Eleição comprada.

Nas eleições de 2018, que vão eleger deputados estaduais, federais, senadores, governadores e presidente, temos uma pequena novidade: os candidatos vão poder pagar para aparecer mais na internet. E isso deve mudar completamente a forma como as campanhas funcionam dessa vez.

Até a última eleição, gastar dinheiro na internet era proibido, ou seja, os candidatos dependiam quase que exclusivamente de gente contratada para postar freneticamente nas redes sociais, até porque aqui no Brasil as pessoas estão mais engajadas em brigar com as outras por política do propriamente defender seu candidato. Seja como for, isso muda muito a dinâmica da coisa para você, pobre vítima da torrente de caras feias que vão preencher sua tela começando no dia 16 de Agosto.

A internet já seria o grande palco (ou picadeiro) dos candidatos neste ano, mesmo considerando as táticas antigas, mas com a liberação para gastar dinheiro com Facebook, Instagram e até mesmo as pesquisas do Google (mais sobre isso depois), tende a virar um dos pontos centrais dos gastos das campanhas. Como nenhuma das gigantes da internet é estranha ao conceito de fazer mais dinheiro, vão manter as vias totalmente abertas para o festival de gastos eleitorais que virão em sua direção. Não espere que ninguém controle quaisquer excessos a não ser que ameace as ações de Facebook e Google.

O mais perigoso nesse processo todo é que a Justiça Eleitoral basicamente encurralou as verbas de campanha na internet: os outros meios de comunicação continuam com limitações severas, TV e rádio não dão mais sequer uma fração da relevância de tempos passados. Muito se falou nas alianças dos candidatos com partidos nanicos para adicionar segundos a mais em seus programas eleitorais, mas por mais que eles ainda alcancem muita gente, são uma piada de mau gosto em comparação com o poder das redes sociais e dos mecanismos de busca.

Na verdade, os partidos não estavam buscando mais tempo de rádio e TV, e sim mais capilaridade: tendo uma legião de candidatos de cargos menores alinhados com um mesmo candidato à presidência garante que a foto do cidadão vai aparecer em milhares de outras mini-campanhas regionais, especialmente na internet. É uma forma de turbinar a presença de qualquer candidato nos níveis inferiores, e como os gastos de internet são planilháveis e suficientemente confiáveis nos relatórios, é bem mais fácil para os partidos soltarem a verba.

Nas redes sociais, a palavra-chave vai ser alcance: os panfletinhos que entulhavam toda a rua agora estarão na sua timeline. Por limitações na legislação eleitoral (que continua meio confusa na parte da internet), basicamente estão forçando as campanhas a montar estratégias de alcance e frequência, ou seja: jogar uma imagem ou vídeo para o máximo de pessoas possível o máximo de vezes possível. Os candidatos com uma equipe um pouco melhor vão conseguir inclusive focar em regiões, cidades ou mesmo bairros! Talvez você veja a mesma cara feia umas duzentas vezes até o final da eleição por estar no planejamento regional dele. Os materiais não vão ser muito focados em interação com o candidato, mesmo que o candidato queira, vai ser santinho online sem parar por determinação da legislação eleitoral.

E como não tem dessa de desligar propaganda, porque Facebook e Google ganham quando você vê ou clicar nesses materiais, pode ser que a internet sofra como um todo nesse período. Considerando que um mero deputado estadual tem até um milhão de reais para gastar na sua campanha (era para o TSE definir os valores, mas não fez, aí o Congresso tirou esses da bunda) e a campanha só vai durar um mês e meio, estão notando como vai ser insano esse processo?

Principalmente porque volta a dar muito mais poder para quem tem mais dinheiro, não que tenha mudado grandes coisas as ações de aplicação de teto de gastos, mas era um norte para a redução da vantagem do poder econômico entre candidatos. Agora isso se torna irrelevante com a liberação dos gastos com internet. Como todo mundo pode fazer propaganda impulsionada, dá para dobrar ou triplicar a verba de campanha passando o dinheiro para os candidatos menores e impulsionar materiais dúbios onde o candidato a deputado estadual, por exemplo, faz campanha para um candidato à presidência.

E nesse jogo, quem já estabeleceu uma boa base de defensores da candidatura “de graça” vai ter uma vantagem: uma coisa é ver uma propaganda como propaganda, outra é ver como algo compartilhado por uma rede de fãs do candidato. E sabemos bem que temos dois deles com uma rede poderosa de defensores naturais. Um está preso, o outro deveria também. Se estava chato até aqui, vai ficar ainda mais.

E isso me leva a outro ponto: como disseram que pode impulsionar conteúdo sem dizer exatamente aonde, todas as funções de propaganda online estão na mesa. Isso significa que não só vai estar na rede social, como no seu YouTube, em banners que cobrem algo em torno de 97% dos sites da internet e também nos resultados de pesquisas que você fizer, todas possibilidades geradas pelos serviços do Google. A encheção de saco vai ser a mesma coisa já dita antes no caso da plataforma de vídeos e dos banners entulhando os seus sites preferidos (menos no desfavor, chupa!), mas quando falamos de comprar palavras das pesquisas do Google, isso fica bem mais preocupante.

Para quem não sabe, você pode comprar uma palavra no Google, e todo mundo que pesquisar ela vai ser o seu resultado no topo, independentemente da relevância original da página. Claro que existem algumas proteções internas no sistema do Google para evitar que um compre o nome do outro, mas… todas elas podem ser contornadas com mais dinheiro. O problema é começar a comprar palavras-chave que reforcem a enxurrada de fake news que vão surgir por aí. O TSE disse que um candidato não pode impulsionar algo que fale mal de outro, mas obviamente existem muitos truques para fazer isso sem dar na cara.

Na pior das hipóteses, apenas tenha em mente que dessa vez tudo o que você vir na rede social, banners e resultados de pesquisa pelos próximos 100 dias provavelmente vai estar contaminado por dinheiro dos candidatos que você tanto despreza. Pode ser uma ótima chance de fazer aquela tão esperada desintoxicação de internet…

Para dizer que só fica pior, para dizer que só de imaginar ver a cara da Marina Silva de cinco em cinco minutos te deixa desesperado, ou mesmo para dizer que pagaria para não ter que ver nada disso: somir@desfavor.com

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Comments (4)

  • AdBlock é o meu pastor.
    E se o site recusar meu acesso, paciência. Geralmente sites que mandam desativar AdBlock possuem conteúdo beeem duvidoso…
    Mas ainda não dá pra descartar totalmente a relevância da TV, especialmente entre as gerações mais velhas, que compõem a maioria do eleitorado.
    “A internet e as mídias sociais são mais importantes para jovens entre 16 e 34 anos, correspondendo a 49% da preferência desse eleitor na hora de buscar informações. Esse percentual cai para 44% na faixa etária dos 35 aos 44 anos; para 39% entre 45 e 59 anos; e para 32% para eleitores acima de 60 anos.”
    https://www.gazetadopovo.com.br/eleicoes/2018/internet-radio-ou-televisao-como-eleitor-vai-se-informar-para-decidir-o-voto-5azwjndb4mbhimcve58tnoqt5

    No fim das contas quem vai decidir as eleições não tem tempo pra Twitter nem Whatsapp e provavelmente vai se vender por uma dentadura ou frases prontas. Ideologias, planos e projetos não importam pra essas pessoas.

  • (…) pagaria para não ter que ver nada disso (…)

    …”Dilpeachment suada” era, pelo menos, cômica…

    #Snif #Sad2018

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