Skip to main content

Colunas

Arquivos

País do futebol?

País do futebol?

| Sally | | 48 comentários em País do futebol?

Brasil não é mais o país do futebol. Acredito que depois desse vexame na Copa América, isso esteja consolidado. Ninguém mais duvida que o futebol nacional decaiu de forma irrecuperável e foi contaminado por uma série de venenos que o tirou de cena, de forma vergonhosa.

Fato: não é de hoje que a Seleção Brasileira dá vexames históricos. O 7 x 1 deixou de ser um placar para ser um simbolismo, um sentimento, uma síntese do atual futebol e um resumo do Brasil. Desde o ano passado que eu me apego ao bordão “7 x 1 foi pouco”. Isso resume tudo que sinto não apenas pelo futebol brasileiro, como por muitas outras coisas deste país. Uma humilhação pública, uma exposição ao mundo da incompetência, da arrogância de achar que o jeitinho ou um milagre vão resolver.

7 x 1 é um tapa na cara de quem pensa que na hora vai dar um jeito, que na hora vai resolver, que se tiver muita força de vontade ou fé vai conseguir. Gente que pensa que amor verdadeiro faz surgir um milagre e tudo vai ficar bem. Enquanto os macaquitos sambam, batucam e rezam, os outros se preparam de verdade, adquirem técnica e informação e dão um baile. Vergonha mundial após vergonha mundial, o Brasil parece ter entrado nessa espiral de vexame e não demonstra intenção de sair dela.

Daí eu te pergunto: uma das únicas coisas que o brasileiro tinha para se orgulhar foi tirada. Existem outras, mas nenhuma inerente às suas habilidades.

Sim, existem praias, que já estavam aqui quando o Brasil foi descoberto e em nada são mérito do brasileiro. Praias que eles adoram exaltar como “as mais bonitas do mundo”, coisa de quem claramente não conhece o mundo. Belezas naturais no geral, clima e outros atributos sem mérito são o que restou. Isso gera um problema.

Um povo com uma autoestima tão baixa, tão vira-lata e complexado não vai lidar bem com isso. O brasileiro PRECISA encontrar um substituto para o futebol. Talvez não tenham percebido isso, pois estamos no meio desse processo de transição, mas eu garanto que os little monkeys vão fazer essa transição, mesmo que sem se dar conta.

O brasileiro não vive sem uma bandeira para ostentar, sem um motivo (errado) para se orgulhar. Ele precisa se sentir o melhor em algo, e como não tem méritos pessoais para isso, desloca para o coletivo. Ele precisa se sentir especial, ter algo grupal, enquanto nação, para mostrar. Isso lhe permite esquecer seu emprego de merda, seu relacionamento de merda, seu salário de merda e se sentir superior em algum momento.

Existiram tempos onde religião supria isso. Havia “a religião correta”, o catolicismo. Quem queria ser de uma “elite” era católico, o resto eram desgarrados marginalizados. Quem queria ter uma pertinência e ostentar podia frequentar o clube caro da cidade ou ter um carro da moda. Hoje tudo isso se diluiu. O grande motivo de ostentação que une esse povo feio e oleoso durante muitas décadas foi o ser brasileiro, com muito orgulho, com muito amor, em dia de jogo.

Já tentaram deslocar isso para o MMA, mas lá também teve 7 x 1. Anderson Silva começou a protagonizar uma série de vexames, desde derrota por excesso de arrogância até ser punido pelo uso de anabolizantes. Não só ele, como outros lutadores andaram levando um pau. Não deu para deslocar o “orgulho nacional” para o MMA. Também não há condições de fazê-lo na Fórmula 1. Tá difícil de conseguir “heróis” com esse bando de amadores que se acham fodões o suficiente para derrotar o mundo todo sem muito esforço e estudo.

Alguém vai preencher esse espaço. É questão de tempo. Por um mero exercício mental, estou tentando antever quem será. E os convido para fazer esse exercício comigo. O Brasileiro Médio é tão previsível… não duvido nada que acertemos.

O ideal, claro, seria que com esse vazio, as pessoas percebam que não precisam disso e rompam com esse hábito. Vai acontecer? Não, não vai acontecer, porque assim como crianças que não estão prontas para largar as fraldas ou a chupeta, o brasileiro ainda não consegue viver sem um pseudo-mérito coletivo qualquer. Seriam obrigados a olhar para si e vislumbrar toda sua danação sem ter uma mísera peneira para tapar o sol. Não aguentam.

Uma das minhas apostas é um esporte olímpico onde eventualmente algum brasileiro dê sorte e consiga uma colocação razoável. Ano que vem tem olimpíadas, algum modismo vai sair daí. Não pode ser nada caro de praticar, caso contrário não viraliza. Algo que possa ser praticado nas esquinas, de preferência em grupo. Talvez corrida. Algo que seria um fogo de palha olímpico, mas que vai acabar ficando por causa desse espaço que se abriu com a morte do futebol brasileiro.

Já falamos sobre isso antes: no quesito fanatismo e rivalidade, quem tomou o lugar desse futebol paumolenga foi a política. Vimos isso claramente nas últimas eleições: Lado A e Lado B brigando como torcedores de um time de futebol. O orgulho não foi canalizado para a política, porque né, também é vergonha atrás de vergonha. Esse lugar ainda está vago.

Poderia passar muitos parágrafos especulando sobre o que ocupará o lugar do futebol, mas não importa o que seja, as coisas mudarão gradualmente até o povo estar totalmente tomado pelo orgulho coletivo de ser o melhor em algo ridículo que não acrescenta em nada à humanidade. E vão continuar comemorando a coisa errada, farelos, sem se darem conta disso. As pessoas querem qualquer bosta para se orgulhar, assim como gente carente quer qualquer bosta de pessoa para amar: uma mera desculpa para canalizar um sentimento do qual precisam.

Pescando o mecanismo de funcionamento a gente consegue desvendar qualquer armadilha hipócrita que esse povo esteja armando para si mesmo. Não apenas vamos escapar dessa armadilha como também vamos saber argumentar com propriedade.

Vejo muitas pessoas atacando atitudes equivocadas pelos motivos errados. A pessoa compreende que tem algo ali que não encaixa, mas não consegue organizar os pensamento e apontar a razão da reprovação. Falta um elo de ligação entre o que está errado e o motivo. A tentativa de argumentar ou criticar acabaquebrada ao meio pela inconsistência dos argumentos, mesmo que no mérito pessoa esteja certa.

Por isso foquem no mecanismo: brasileiro precisa de algo para se orgulhar. Qualquer merda onde sejam ou se achem os melhores, como coletividade. Daí nascerão todas as aberrações que estão por vir, até que uma emplaque, até que uma se encaixe nessa neurose coletiva. É nesse mecanismo que temos que ficar de olho. Quando se é tão fodido que se sentir especial é uma necessidade, todo cuidado é pouco.

E já que estamos falando em cuidado, cuidado também para não repetir isso, em escala menor, no dia a dia. Cuidado para não precisar se sentir especial, para não precisar dessa sensação de pertinência a um grupinho qualquer, a uma elite, para se valorizar. Essa é a chave para religiões, modismos de consumo, publicitários demoníacos e outras pragas te manipularem. Só precisa se sentir especial quem não o é. Reflitam.

Para chutar quem vai preencher esse buraco deixado pela seleção brasileira, para exigir informações sobre o Alicate ou ainda para reclamar que não foi um Processa Eu: sally@desfavor.com


Comments (48)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Relatório de erros de ortografia

O texto a seguir será enviado para nossos editores: