A internet brasileira estava muito ocupada com a Terceira Guerra Mundial (vulgo nada) para prestar atenção nisso, mas uma meme nasceu no começo do ano para dar um pouco de esperança para esta década: o New Guy. Mas só um pouco mesmo…

Tudo começou com uma tira de quadrinhos de uma artista lacradora:

Basicamente, o avatar da desenhista estava rindo do fato que o YouTuber PewDiePie teve sua casa roubada, e o “macho branco opressor aleatório” que sempre aparece de vilão nessas tiras diz que não é algo legal rir disso e pergunta como ela se sentiria se fosse com ela. Ela responde dizendo que já pode ver que eles serão bons amigos, ele pergunta de forma inocente se é verdade, e ela diz que não, completando a piada.

Seria só mais uma dos inúmeros quadrinhos lacradores da internet, não fosse ter chamado atenção de um animador relativamente famoso, que republicou a imagem dizendo que estava animado com 2020 até ver aquilo. Não escreveu mais nenhuma crítica, não atacou a pessoa que fez, aliás, nem colocou o link do perfil dela. Mas, cidadão tem mais de 300.000 seguidores no Twitter… muita gente prestou atenção no material.

E a resposta de desgosto foi quase que unânime. O suposto vilão dos quadrinhos, o rapaz com o crachá de “New Guy”, acabou saindo como a pessoa mais empática da história, e a autora, que deveria ser a personagem com a qual simpatizamos, como uma babaca. O que deveria ser óbvio para qualquer pessoa com um mínimo de habilidades sociais passou batido pela pessoa que fez a tira. De alguma forma, ela olhou para o material pronto e sentiu-se confiante que estava lacrando e todo mundo gostaria (menos os nazistas, é claro).

A internet, sendo a internet, não demorou muito para achar a autora. Como era de se esperar, recebeu uma enxurrada de mensagens, algumas educadas apontando os problemas, outras nem tanto. Mas voltaremos a esse ponto depois, porque essa nem foi a forma principal de crítica ao conteúdo dela, as memes surgiram na velocidade da luz! O New Guy, a personagem que deveríamos desgostar na tira original, virou símbolo dos melhores comportamentos do ser humano. Logo surgiram várias edições e artes originais exaltando a forma como o rapaz conseguia se colocar na pele do outro e ser compreensivo.

A maior vingança da internet foi justamente criar o status de herói para o New Guy, em cima das falhas da cartunista ao tentar pintá-lo como uma pessoa desprezível. Tem todo o aspecto das falas dele na tira, primeiro tentando se enturmar (sendo o cara novo no trabalho), depois demonstrando empatia, e por último inocentemente achando que fez uma amizade. Mas além disso, há um erro claro na forma como ele foi desenhado: na cabeça da autora, desenhou alguém que parece um imbecil, mas acabou criando uma forma simpática. Formas simples, arredondadas, e evocando toda a imagem de “gigante gentil” que cativa pessoas desde que o ser humano aprendeu a desenhar.

E o erro é exacerbado pela qualidade técnica da autora: você pode até não gostar muito da arte, mas é alguém que parece que sabe o que está fazendo ao desenhar. É incrível que alguém com essa noção mínima da parte artística não tenha percebido que inclusive desenhou uma personagem carismática no “vilão” da sua peça. New Guy fala e se parece com alguém que a maioria de nós ia gostar. Como foi que ela não percebeu?

Seja como for, tivemos uma meme com uma natureza boa nesse começo de ano. Como de costume, o ciclo de notícias chegou para tirar sua relevância, mas podem apostar que o New Guy ainda vai continuar aparecendo em vários outros lugares durante o ano, mesmo que mais discretamente. Então, é só isso? Uma pessoa desenhou um quadrinho e explodiu na cara dela? Quem me dera. O drama continua.

Como disse antes, o perfil dela apareceu e recebeu um monte de mensagens. A resposta não surpreende, ela saiu bloqueando geral. O que não é tão estranho considerando que muita gente vem só para atacar mesmo. Não podemos nos enganar achando que existe um lado “bom” na guerra cultural: o que não faltam são lacradores e mitadores doidos para vomitar todo seu ódio da vida no primeiro alvo que encontrarem pela frente. A ferramenta de bloquear está lá pra isso mesmo, então nem de longe esse é o problema. Mas, muita gente também aparece com críticas construtivas. E foi na resposta delas que percebemos a pior parte do comportamento de quem fez a tira original: ignorou completamente a discussão sobre o conteúdo e entrou no bom e velho modo de vítima, chamando todo mundo de opressor, mesmo os que mandaram mensagens muito educadas.

E como polarização pouca é bobagem, o Twitter lacrador considerou isso uma declaração de guerra. Logo vários vieram à defesa, com a mesma narrativa de opressão e transfobia.

Opa… transfobia?

Como a maioria das pessoas que entraram nessa polêmica sobre a história do New Guy descobriram depois de começarem a discutir sobre isso, a autora era transexual. Mas, de alguma forma, ficou claro não só para ela quanto para seus defensores que desde o começo tudo foi um plano arquitetado para atacar transexuais. Por sorte, como a crítica estava sendo feita ao material publicado por ela e não diretamente contra ela, as memes do New Guy do bem continuavam proliferando e o ângulo da transfobia ficou mais limitado a quem foi lidar com ela no perfil.

A autora saiu disso tudo com a certeza de que não havia nada de errado com o que desenhou (e tecnicamente, problema dela mesmo) e muita gente para passar a mão na sua cabeça dizendo que tudo não passou da sociedade opressora a odiando por ser transexual. Aposto que quando tudo passar, ela vai continuar fazendo a mesma coisa, agora com um grupo fiel de defensores e inimigos online. Pra ela, vai ser mais uma festa de polarização, que no final das contas acredito que seja um resultado aceitável. Infelizmente.

Em troca, temos o New Guy e talvez muita gente acordando para a natureza cínica e bélica da internet moderna. Vai bem uma meme bem intencionada, não?

Mas, a partir deste parágrafo, eu vou começar a chafurdar em uma realidade bem mais escrota que dá a sustentação para esses casos. Se quer terminar o texto numa nota positiva, melhor parar por aqui. Durante a discussão do quadrinho, ninguém estava focado no fato da autora ser transexual, até porque a maioria nem sabia, mas depois de saber disso, explica mais coisa do que gostaríamos. Como estou escrevendo para brasileiros, acho melhor estabelecer uma coisa: a imagem que temos de transexuais aqui não é a mesma coisa que nos Estados Unidos, por exemplo.

Eu tenho certeza que para a maioria dos brasileiros, transexuais são seres hipersexualizados, com peitos e bundas enormes, extremamente seguras de si e potencialmente até perigosas se você criar confusão com uma delas. Pelos exemplos que temos aqui, é normal imaginar uma pessoa extrovertida, descontraída e até mesmo espalhafatosa. É um preconceito, óbvio, mas considerando o que vemos por aí, com uma boa base na realidade. Transexual brasileira é um ser da realidade, do concreto. Se quer ser mulher, se enche de silicone e vai pra rua dar a cara a tapa (e outras coisas também, considerando a condição econômica terrível do brasileiro médio).

Pois bem, esqueçam essa imagem quando falamos de transexuais americanas, por exemplo. Ela não é um ser bronzeado orgulhoso dos seus grandes seios que te quebra no meio se você faltar com o respeito, costuma ser um nerd pálido que colocou um vestido e se entupiu de hormônios. E isso faz uma diferença gritante na cultura gerada ao redor delas. Você não imagina uma transexual brasileira amarga num quarto escuro com raiva do mundo, você imagina um “mulherão” que às vezes depende de um contato mais íntimo para descobrir o segredo. A transexual americana fica postando suas fotos online perguntando se passa por mulher e procurando briga na internet. A transexual americana trabalha no Google ou no Facebook de dia, ditando as regras de conduta do meio digital para todos nós. Ela parece ter muita raiva do mundo e seu amargor é parte integrante da personalidade.

E se você acha que eu estou batendo em transexuais, não é bem assim: estou batendo nos nerds. Porque antes da transição, quase sempre eram o mesmo tipo de homem “falho”, que não conseguia socializar e ficava o tempo todo na internet. Ninguém pega esse hábito depois de tomar hormônio, era algo que faziam antes da transição. Trocar de sexo não causa esses problemas de personalidade repugnante e incapacidade de lidar de forma saudável com outras pessoas, tanto que eu aposto que a maioria de vocês que só conhecia o conceito de transexual pelas brasileiras nem considerava essa conexão.

Mas é isso que acontece nos países mais civilizados atualmente: uma legião de “machos beta” trocando de sexo e carregando todos seus problemas junto com a transição. Fazem isso achando que vão se encontrar do outro lado, mas a maioria descobre que tem os mesmos problemas de antes, mas agora precisam se depilar todo dia… e não é que eu não sinta por eles, como o New Guy nos ensina, todo mundo tem seus problemas e é escroto não pensar no outro, mas acho que já passou da hora de falarmos uma verdade inconveniente: carregar esses nerds amargos é pesado demais para o movimento LGBT, e só LGBT mesmo, porque da metade do T pra frente, é SÓ nerd amargo com um vestido mesmo.

O comediante americano David Chapelle tem uma fala muito boa sobre a “turma do alfabeto”, dizendo que é como se estivessem todos indo juntos para o mesmo lugar num carro, mas que o “T” faz a viagem ficar mais longa. É o tipo de comentário perfeito de comediante: faz a gente pensar em algo que ninguém quer falar, mas todo mundo está sentindo. Eu mesmo já escrevi algumas vezes aqui que tem algo de errado do T pra frente e isso está complicando o processo todo, só não sabia onde estava o problema. Com essa história do New Guy, foi ficando mais claro.

Não sabia que a autora era trans, mas assim que a informação apareceu, parecia óbvio. Um cisne negro. Quem mais deixaria passar um quadrinho onde o vilão age como mocinho e a mocinha age como vilã? Só uma pessoa com um amargor tão internalizado ao ponto de ser invisível para a pessoa. Ela acha normal ser escrota com quem é diferente e acha que tem o direito de fazer isso porque seus problemas são maiores no final das contas. Ela é uma transexual de primeiro mundo. Pálida, solitária e ressentida.

E é aqui que eu acho que nós brasileiros temos uma informação que completa essa análise, uma que os americanos, por exemplo, não têm. Nós sabemos que transexuais não são sinônimo disso, porque transexuais aqui no Brasil agem de forma completamente diferente. Tanto que debaixo do seu nariz, eles estão muito mais integrados na sociedade do que por lá, não do ponto de vista de direitos e garantias legais, o que os de países mais civilizados têm muito mais, mas por terem um lugar na sociedade, mesmo que soterrado por preconceitos. Claro que podemos fazer melhor que uma esquina de noite, mas o brasileiro médio parece ter mais dificuldade de lidar com gays do que transexuais. O que é invertido nos países mais ricos.

E agora me parece claro que não tem a ver com as transexuais, mas sim com quem elas eram antes da transição. Por aqui, são pessoas que pulam de cabeça na piscina da sociedade, por lá, são aqueles que mal conseguem molhar os pés. Não é sobre quem você se torna depois da transição, é sobre o tipo de pessoa que você é. A epidemia de gente cada vez mais incapaz de lidar com a vida em sociedade é o pior dos problemas, alguns deles resolvem trocar de sexo.

E enquanto o resto de nós não souber como lidar com essa gente, a situação vai piorar. Curiosamente, a solução parece ser agir mais como o “vilão” New Guy e tentar entender e integrar mais esse gente que se exclui do mundo. O que com certeza não vai acontecer se continuarmos tratando tudo como uma guerrinha tribal. Não é sobre o sexo com o qual você se identifica, é sobre como você se integra ao resto do mundo, e gente amarga e solitária nunca vai conseguir fazer isso direito.

A autora não deveria ter dito “Hell, no!” para a amizade do New Guy, mas acho que ela não consegue perceber isso.

Para dizer que o texto tomou um rumo surpreendente, para dizer que é nerd solitário e amargo mas pelo menos não enche o saco dos outros, ou mesmo para dizer que até no desenho ela é desagradável: somir@desfavor.com

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Comments (11)

  • Nerds/Trans realmente nunca havia pensado por esse angulo. Perceber que mudar de gênero não conserta o que está errado internamente deve ampliar ainda mais os problemas, possivelmente dai vem o aumento do número de pessoas buscando reverter a transição.

  • “O brasileiro médio tem mais dificuldade de lidar com gays do que com transexuais.”

    Certo? Não, errado. Brasileiro médio no geral é tão inculto que confunde as bolas. Acha que a homossexualidade é o caminho para a bissexualidade e pra “transexualidade”, numa lógica que não tem lá tanto pé assim na realidade. E a reação dos grupos menos liberais no campo social tem muito a ver com isso.

  • Geraldo Renato da Silva

    De fato, a praga dos nossos dias se chama vitimismo. A pessoa tenta fazer uma coisa, não dá conta e culpa o mundo tudo pelo fato de “pertencer a um grupo historicamente desfavorecido”. E a Internet serve como válvula de escape para este tipo de gente.
    Enfim, o que me anima nessa história é que essas pessoas tendem a não se reproduzir e se a Teoria da Evolução agir corretamente, eles serão extintos, como os neardertais.

    • Vitimismo funciona muito bem quando é uma tática utilizada da forma adequada.
      Se fazer de vítima pode gerar empatia de outras pessoas e aí entra o velho ditado de “que não chora não mama”.

  • Levando em conta como homens brancos, especialmente os introvertidos, vêm sendo retratados e tratados mídia afora, é uma boa estratégia buscar algum título de minoria pra conseguir benefícios e imunidades. Isso até uma trans negra te chamar de opressora…

    Falando um pouco mais sério, a quantidade de adolescentes e jovens adultos de cabeça fraca assusta. Às vezes penso que o mal que big techs fazem pro mundo não compensa os benefícios. Na próxima década, quem vai estar no controle do mundo é esse povo que acha que histeria é coragem, que acha normal tratar pessoas feito merda por opiniões divergentes, pois é por um “bem maior”, incapazes de controlar seus instintos e vícios, capacidade que nos faz humanos. Aí ficam obesos, drogados, super sentimentais, personalidade resumida aos próprios genitais e a ídolos. Por outro lado, carecem do instinto de socialização básica. Piores que animais. Sementinhas do mal. Ainda veremos mais uma ou duas gerações bosta até as coisas se equilibrarem.

    • A taxa de fertilidade mundial não está caindo à toa… a natureza sabe se regular. Talvez tenhamos que recomeçar com os netos dos Mohammeds.

    • Tirar vantagem as custas de gente influenciável é um grande negócio, tanto que as big techs representam uma das principais facetas da profissionalização dos negócios baseados na internet.
      É tudo pelo lucro e se utilizar das fraquezas das pessoas mais jovens em busca de aceitação é o grande golpe aí.

  • O que vai acontecer (pelo menos o que aconteceria se fosse no Brasil, não sei como funciona nos outros países):
    -O meme vai cair no ostracismo e virar mais uma piada interna de chan
    -A fama dada para a autora da tira original vai dar a ela um espaço numa panelinha progressista monetizada (blog, Youtube, podcast, talvez até programa de entrevista na TV)
    -Autora é convidada pra um monte de eventos e collabs com outros autores/webfamosinhos e lucra
    -A narrativa é preservada
    -Criadores e disseminadores do meme continuam sendo uns fodidos que não podem se revelar pelo risco de exclusão social
    -Fim

    • Duvido que ela capitalize muito em cima disso, porque é puxado defendê-la pelo conteúdo que produz. Talvez como vítima em alguns artigos lacradores, mas mesmo esses andam cada vez menos lucrativos… o pêndulo não se importa com a gente, ele continua se mexendo.

      • Com o$ contato$ certo$, dá pra ir tapando o sol com a peneira.
        Mesmo com todas as baixarias, Neymar Jr continua numa posição de destaque do ponto de vista socioeconômico e talvez só depois de pendurar as chuteiras que ele sinta as dificuldades de manter as aparências.

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