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Marcha “nazista”.

Marcha “nazista”.

| Sally | | 29 comentários em Marcha “nazista”.

Muito se falou de uma marcha “nazista” realizada na Virgínia, nos EUA. Quando vemos a notícia apresentada desta forma, dois desfavores enormes acontecem: 1) você é induzido a erro e 2) glorificamos um grupo medíocre que merece morrer na escuridão.

Um breve resumo do que originou a manifestação: na cidade de Charlottesville existe um parque, no centro da cidade, onde há uma estátua de um general chamado Robert E. Lee. Robert ganhou uma estátua por ter lutado pela independência dos Estados Confederados, no sul do país, durante a Guerra Civil americana. Diversos generais com o mesmo feito tem estátuas espalhadas por todos o país. Porém, parece que o fato de Robert ter lutado contra a abolição da escravatura estava causando algum desconforto e foi decidido remover sua estátua.

Membros da chamada “extrema direita” se reuniram e saíram para protestar contra a remoção desta estátua. O protesto foi descrito como “nazista” e pregando “supremacia branca”. Em fotos, é possível ver cartazes com dizerem “Vidas brancas importam”, em uma alusão aos protestos realizados por negros, com cartazes “Vidas negras importam”. Até aí, me desculpem, mas vidas brancas importam sim, assim como negas, azuis, amarelas ou vermelhas. Vidas humanas importam e se negros podem andar com cartazes (e até pichar ruas e monumentos) com a frase “Vidas negras importam”, brancos também podem. Particularmente acho feia essa distinção de raças, mas, no caso, ambos os lados estão sendo antipáticos.

O que a imprensa vendeu foi: “Marcha Nazista”. Você chegou a assistir aos vídeos? Se garimparmos até a fonte primária desta manchete, chegamos à BBC, que, em sua notícia original, diz “um homem que participava do ato chegou a gritar ‘sim, eu sou nazista’ “. Um homem. UM HOMEM. Não custa lembrar que na marcha contra a corrupção aqui no Brasil tinha uma meia dúzia de gatos pingados pedindo loucuras como volta da monarquia ou volta da ditadura militar. Maluco tem sempre, em qualquer lugar. Considerando os vexames que a imprensa vem protagonizando, isso, no mínimo, me deixou de orelha em pé. Mas, ok, não estávamos lá, não podemos saber se nazistas eram maioria ou não. Então, vamos supor que de fato todos os que estavam lá são nazistas, estavam pregando a superioridade da raça branca e estavam propagando a intolerância contra negros, gays, judeus e etc.

Ainda assim, ainda que estejam pregando a coisa mais errada do mundo, as pessoas tem direito a opinião e a manifestar sua opinião, principalmente nos EUA, onde a liberdade de expressão é muito bem assegurada pela lei e um dos pilares do país. Então, não faz sentido, principalmente em um país onde uma associação de pedófilos (NAMBLA) tem permitido um site, querer calar a boca de alguém que você discorda. O desprezo é silencioso, qualquer outro ato deixa de ser desprezo e, por mais que esteja revestido de repúdio, acaba virando marketing e divulgação gratuita nos dias de hoje. Imbecilidade se combate com instrução e informação, não com resistência e agressividade.

Então, por mais que você despreze o mérito da manifestação, ele tem, perante a lei americana, o sagrado direito de estar ali. “Ah, mas eu não concordo”. Pega sua brasilidade nagô e enfia bunda acima, pois esse conceito de “não concordar” com lei só existe aqui, nesta República das Bananas. Lei é lei, é um direito que o Estado conferiu a estas pessoas e no dia em que começarmos a suprimir um direito conferido a todos porque Vossa Majestade Você não concorda, o mundo vai virar uma merda. A manifestação só se tornou ilegal quando se tornou violenta e… adivinha se foram os nazistas que jogaram a primeira pedra?

Um grupo de discordantes tentou fazer uma parede humana, impedindo que os manifestantes cheguem a seu destino. Pra que? Pra queeee? Deixa o coleguinha falar merda, deixa o coleguinha fazer merda, o preço de poder falar o que quer é que todos, inclusive os ignorantes e os filhos da puta, também possam falar o que querem. Se alguém impedisse uma marcha gay ou de negros, o mundo todo cairia de pau. Por qual motivo uma causa é mais válida do que a outra? Certamente não é pela sua opinião ou pela minha. Em uma sociedade democrática, todos tem o direito de se expressar, inclusive os idiotas.

Mas parece que não. Além de tentar impedir, também tomaram atitudes mais enérgicas, como jogar spray de pimenta nos manifestantes. Grupos rivais partiram para o confronto e teve pancadaria com barra de ferro, pedaços de madeira e outros objetos. Se você entende que aquela manifestação é ilegal, chame a polícia. Pegar um spray de pimenta e fazer justiça com as próprias mãos ou uma barra de ferro e ir bater nas pessoas te faz tão errado e intolerante quanto elas.

Um dos organizadores da marcha disse que o objetivo é defender direitos dos brancos e lutar contra a censura, o revisionismo e a favor da liberdade de expressão. Olha, não vejo nada de mais neste discurso, mas, novamente, ainda que fosse algo totalmente reprovável, não se bate palma para maluco dançar, se o sujeito está falando besteira, deixe-o morrer na escuridão em vez de dar fama e notoriedade para suas bobagens.

Agora o mundo todo está falando na “Marcha Nazista”. Começam a surgir versões de que pessoas faziam gestos nazistas, levavam suásticas, gritavam contra gays, negros e judeus. Uma aparição text book de nazismo foi instituída. Sabe qual é o problema de divulgar idiotas? Chamar de outros idiotas, que acabam se unindo à causa. Adivinha se não teve aumento de busca por sites nazistas, adesão a grupos extremistas e outros movimentos neste sentido? Parabéns, apontaram uma seta para onde todos os malucos desajustados e preconceituosos do mundo podem se encontrar e se reunir.

A imprensa noticiou as brigas que ocorreram como “manifestantes nazistas em embate com pessoas que eram contra essa manifestação”. O conceito de ser contra o nazismo eu conheço e pratico, mas… ser contra manifestação por discordar do que ela prega? Isso felizmente ainda me choca. Posso criticar uma manifestação por achar que não seja um meio eficiente, mas existe um mundo de diferença entre ser contra o que grupo prega e ser contra que esse grupo possa falar, reivindicar e se manifestar.

Quando pessoas tentam calar um grupo, passa a impressão de que este grupo tem força: “rápido, vamos silenciá-los, se não este pensamento vai se espalhar”. Pensamento não é vírus, pensamento não se espalha pelo ar. Pessoas instruídas, educadas, esclarecidas, não se tornam nazistas. Pessoas toscas, sem instrução e ignorantes se tornam nazistas ao simples acessar um site, nem precisa de manifestantes. Então, não há relação direta entre uma manifestação (principalmente em uma cidade de 50 mil habitantes) e adesão massiva a nazismo. A menos, é claro, que imbecilóides façam repercutir isso pelo mundo, dando um status de concerto de rock ao evento. Parabéns aos envolvidos.

Então, não tem “lado certo” nessa história. Independente de ser contra nazismo, ser contra que pessoas expressem sua opinião é uma abominação. Pior: uma abominação burra, pois mais do que repelir, acaba promovendo esses babacas e permitindo que mais babacas se juntem e eles.

Depois de dois embates, Virgínia declarou estado de emergência, e isso foi noticiado como “Manifestações nazistas fazem Virginia decretar estado de emergência”. Na verdade, os babacas estavam manifestando na deles, quem foi procurar embate foi o grupo com pensamento contrário, que tentou impedi-los de continuar manifestando e começou a confrontá-los. Só que fica feio demais publicar uma sentença com a palavra “nazista” sem que venha junto uma crítica a este grupo.

A imprensa tentou capitalizar o evento para atender a seus interesses. Se há nazistas fazendo barulho, vamos vinculá-los a tudo que não gostamos e queimar nossos desafetos. Insinuou, por exemplo, que esta marcha estaria, de alguma forma, ligada a Trump. Tudo de ruim acaba vinculado a Trump, ele é a lixeira da imprensa. Mas Trump, esperto que é, não usa intermediários, foi direto a seu Twitter: “Nós todos devemos estar unidos e condenar tudo o que representa o ódio. Não há lugar para esse tipo de violência na América. Vamos continuar unidos”. Não parece sincero, mas é politicamente correto, não se pode negar. Mas sofreu críticas: acharam ruim ele não ter criticado diretamente o grupo nazista.

Não há como argumentar: está instituído que 1) Eram todos nazistas que marchavam pelo nazismo, contra gays, negros e judeus ; 2) Eles foram a causa da violência e 3) Devem ser combatidos e silenciados, caso contrário é sinal de que você concorda com eles. E de fato, muitas pessoas intimidadas por este mecanismo, acabam detonando algo que sequer averiguaram. Pessoas que querem soar boas aos ouvidos de terceiros marretam o que aconteceu batendo sempre nos nazistas. Bater em nazista é sucesso garantido, pois todo mundo os odeia. Difícil mesmo é tentar ver um novo ponto de vista de uma situação delicada como esta.

Não sejam essa pessoa, que afirma com certeza uma coisa que não viu e que tenta silenciar quem ela acha que está errado. Não seja essa pessoa burra que tentando silenciar promove. Mas, acima de tudo, não seja essa pessoa boba que pensa que todos aqueles que se opõe ao nazismo e obstruem sua manifestação são boas pessoas e estão com a razão.

Para me chamar de Hitler, para me chamar de Ritler ou ainda para me chamar de nazista, provando seu analfabetismo funcional: sally@desfavor.com


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