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Menos médicos?

Menos médicos?

| Desfavor | | 44 comentários em Menos médicos?

O governo de Cuba comunicou nesta quarta-feira (14/11) que vai se retirar do programa Mais Médicos devido a declarações “ameaçadoras e depreciativas” do presidente eleito Jair Bolsonaro, que anunciou modificações “inaceitáveis” no projeto. (…) Bolsonaro questionou a formação dos especialistas cubanos, condicionou sua permanência no programa à revalidação do diploma e impôs como único caminho a contratação individual, argumentou o governo cubano. LINK


Apesar de concordarmos com a decisão do Bolsonaro, o entorno dessa história virou o desfavor da semana.

SALLY

Muita desinformação, alarmismo e exercício de adivinhação permeiam o fim da parceira Brasil e Cuba no Programa Mais Médicos. Um show de achismos sem fundamento e besteiras repetidas até virarem verdades tomaram as redes sociais e a imprensa. Vamos por partes, descontruindo tudo que está errado

Antes de mais nada quero lembrar que tem texto nosso com este exato conteúdo na data em que o programa foi implementado pela Dilma, então, não é sobre ser a favor ou contra do Bolsonaro, é sobre o que pensamos do assunto. Eu não sou fã do Bolsonaro, mas nem por isso vou arrumar motivo em tudo para criticá-lo. Dessa ver o sujeito agiu bem, agiu certo e fundamentou seus atos com coerência. Tenho muitas críticas a fazer sobre ele e suas escolhas, mas não hoje.

Ao contrário do que vem sendo noticiado, Bolsonaro não “acabou com o Programa Mais Médicos”, ele apenas fez o que era necessário para adequá-lo à lei brasileira. Sim, até então ele era ilegal e inconstitucional, em uma das muitas gambiarras descaradas que o PT fez ao longo dos anos.

Se um trabalhador é levado de uma fazenda a outra fazenda para cortar cana e 80% do seu salário fica com o dono da fazenda, a lei brasileira considera isso trabalho escravo (ou análogo a). Não precisa ter muita inteligência ou sensibilidade para perceber que um trabalho onde 80% do que VOCÊ produziu te é tirado e dado ao governo é, no mínimo muito injusto. Garanto que nenhum dos hippies e zé droguinhas que defendem o Mais Médicos como estava aceitaria que o governo tire 80% do salário deles.

Além disso um trabalho onde você muda de país e não pode levar sua família, não desfruta dos direitos trabalhistas que lhe são devidos e tantos outros absurdos do esquema Mais Médicos são flagrantemente ilegais. Não apenas de acordo com as leis do Brasil, como também violando uma meia dúzia de determinações da Organização Mundial do Trabalho. Como eu disse: coloque quem defende o programa para trabalhar nesse esquema e veja se eles não dão um faniquito.

O que Bolsonaro fez foi dizer: “Beleza, nada contra manter a parceria com Cuba no Mais Médicos, mas para isso eles terão que ter o diploma revalidado no Brasil (exigência para profissionais DO MUNDO TODO), terão que receber direitos trabalhistas, terão que ter o direito de trazerem suas famílias se assim o desejarem e o salário fruto do trabalho DELES, vai para ELES não para o governo cubano. Pode ser?”. Era uma belíssima chance para o novo governo Cubano mostrar que é melhor que o anterior e aceitar. Não aceitou.

Acho curioso que a pessoa acusada 24 horas por dia desde o começo do ano de ser quem vai promover uma ditadura no Brasil é a pessoa que justamente está criando medidas para combater uma puta duma sacanagem que um esquema ditatorial cubano está usando para perpetrar uma injustiça contra seu povo.

Meus queridos, se tem uma coisa que Bolsonaro não é, é diplomata. Se ele quisesse acabar com a parceira por implicância com o governo cubano, ele teria dito “Não quero mais não, tá ok? Esses cubanos não prestam, chega, acabou!”. Grosseria é o forte ali. E ele pode se dar ao luxo, ele está eleito. Ele já foi grosseiro dezenas de vezes e o continuará sendo. Mas desta vez, ele fez questão de explicar os motivos e, pasmem, são coerentes.

Querer fazer parecer que Bolsonaro fechou as portas deliberada e cruelmente para os profissionais cubanos é imbecilidade. Primeiro que ele não fechou, ele apenas fez adequações para que o programa esteja dentro de normas nacionais e internacionais de trabalho. Segundo que ele explicou ponto a ponto a razão de cada alteração, todas com embasamento legal. Então, não é perseguição “contra” médicos cubanos, é uma medida protetiva a favor deles.

Tanto é coerente, que países que prezam pela seriedade das leis trabalhistas e pela liberdade de ir e vir deram o braço a torcer e, pela primeira vez, parabenizaram o Brasil por este ajuste. A pessoa que acha que o governo tem que ficar com 80% do que ela ganha só pode ter um parafuso a menos, haja fanatismo para sustentar uma coisa dessas.

O próprio governo cubano deixou bem claro que o programa foi suspenso por decisão unilateral sua, por não aceitar que os médicos que trabalham no Brasil tenham direito a seu salário sem ter que dar de 70 a 80% do valor para o governo cubano. Sério mesmo, quem é o vilão dessa história?

Quando um resquício de humanidade vem do lado onde está Bolsonaro, dizendo que é desumano proibir que as famílias acompanhem os médicos, obrigar que mães venham trabalhar no Brasil deixando seus filhos em Cuba, é sinal que o outro lado é muito fodido da cabeça.

Não é como se ele tivesse enxotado todo mundo e mandando embora, ele usou as seguintes palavras, citadas textualmente: “o cubano que quiser pedir asilo aqui, VAI TER”. O que ele não concorda é em obrigar uma mãe a deixar seus filhos para trás e em ser conivente com o governo cubano embolsando 80% do que o médico sua para ganhar no Brasil. E porra, está certíssimo! Sério que vão dizer que ele inventou motivo por implicância?

Ao contrário do que muitas bibas histéricas estão alardeando, ele também não tem a intenção de deixar um buraco no sistema de saúde, como ele mesmo disse, o programa não está suspenso, médicos de outros países, podem vir para cá, inclusive já estão trabalhando em um esquema de “importar” médicos de outros países, para suprir uma eventual defasagem. Pois é, o programa Mais Médicos contempla médicos do mundo tudo, não será a saída de UM país, uma ilhota, no meio de mais de 300 países que vai quebrar o sistema, não acham?

E digo eventual porque os cubanos não querem voltar para Cuba. E, ao contrário do que muitos pensam, eles não estão chateados com a atitude de Bolsonaro. Vi uma entrevista de uma médica cubana onde ela dizia que achava muito justo revalidar seu diploma aqui, já que é um procedimento de prática mundial, e que estava muito feliz de ser contratada fora do programa, assim não perdia mais da metade do salário dela para o confisco do governo cubano. Pensa comigo, quem de nós ficaria chateado se o salário aumentasse em 80%? Todo mundo ganha, só quem perde é o governo cubano.

Além disso, a lei que instituí o programa diz que a prioridade é para profissionais brasileiros. No ano passado, por exemplo, 99% das vagas foram preenchidas por brasileiros. Então, não sei que medo do fim do mundo é esse que as pessoas tem, de achar que o sistema de saúde colapsa se médico cubano for embora. O Brasil já tem capacidade de preencher as vagas, e esse 1% não preenchido pode ser recheado com profissionais de muitos outros países. Vamos parar de espalhar terror sem fundamento?

Então, não foi cruel, não deixou o brasileiro na mão, não sacaneou os médicos cubanos e não vai causar caos na saúde pública. Vamos parar com o exercício de futurologia de “eu sei que ele só fez isso porque…”. Não, você não sabe nada, que arrogância é essa? “Eu sei que vai gerar um caos…”. Não, você não sabe nada. Tem bola de cristal? Usa para os números da Mega Sena.

Se a cada ato do Bolsonaro as pessoas ficarem prevendo o fim do mundo, estarão alavancando a popularidade dele, pois quando o fim do mundo não acontecer, todos vão olhar e pensar “Hmmm, até que ele não é ruim”. Pior coisa é abaixar as expectativas da forma como estão fazendo: qualquer merdinha que o Bolso faça vai ser considerado melhor que a encomenda. Apenas parem, estão ajudando ele sem perceber.

Para dizer que você toparia revalidar seu diploma para passar a ganhar 12 mil em vez de 3 mil, para dizer que qualquer pessoa com bom senso percebe que esse esquema com Cuba era imoral ou ainda para se recusar a sair da bolha e dizer que é cubanofobia: sally@desfavor.com

SOMIR

Para quem já estava muito de saco cheio da forma como o Brasil estava sendo dirigido pelo PT nesses últimos anos, o momento é de esperança. Bolsonaro já é efetivamente mais presidente do que Temer jamais foi, e muitas das suas primeiras decisões parecem ter uma boa direção. Cortar a mamata do governo ditatorial cubano e exigir o tratamento justo dos médicos que vieram pra cá é uma ação surpreendentemente humanitária para um candidato que se elegeu por se opor aos direitos humanos.

Sally apontou muito bem como não há espaço para a gritaria das viúvas petistas e como muita gente parece não ter entendido ainda que a situação da medicina brasileira não era dependente dos cubanos. Males da era da desinformação. Mas eu quero aproveitar o tema e levantar uma preocupação, que ainda é embrionária até mesmo pelo estágio do governo de Bolsonaro, mas que vale a pena prestar atenção daqui pra frente: será que o antagonismo ao PT não é maior que a vontade de tornar esse país melhor?

Podemos ver essa situação de duas formas: na primeira Bolsonaro e sua equipe viram um absurdo no tratamento dos profissionais cubanos e no suporte brasileiro ao regime ditatorial caribenho; na segunda uma grande oportunidade de atacar um dos programas mais midiáticos da história recente do PT. Muito embora as duas visões possam coexistir, algo me diz que o fato de ter sido idealizado pelo inimigo eleitoral teve mais peso na decisão do que deveria.

Eu mesmo disse várias vezes aqui que o Brasil não é os EUA e não dá pra achar que as coisas vão funcionar igual, mas que as tendências de lá acham seu jeito de acabar por aqui, isso com certeza. Uma das primeiras ações de Trump quando assumiu o governo foi ir pra cima do Obamacare, o nome (que pegou) de um programa de saúde cujo objetivo era universalizar o máximo possível o sistema de saúde de lá. Parecia birra até porque o partido republicano passou vergonha por muito tempo por sequer conseguir escrever um plano diferente, como se não tivessem uma alternativa e só quisessem desfazer algo com o nome de um concorrente. Segundo o que eu acompanhei nos últimos tempos, no final das contas não reduziram muito os gastos do governo e pioraram o acesso à saúde para a população mais pobre. Birra.

Eu quero o PT longe do governo, eu quero que as inúmeras decisões equivocadas deles feitas em nome de propaganda eleitoral e governabilidade por suborno sejam desfeitas, mas… não podemos nos contentar com qualquer coisa em nome do “inimigo do meu inimigo”. Dessa vez eu acho que o Bolsonaro deu uma bola dentro. Mas é muito importante que Bolsonaro não tente continuar surfando na popularidade de ser contra o PT para sempre.

Até porque o cenário político brasileiro ficou tão bizarro que mais da metade da população de um país pobre está achando que a solução é eliminar a esquerda do espectro político. Derrubar o poder do PT serviu também para tentarmos soltar a esquerda do cativeiro petista, na qual foi torturada por mais de uma década em prol de interesses pessoais de Lula e seus amigos. O Brasil está muito atrasado ainda para tomar decisões profundas sobre esquerda e direita, o ideal é não abusar muito nem de um lado, nem do outro.

Eu posso estar errado, espero estar errado, mas… eu duvido muito que se trocássemos Cuba por Israel no caso do Mais Médicos, Bolsonaro teria agido da mesma forma. Está muito bem fundamentado? Está. Foi o Bolsonaro que pensou e escreveu aquilo tudo? Não, né? Até uma concordância sai meio forçada dali, quem dirá aquela argumentação. O suculento alvo de um programa símbolo do PT em parceria com Cuba parece ser a maior parte da motivação. Vamos celebrar os acertos, é claro, mas sempre prestando atenção se eles vem de uma base reprodutível. Bolsonaro demonstrou preocupação com sistemas de trabalho análogos à escravidão agora. Bato palmas. Mas, será que se for a Bancada Ruralista aprontando vamos ter uma posição parecida?

A polarização que o Brasil vive sugere que é popular com sua base atacar até mesmo as realizações do outro lado. A tendência americana vai se repetindo: ao invés de Republicanos, Bolsonaristas; ao invés de Democratas, Lulistas. Vale um texto à parte só para falar do perigo que é viver numa caricatura de um sistema bipartidário cuja maior identidade são seus líderes. Mas no que tange o ponto deste texto: só não podemos ser o “Brasil que dá certo” na hora de desfazer os erros do PT e continuar com o Brasil de sempre quando não tem esse incentivo” de atacar o adversário.

Porque aí importaremos o pior do sistema de dois partidos: o antagonismo pelo antagonismo e a incapacidade de dialogar. Não tenho dados concretos para cravar que Bolsonaro vai atacar os erros do PT e fazer vistas grossas para quem considera dos seus, mas tenho experiência de Brasil e um conhecimento considerável de outros países com sistemas tão polarizados. Não tenho muitas esperanças de estar errado, mesmo que esteja com muita vontade dessa vez.

Veremos.

Para me chamar de comunista, para dizer que democracia é o sistema de destruir o que o adversário fez, ou mesmo para me chamar de nazista por ter usado o exemplo de Israel: somir@desfavor.com


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