Deus no comando.

Enquanto a democracia vai se sustentando por estas bandas, Sally e Somir discordam (democraticamente) sobre qual seria o melhor de dois sistemas caso ela falhasse. Os impopulares votam enquanto podem.

Tema de hoje: o que seria menos pior para o Brasil hoje, anarquia ou teocracia?

SOMIR

Anarquia. Caso o brasileiro médio sequer entendesse os termos discutidos aqui hoje, provavelmente discordaria de mim. Mas para quem precisa de um reforço: anarquia é a ausência de um governo, com liberdade absoluta para cada cidadão; já teocracia é uma ditadura baseada numa religião: os líderes da religião também seriam os líderes do Estado. O brasileiro provavelmente toparia na hora ter seus políticos substituídos por padres e pastores, considerando que praticamente todos são cristãos. E é muito por isso que eu faço minha escolha, fazer o que esse povo quer está nos levando para o buraco há séculos…

Não nego que a teocracia evitaria o caos inicial de uma mudança de sistema, mesmo com católicos e protestantes (evangélicos) tendo disputas históricas, a mera ideia de governantes que seguem os mesmos preceitos religiosos manteria a imensa maioria da população mais calma nessa hora crítica. Apesar de achar potencialmente hilária a ideia de uma ditadura do Candomblé, ela não duraria nem horas no país. Tem que ser cristã mesmo para resistir. Mas essa estabilidade teria um preço caro demais nos médio e longo prazos.

Nossas relações internacionais iriam para as cucuias, em questão de horas. Não existem mais teocracias cristãs por um motivo. Teocracias muçulmanas ainda conseguem alguns aliados, mas não sobraria muita gente disposta a negociar com o Brasil. A dependência do país do comércio exterior é tão grande atualmente que indústria e agricultura entrariam em colapso por causa dos boicotes. Nem mesmo a China (que provavelmente daria de ombros para todos os abusos) é grande o suficiente para sustentar nosso comércio internacional sozinha. Em pouco tempo a gritaria internacional seria tão grande que viraríamos o Irã cristão. Se o Brasil é atrasado agora, imaginem só com o mundo civilizado contra a gente?

Porque não dá para fazer teocracia sem repressão: se os valores cristãos de obsessão doentia com sexo não forem impostos, a teocracia tupiniquim desaba por falta de “respeito” do povo. E se aprendemos alguma coisa com a história, é que ditadores fazem tudo para manter seu poder. As leis rapidamente alcançariam níveis africanos de repressão a homossexualidade, pessoas como a Damares poderiam te prender por discordar dela em qualquer tema… mas, por mais que o brasileiro se diga muito cristão, este país está profundamente cooptado por uma cultura hipersexualizada, comum entre povos com baixo índice de desenvolvimento humano. O cristianismo tem um fetiche insaciável por regular sexualidade, e teria poder absoluto na terra dos travestis e funk pornográfico!

Some-se a isso a violência desse povo. Com chancela governamental, a maioria quase que absoluta de criminosos (todos evangélicos) rapidamente aproveitaria a oportunidade para se reorganizar como uma espécie de inquisição. Esse é o povo que mais lincha no mundo (em números), seria um banho de sangue! Corremos até o risco de ser invadidos por uma coalização da ONU, tamanho o desastre humanitário que teríamos em nossas mãos. O Brasil tem riquezas suficientes para vale a pena ser “liberado” por forças internacionais. E se por algum milagre isso não acontecer, sistemas fundamentalistas não conseguem avançar em ciência ou qualquer aspecto tecnológico básico, nos fadando a um sistema medieval em pouco tempo.

Mas como isso seria diferente da anarquia, você pode me perguntar… e a diferença seria no vácuo de poder criado por uma recém-instaurada anarquia. Se da noite para o dia todas as leis desaparecem e a máquina pública fosse extinta, temos imediatamente um estado de alerta para toda a população. Não teríamos festas nas ruas como teríamos com os religiosos tomando o poder (não minta, você sabe que esse povo ia comemorar muito nas ruas), não teríamos um planejamento de como abusar do novo sistema, teríamos apenas o caos. E surpreendentemente, o brasileiro tem experiência com o caos. Nosso Estado é inchado, mas não é eficiente. Não é como se o brasileiro estivesse acostumado com um sistema onde as coisas funcionam, a anarquia seria a oficialização de cada um por si. Quem fica doente e precisa do SUS já sabe o que é isso. Quem mora numa favela e se sente ameaçado por traficantes não vai ter nenhuma surpresa.

A maioria da população brasileira já vive na anarquia. E para provar que organização é uma tendência natural do ser humano, ela já se organiza nos enormes buracos deixados pelo nosso sistema atual. O PCC e as Milícias que não me deixam mentir. A parte boa da anarquia é que ela tira o “papai” do Estado da jogada e força todo mundo a pensar de forma coletiva também. Você não vai proteger seu prédio dos inevitáveis arrastões se defender só a sua porta. Durante um tempo, a massa ignorada de miseráveis brasileiros vai destruir toda a estrutura que vir na sua frente, e só aqueles que conseguirem organizar defesas vão sobreviver.

Sinto-me um monstro insensível dizendo isso, mas você sabe que é verdade: essa massa muito pobre e ignorante é mais ou menos como um grupo de zumbis. Muito perigosos pelos números, mas não pensam. Durante semanas, talvez meses, vão ter o que destruir, especialmente nas grandes cidades, mas depois de um período de tempo, os alvos fáceis acabam. E aí, o Estado começa a fazer falta. Sem acesso aos itens básicos de sobrevivência, os números vão começar a cair. De uma certa forma, instaurar a anarquia no Brasil é a resposta para a pergunta “e se matássemos todos os pobres?”. Quem conseguir se organizar, juntar armas e recursos em lugares bem protegidos, vai conseguir navegar por essa tempestade até a massa revoltosa começar a morrer de fome e falta de tratamento médico.

Provavelmente a tempo de uma grande intervenção internacional. O mundo não aceita vácuos de poder, não somos uma ilha na humanidade. Com o “papai” voltando, o brasileiro médio vai voltar ao modo subserviente habitual, mas todas as estruturas de poder poderão ser reconstruídas. Provavelmente o país se reconstrói em unidades menores, com gente que viu na pele como é perder toda a estabilidade. Não existiria mais um Brasil, mas vários, cada um governado por gente que se importa com seu pedaço de chão. É a única forma que eu vejo de resetar o sistema, mesmo que custe a vida de milhões (provavelmente as nossas, já que a maioria dos leitores do desfavor moram em grandes cidades).

Anarquias não se sustentam por serem contrárias à nossa natureza. O ser humano definha sozinho e busca estrutura onde puder encontrar. Melhor que descubramos na raça qual funciona para nós do que ficar presos numa ideia arcaica de fundamentalismo religioso que sabemos que vai terminar muito mal.

Para dizer que eu não defendi de verdade a anarquia, para dizer que leu algo horrível nas entrelinhas, ou mesmo para dizer que por mais horrível que seja, é a pura verdade: somir@desfavor.com

SALLY

O que você acharia menos pior hoje para o Brasil: o país sob um governo anarquista onde cada cidadão tem que se regular ou sob um governo fundamentalista religioso?

Vocês sabem que eu abomino religiões, que as acho um câncer para a humanidade e que discordo totalmente das amarras que elas colocam nas pessoas. Mas, ainda assim, quando falamos do Brasil, acho que pior do que religião é anarquia. Por mais nociva que seja a religião, pior ainda é o livre arbítrio do brasileiro médio. Se, com regras a coisa já está impossível, imagina sem regras.

Religião é adestramento, é contenção social, é emburrecimento para manter a pessoa em um cercadinho. Péssimo para pessoas com discernimento, útil para pessoas animalescas que matam, estupram e roubam umas das outras quando há alguma possibilidade de fazê-lo. Eu sei que nem todo brasileiro é estuprador, assassino ou ladrão, mas sim, quase todo brasileiro é corrompido, eticamente questionável e com zero senso de coletividade. Gente assim se porta melhor em um governo fundamentalista, bem radical, que não dá espaço para mijar fora da bacia.

Quando se tem um povo com tão pouca consciência, tão focado apenas em seus interesses pessoais, tão sem educação, infelizmente cercas, grades e contenção são necessárias. Ainda que as contenções sejam nocivas, o povo brasileiro certamente é ainda mais nocivo a si mesmo. Sim, isso mesmo, eu estou dizendo que nenhum governo opressor conseguirá ser pior do que o que seria o brasileiro sem controle. A situação é merda a este ponto.

E, tenho a plena consciência que repressão e medo não educam, não trazem ganhos a longo prazo e não mudam mentalidades. É apenas uma focinheira para o cachorro mal educado não morder ninguém enquanto a está usando. Jamais afirmaria que um governo fundamentalista religioso poderia trazer algum ganho que não um grande cercado para conter essa população escrota e sem um pingo de civilidade.

Existe uma teoria de que, com o tempo, a sociedade se autorregularia: após muita barbárie, se estabelece um equilíbrio. Acho possível, quando há um mínimo de civilidade. No grau de involução em que as pessoas estão, seria apenas os mais fortes subjugando os mais fracos e muitas pessoas se matando por disputa de poder. Evolução social acontece onde há terreno fértil para que ela aconteça. O brasileiro não tem educação, respeito pelo próximo nem um mínimo de noção. Não há matéria prima, não há terreno fértil para que surja algo de bom dessa liberdade, ao menos não por enquanto. Apenas tempo ou experiência não trazem isso.

Ensino, educação e exemplos fazem uma civilização evoluir. Apenas tempo e barbárie não. Não contem com a evolução pelo mero decurso do tempo. Historicamente, as civilizações evoluíram entrando em contato com outras civilizações e aprendendo coisas novas com elas, sendo criativas pela necessidade de buscar novas soluções e outros fatores que impulsionaram as mudanças. Porrada, crime e barbárie não fazem ninguém evoluir, muito pelo contrário. As civilizações se aramam, se focam apenas na guerra e na defesa e o resto fica estagnado.

Por mais que eu deteste religião, consigo reconhecer quando ela é necessária. Pessoas animalescas precisam de um freio, e no Brasil a lei não funciona como freio para nada. A religião não impede que a pessoa evolua, estude ou melhore, pode até dificultar o processo, pois deixa a cabeça mais fechada, mas sabemos que muitos gênios da ciência superaram o entrave da religião. Já a barbárie, ela sim impede que uma pessoa evolua. Quando se está na base da Pirâmide de Maslow, lutando pela sobrevivência, não sobre disponibilidade, tempo ou energia para pensar em mais nada.

Então, de uma civilização minimamente contida pela religião, podem surgir mentes pensantes que transcendam essa mente pequena que é ensinada pelos religiosos, mas de uma barbárie, só surgem humanos assustados, preocupados apenas consigo mesmos e com a sua sobrevivência, sem pensar no coletivo, em descobertas ou em evoluir.

E, sejamos sinceros, se amanhã ou depois isso aqui virar uma barbárie, as chances de que as mentes pensantes sobrevivam são pequenas. Traficantes fortemente armados, sarados de academia ou pessoas habituadas à força bruta e criminalidade tomariam o poder. É ilusão nerd achar que com o tempo a inteligência encontrará uma forma de tomar o poder da força. Não vai. Inteligência é superestimada, basta olhar para como está a vida de quem é apenas inteligente e comparar com a vida de quem performa bem socialmente. Vamos além: observe o reino animal, os maiores e mais fortes são os que se mantém no poder, pouco importa se o coleguinha sabe usar ferramentas.

E, por mais contraditório que seja, na religião os mais hábeis mentalmente controlam o poder e os fortes/criminosos ficam com os ânimos mais apaziguados, graças a um fator chamado medo. Então, do alto do meu um metro e meio, desculpa por puxar a sardinha para a minha brasa, mas eu prefiro um país onde habilidade intelectual, de fala, de convencimento seja o grande trunfo da vez, ainda que seja baseada no medo. Fundo uma igreja antes de ver bandido tomando o poder na marra, no soco e no tiro.

Anarquia é linda na teoria, mas na prática não presta. O ser humano ainda não está pronto para se autorregular e não estará tão cedo. Até lá, não convém dar poder a quem ainda não é capaz de usufruir desse poder sem fazer merda. Vejam o que já aconteceu com a democracia e com a liberdade de expressão. Chega, né? Não adianta querer estabelecer regras mais evoluídas do que o estado de consciência de uma civilização, isso não atrai evolução, atrai problemas.

Primeiro se evoluí, depois se implementa um sistema compatível com o atual estado mental da população. Jogar algo evoluído e esperar que as pessoas se enquadrem bem nisso é suicídio. Vejamos, por exemplo, nosso sistema penitenciário: lindíssimo na teoria, ressocializa o preso e o devolve bonitinho para a sociedade. Em outros países civilizados este mesmo sistema alcança um índice de reincidência muito próximo de zero. No Brasil é uma fábrica de psicopatas que devolve as pessoas ainda piores para a sociedade, com um dos maiores índices de reincidência do mundo.

Então, não é sobre o sistema que se implementa, sobre ele ser bom, ruim, evoluído ou retrógrado. É sobre a compatibilidade desse sistema com o grau de consciência das pessoas que viverão nele. Não adianta um sistema lindo em uma civilização que não está pronta para usufruir dele. Essa gente bronzeada que batuca não pode ter nada além de uma religião cabresteira no momento.

As coisas são como elas são, não como gostaríamos que elas fossem. Brasileiro é involuído e precisa do máximo de contenção possível, fica mais educado quando sente medo. Você não é o brasileiro médio, talvez você pudesse viver bem em anarquia, mas a esmagadora maioria da população não pode.

Para dizer que são verdades tristes, para dizer que só bomba atômica resolve ou ainda para dizer que Anarquia seria útil por todos matariam a todos: sally@desfavor.com

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Comments (7)

  • A anarquia é onde os fracos não tem vez, é puro caos, é Mad Max e eu iria preferir me armar para proteger minha propriedade temporariamente do que ter que aguentar uma teocracia pro resto da minha vida, a anarquia é frágil, qualquer um que imponha o poder pela força se torna o novo governante já a ditadura não, ela é estável teríamos que lidar com o caos (fome e escassez) e com o estado repressor ao mesmo tempo. Apostar na anarquia é uma aposta que após o banho de sangue vai vir algo melhor do que uma teocracia, quem iria assumir? Banqueiros bilionários, George Soros, o PCC? Não importa, qualquer um desses me parece uma opção melhor do que uma teocracia.

  • Minha conclusão é que o Brasil vive uma anarco-teocracia, então dá na mesma.
    Mas vou me alinhar com o texto da Sally porque sou contra redução populacional, não quero que a ONU tenha motivos pra empurrar pra gente a outra metade da África que não foi pra Europa.

    • “Minha conclusão é que o Brasil vive uma anarco-teocracia, então dá na mesma.” Me sinto meio mal por concordar com essa frase…

  • “pessoas como a Damares poderiam te prender por discordar dela em qualquer tema… ”

    Ô caralho que ia ter mulher com tanta autoridade assim num governo teocrático, seja ele judeu, cristão ou muçulmano. Damaris seria recolocada no lugar que a Bíblia diz que pertence: em casa quietinha cuidando de (muitos) filhos. E se levar tabefe, nada de políticas pró-mulher, B.O, ou divórcio, foi culpa da insubmissão dela!

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