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Abuso!

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| Desfavor | | 13 comentários em Abuso!

+Kevin Spacey se assume gay depois de acusação de assédio e faz pedido de desculpas.
+Justiça manda Alexandre Frota e MBL apagarem posts ofensivos a Caetano e Paula Lavigne.

Mais uma semana com todo tipo de escândalos relacionados a sexo, tanto que resolvemos fazer um apanhado geral. Desfavor da semana.

SALLY

Conforme previsto, foi mais uma semana de revelações de escândalos sexuais. Nos EUA a coisa ficou feia a ponto de ter série campeã de audiência cancelada. Já no Brasil, quem recriminou agressor é que sofreu uma represália judicial. Ê desfavor…

O ator Kevin Spacy, vencedor do Oscar e protagonista do seriado House of Cards, teve que enfrentar uma acusação de ter assediado um menino de 14 anos. Sua resposta não foi muito bacana: disse que estava bêbado e que era gay. Relativizar abusos só cola quando você faz parte de uma minoria vitimizada. Seu histórico de homem branco bem sucedido fez com que as pessoas se voltem contra ele, dizendo que estar bêbado e ser gay não é motivo para molestar uma criança de 14 anos, por sinal, opinião com a qual concordo totalmente.

Em contrapartida, no Brasil, uma entrevista de Paula Lavinge contando que perdeu sua virgindade com Caetano Veloso quando ele tinha 40 anos e ela 13, circulou pelas redes sociais. A lei brasileira na época em que ocorreu o fato já previa que sexo com menor de 14 anos poderia ser considerado estupro, como regra, por entender que uma criança de 13 anos não tem maturidade para consentir algo deste porte. Eventualmente, se admitia uma prova em contrário, eximindo a pessoa de crime, em caráter excepcional.

Hoje a lei é mais dura e não importa o que você faça, a presunção de violência em sexo com menores de 13 anos é absoluta. Mas a lei penal não pode retroagir para prejudicar, então, a aplicação da lei que vale para Caetano Veloso é a da época do fato, ou seja, é de que sim, pode ser considerado estupro, mas também admitem-se situações excepcionais onde possa não ser. Só dei esta explicação para poder partir para o próximo parágrafo com a consciência tranquila.

Foda-se. Não estamos falando de um parecer jurídico. Foda-se. Os patrulheiros se tornaram patrulhadoes e não estão gostando. Vai você tentar sair de uma acusação que é uma regra que, raramente, admite exceção. Vai você tentar dizer a uma multidão enfurecida que você é a exceção e que as coisas não são bem o que parecem. E foi isso que aconteceu com Caetano. A hashtag #CaetanoPedofilio rodou as redes sociais e não totalmente sem razão. Não cabe aqui discutir se ele cometeu ou não um crime, até porque pedofilia não é o nome do crime, seria crime de estupro se fosse o caso.

O que se quis dizer com a hashtag #CaetanoPedofilo é que não se está de acordo com um homem de 40 anos fazer sexo com uma menina de 13. É uma reprovação social, não um parecer jurídico. Mesmo quem o defende tremeu na base quando perguntado se levaria numa boa se sua filha de 13 anos fizesse sexo com um homem de 40. Moralismo? Não, não. Pessoas que pensam que há uma disparidade mental e emocional grande demais entre uma menina de 13 e um sujeito famoso de 40 para que exista um consentimento válido ali.

O mesmo brasileiro que usa sem puder a palavra “roubo” para descrever um furto (roubo ocorre quando há violência ou grave ameaça à pessoa), busca nas profundezas do seu jurista oculto o preciosismo de afirmar que Caetano não é pedófilo. Se for para denegrir ou ofender algum “rival” ou “inimigo”, carrega na tinta, mas quando o fazem com uma pessoa pela qual se nutre simpatia, vale toda a tecnicidade leiga para defender. Haja saco!

Caetano se chateou e recorreu ao Judiciário que, adivinhem? Mandou Alexandre Frota e outros que iniciaram esta crítica apagarem as postagens, sob pena de multa diária de dez mil reais por dia. Já vi gente que precisava de uma cirurgia para salvar sua vida e que entrou com uma ação depois da recusa do hospital em realizar o procedimento com sentença fixando multa diária de cinco mil reais em caso de descumprimento. Tem algo que foge muito à coerência nesta história toda.

Se você fosse vítima de um hashtag ofensiva e pedisse ao Judiciário que ela fosse removida, qual seria o resultado? Em quanto tempo? Caetano representa uma minoria intocável no Brasil: artista, incompreendido, ex-preso político, pseudo-revolucionário. Assim como gays usam camiseta do Che Guevara, que dizia que homossexualidade era doença e fuzilava os gays por serem gays, Caetano continua sendo considerado um exemplo de liberdade disruptiva, mesmo mandando calar a boca daqueles que dizem o que lhe incomoda.

Tudo isso me fez refletir sobre um ponto: o que está enfurecendo tanto as pessoas, todas as pessoas, não importa o grupo nem de que lado ficam, mais do que os atos, é a contradição. Não importa por onde se tente sustentar algum argumento ligado a assédio, adequação, pornografia e arte, sempre vaza alguma contradição.

Não é sobre o ato, não é sobre a vítima. É sobre o agressor. Dependendo de quem seja o agressor ou opressor e do momento social, a agressão ou abuso podem ser relativizados ou julgados com o mais extremo rigor. Este sentimento está incomodando a sociedade toda, mas ninguém parece conseguir identifica-lo ou isolá-lo, tal qual uma criança que fica rabugenta por estar com fome culpando a TV, os pais e os amigos, quando na verdade a real causa do seu mal estar é a falta de comida.

Será que se Kevin Spacey fosse negro, o julgamento teria sido o mesmo? Será que se ele fosse judeu teria sido diferente? O que vale hoje é o quanto se está socialmente autorizado a bater naquela pessoa, naquele contexto. É cool detonar alguns grupos e é uncool detonar outros, ainda que seja pelos mesmos atos. O que alguns podem fazer de forma impune, outros não podem nem sonhar em cogitar.

Isso causa uma instabilidade social enorme e todo mundo sai perdendo. As pessoas não tem mais certeza do que se pode ou do que não se pode fazer. Também não tem muita certeza do que será acolhido caso se chateiem ou reivindiquem algo no Judiciário ou perante a sociedade.

A ideia de criar leis escritas surgiu justamente de uma situação muito parecida: uma época onde alguns privilegiados podiam tudo enquanto outros não podiam nada, uma época onde a falta de clareza criava distorções e brechas para abuso. E não é que o Brasil conseguiu trazer de volta essa situação escrota, mesmo com leis escritas?

Parabéns aos envolvidos.

Para dizer que estamos repetitivos, para dizer que esperava que a postagem de hoje fosse em áudio ou ainda para dizer que se fosse com a sua filha seria estupro mas com a filha dos outros não é: sally@desfavor.com

SOMIR

Em tese, é uma coisa boa que mulheres sintam-se seguras para denunciar aqueles que abusaram delas. Evidente. Como eu sou homem e nunca tive de lidar com esse tipo de assédio e ameaças até hoje, só posso imaginar o inferno que seja a sensação de impotência e medo diante de uma situação assim. E mesmo assim, com aquela reação típica masculina: “deveria ter dado um chute no saco do filho da puta e não deixado acontecer”. Sim, eu sei que não é uma estratégia realista na maioria dos casos, mas que a ideia sempre vem, sempre vem.

Começo assim até para explicar algo da mente masculina que talvez tenha muita relação com o enorme número de casos de abuso que acontecem todos os dias: homens pensam em termos combativos. Cérebros montados para analisar o mundo de acordo com a reação agressiva gerada na outra parte para medir o grau de “ofensividade” das nossas ações. Ficou complicado? Resumo: homens esperam reações agressivas de quem não está gostando de uma coisa. Eu aposto sem medo que a maioria dos homens aqui vai concordar comigo sobre essa parte de ficar pensando porque diabos as mulheres abusadas não tentaram ferir seriamente os homens que fizeram isso. Mesmo os que sabem que tem algo errado nessa lógica.

Porque tem. Mesmo os homens mais “fracos” costumam ter em si uma agressividade muito maior que a imensa maioria das mulheres. Tem algo genético e algo cultural aí. E essa noção quase que inata de que existe a via da violência para tentar controlar o comportamento inadequado alheio vaza para outros aspectos da vida masculina. Ficamos um pouco mais cegos para placas de pare baseadas em medo e vergonha para mulheres. Isso de forma alguma inocenta, justifica ou até mesmo alivia a culpa dos que efetivamente ameaçam mulheres, mas pode nos ajudar a entender como seguir para um mundo mais seguro para ambos os sexos.

O ônus da aproximação sexual costuma cair sobre os homens. E eu posso garantir para vocês que comportamentos que duram milênios normalmente são mais fruto de preferências genéticas de ambos os lados do que convenções sociais. Como os dois gêneros genéticos costumam agir de forma diferente nessa aproximação, coube a um deles o papel de ser mais ativo e eventualmente mais agressivo no processo. O que infelizmente faz muitos homens agirem de forma abusiva, mas que na prática pode ser realizado de forma saudável e agradável para homens e mulheres. Existe uma diferença considerável entre um homem insistente que agrada e desagrada a mulher, mesmo que ambos ajam da mesmíssima forma. Um parece “másculo e decidido”, outro parece “assustador e sem noção”.

E como leitura de mentes ainda não é uma possibilidade, homens tendem a jogar esses dados e torcer pelo melhor na hora da conquista. E antes que alguém venha me encher o saco por isso, eu estou falando de insistência sem violência ou chantagem. A não ser que você seja uma criança, é relativamente fácil saber a diferença entre alguém que está tentando te conquistar (mesmo que seja de fato sem noção) e alguém que está tentando te forçar, não? Dito isso, conseguem perceber onde está o perigo dessa onda de “eu também”?

Em tese, perfeito. Que os filhos da puta que forçam e ameaçam mulheres sejam expostos e paguem caro por isso. Mas, esquecemos que existem mulheres malucas e eticamente podres por aí? Porque igualdade é isso aí: mulher é estatisticamente tão filha da puta e ruim quanto homem, só tem menos massa muscular para agir de forma física. Eu não canso de repetir que o pior preconceito contra mulher é o que a infantiliza e a faz ser mais inofensiva e inocente do que realmente é. Se a gente começar a acreditar cegamente em todas as mulheres que acusam homens, estamos abandonando a realidade em troca de uma sensação passageira de segurança.

Toda mulher deve ser livre para acusar agressores e ser protegida deles, mas nem todos os acusados serão culpados. Muitas vezes o cidadão foi sem noção, mas naquela soma complicada de necessidade de tomar a dianteira e dificuldade de entender quem não se defende de forma agressiva, vamos ter muitos casos que sequer se aproximam de abusos mais violentos. É um equilíbrio sutil, mas enquanto não formos capazes como sociedade de fazer as mulheres “crescerem” para poderem ser filhas da puta mentirosas também, estamos avançando rapidamente para uma virada de pêndulo que vai tornar menos segura a vida de mulheres no futuro.

O garoto que gritava lobo e a garota que gritava abuso. Se não começarmos a desconfiar um pouco mais delas, eventualmente vamos desconfiar de todas. Porque ou o mundo é um lugar onde todos os homens são monstros estupradores (como as feminazis adoram dizer), ou o mundo é um lugar onde mulheres EVENTUALMENTE mentem e/ou enxergam abuso onde não aconteceu nenhum. O primeiro modelo de realidade não se sustenta, porque você tem que ser completamente retardado(a) para achar que todos os homens são igualmente podres nesse sentido.

E se não houver um mínimo interesse de voltar ao “meio”, a próxima etapa são os homens se cansando de serem acusados sem direito a defesa e ou vestindo essa camisa, ou começando a não dar bola mais para quem denuncia. Veneno ou remédio, depende da dose.

Para dizer que eu sou apologista do estupro, para dizer que só quer ver linchamentos, ou mesmo para dizer que o ponto da reação agressiva te fez entender quase tudo sobre homens (deveria, é a chave de tudo): somir@desfavor.com


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