Apesar da vontade ser outra muitas vezes, todos precisamos sair de casa eventualmente. E nessa hora, Sally e Somir discutem o que mais incomoda em relação ao clima lá fora. Os impopulares entram na discussão.

Tema de hoje: o que mais desanima na hora de sair, chuva ou calor?

SOMIR

Apesar de odiar calor, chuva é pior. A não ser que você seja um cachorro, o prospecto de se molhar aleatoriamente na rua não é nem um pouco agradável. Chuva foi feita para ser apreciada sob proteção, é o que diferencia humanos de animais selvagens, entre outras coisas. Nossos antepassados passaram muito tempo trabalhando e sofrendo para que nós pudéssemos nos abrigar dos elementos, me parece um crime contra a evolução aceitar passivamente programas com chuva nos dias atuais.

Na chuva, o mundo todo fica mais complicado. Você precisa carregar um guarda-chuva o tempo todo para não ficar com suas roupas todas cagadas ao chegar aonde deseja, e mesmo assim, vamos concordar que guarda-chuvas não são o ápice da engenhosidade humana: não importa o quão bem você faça a dança de evitar chuva, acaba molhado. Porque chuva tem esse péssimo hábito de ficar tentando desviar da sua proteção, com ventos arremessando as gotas em direções imprevisíveis. Que jogue a primeira pedra quem nunca ficou parecendo um demente na rua tentando “pegar” a chuva enquanto ela muda de direção. E no final das contas, por uma questão de física simples, seus pés e barra da calça ficam todos molhados do mesmo jeito, já que as gotas parecem atraídas pelo seu corpo.

Locomover-se na chuva é uma merda seja como for: se você estiver a pé, tem que ficar fazendo aquelas corridinhas indignas entre coberturas, sempre com algum filho da puta te olhando enquanto você corre de forma desengonçada, preocupado com escorregões. Com guarda-chuva não melhora muito, porque você vai continuar pisando em poças e ainda corre o risco de tomar aquelas vergonhosas puxadas com o vento que costuma vir junto. Você fica parecendo um navio no meio da tempestade, navegando a esmo. Isso quando a porra do guarda-chuva não inverte aleatoriamente e te deixa na mão!

Transporte público? Mesma merda, só que você passa mais tempo dentro de um lugar fechado com outras pessoas molhadas e mofando. O brasileiro médio não é conhecido pelo seu cheiro agradável, e sem ventilação qualquer ônibus vira uma câmara de gases. Nem de carro a coisa melhora: todo o trabalho que você tem para não se molhar vai por água abaixo (literalmente) naqueles segundos malditos entre abrir a porta do carro e ativar o guarda-chuva. Parece que os céus sabem quando você está fazendo isso e miram todas as gotas em você naqueles segundos de vulnerabilidade. É quase como se você nem tivesse um guarda-chuva. Para resolver o problema de falta de água do mundo, basta construir coletores de chuva embaixo de portas semiabertas de carros.

Sem contar que por total falta de estrutura pública, você vai pegar congestionamentos e arriscar passar por enchentes. Todo mundo tira o carro da garagem na chuva, até quem não deveria. O número de perdidos no volante durante dias chuvosos fica tão grande que pode apostar que você vai lidar com gente andando em segunda marcha em grandes avenidas (na esquerda, porque direita é coisa de otário), com gente que não entende o conceito de seta, e com gente que para aleatoriamente onde der na telha. É tipo domingo, mas com chuva. E como todo mundo quer ser deixado na porta dos lugares nesses dias, a chance do trânsito travar em lugares onde você quer ir no dia tende a 100%.

E se você for abençoado com um caminho que passa por um rio, córrego ou poça muito grande, quase certeza que pega enchente. Por algum motivo, não deram muita bola para excesso de chuva num país tropical e as cidades não são planejadas para algo que acontece a porra do tempo todo. Espero que você goste de esperar, porque fatalmente vai. Talvez quem viva em cidades muito grandes e não conceba que trânsito flui mal perceba isso, mas o resto de nós sim.

Calor é terrível e traz o pior dessa gentalha, mas de uma certa forma, é mais do mesmo. O brasileiro é brasileiro sempre, você só aguenta um pouco mais de ofensas sensoriais no calor, mas nada de fundamentalmente diferente da norma. Já na chuva, você lida com o brasileiro médio do mesmo jeito, mas está tudo mais cagado no ambiente. Nem a redução da fotossíntese de breguice costumaz ao nosso povo na falta de luz solar abundante consegue ser compensatória o suficiente. Você vai ver a mesma gente tosca, mas com roupas mais transparentes e mais doenças contagiosas em ambientes fechados.

Sem contar que no calor existe uma vantagem: pessoas com as quais você não quer conviver congregam ao ar livre em programas ensolarados. Quer sossego no calor? Ambientes fechados servem para isso. Povão vai tomar sol e suar em conjunto em outros lugares. Dias quentes e ensolarados são excelentes para quem não quer estar nos eixos popularescos habituais. Mas em dias de chuva, toda aquela gentalha que você evitaria por estarem em churrascos com pagode, praias e piscinas vai estar em lugares onde você está, como em shoppings, cinemas e similares.

Se vivêssemos num país civilizado, eu até concordaria com a Sally, mas na conjuntura atual, calor é mais do mesmo. Chuva me aproxima das pessoas que eu não gosto, e ainda é uma merda para fazer qualquer coisa fora de casa. Nunca pensei que diria isso, mas prefiro calor…

Para dizer que quem gosta de chuva e vendedor de capa, para dizer que nada pode ser pior que suor coletivo, ou mesmo para dizer que eu deveria ir embora do Brasil (sim!): somir@desfavor.com

SALLY

O que desanima mais: fazer algo quando está calor ou fazer algo quando está chovendo? Calor. Contra chuva tem guarda-chuva, porra.

Programas ao ar livre ficam extremamente prejudicados por ambos. A menos que você seja um degenerado sem caráter, deve achar desagradável ficar ao ar livre em temperaturas elevadas. Calor faz suar, calor causa desconforto, calor atrapalha cada movimento corporal. Chuva não é algo propriamente agradável, eu sei. Se não tomarmos cuidado, a chuva molha, faz lama, nos deixa doentes. Mas a chuva pode ser evitada: galocha, guarda-chuva, capa de chuva e outras providencias atenuam o problema.

Você pode dizer que chuva inviabiliza programas ao ar livre. Sim, só que o que para você pode ser um problema, para mim está mais para bênção. Programas ao ar livre geralmente envolvem natureza ou um grande grupo de pessoas e desgosto de ambos. Não vai ter churrasquinho? #Gratidão. Não vai dar para ir à praia? #Gratidão. Não vai dar para correr ao ar livre às seis da manhã, antes de ir trabalhar? #Gratidão #Gratidão #Gratidão.

Nos outros programas que não envolvem céu aberto, um dia quente me causa um desânimo maior. O máximo que a chuva faz é nos obrigar a um guarda-chuva ou um agasalho. Para o calor não há solução, mesmo que se tire a roupa toda você vai continuar melado, sujo, suado. Me desanima profundamente sair para onde quer que seja ao saber que, colocando o pé na rua, terei aquela sensação de que enfiaram um maçarico no meu cu. Aquele bafo do demônio quente na nuca me faz ter vontade de ficar em casa, vestida com o farrapo mais fresquinho, tentando me mexer o mínimo possível.

No calor não dá para se arrumar direito. Você sai sabendo que em vinte minutos estará em um estado lamentável. Para uma pessoa que gosta de se arrumar para sair, isso gera um baita desânimo. No calor há uma tendência natural ao embarangamento: cabelo e pele ficam oleosos, suor faz com que a maquiagem se esvaia em poucos minutos, as roupas elegantes não atendem às necessidades do calor infernal. Então, pode ser fútil, mas eu fico menos empolhada para sair quando não posso ir dentro do padrão que gostaria.

Há quem diga que chuva causa trânsito. Bem, aqui vai uma informação de uma pessoa que mora em uma cidade litorânea: sol causa mais. Em dia de sol cada filho da puta que gosta de calor fica feliz, agitado e corre para a praia, atravancando o trânsito na cidade toda. Talvez não seja a realidade de todo o país, mas aqui, no Rio de Janeiro, quando faz sol os cariocas saem às ruas frenéticos. Quando chove, eles se escondem, quase que não colocam o nariz na rua. Adivinha qual opção me agrada mais? Quanto menos gente, mais vontade me dá de sair.

Dias de chuva podem ser chatos em alguns aspectos, mas em outros, são convidativos. Alguns programas (geralmente muito dignos), como por exemplo, comer um fondue, ficam mais agradáveis com tempo ruim do que com tempo bom. No calor… bem, nada fica bom no calor, a menos que você seja um aborígene que gosta de se revirar na areia e nadar na bosta, enquanto cultiva um câncer de pele (vulgo “ir à praia”). Dentro das minhas preferências, dias de chuva são mais convidativos para sair, provavelmente por morar em uma cidade onde, no fuckin´ inverno, fez 40° quando saiu o sol.

Todos sabem da minha aversão à natureza, logo, dificilmente você me verá em um programa a céu aberto, salvo para algum fim específico. Assim, a chuva não me desmotiva a sair, afinal, meu habitat natural é shopping. O calor, infelizmente, te segue onde quer que você vá. Por mais que exista ar condicionado no local de destino, o trajeto pode ser bastante sofrido. O calor contamina tudo: o deslocamento, as roupas e até o ânimo das pessoas.

O entorno também conta. Em tempos de calor as pessoas perdem a dignidade e frequentam locais fechados usando regatas e expondo seus sovacos. Parece que o calor faz com que as pessoas se sintam no direito de usar cores cítricas, óculos escuros em ambientes sem luz solar, chinelo de dedo em locais que não sejam praia. O calor deve provocar algum tipo de reação química cerebral que suprime o bom senso e acentua o mau gosto. Ter que sair e cruzar com essa gente bronzeada mostrando seu valor desgasta meu senso estético.

No calor as pessoas ficam mais expansivas. O carioca, por exemplo, entra no cio no verão. É chato, é cansativo. Falam alto, flertam compulsivamente, batucam. Prefiro chuva, quando você sai e está chovendo as pessoas estão mais dignas e comedidas. Considerando que, para mim, pessoas são sacos de carne que se arrastam na minha frente e atrasam meu dia, com chuva elas ficam menos pior. É sempre mais fácil sair quando as pessoas estarão um pouco menos expansivas e mal educadas, não é mesmo?

Acredito que se fizermos uma enquete pelo país a maioria esmagadora dos brasileiros dirão que sentem muito mais desânimo em sair quando chove, pois, como sabemos, o brasileiro é movido a energia solar. No que brota o primeiro raio de sol pela manhã eles entram em um frenesi e saem para correr ou começam a cantar e batucar. Então, este é mais um argumento para o meu ponto: me dá mais ânimo para sair quando eu sei que vai ter menos gente na rua, talvez por morar em uma cidade do tamanho de um ovinho de codorna com sete milhões de habitantes, onde sempre tem muita gente em qualquer lugar a qualquer hora. Vocês sabem, odeio gente.

Chuva me parece contornável, calor (e todos os desdobramentos nefastos que ele gera) não. O calor por si só é desagradável e essa enxurrada de merda que ele gera me afeta muito mais que pés molhados ou restrições a alguns lugares (que eu normalmente não frequentaria). Chuva é chato, não vou negar, mas calor me desanima muito mais.

Para não entender o componente de humor e me chamar de amarga, para entender o componente de humor e mesmo assim me chamar de amarga, para dizer que não sai nem com chuva nem com calor: sally@desfavor.com

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Comments (24)

  • Avaliando ambos os casos a pé:
    Sair de casa no calor: super desagradável, dependendo do lugar dá aquela sensação de se estar num deserto, quem é homem tem que trabalhar de calça comprida (90% dos casos), mas, “faz parte”.
    Sair de casa na chuva: super desagradável +1, como disseram, os carros passam sempre em alta velocidade nas poças te dando um banho de água suja, tem que manobrar o guarda-chuva (nem sempre com sucesso) de acordo com o vento (isso quando o vento não o entorta) ou de acordo com outras pessoas que estejam também usando, sapato sempre fica molhado, aumenta a probabilidade de pegar uma virose, se a chuva estiver muito forte nem o táxi aceita a corrida (onde moro).
    Precisando escolher, prefiro sair no calor.
    Agora, ideal pra mim seria: frio, vento leve a moderado e sem chuva.
    Há uma marca gringa (“Senz”) que anuncia “windproof umbrellas” que não invertem. Fiquei com vontade de usar, mas não estou animado a importar nada.

  • Ri muito com o ‘maçarico no cú’. Descreveu todo o sentimento Sally. Genial. Eu simplesmente perco a vontade de viver! O calor é indigno. Não dá pra ser bonito no calor, não dá!

  • Nasci numa cidade pertinho do Rio de Janeiro, quase tão quente quanto e com os agravantes do vento parecer uma baforada do capeta e uma administração que possibilita que haja enchentes e falta d’água na mesma época. Calor e sol me desanimam muito mais. Aliás, quando estou em minha cidade natal, fico mal humorada só de acordar e ver que o tempo abriu. Parece que aquela maldita bola amarela fica rindo da cara de quem se dá o trabalho de sair com o cabelo apresentável, roupas bonitas e maquiagem. Sem contar que sou quase transparente e, mesmo usando FPS 60, fico parecendo um camarão depois de 15 minutos no sol.
    Chuva pode ser incômoda na hora de sair, mas aprendi a gostar depois de passar por algumas crises hídricas e até me sinto aliviada sempre que chove, mesmo tendo me mudado para um lugar em que chove tanto. Nunca consegui entender essas pessoas que ficam tão alegres com aquela dupla infernal de calor e sol, parecem uns minions criados para irritar!

  • Antes eu pensaria chuva, até ter um carro sem ar condicionado no verão do Brasil.

    Prefiro mil vezes sair na chuva que no calor.

  • Eu contraporia a discussão a calor x frio, sem chuva neste caso. Pegando como exemplo aqui em Curitiba, eu simplesmente adoro sair no frio, não tem coisa melhor! Seja pra apreciar uma bebida (dá pra tomar whisky puro sem gelo, eee!), seja pra “comer um founde”, sair no frio é a opção certa.

    Mas, no caso, se atendo à temática do texto – e embora considerando que também detesto calor e aglomeração de gente – concordo com o Somir nessa. Sair na chuva é um saco, ninguém merece! Mesmo com guarda chuva tu VAI SE MOLHAR, e ainda ter que enfrentar obstáculos, marquises, pular daqui e dali, não adianta, tu vai molhar o pé e a calça até metade do joelho. Um saco, isso desanima!

  • “que pode apostar que você vai lidar com gente andando em segunda marcha em grandes avenidas (na esquerda, porque direita é coisa de otário), com gente que não entende o conceito de seta, e com gente que para aleatoriamente onde der na telha”

    Campinas… os piores motoristas do Brasil!!

    E pra não ficar sem opinar, tô com o Somir! Chuva é pior…

  • Por mais que eu odeie o calor tanto quanto a Sally, vou ficar com o Somir nessa. Sair de casa debaixo de chuva é pior. Por mais que se tente, é praticamente impossível não se molhar e, de quebra, estragar os sapatos. Temos que ficar carregando aqueles trambolhos que são nossos guarda-chuvas e ficar tomando cuidado pra não molhar bolsas e mochilas – com tudo o que houve dentro – e gadgets eletrônicos. O simples ato de andar se torna um problema quando se tenta esgueirar-se por sob marquises ou driblar poças d’água e pessoas desajeitadas com seus respectivos guarda-chuvas. Em transportes públicos, com as janelas fechadas e muita gente molhada, quase dá pra ver o mofo se alastrar. Lavar e secar roupa quando chove por dias seguidos também é um suplício porque, por mais que se tenha secadora em casa – e não é todo mundo que tem – ainda acho que é melhor que a roupa lava tome um pouco de sol. O cachorro se apavora com os trovões, não quer ficar na casinha de jeito nenhum, fica ganindo e arranhando a porta pedindo pra entrar, corre pra lá e pra cá com água pingando do pêlo e se sacode todo DENTRO DE CASA! Outra coisa muito desagradável em dias de chuva e que, imagino, muita gente aqui já passou por isso, é que sempre tem um FDP a passar de propósito com o carro numa grande poça d’água na sarjeta e espirrar aquela água imunda em cima da gente!

  • Eu odeio guarda-chuva. Ter que ficar carregando aquele trambolho em qualquer dia nublado. E depois que molha ainda tem que dar um jeito de não se molhar com ele. Eu acho muito feio esse pessoal que acha que está em casa e deixa aberto em qualquer lugar para secar. E ainda tem os que mesmo debaixo da marquise continuam com o guarda-chuva aberto atrapalhando quem está sem. Pena que capas não sejam tão comuns.

    Sally está sendo injusta em relação ao chinelo de dedo em locais que não sejam praia. Eu acho que isso diminuiu muito ultimamente. A uns 10 anos atrás era aquela bosta de sandália rasteira para tudo quanto é lado. Hoje em dia acho que as sapatilhas estão se tornando mais comuns, ainda bem. Porque o pessoal só considera chinelo se for de borracha, tipo havaianas. Se for de couro acham que está tudo bem e chamam de sandália rasteira.
    Entretanto ela tem razão quando diz que as roupas elegantes não atendem às necessidades do calor infernal. Verão é uma bosta para comprar roupa, é impossível achar uma blusa com manguinhas. E Somir está errado quando diz que sossego no calor está em ambientes fechados. Vai no shopping no verão ver todos os pobres entrando e sentando nos banquinhos só para pegar o ar condicionado.

    Para mim o que irrita mais na chuva é que ela pode ser inesperada. O calor não. Aí começa a entupir bueiro, vazar esgoto, tem enchente, desabamento, engarrafamento.

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