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Preferências.

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| Sally | | 36 comentários em Preferências.

Talvez o que eu vou dizer aqui seja óbvio para você, mas talvez não seja para muita gente. Talvez o que vou dizer aqui seja óbvio agora, mas, dentro de alguns anos, tenha sido tão massificado o contrário, que deixe de ser. Então, acho importante deixar registrado em algum lugar para que se, algum dia, você for trucidado por algo do tipo, saiba que essa reprovação é apenas um ponto de vista, não a verdade absoluta. O assunto? Tá tudo bem não se sentir atraído ou não querer ter um relacionamento amoroso por algum critério seu.

Parece óbvio, né? Mas está deixando de ser. Ao que tudo indica, você pode ter algumas preferências, mas outras viram preconceito. Em uma rodinha de lacradores diga “Eu não me relaciono com Bolsominion” e observe todos te aplaudirem de pé. Agora, se você disser que não se relaciona ou não se sente atraído por pessoas pelos motivos que eles consideram “errados”… senta que lá vem chumbo grosso: vão de acusar de preconceito, de algumacoisafobia, de crime e vão de escrotizar publicamente até moer a sua reputação.

“Quer dizer que você apoia escolher pessoas por características físicas?”. Não, “Pessoa Quer Dizer”, não é isso. Eu acho que cada um tem direito a ter seus critérios e fazer suas escolhas sem que fique um pau no cu apontando, julgando, tornando públicas essas escolhas e estimulando linchamento virtual. Eu entendo e concordo que pessoas são muito mais do que aparência, mas eu sinto a obrigação de respeitar quem pensa diferente.

A ideia deste texto veio de um vídeo que recebi, cujo conteúdo é tão caricato, que nem me atrevo a resumir. Vou transcrever essa excrescência tal como foi dita (inclusive a caixa alta nas legendas):

“O que é o SUPER HETERO e porque ele é prejudicial para TODAS AS MULHERES em geral? Super Hetero é uma orientação criada nos Estados Unidos que acolhe homens que só se atraem por ‘mulheres verdadeiras’, que segundo eles, NÃO incluem as mulheres trans (nota do Desfavor: homens que se sentem mulheres). Basicamente, eles criaram uma orientação para justificar a TRANSFOBIA deles, porque não se relacionar com uma pessoa só porque o sexo dela não bate com o gênero dela É PRECONCEITUOSO SIM! Sem contar que eles estão REZUNDO todas as mulheres a uma MERA GENITÁLIA, basicamente estão dizendo que nós não somos pessoas para eles, que nós somos apenas vaginas com pernas. Compartilhem isso para que mais pessoas se mobilizem e parem com esse movimento”

Não sei se é real ou não (tomara que não seja), mas existem muitas pessoas pensando assim e propagando esse tipo de fala. Dependendo da bolha onde se transite, se corre o risco de acreditar que isso é o “normal” e que está fora disso é “anormal” ou “errado”. Então, hoje eu vim aqui dizer que não, pau no cu de todo mundo, você tem direito de ter os seus critérios e isso não te faz preconceituoso, “ista” (machista, racista etc.) ou “fóbico” (transfóbico, homofóbico, etc).

Tem dois focos aqui: 1) todo mundo tem o direito de se sentir atraído ou deixar de se sentir atraído por qualquer atributo físico e 2) mesmo que a atração por algum atributo físico fosse algo a ser “combatido”, não é assim, fazendo desse jeito só pioram a situação.

Aqui no Desfavor, nunca contestamos ou vamos contestar que uma pessoa tem o direito de se sentir algo diferente de sua forma física original: homem, mulher, golfinho, árvore, ET. Ela tem o direito de se sentir como quiser. Ela tem inclusive o direito de recorrer ao Judiciário e/ou à medicina para adequar seu documento ou seu corpo ao que quiser. Mas acaba aí. O que nós contestamos é: o quanto temos que participar disso? A resposta? O quanto a gente quiser, é o caralho que vão impor algo a alguém no grito.

Eu, por escolha pessoal, trato a pessoa da forma como ela se sente, mas jamais me passará pela cabeça cagar regra, constranger ou forçar que os demais façam o mesmo. Como você se sente diz respeito a você, é absurdo querer impor isso a outros oito bilhões de pessoas no mundo. SE elas quiserem, SE elas estiverem prontas, elas vão lidar com isso de uma forma bacana. Se não, não.

E adivinha só? Todos nós somos falhos, involuídos e deixamos a desejar em alguns aspectos. Todos nós temos dificuldades. Todos nós precisamos evoluir em algumas áreas. Pisotear o coleguinha que não evoluiu onde você já evoluiu é egóico, é babaca, é covarde e é hipócrita. Não vamos estender a mão para quem está no degrau de baixo subir, vamos aproveitar que estamos por cima e pisar em suas cabeças! Meu querer tem que ser imposto a você, se não, te imputo um crime, um estigma social reprovável!

Sem contar que uma coisa é tratar a pessoa como ela se vê, outra muito diferente é ter que se sentir atraído pela pessoa como ela se sente. “Vagina com pernas”? “Mera genitália”? É como dizer que o sexo não deixa de ser consensual por falta de um “mero consentimento”. Você pega o cerne da questão (biologicamente, homens tem pênis e mulheres tem vagina) e transforma em um “mero”. Pera lá. Quer questionar critérios biológicos? Vamos lá, acho uma discussão interessante. Simplesmente desmerece-los como se eles não importassem não. As mesmas pessoas que depois usam leis que diferenciam sexos, como a Lei Maria da Penha, os igualam quando lhes convém.

Seu querer afeta a você e a quem quiser participar dele. Impor seu querer ao mundo todo e pretender que o mundo todo se adeque ao seu querer é algo ditatorial. E, desculpa, eu sou do time “ditadura nunca mais”, qualquer modalidade dela, inclusive a autoimagem que uma pessoa tem dela mesma.

Todos nós temos o direito de ter predileções, de nos sentirmos atraídos por quem quisermos. Se um homem não se sente atraído por um corpo que tem um pênis mas se sente mulher, não é preconceito, é sagrado direito dele. Assim como é direito de qualquer um não se sentir atraído por pessoas de pele branca, pessoas de pele negra, pessoas altas, pessoas baixas, pessoas magras, pessoas gordas. Se sentir mulher não remove a masculinidade de um corpo que nasceu homem e os homens tem todo o direito de não se sentirem atraídos por um corpo biologicamente masculino.

Eu não estou discutindo se é legal ou não. Você pode achar muito escroto, fútil e superficial que alguém só se sinta atraído por corpos, em qualquer modalidade restritiva, mesmo que não seja sobre masculino/feminino. Uma pessoa que só se sinta atraída por corpos magros, por exemplo. Você pode achar uma grande besteira que aparência física, qualquer que seja, feche as portas para uma pessoa, uma vez que uma pessoa é muito mais do que seu corpo. Bato palmas para você e acho isso um sinal de evolução espiritual, desde que, você respeite quem ainda não chegou lá.

E tem uma grande diferença postural aqui. Repito: se você acha uma grande besteira que aparência física, qualquer que seja, feche as portas para uma pessoa, uma vez que uma pessoa é muito mais do que seu corpo, mas respeita quem não pensa assim, quem ainda não chegou nesse patamar, eu te acho espiritualmente evoluído.

Porém, se você acha uma grande besteira que aparência física, qualquer que seja, feche as portas para uma pessoa, uma vez que uma pessoa é muito mais do que seu corpo e detona quem não pensa assim quem ainda não chegou lá, fazendo esse tipo de shame público, eu te acho um verme, mais involuído do que babaca que posta foto do filho fazendo arminha com os dedos, uma merda de ser humano equiparável aos piores ditadores que você critica, pois pior do que ditador é ditador desempoderado que usa vergonha como arma para oprimir quem não pensa como ele.

Foda-se se você está certo. Fazer egovideo acusando os outros de preconceito, mostrando sua superioridade moral é escroto, é pequeno, é babaca e apenas oprime quem ainda não chegou lá. Quem não pensa assim, certamente retrocedeu dez casas no tabuleiro de evolução pessoal, diante de um horror como o desse vídeo. Parece aquele pai da década de 80 cujo filho tem pavor de aranha que pega e joga uma aranha dentro da blusa do menino para ele “perder o medo”. Não é assim que se dialoga com quem está no meio do caminho.

Esquerdinhas asquerosos que usam camiseta encardida “ditadura nunca mais” mas tentam impor seu sistema de pensamento a todos são a mesmíssima merda que esses ditadores que tanto criticam, com a diferença que não tem poder suficiente para fazer os mesmos estragos. A única arma é a rede social, onde, a pretexto de “combaterem” algo (homofobia, preconceito, racismo, etc.) pisoteiam na cabeça de quem não pensa como eles. Não apenas não ajudam, como ainda cobrem a causa de merda e em vez de “combater”, criam pessoas ainda mais avessas a isso. É por causa de gente assim (não de voto nulo, não de voto em branco) que Bolsonaro ganhou e pode ganhar novamente.

E o exemplo do “tem que se sentir atraído por um corpo de homem com pênis se ele se sentir mulher caso contrário é preconceito” é um exemplo grotesco. Você pode pensar “Nunca que eu vou ceder a uma bizarrice dessas”. Ok. Mas tem exemplos mais sutis que muita gente já cedeu e nem percebe. Se você ainda tem predileções físicas para se sentir atraído por alguém, você teria coragem de dizer em voz alta, por exemplo, que seu tipo são mulheres brancas e que não se sente atraído pelas demais?

Garanto que se fosse ao contrário, só sentir atração por mulheres negras, isso poderia ser dito tranquilamente – e quiçá aplaudido. Mas se for o inverso… Quem aqui tem coragem de abrir a boca para dizer que só se sente atraído por mulheres brancas? Vai tomar chuva de hate, vai ser trucidado pelo pessoal que depois te chama para comer bolinho e conversar quando lhes convém.

E aí eu te pergunto: você não tem o direito de ter preferências? Durante muito tempo eu tive as minhas. Com o passar do tempo e alguma dedicação, elas foram desaparecendo e hoje me interessa mais a pessoa do que seu físico, mas ninguém é obrigado a ser como eu, pois eu não sou a régua medidora do que é certo na sociedade. Isso não me faz melhor. Ter preferências não faz ninguém pior. Ou por acaso alguém acusa gay de misoginia por não querer fazer sexo com mulher?

Você tem sim o direito a ter as suas preferências. E tem o direito a expressar as suas preferências. Ou então, podemos fazer um pacto social diferente: ninguém tem mais o direito a expressar suas preferências para não ofender essa massa insegura e de ego frágil, que tal? O que não pode é que alguns possam bradar suas preferências e receber aplausos e outros tenham que escondê-las e sejam trucidados quando, de alguma forma, elas aparecem.

Escrotizar negro(a) que se relaciona com branco(a) esculhambando, chamando de palmiteiro, avacalhando com a aparência do branco pode? O inverso, nem pensar. Que tal a gente convencionar de ninguém escrotizar ninguém, cada um cuidar da sua vida e permitir que quem usa aparência como critério para escolha tenha o sagrado direito de fazê-lo? Que tal não pisar na cabeça de quem ainda não chegou no mesmo patamar que você? Que tal criar um padrão, qualquer que seja, e ele valer para todos?

Independente da sua opinião, o que estou pedindo aqui é igualdade: ou todo mundo pode, ou ninguém pode. Bastante coerente, não? Ou todo mundo pode expressar livremente suas preferências ou então ninguém pode. Mas não, esse grupinho imundo que está emergindo dos esgotos sempre agiu assim: “o que a gente aprova é aplaudido, o que contraria nossa cartilha será trucidado e quem ousar defender terá a reputação moída”. Ditadura nunca mais, desde que não seja a deles.

O que mais me intriga é que essas pessoas costumam se dizer religiosas ou espiritualizadas. Certamente é isso o que Jesus faria: um vídeo em rede social dizendo quão merda é quem não consegue transformar água em vinho. Ou Buda, talvez, um vídeo rindo e debochando dos idiotas que ainda precisam de alimentos para viver, dizendo o quanto são estúpidos. Vai lá, filho da puta, teu deus deve estar orgulhosão de você.

Ou então se escondem na capa da espiritualidade. Não adianta usar cristalzinho energético no pescoço, fazer meditação para vibrar alto, comer comida natural para equilibrar os chakras e ser um baita dum filho da puta arrombado intolerante. Você é apenas um escroto místico, o que, por sinal, é o tipo mais comum.

Enfia o cristal no cu e aperta até sair lapidado. Não adianta fazer nada enquanto não aprender a primeira lição de todas: a compaixão e o respeito por quem ainda está galgando um caminho que você já traçou. O jovem místico é um câncer ainda pior do que o jovem bolsonarista, pois o jovem bolsonarista deixa bem clara a bosta que é, não se reveste de nenhuma alegoria nobre. Colocar frase de efeito e escrever #Gratidão enquanto se comporta como um lixo humano está virando padrão.

Quer ser espiritualizado? Quer alinhar seus chakras? Quer vibrar alto? Quero o caralho a quatro espiritual? Não julgue. Se julgar, não ouse se esconder atrás desse manto gratiluz, pois você é uma fraude, um cara de pau, um hipócrita.

Independente da alegoria, não cuspa para baixo. É feio, é baixo, é vil. Se promover escrotizando os outros é babaca e só mostra o quanto você é pior do que as pessoas que diz criticar.

E é burro também. Não se “combate” algo com ataque. Aliás, não se “combate” nada, a partir do momento em que você se posiciona como antagonista e “combate” algo, você só cria mais do que busca combater, pois a pessoa atacada só vai se agarrar a aquela crença e virão outros tomar o lado dela, por ela estar apanhando.

“Mas Sally, então eu tenho que aturar todas as babaquices do mundo calado(a)?”. Não. O que promove mudança não é combate, não é ataque, não é enfrentamento, é consciência. Consciência, como premissa básica, é uma abordagem sem julgamentos, que busca o que é melhor para todos (não só para você ou seu grupo), que vê o outro como igual e que o respeita e respeita seus tempos.

“Ah, então quer dizer que você virou politicamente correta?”. Não. Aplaudo de pé humor incorreto, sou fã do Leo Lins e acredito na liberdade de expressão. Só que quando o Leo Lins fala, ele fala nos shows DELE, nas redes sociais DELE, ele não vai atrás de ninguém escrotizar ninguém. Não há limites para o humor, há limites para onde ele é exposto. Vocês podem nos ver fazendo todo tipo de humor aqui, mas não vão nos ver indo catar um desconhecido em seu perfil para fazer piada com ele.

E o texto nem é sobre humor, algo criado, escrito e falado para não ser levado a sério. É sobre quem fala sério, escrotizando o outro por ele não atender a sua cartilha, jogando a pessoa aos leões para ser linchada. Deixem os outros em paz, as pessoas têm o sagrado direito de se sentirem ou não atraídas pelos atributos físicos que quiserem.

Fica a dica para todos: viu ou ouviu algo em rede social que não gostou? Bloqueia, silencia, ou vai para o seu blog falar com os seus leitores. Replicar o que a pessoa disse com um “olha só que escrota que essa pessoa é”, além de ser babaquice, só está alimentando aquela pessoa ou o que ela diz. Parem de divulgar bosta e parem de achar que tacando pedras alguém vai deixar de ser bosta – a pessoa só vai ser mais bosta ainda. Essa postura provoca tanta repulsa que a ditadura esquerdisticamente correta pode acabar dando uma nova vitória ao Bolsonaro.

Para dizer que até você quer a vitória do Bolsonaro depois de ver esse vídeo, para dizer que se você falar o que te atrai fisicamente perde até o emprego ou ainda para dizer que também odeia o jovem místico: sally@desfavor.com


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