A Copa do Mundo da Rússia se aproxima a passos largos, e Sally e Somir discordam sobre quem mais deveria tropeçar nesse caminho. Os impopulares torcem.

Tema de hoje: o que é melhor para o Brasil, que a seleção ganhe ou perca a Copa?

SOMIR

Eu começo realmente a acreditar que sofrimento e aprendizado não são tão ligados assim. O fato de alguns aprendizados acontecerem logo após o sofrimento não quer dizer necessariamente que as coisas são consequência uma da outra. Não acho que o brasileiro vá aprender nada de especial com mais uma derrota da seleção na Copa, portanto, melhor vencer e curtir os benefícios de curto prazo.

Se mais um vexame num dos poucos pontos de orgulho do brasileiro fosse o combustível necessário para esse povo repensar suas prioridades, vá lá. Mas da forma como as coisas se desenrolaram pós o pior de todos até hoje, a goleada acachapante aplicada pela seleção alemã aqui mesmo em território tupiniquim, não faz muito sentido esperar algo positivo. Nem mesmo o futebol brasileiro aprendeu algo de novo.

Todos os pontos positivos da seleção brasileira atual continuam vindo da mesma fonte de sempre: capacidade individual. Dessa vez o técnico é muito bom e estamos com uma safra de jogadores até que bem aceitável para a média. Isso pode até gerar a ilusão que o futebol brasileiro se reergueu, mas na verdade continua podre desde a base até suas autoridades máximas. Não tem nenhum planejamento de longo prazo, tem foco nos atletas e comissão técnica de agora e só.

No resto dos frontes dessa batalha contra a bandalheira nacional, o país não demonstrou nenhum sinal de querer ser conhecido e admirado por outros motivos. Ciência, tecnologia, cultura e artes estão ainda mais sucateadas do que estavam antes do vexame futebolístico. O brasileiro continua admirando pessoas que chutam bolas e tratando como gênios pessoas como o Bolsonaro. Não teve avanço nenhum. Não aprendemos nada com aquele trauma.

E, pensando bem, era muita inocência achar que um trauma futebolístico fosse capaz de gerar mudanças. O esporte tem dessas mesmo de ganhar e perder de forma cíclica, seus problemas são momentâneos no que tange nossa emoção, então… mais fácil esperar o próximo jogo e torcer para dar tudo certo do que deixar de se importar, ou no mínimo se preparar melhor. Nem o trauma de uma ditadura foi forte o suficiente para dissuadir as pessoas dessa ideia, imagine só ver um bando de alemães chutando uma bola no gol do Brasil.

Então, se não há aprendizado, qual a vantagem de ver o Brasil perdendo a Copa de novo? Vai desanimar um povo que já está meio ressabiado, mas nada que seja suficiente para sequer mudar o próprio futebol de novo. Enquanto tiver dinheiro rodando nesse mercado, zero incentivos para fazer algo diferente. Talvez com o tempo e a insistência em pegar e punir corruptos as coisas melhorem, mas não vai ser tão rápido quanto ver aqueles crentes metrossexuais chorando por uma eliminação futebolística e decidir não partilhar daquela bobagem.

Já que é assim, que ganhem a porcaria da Copa. O ânimo gerado por milhões de pessoas que se medem internacionalmente por isso ajuda a dar um reforço na autoestima vira-lata do brasileiro e o faz botar a mão na carteira para gastar mais dinheiro. Pode não ser ideal, mas uma economia girando um pouco melhor já ajuda muito no funcionamento básico do país. Quanto mais o Brasil avança na Copa, mais dinheiro troca de mãos, mais empolgação na população e mais oportunidades de negócios para todos os lados.

Ganhar a Copa estende esse processo de otimismo financeiro por mais tempo e por tabela, faz essa gente maluca que se mede pela performance da seleção agir de forma um pouco melhor por mais tempo também. Euforias coletivas são comprovadamente poderosas para gerar mudanças num país, nem sempre para o bem, mas é uma janela de oportunidade. E como dessa vez nenhum partido ou líder político vai poder se vangloriar por isso (se o Temer tentar, capaz de tomar ovada até dos jogadores), é relativamente limpo. Não vai ter FHC ou Lula tirando casquinha política.

E se a questão é pensar em quem o brasileiro vota se estiver eufórico pelo título, não esquente: não tem ninguém que preste nessa eleição. Quem ganhar vai ser mais do mesmo. Só vai entrar num país um pouco mais feliz e contente com o status quo, o que pode atrapalhar alguma mudança muito radical. É só pensar em como nada faz muita diferença no final das contas pra perceber como ganhar a Copa é ligeiramente preferível. Não por uma grande margem, mas o suficiente para valer a pena.

Esse povo não tem mais o que comemorar não. E até ter, vai demorar muito mais do que alguns meses. Pode ser meu lado imperador romano falando, mas deem o circo para eles. Eles só entendem isso.

Para me chamar Somirius, para dizer que eu estou torcendo escondido, ou mesmo para dizer que eu desisto fácil: somir@desfavor.com

SALLY

O que é melhor para o Brasil, que a seleção brasileira ganhe ou perca a Copa do Mundo de 2018?

Perca, né gente bonita? Alguém tem alguma dúvida?

Não estamos perguntando o que você quer, o que você gostaria ou para quem você torce. Hoje não é sobre você, ok? É sobre o país.

O que é melhor para o Brasil: o povo se encachaçando com a autoestima lá em cima (sim, brasileiro se sente menos vira-lata quando ganha biscoito, mesmo que seja em esportes) ou o povo putaço, focando em todo o resto, cobrando ainda mais, tendo ainda menos paciência?

Eu quero que o Brasil não passe nem para as oitavas de final, para o povo ficar bem injuriado e focar em questões mais importantes. Essa gente feia e oleosa que compõe a seleção brasileira, esses crentes metrossexuais que colocam faixa escrito “Jesus” na testa, não merecem ganhar nem campeonato de cuspe à distância. É recompensar vícios, putaria e falta de dedicação, pois além de pagar salários exorbitantes, também se dá aplausos públicos.

Além de achar ideologicamente lastimável que uns Zé Cu que só chutam uma bola ganhem uma fortuna, acho igualmente tenebroso que outros Zé Cu fiquem em casa gritando e torcendo como se isso fosse fazer alguma diferença na vida da pessoa. Amigão, se a seleção brasileira ganhar te gera alguma alegria, desculpa aí, mas sua vida está muito merda. Queira mais, seja mais. Esse tipo de torcedor “que veste a camisa” incondicionalmente eu tenho o maior prazer em ver se foder. Isso se chama devoção, é algo muito patético e próximo a uma religião, não merece ser recompensado.

Eu poderia usar o argumento mais simples do mundo: o Brasil não merece ganhar. Não se empenham, não treinam direito, vivem na putaria, enchendo os cornos de bebida. Isso não é ser atleta, é ser um deslumbrado sem disciplina. Meu coraçãozinho argentino se enche de tristeza cada vez que eu vejo vagabundo fazer as coisas nas coxas e ser recompensado financeiramente e aplaudido, sou romântica.

Mas dá para ir além deste argumento. Estamos em um momento crítico no Brasil, onde pela primeira vez na vida gente realmente grande está sendo processada e presa. Muito disso acontece pela pressão popular sim, o povo está acompanhando julgamento, eventualmente até indo às ruas. Seria uma pena que toda essa energia e foco do brasileiro fosse canalizada para 11 imbecilóides que não acertam uma concordância verbal. Será possível que só eu me sinta assim?

“Ain Sally, mas tá foda, eu preciso de uma alegria nessa vida”. Meu anjo, busque dentro de você, faça por onde se sentir feliz, faça por onde que coisas boas aconteçam na sua vida, foque em conquistas suas, em vez de ficar na esperança que estranhos te alegrem. Pensa aí com calma quão merda é esse projeto de buscar um momento de alegria em estranhos e me diz se acha isso realmente uma boa escolha. Ganhar uma Copa é conquista dos jogadores, não da torcida. Tem que ser muito desempoderado para achar que a conquista também é sua.

Outro aspecto é a onipresente vergonha internacional. Quanto menos exposição brasileiro tiver, menos se queima a imagem do Brasil pelo mundo. Brasil na final é ver jogador beijando amuleto da sorte, usando faixa de “Jesus”, arrancando pedaço do gramado e se benzendo. É ver toda sorte de mandingas ridículas. É ter divulgado como “moda” brasileira todo tipo de cabelo ridículo. É ver aqueles Zé Bucetas com aquelas tatuagens escrotas que mais parecem legendas pelo corpo sendo mostrados como símbolo do Brasil, fazendo presumir que a população local é isso.

Jogador de futebol brasileiro é um bicho brega, ridículo, vergonhoso. Ter essa imagem divulgada representando o país é ruim para todo mundo. Não adianta dizer que não se importa, quando você estende seu cafona passaporte verde para entrar em qualquer país, paira sobre você a sombra dessa gente cafona. Impacta sim. Melhor que não saibam nada sobre o Brasil, em vez de ter essas péssimas referências.

E, por fim, passa um recado muito bonito para a juventude: estude, pois se escorar no futebol não é mais uma esperança. Tá cagado, tá uma merda, tá decadente, tá dando vexame. Chega desse sonho macaquito, do auge da vida de uma pessoa ser sucesso na “carreira” de jogador de futebol. Já deu, os anos 80 acabaram, hoje qualquer pessoa pode acessar o conhecimento que quiser pela internet, é possível ser mais do que isso.

Agora, um breve momento para ser egoísta: eu não gosto de aglomeramento de pessoas, sobretudo quando estão bebendo. Também não gosto de barulhos no geral, gritos e fogos. Fica fácil entender porque minha qualidade de vida e paz de espírito aumentaria se o Brasil perdesse, certo? Ruas fechadas, símios de verde e amarelos pulando, gritando e urinando na via pública, gente sem noção do ridículo pendurando essa bandeira brega em cores tropicais que o Brasil tem na janela… um espetáculo odioso. Prefiro não.

Não sei qual ganho secundário você pode ter com uma vitória do Brasil, mas certamente não é bom para a coletividade. É ano de eleição, o povo tem que estar atento, ligado na movimentação política e, de preferência, com a faca nos dentes, em vez de estar encachaçado gritando sobre o orgulho de ser brasileiro. Façam isso quando ganharem um Noblel, ok? Comemorar Copa é macaquice.

Para dizer que quer que ganhe mais pela questão dos feriados em dia de jogo, para dizer que se a Argentina perder já está ótimo ou para dizer que eu tô muito cheia de marra para alguém que tem Higuaín como atacante: sally@globo.com

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Comments (36)

  • Pra mim tem que ir até a final pra eu poder ter dispensa do trabalho pra assistir os jogos e aí chegar em casa e dormir ou jogar videogame que é muito mais interessante. Foi o que eu fiz na copa de 2014.

  • Não tenho nenhuma expectativa de que perder vá fazer diferença na mentalidade dos brasileiros, não ganhamos Copa há quase 20 anos e eles continuam com esse ufanismo bizarro no futebol.
    E sem futebol, iriam simplesmente canalizar as energias para outra coisa.

  • é melhor devolver o Brasil aos índios e pedir desculpas, pois não somos capazes de fazer nada de melhor por esse país, aliás, temos muito a aprender com os índios…Um país que gira em torno do carnaval e do futebol, não pode ser levado à sério. “vamos protestar só depois da copa tá??”.

  • Eu poderia dizer que quero ver o Brasil perder para mudar essa mentalidade “vamos esperar a natureza produzir mais um Neymar” mas como aqui eu posso destilar o amargor do meu coração, vou direto ao ponto e digo que quero ver o Brasil perder para ver o Brasileiro Médio cada vez mais pistola.

  • Estou com a Sally, tomara que o Brasil perca logo.
    Outra coisa boa disso é ver o Galvão narrando derrota do Brasil, acho lindo! Menos o icônico grito de: É tetraaa, é tetraaa! Que esse eu adoro!

  • O Brasil não vai ganhar. E nem tinha pensado acerca do que a Sally apontou (o título sendo reforço positivo para as mais diversas brasileirices). Eu penso do ponto de vista técnico mesmo: a seleção vai repetir os mesmos (ou quase todos) erros de 2014 (e anos anteriores). Sai treinador, entra treinador, os mesmos bisonhos sem senso de coletividade e entrosamento permanecem jogando. Nos mesmos esquemas.

    Definitivamente não vai ganhar, isso eu já nem me preocupo muito. Agora você me mostrou que ainda podemos colher bons side effects em caso de (mais uma) derrota. O povo precisa se manter focado em tentar fazer força e consertar o país.

    PS: estou torcendo para que a Alemanha vença de novo, para invalidar mais um ranço do torcedor BM: o de única seleção pentacampeã

  • Eu só queria Ter a imagem da primeira dama lutando com os patos pra salvar o cachorro. Valeria até um emprego .

  • Concordo com a Sally. Desde adolescente, sempre torci pro Brasil perder. Também nunca vi mérito nesse povo que ganha fortunas pra chutar uma bola, mas mal sabe falar. Ainda são tratados como heróis, como exemplo pras crianças. É um absurdo. Tem eleição, tem um monte de coisas mais importantes com as quais o povo deveria se preocupar.

  • “Eu quero que o Brasil não passe nem para as oitavas de final, para o povo ficar bem injuriado e focar em questões mais importantes. ”
    Sally foi um tanto otimista aqui. Mas na nossa última derrota, em 2014, a maior movimentação foi memes. E isso só na minoria que tem tempo e saco para política, lacração, memes e afins. O mundo não é a internet.

    Meus achismos: se essa série de derrotas continuar e supondo que a Alemanha seja a primeira a ser hexa, aí talvez tenha de fato alguma chance de mudança cultural, pois o Brasil não teria mais a reputação internacional de “país do futebol” para se encostar. Mas acho mais provável o brasileiro se encostar em outra reputação para sugar, tipo a de “país do carnaval” ou mesmo “país do funk”.

  • A Sally já deu meu argumento ali nos instantes finais do texto: to torcendo é pelos feriados!

    Mas não sei não, Sally… acho que vc está sendo muito otimista. O Brasil perdeu com aquele vexame e mesmo assim o Neymar foi vendido pro PSG por aquela quantia indecente… o Brasil perdeu com aquele vexame, e quando saímos do país e falamos que somos brasileiros falam “ha ha ha.. Neymar.. soccer”.. a aspiração do BM continua sendo ser jogador de futebol ou MC do funk…

    E não acho que ninguém vai se voltar pra melhorar o país não… nem querer estudar (com essas reformas que estão sendo feitas)…

    Acho que dessa vez to com o Somir. Pelo menos o dinheiro gira…

    • Enquanto Dilma mandou sacrificar seu cão por não achar conveniente levá-lo para Brasília, Marcela se joga no lago para salvar o dela. Impressionante a diferença.

  • Considero que o país dos sonhos de quem detesta Copa, aquele em que só nos preocupamos, de fato, com o que é relevante, não existe. Nem no Brasil, nem nos “modelos” que alguns colocam para a gente, como Suécia, Islândia, Cingapura ou os onipresentes “USA”.

    Ora, desde sempre sabemos que a futilidade é que move o mundo. Cientista sempre ganhará menos que jogador de futebol ou personalidade da mídia, assim como político nenhum aplica remédios amargos na população (e os jornalistas sabem disso, pois, infelizmente, a verdade não vende jornal).

    O Brasil não mudará por ganhar ou perder a Copa, mas ninguém quer perder – todo mundo quer ganhar. Se não fará diferença, e teremos alguns dias de feriado, então que se lute ao menos para ganhar a bendita.

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