim não haverá nem bom senso, nem consideração. Assim como os pais dão as mãos a seus filhos para atravessar a rua (ou, ao menos, deveriam), se faz necessário “dar as mãos” no sentido de supervisionar e proteger durante o uso de redes sociais. Assim, se a situação se tornar nociva, o adulto pode intervir, seja para solucionar o conflito, seja para retirar a criança das redes sociais para seu próprio bem. Mas não… muito mais fácil (e rende muito mais ibope) ir reclamar em público que a filha está traumatizada, como se fosse um evento aleatório, incontrolável, quase que um motivo de força maior, que não podia ser previsto ou mediado.

Adultos, por favor: sejam adultos. Vocês não são parceirões, nem colegas de quarto, nem brothers dos seus filhos, vocês são PAIS. Isso implica em impor restrições frustrantes para a criança pensando em seu bem, isso implica em constante atenção e dedicação quase que escravizante para supervisionar tudo que eles fazem, isso implica em total atenção a eles no tempo em que passam juntos para detectar problemas ou angustias tão assustadoras que a criança nem ao menos consegue externar. Olhem mais para seus filhos, estejam mais atentos e, principalmente, mais presentes.

Lugar de criança não é em rede social. Quem planta merda colhe bosta. Tenham a decência de chamar a responsabilidade para si e não permitir que eventos de internet causem traumas ou abalem o psicológico dos seus filhos, pois se isso acontecer, a culpa não será nem da internet nem da rede social: será sua. E, ainda que você seja uma negadora de carteirinha e se recuse a ver as coisas assim, saiba que o preço disso custa caro, muito caro, quando a adolescência chegar. O que os pais plantam na infância, colhem na adolescência.

Para dizer que prefere filho traumatizado do que enchendo o saco, para dizer que como todo mundo tem seu filho tem também ou ainda para dizer que acha sinceramente que o mundo todo tem que se adaptar para o bem estar do seu filho: sally@desfavor.com

SOMIR

Eu lembro de já ter argumentado aqui algumas vezes que sou contra censura etária. Uma das funções da infância e da adolescência é expor a pessoa ao que vai encontrar no mundo, e existe uma certa autorregulação baseada nos interesses de cada fase da vida. Mas, pensando bem, há uma falha nesse argumento: a presunção de que a criança ou o adolescente vai ter uma boa base de criação em casa. Sem suporte suficiente dos pais e adultos ao redor, fica bem difícil lidar com as coisas que ela pode ter acesso.

A exposição gradual aos temas mais adultos é sim essencial para o desenvolvimento de uma pessoa, mas desde que se respeite o “gradual”, e esse trabalho depende quase que totalmente dos pais. Com a internet e a enorme quantidade de pessoas e informações com as quais ela te coloca em contato, esse trabalho ficou sim mais complicado, mas continua sob a mesma responsabilidade.

O ambiente virtual tem muitas semelhanças com a vida adulta, principalmente na ausência de supervisão e controle de um responsável sobre suas ações. Na infância, presume-se que crianças estejam interagindo sob o olhar de um adulto que vai moderar os piores comportamentos inerentes ao ser humano. Em casa, os pais deveriam controlar a relação entre irmãos, na escola os professores fazem isso com os colegas… seja onde essa criança estiver, não estaria totalmente sozinha caso as coisas ficassem pesadas demais pra ela lidar.

Mesmo na vida adulta vivemos encontrando situações que passam do nosso limite de resistência, mas pelo menos temos um kit de ferramentas mais robusto para lidar com elas. Fruto da exposição controlada aos horrores da convivência social, aprendendo passo a passo a resistir o máximo que pudermos. Quando não tem mais pai ou professor mediando nossas relações, tudo tem consequência. E não importa a idade que você entre na internet, é um ambiente bem mais adulto nesse sentido. A criança é exposta à pressão de ter consequências em seus atos mesmo sem ter capacidade para isso.

O senso de responsabilidade é o mais lento a se desenvolver na mente humana, assentando bem depois do que a maturidade física. Legalmente somos adultos aos 18, mas o seu seguro de carro, por exemplo, empurra isso efetivamente para os 25, onde deixa de cobrar um extra pela sua potencial irresponsabilidade. Na prática a teoria é outra. Seres humanos são muito complexos, e demora mesmo para termos a capacidade de encarar uma sociedade ainda mais complexa.

Então, não é por moralismo que estamos dizendo que uma criança nem deveria estar numa rede social, é pela característica adulta inerente a um ambiente sem supervisão. E para quem acha que a solução é controlar mais a internet, se nem os pais estão dando atenção, vocês realmente acham que estranhos vão se dar ao trabalho? Sistemas automatizados de supervisão só funcionam contra o óbvio e são facilmente burláveis por quem mexe com tecnologia desde muito pequeno. Nesse momento, nada substitui interesse genuíno de um adulto preocupado com o desenvolvimento de seus filhos.

E nesse momento também, acesso irrestrito à internet não combina com atenção válida de um adulto. Não tem como garantir que seu filho tenha uma exposição saudável às intempéries da socialização se ele passa a maior parte do dia fora da sua vista. Chegamos num ponto da nossa evolução como espécie que mesmo olhando pra criança o dia todo ela ainda pode estar fazendo muita merda na tela do seu tablet ou smartphone. Mesmo enfurnada em casa e sem interações físicas com outras pessoas, essa criança pode estar vivendo um momento social intenso, fazendo coisas irresponsáveis como crianças fazem e acumulando traumas.

Não basta mais olhar para uma criança sem olhar para a tela que ela está olhando. Sem controlar o seu acesso a esse mundo adulto que vai sim arremessar ofensas pra cima dela. A internet é isso, e não existem mais leis ou mais tecnologias que mudem isso num futuro próximo. Se a criança não é protegida pelos adultos ao seu redor, está sozinha. E se não aprender a lidar com a parte negativa da internet, nem deveria estar lá. Uma pessoa criada para ser segura e dividir seus problemas com pessoas próximas de confiança vai resistir muito melhor aos terrores que muitas das crianças exemplificadas na matéria enfrentaram.

Criança vai fazer merda, vai ser horrível com outras pessoas, e isso faz parte do processo. Todos somos assim nessa fase, e não tem outra forma de aprender senão essa. Internet é como é e não existem formas de fazer ela criar suas crianças por você. Quer estar lá? É vida adulta. Se vai deixar seu filho mergulhar de cabeça nisso, vai ter que estar muito perto pra protegê-lo. De ser atacada e de atacar demais as outras, inclusive. Num mundo tão conectado, é essencial ensinar bem mais cedo o poder das palavras e das imagens nos outros. E aprender a ter uma casca mais grossa desde cedo.

O que talvez explique perfeitamente essa nova geração que se vitimiza por tudo… mas, isso fica para um próximo texto.

Para me chamar de pedagogo teórico, para dizer que é só passarem mais leis, ou mesmo para dizer que é bom treinar desde cedo para quando forem adultas mandarem nudes mais em foco: somir@desfavor.com

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Comments (11)

  • Hoje em dia não se luta para se destacar e ser melhor no que escolher. Isso é ultrapassado e até reacionário.

    Hoje se busca gritar mais por benesses e atenção governamental e social.

    Se destaca quem consegue gritar mais alto que é mais necessitado, oprimido e discriminado.

    Hoje ao invés de tentarem serem melhores, lutam por tentarem ser o pior possível.

    è um caminho mais fácil…

  • uma criança nem deveria estar numa rede social [2]

    Criança não deveria nem ter acesso fácil à smartphone e tablet (só se os pais estivessem por perto cronometrando o tempo e olhe lá). O que eu já vi de pirralho(a) sendo xingado brutalmente lá nos comentários dos vídeos do YouTube…

  • A vitimização é consequência da falta de apoio, atenção e valorização.Os pais não se preocupam em passar isso pros filhos,nem proteger as crias de ambientes hostis.Preocupação zero se estão estão atingindo a autoestima de outra criança já fragilizada pela negligência dos pais. Acho que esses pais que permitem essas situações deviam ser obrigados a fazer um curso de como criar filhos, assim como já acontece em outros países.

  • Também acho que não deveria ter censura etária e que a juventude não sabe se defender nem na internet nem fora dela. Sou da época que o gordinho metia a porrada se fosse zoado.sem mimimi de bullying. Minha mãe me dizia que se eu apanhasse na rua sem devolver, quem ia me bater era ela.

  • Eu realmente fico me questionando o que tem acontecido de uns anos pra cá, com essa “nova geração”. Questiono no seguinte sentido: eu era lá adolescente (fica a pergunta também: quem hoje em dia e mesmo num passado não tão distante não tinha já um perfil em rede social?) e já tinha orkut, e sim, já naquela época tinha sim bullying na internet, ofensas gratuitas aqui e ali etc etc, e a galera continuava brigando “numa boa” sem esse mimimi todo de vitimização.
    Não estou dizendo também que era agradável de todo, as vezes realmente ficava um climão chato no meio de uma discussão deveras interessante lá no fórum de alguma comunidade e isso atrapalhava um pouco o caminho da discussão. Mas apenas aponto para o fato de que a uns anos atrás não tinha todo esse mimimi barato não.

    • É porque a nova geração cresce aprendendo que se fazer de coitado e ter um “passado triste” rende aplausos e ameniza as merdas que fizerem na vida.

  • Ainda vai levar alguns anos pra sociedade conseguir conciliar esse monte de tecnologia com a criação e formação de crianças minimamente preparadas pra vida. As demandas estão aumentando, já se começa a cobrar bilinguismo e programação básica, por exemplo.
    Mas por enquanto as crianças de hoje são ratos de laboratório nessa transição.

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