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CBM: Paredão Metralhadora

CBM: Paredão Metralhadora

| Sally | | 64 comentários em CBM: Paredão Metralhadora

Todo carnaval uma música odiosa desponta e é tocada incessantemente por todo o país. Geralmente um axé de rima pobre e duplo sentido, com melodia fácil, daquelas que gruda na cabeça. Se fosse possível combater essa teratologia musical, certamente eu ignoraria o assunto e deixaria essa excrescência morrer na escuridão, de onde nunca deveria ter saído. Mas, infelizmente, no Brasil o carnaval vai até você: blocos, trios, vizinhos, festas e muitos outros meios de propagação desses aterros sanitários musicais promovem um estupro auditivo te forçam a escutar música merda.

Bem, se não pode vencê-los, ao menos deboche deles. Eu lhes apresento a música que vai paunocuzar o carnaval de todos nós e aproveito para tecer algumas considerações sobre ela. Talvez, quem sabe, quando ela estiver sendo reproduzida incessantemente estuprando seus ouvidos, você se lembre das belas palavras proferidas neste texto e consiga rir por um instante dessa desgraça. Não custa tentar.

O estume da vez é uma música chamada “Paredão Metralhadora”, cantada por algo conhecido como banda Vingadora. O ritmo é “arrochadeira”, uma mistura do arrocha (Pablo, aquele que diz que homem não chora) com a música baiana comum e um violino no meio para tentar dar um ar chique. Evidentemente falhou. Um porco com um terno Armani ainda é um porco.

A vocalista da banda se chama Tays, com y. Nunca ouviu falar na banda? Imagina, um sucesso. Tem até DVD gravado em… Imbicuí, na Bahia. Entendo que você não queira passar por isso, mas, confie em mim, você vai acabar ouvindo essa merda mais cedo ou mais tarde, que ao menos seja com alguém que partilha do seu sentimento comentando…


O clipe já começa com a inadequação de pessoas se preparando para uma guerra, saindo com cara pintada, roupa camuflada, de dentro de um barracão. Sai um elemento com franja emo, mas em vez de uma arma ele tem um… violino. Deixa o Estado Islâmico descobrir o poder bélico do violino para vocês verem o que é bom. No dia em que perceberem que tocando essa merda todo mundo vai embora da sua terra prometida, aposentam a AK-47.

Uma moça com cara de cavalo passa uma pintura supostamente para se camuflar no rosto. Não dá para deixar de reparar no topete mal feito. Não custava nada passar um pente fino para nivelar o cabelo depois de ter jogado o laquê. E vou logo avisando que a música tem apenas DEZ frases.

Isso mesmo. São três minutos de clipe repetindo apenas dez frases. Eu disse frases? Na verdade, são meras junções de palavras, nem verbo tem em algumas linhas. Nem verbo nem sentido: “Paredão zangado, grave tá batendo, médio tá no talo, corneta tá doendo”. Parece aquelas obras de arte que eu nunca consigo compreender nem apreciar feitas por malucos de hospício.

A parte seguinte eu entendi, até porque, como toda música baiana, tem aquela mimicaeróbica: coreografia que se limita a descrever o que está sendo dito na música, que no caso é “Pega a metralhadora: tratratra, as que comandam vão notra”. A moça com cara de cavalo simula estar dando tiros de metralhadora com os dedos enquanto o ruído de balas sendo disparadas é ouvido no meio da música. É bacana pois essa música me faz sentir em casa onde quer que eu esteja, levando um pouco do Rio de Janeiro a quem quer que a escute.

Claro, se fosse um humorista polêmico a fazer algum vídeo com um conteúdo similar (não com música, mas com piada), viria o Ministério Público em cima por incitação à violência. Todo mundo criticaria a tamanha falta de sensibilidade de, neste contexto mundial, estar retratando como algo bonito ou com algum glamour tiros de arma de fogo e uma metralhadora. Mas, como é axé e manifestação de minoria não pode ser jamais criticada para não ser interpretado como racismo e preconceito, podem fazer suas metralhadoras com o dedinho que tá liberado.

Já tem criança fazendo. Não bastava o axé sexualizar precocemente as crianças, agora também vai introduzir o culto às armas de fogo junto: atira e rebola, atira e rebola. Meus parabéns aos que tiveram coragem de ter filho morando no Brasil, vocês tem a tarefa hercúlea de tentar criar essas crianças com dignidade. Boa sorte. Boa sorte também para explicar os horrores da guerra nesse contexto.

Então, recapitulando: atira + rebola, atira + rebola. Depois dá meia dúzia de pulinhos com deslocamento e mais rebolado ao som da última frase da música: “As que comandam vão no tra… tra… tra”. Ou seja, quem é bacanão, quem tá no poder, quem comanda, o faz atirando uma metralhadora (e rebolando). Se você é alguém na fila do pão, vai notra. Se você tem alguma relevância, vai notra. Na boa? Em tempo de guerras e refugiados seria mais digno se esse “tra” fosse um peido e não um tiro.

Se eu te disser que a letra acabou, você acredita? Ainda faltam dois minutos de clipe e a letra já acabou, sofrendo apenas pequenas variações ao longo da música. “Jacaré Iemanja, repete mais 69 vezes para acabar…”. A letra acabou, mas infelizmente o clipe segue.

Um conjunto de mulheres daquele tipo cujo rosto não compensa o corpo continuam atirando e rebolando enquanto um sujeito olha de longe com um binóculos. Esse sujeito ganha minha total simpatia quando, aos 55s de clipe faz cara de nojo depois de ver essas mulheres. Gostaria de convidá-lo a frequentar o Desfavor. Pessoa de bom gosto.

Aos poucos, mais pessoas de bem se aproximam das mulheres-traveco que comandam e vão notra. Tenho a impressão que eles estão armados e torço para que fuzilem cada uma delas. Um tiro no rosto seria bom, pois é sempre um alívio não ter que olhar para feiura e vulgaridade, mas na verdade, na verdade verdadeira, por mim poderia ser um tiro em cada joelho, que é para doer bastante e nunca mais conseguirem reproduzir esses movimentos hediondos.

Infelizmente os sujeitos que eu pensei serem pessoas de bem não estão armados. Estão com instrumentos musicais. A vida é cheia de decepções. Um elemento se levanta com um uma Keytar. Parece mais uma versão terrorista do Alan do Polegar. Eu não subo em um avião se esse sujeito estiver do lado de dentro. Em um twist digno de drogado, a Keytar lança uns raios circulares contra as barangas, que se esquivam na versão mais pobre, deprimente e roceira de Matrix que eu já vi. Nesse ponto, um único olho meu latejava de raiva. Mas prossegui.

Depois, óbvio, elas começam a arrochar: 180° +180° + 360° com o quadril. Não entendeu? Parecem um Lango-Lango levando um choque. O Fulano com o violino é colocado em destaque. Não dura muito, rapidamente os falsetes dignos de Mc Melody (se não sabem quem é, mantenha-se puro e não procure saber) de Tays tomam conta da cena novamente e em poucos segundos ela já está metralhando novamente.Me entristece saber que as pessoas vão fazer isso indiscriminadamente pelas ruas, pelo trabalho ou onde mais estiverem. Os que não comandam vão no tra durante todo o verão para tentar parecer que comandam.

Um grupo de mulheres se aproxima e joga uma suposta bomba nos homens que combatiam as Vingadoras com instrumentos musicais. Menção honrosa para a unha de acrigel mal feita que liga a bomba antes de atirar. Mas os rapazes se recuperam e continuam combatendo a música-lixo. Desta vez pegam uma caixa de som e direcionam as ondas sonoras para as Vingadoras. Aí chega aquela parte que eu adoro: os defeitos especiais dos clipes de pobre. Vejam por vocês mesmos. Chaves feelings.

Tays pede reforços e chega uma caixa de som maior ainda para impor sua música a todos. Essa parte é realista: pobre tem sempre o melhor aparelho de som de todos. Podem comer merda, miojo com salsicha o mês todo, mas o som custa mais do que o carro. Ao que tudo indica, as Vingadoras conseguem aprisionar os homens. Muito apropriado falar de prisioneiros de guerra acorrentados no atual contexto. Tão de parabéns. E também estão de parabéns por conseguir me fazer torcer para homem conseguir enfiar muita, mas muita porrada em mulher.

Escravizados, barbarizados e humilhados, os prisioneiros de guerra são obrigados a fazer a coreografia ridícula. E você achando que as torturas do Estado Islâmico eram cruéis… Enquanto os rapazes executam a coreografia acorrentados pelo pescoço, Tays segura as correntes. Toda mulher sacaneada por homem e ressentida vai ao delírio ao ver isso e vai se realizar vendo esse clipe. Isso deveria se chamar “gozar com a buceta alheia”. Que triste. Sinal de estar muito mal resolvida, de ser muito saco de pancada de homem, de ser bem histérica se alegrar em ver homens acorrentados sendo torturados dessa forma humilhante e cruel. Por mais mal que um homem tenha me feito, não desejo a obrigação de dançar Paredão Metralhadora a ninguém. Há limites.

Preparem-se, porque neste verão “as que comandam vão no tra”. Você vai ver e ouvir muitas pessoas metralhando e rebolando como se fosse status, como se fosse algo bonito, como se fosse cool. Faça as pazes com isso, pois vomitar em público é constrangedor.

Para se revoltar e desabafar nos comentários sem medo de ser recriminado, para frisar que pobre é uma desgraça ou ainda para dizer que prefere Tom Produções: sally@desfavor.com


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