FAQ: Coronavírus – 27

Quantas variantes já criamos? Com quais temos que nos preocupar mais?

Quando você fala “criamos”, eu imagino que esteja falando de toda a humanidade, não apenas do Brasil. Sabemos que já existem mais de 4.000 variantes para o coronavírus, entretanto, nem todas são preocupantes. Como já explicamos em outras postagens, é mais grave quando a mutação impede o corpo de reconhecer o vírus, o torna mais contagioso ou mais letal.

A variante mais falada atualmente é a indiana (o nome correto é B 1.617, sabemos que não é certo se referir à variante por nome de país, mas é a forma como todos a conhecem, por isso vamos chamá-la assim). Essa variante já tem inclusive subespécies: três versões identificadas até o momento: B.1.617.1, B.1.617.2 e B.1.617.3. Todas foram descobertas na Índia. A que desembarcou no Brasil, pelo Maranhão é a B1.617.2, mas certamente ela já está em muitos outros lugares do país.

Estão falando muito dela agora, mas ela não é uma novidade. Foi identificada pela primeira vez na Índia, em outubro no ano passado, ou seja, há mais de seis meses todos os países do mundo a conheciam e sabiam da possibilidade de contágio e, ainda assim, não adotaram as medidas necessárias para impedir que ela se espalhe. Em 10 de maio a OMS classificou essa variante oficialmente como “de preocupação global”, ou seja, com capacidade para fazer um estrago em todo o planeta.

Assim com a variante de Manaus (P1) e a do Reino Unido (B117), a da Índia também sofreu mutações na proteína que fica na superfície do vírus, responsável por se conectar aos receptores das células humanas, ou seja, na região “responsável por nos infectar”, com o perdão da simplificação.

Isso quer dizer que ela é mais eficiente no contágio. Como já falamos nesta coluna em edições passadas, não dá para colocar toda a culpa da catástrofe que está acontecendo na Índia na variante, pois outros fatores também contribuíram para o desastre que ocorre hoje na Índia (pobreza, eventos religiosos com aglomeração, hábitos pouco higiênicos, etc). Entretanto, é bastante provável que tenha poder para fazer mais estragos.

Mais de 40 países já confirmaram que a variante indiana está circulando em seu território, mas ainda é cedo para mensurar os reais efeitos dela. O que se sabe é que ela se dissemina mais rápido que as demais, mas falta averiguar se é mais letal e como reage a vacinas.

Também tem a variante Andina (C37), que recebeu esse nome por ter surgido em algum lugar entre o Peru e o Chile. Dessa vocês não devem escutar muito, pois ainda não parece ter chegado no Brasil. Ela também tem mutações que a tornam mais transmissível, entretanto, ainda não se sabe se é mais letal. É questão de tempo até ela chegar ao Brasil (se é que ainda não chegou), então, relaxem que em breve vocês escutarão falar dela.

Um adendo que já falamos em outros textos, mas vale repetir: a menos que um país seja muito civilizado e organizado, qualquer variante mais transmissível acaba sendo mais letal, pois faz colapsar o sistema de saúde e, quando isso acontece, morre mais gente: por falta de atendimento, por atendimento precário, por falta de oxigênio, por falta de respirador. Então, “a nível Brasil”, qualquer variante mais transmissível será mais letal.

Sobre a mais preocupante, no momento, segundo a OMS, é a da África do Sul, pois é a única que mostrou uma capacidade de, em algum grau, escapar de algumas vacinas. A questão ainda não está totalmente esclarecida, pois como falamos em uma coluna anterior, há outros fatores que podem contribuir para que vacinas não sejam tão eficientes no continente africano (alta incidência de HIV, má nutrição e outros).

Mas, se você quer saber qual é a variante que vai predominar, não sabemos, mas é uma questão de tempo até saber. O que veremos agora é uma rinha de variantes. O Brasil começa a sediar uma Copa do Mundo de variantes: cada continente envia a suas e ocorrerá uma disputa entre elas em território brasileiro. A que prevalecer é a mais forte e provavelmente a mais perigosa. E, pela postura do Brasil, é provável que essa pior de todas ainda sofra uma mutação em território nacional, ficando pior ainda.

A sorte é ainda não ter surgido uma variante que escape 100% às vacinas ou que seja significativamente mais letal. Mas pode acontecer. É hora do Brasil começar a levar a sério a necessidade de barreiras sanitárias e de controlar de forma rigorosa quais variantes entram, tentando impedir que elas se espalhem. Mas o Brasil não consegue evitar nem que seu povo crie variantes (de Manaus, do Rio de Janeiro, de São Paulo…) imagina controlar as de fora… Oremos.


Criança pode usar máscara PFF2? Meu filho não quer usar

Se você não sabe o que é PFF2, tem explicação detalhada aqui.

Após os dois anos de idade, as crianças já podem usar máscaras, inclusive a PFF2. Antes disso não é recomendado, pois há risco de sufocamento. Seu filho não quer usar? Faça ele usar. Criança, maluco e bêbado não tem querer, pois eles não sabem o que é melhor para eles. Sua função de pai/mãe é justamente essa: obrigar a criança a fazer o que é melhor para ela. Boa sorte.

Até onde eu sei, ainda não muitos modelos infantis equivalentes à PFF2 à venda (conheço apenas o da marca Ekomascaras), mas normalmente, se você comprar um modelo compatível com um rosto pequeno para um adulto, ela se adapta muito bem ao rosto da criança, já que o elástico é feito para ser bem apertado. Lembrando sempre que é importante, ainda mais quando se fala em crianças, de prender o elástico na parte de trás da cabeça (não atrás da orelha), assim a máscara fica mais firme e não sai ou se desloca com facilidade.

É mais difícil respirar com PFF2? Sim, justamente por ela ser muito filtrante. Mas uma criança consegue respirar perfeitamente com ela. Vai gostar? Não, não vai gostar, mas tem que usar mesmo assim. Nem nós, que somos adultos, gostamos de usar esse tipo de máscara. Não é agradável, mas é melhor do que ficar doente.

Também é importante lembrar que não basta colocar a máscara e dar a criança como protegida. A criança deve ser instruída e constantemente vigiada para não tocar na máscara nem levar os dedos à boca, a máscara precisa ser trocada a cada 4 horas ou cada vez que ficar suja ou molhada.

Outro fator importante: o coronavírus não entra apenas pelo nariz e boca, de nada adianta uma criança com máscara PFF2 que coça o olho. Por isso, pensem dez vezes antes de mandar seus filhos para a escola, pois é humanamente impossível que uma professora com várias crianças impeça todas de colocar o dedo no olho. Mas você pode. Não deixe seu filho meter o dedo no olho, por gentileza.


Vacinas contra covid vão causar a extinção dos tubarões?

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Tive que pesquisar bastante para entender de onde veio essa ligação improvável de vacinas e tubarões, mas entendi. Não, vacinas contra covid não vão causar a extinção dos tubarões.

Essa ideia deve ter surgido pelo fato das vacinas contra o coronavírus usarem uma substância extraída do fígado de tubarões (papo técnico: esqualeno) na sua composição.

Na verdade, várias vacinas, usam esqualeno em sua composição, como adjuvante: uma substância que aumenta a resposta imunológica do organismo, tornando mais provável que o corpo ataque o vírus e, portanto, que passe a reconhece-lo como inimigo.

Cada dose de vacina contra o coronavírus contém aproximadamente 10 miligramas de esqualeno, então, se a gente for pensar em oito bilhões de doses (até mais, pois várias vacinas demandam duas doses), seria necessária uma quantidade realmente grande, que demandaria muitos tubarões.

Mas, felizmente, o esqualeno pode ser sintetizado em laboratório ou extraído de plantas, então, os tubarões podem respirar em paz, pois é muito mais fácil obter essa substância das outras duas formas. Ninguém em sã consciência vai ficar caçando tubarões para fazer vacina.


Se meus pais adoecerem, eu não vou sair de casa e deixar eles sozinhos. Qual é a forma mais segura de cuidar deles se ficarem doentes e não precisarem de internação hospitalar?

Você veio ao lugar certo. Normalmente você seria orientada a ficar na casa de outra pessoa ou em um hotel. Eu também não deixaria, entendo perfeitamente como você se sente. Por isso, eu vou te falar o que eu faria, com a ressalva de que o que eu faria não é o indicado, ok?

A recomendação (e eu tenho a obrigação de te alertar sobre o que se deve fazer, oficialmente) é que a pessoa doente fique isolada, sem contato com outras pessoas, mas nem fodendo que alguém me tiraria de perto, então, aqui vão dicas para que isso seja feito da forma mais segura possível, porém com a advertência de que existem grandes chances de que você acabe com covid também.

Primeira providência: se uma pessoa que você ama estiver com covid, mande as outras pessoas que você ama e não foram contaminadas para outro lugar (casa de amigos, parentes, hotel) e fique apenas você cuidando do doente. Não há necessidade de todo mundo se arriscar. Mata no peito sozinho(a) e vamos em frente.

É indicado fazer um teste confiável, um PCR. Só ele pode dizer se a pessoa está com coronavírus ou não. Pode ser que seja qualquer outro problema respiratório (sobretudo se for inverno) e, nesse caso, você pode tomar providências mais simples, sem sujeitar a pessoa doente a tantas restrições. Mas, enquanto não tiver o resultado do PCR, comporte-se como se a pessoa estivesse com covid. Se não puder fazer um PCR, comporte-se como se a pessoa tivesse covid.

Se de fato a doença se confirmar, a primeira providência é confinar a pessoa em um quarto dentro da casa. A barreira física das paredes é sua aliada. A pessoa doente em um cômodo, você no outro. Se a pessoa doente puder ter um banheiro só para ela, melhor. Se o banheiro ficar dentro do quarto, melhor ainda. Então, se por um acaso houver uma suíte onde você mora, desloque a pessoa doente para lá.

Se o paciente ficar confinado em um quarto e você ficar afastada, nenhum dos dois precisa usar máscara dentro de casa, a menos que, por algum motivo, precisem quebrar essa barreira de isolamento. Se a pessoa precisar de algo (água, comida, remédio) deixe na porta do quarto dela (colocando uma máscara para isso), retire-se, e só depois a pessoa abre a porta (também usando máscara) e pega.

O mesmo vale se a pessoa precisar sair do quarto para ir ao banheiro ou por qualquer outro motivo. Abriu-se a porta, todo mundo com máscara. E, se for uma casa com um único ambiente, máscara PFF2 em ambos o tempo todo e a maior distância física possível. Lembrando que a máscara deve ser trocada a cada oito horas ou quando ficar molhada ou suja.

Todas as janelas da casa devem estar o mais abertas possível (obviamente, o quanto se pode abrir vai depender do frio) para que ela ventile as 24h do dia. Quanto mais janelas abertas por mais tempo, menores as chances de contágio. Tente não fechar as janelas, nem mesmo para dormir.

A limpeza de roupa de cama, toalhas e roupas pode ser feita normalmente, com sabão em pó. Não há necessidade de ferver, jogar álcool ou água sanitária. O único cuidado é não ficar sacudindo os tecidos sujos, pois isso pode jogar eventuais coroninhas no ar e fazer com que você os inale e adoeça.

Recolha a roupa suja em saquinho plástico, deixada pelo doente na porta do quarto, usando luva e máscara. Coloque na máquina de lavar ou na água de imediato, sem sacudir, sem chacoalhar e lavando muito bem as mãos depois.

Se o banheiro for compartilhado, a cada usada deve ser limpo pela pessoa que o usou, desinfectando não apenas os lugares onde a pessoa encostou, como também as maçanetas da porta, do lado de dentro e fora. Se a pessoa doente não tiver condições de fazê-lo, você vai ter que fazer: janelas abertas, luva, máscara e tarefa executada o mais rápido que você puder. Depois de cada limpeza, lavar você, os panos, esponjas ou o que mais for usado com água e sabão.

Não compartilhe nada em uso com a pessoa doente: toalha, talheres, copos…nada. A pessoa come com seus talheres, você come com os seus. Depois que todos comerem e os talheres estiverem muito bem lavados com água e detergente, podem ser guardados juntos. E o ideal é que a pessoa doente não cozinhe, pois o risco de contaminação é enorme. Se for o caso de você não cozinhar, peçam para algum amigo ou parente trazer a comida (sem entrar, deixando sempre na porta da casa, do lado de fora).

Caso você precise entrar no quarto onde a pessoa está para ajudar com alguma coisa, aqui vão alguns conselhos: todas as janelas abertas, máscara bem firme no rosto, evite se aproximar ou tocar na pessoa se não for indispensável, se possível, que a pessoa evite de falar (espalha gotículas contaminadas) e, assim que sair do quarto, tire as roupas, coloque-as para lavar, lave muito bem as mãos e qualquer parte do corpo que tenha entrado em contato com a pessoa doente. Eu tomaria um banho bem ensaboado.

Se for necessário levar a pessoa a um hospital (se puder, acompanhe a oxigenação da pessoa com um oxímetro), o que na maior parte das vezes acontece por dificuldade em respirar, não use transporte público. Solicite uma ambulância para fazer o transporte, pois além de ser a forma mais segura ainda podem prestar socorros imediatos.

O isolamento e os cuidados devem durar, pelo menos, 14 dias. A pessoa doente deve ser testada para saber se ainda está com o vírus antes de retomar sua vida normal e você, que cuidou do doente, também.

Para agradecer pela boa vontade mas dizer que prefere textos engraçados, para dizer que você também ficaria para cuidar dos seus pais doentes ou ainda para dizer que em compensação espera um texto bem leve do Somir amanhã: sally@desfavor.com

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Comments (6)

  • Vc que mora em país de 1 mundo ainda não se vacinou não? Ou se vacinou e ainda tá no fica em casa. A minha avó já to.ou as 2 doses, depois fez exame tá com anticorpos certinho! Desse mal a velha não padece. Eu 15 depois de tomar minha 2 dose, ninguém me segura de ir bundear por aí.

    • Quem foi que te disse que eu moro em um país de primeiro mundo?
      Tudo bem que não morar no Brasil é um benefício, mas eu não estou no topo da civilização não, tá?
      E outra: tem muito país de primeiro mundo que está tendo dificuldades em vacinar, como o Canadá, por exemplo.

      Sobre bundear por aí: não faça. Mesmo vacinado você se contamina com o corona (pode não sentir os sintomas mas pega a doença) e pode infectar outras pessoas que não estão vacinadas ou que não podem se vacinar.

  • Por que a Anvisa tá nhenhetando pra aprovar a Sputnik V, se um estudo feito na Argentina mostrou que ela acaba com as variantes brasileiras? Não seria justamente a melhor pra vir pra cá?

    • Já fizemos uma postagem só sobre a polêmica da ANVISA com a Sputnik: http://www.desfavor.com/blog/2021/05/faq-coronavirus-24-sputnik-v/

      Entre outros problemas, o laboratório que a fabrica não fornece as informações que a ANVISA pede, nem autoriza inspeções a todas as suas fábricas. Não só a Argentina, como mais de 60 países já aprovaram essa vacina, mas, dentro dos critérios técnicos da ANVISA, ela não preenche os requisitos para aprovação.

  • Dessa da improvável relação entre vacinas e tubarões eu não sabia. E gostei muito da forma didática com que você explicou como agir de forma minimamente segura caso seja necessário cuidar de uma pessoa com covid em casa, Sally.

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