Aquela da Monkeypox…

SALLY: “Alô?”
TOMIR: “Tá podendo falar?”
SALLY: “Estou sim, tá tudo bem?”
TOMIR: “Comigo sim…”
SALLY:
TOMIR:
SALLY: “Você me ligou para dizer que está tudo bem com você?”
TOMIR: “Não…”
SALLY: “Eu vou ter que adivinhar o motivo da ligação?”
TOMIR: “Não… é que a gente queria uma ajuda sua”
SALLY: “A gente?”
TOMIR: “Estou aqui com o Alicate… ele está com um problema”
SALLY: “Eu quero saber qual é o problema?”
TOMIR: “Provavelmente não, mas eu vou falar mesmo assim”
SALLY: “Você me ligou para me trazer um problema DO ALICATE?”
TOMIR: “É QUESTÃO DE SAÚDE, SALLY! Tenha humanidade!”

Parei o que estava fazendo e sentei para escutar. Se Siago Tomir se deu ao trabalho de fazer uma ligação (ainda que seja de WhatsApp) para outro país, provavelmente havia algo relevante acontecendo.

SALLY: “Fala”
TOMIR: “Então… Alicate acha que está com Varíola dos Macacos…”
SALLY: “Alicate acha?”
TOMIR: “A gente não tem certeza e ele não quer procurar pronto-socorro ou hospital…”
SALLY: “A gente não tem certeza? Como assim?”
TOMIR: “Ele está aqui do meu lado e…”
SALLY: “COMO ASSIM? ELE ESTÁ DO SEU LADO?”
TOMIR: “Sim…”
SALLY: “Era para ele estar em isolamento!”
TOMIR: “Calma, Sally, a gente nem sabe o que é”
SALLY: “Calma? Você liga para uma pessoa leiga em outro país para que, à distância, por telefone, ela detecte uma doença contagiosa? Como posso ter calma com uma irracionalidade como essa?”
TOMIR: “SALLY, ELE NÃO QUER IR AO MÉDICO”
SALLY: “Por qual motivo ele não quer ir ao médico?”
ALICATE: “Vão pensar que eu sou viado” *gritando ao fundo
SALLY: “Minha Nossa Senhora… eu vou pegar uma xícara de café, já vi que isso aqui vai ser demorado e desagradável…”

Fui até a cozinha xingando mentalmente, peguei meu café, voltei e, para minha surpresa, quem estava ao telefone era o Alicate.

ALICATE: “Seguinte, eu não vou ficar com fama dia viado por causa de umas perebas, tá ligada? Me ajuda você, que escreve essas coisas, eu não quero ser visto indo no médico com pereba gay!”
SALLY: “Coloca a ligação em viva voz”
ALICATE: “Até o Presidente já falou que quem pega isso é quem dá o cu, tá ligada? Eu não vou correr o risco de ser visto com uma doença gay e depois a cidade toda ficar falando”
SALLY: “COLOCA A LIGAÇÃO EM VIVA VOZ”
ALICATE: “Ihhh grossa, já começou com a grosseria… Pronto, tá no viva-voz. Não falei que ela ia ser grossa por nada, Tomir? Qual é o problema dela? Não gosta de ajudar os outros?”
SALLY: “Tomir, fala comigo”
TOMIR: “Estou aqui”
SALLY: “Eu não sei o que o Alicate tem, a gente já vai chegar lá, mas você não deveria ter emprestado seu telefone para ele, assim como não deveria tocar em nada do que ele tocar”

*barulho de pancada e muitos palavrões

SALLY: “O que está acontecendo?”
ALICATE: “O filho da puta do Tomir me chutou do sofá, eu caí no chão, é isso o que está acontecendo!”
SALLY: “Tomir, agora que ele encostou no sofá, não adianta chutar ele do sofá, quem tem que levantar é você. E não encostar nele ou em nada que ele tenha encostado”
TOMIR: “Mas ele está de roupa, Sally, eu achei que de roupa não tinha problema! A roupa não protege?”
SALLY: “Onde estão as lesões?”
TOMIR:
ALICATE:
SALLY: “ONDE ESTÃO AS LESÕES?”
TOMIR:
ALICATE:

Esfregando a testa com as mãos e sentindo um dos olhos latejar, olhei para a tela aberta do meu computador, no meio de um trabalho que eu tinha interrompido, e fiquei ainda mais irritada.

SALLY: “VOCÊS ME LIGAM, INTERROMPEM MEU TRABALHO E AGORA QUEREM QUE EU ADIVINHE AS COISAS?”
TOMIR: “Sally, é uma situação constrangedora, você pode ser mais compreensiva?”
SALLY: *respirando fundo
ALICATE: “Eu falei, Mano, essa mulher não gosta de ajudar ninguém não, só tira onda de que gosta de ajudar no blog…”
SALLY: “Tomir, você pode ao menos descrever como são as lesões?”
TOMIR: “Eu não vi as lesões”
SALLY: “Você me interrompe por algo que você nem sequer viu?”
TOMIR: “Não serei eu a olhar o pau do Alicate…”
ALICATE: “FILHO DA PUTA VOCÊ JUROU QUE NÃO IA CONTAR ONDE ERA”
TOMIR: “NÃO ENCOSTA EM MIM! NÃO ENCOSTA EM MIM! AAAAAAIIIII”
SALLY: *palavrão

Ouvi o barulho de uma terceira pessoa no ambiente, mas ignorei. Provavelmente estavam todos os idiotas reunidos, em um grande encontro contagiante.

ALICATE: “Posso te mandar uma foto e você olha?”
TOMIR: “Sally, eu sei que é pedir muito, mas por favor…”
SALLY: “Não serei eu a olhar o pau do Alicate…”
ALICATE: “Quer dizer que você vai me negar socorro?”
SALLY: “Eu não sou médica, eu não posso te socorrer e a informação que você quer saber está no Google Imagens!”
ALICATE: “Eu procurei, tá? Eu não sou burro! Mas tem pereba de todo tipo, de toda cor, qualquer coisa pode ser varíola!”
SALLY: Sinto muito, eu me recuso
ALICATE: “E se eu descrever…”
SALLY: “Meu querido, eu não posso te dar um diagnóstico com base no que você quer descrever, desculpa, mas tem que procurar um médico!”
TOMIR: “Foi o que eu disse a ele”
SALLY: “E deveria ter continuado a repetir, em vez de me ligar!”
MAMÃE TOMIR: “Oi Sally, querida, como você está?”
SALLY: “Oi?”
TOMIR: “Minha mãe estava almoçando comigo, na minha casa, quando o Alicate apareceu…”
SALLY: “TOMIR! Você está colocando a SUA MÃE em risco de contágio!”
ALICATE: “É doença de gay, Sally! A mãe dele não é viado!”
SALLY: “Se você tem tanta certeza de que é doença de gay e de que você não é gay, por qual motivo está preocupado?”
MAMÃE TOMIR: *rindo
TOMIR: “Minha mãe não encostou em nada do que ele encostou, Sally”
MAMÃE TOMIR: “Na verdade… depois que almoçamos eu lavei a louça…”
SALLY: “Copos e talheres com a saliva do Alicate?”
TOMIR: *palavrão

Seguiu-se uma discussão interna, ou melhor, três monólogos simultâneos, já que ninguém estava se escutando. Alicate berrando “Eu não sou gay!”, Tomir berrando palavrões e Mamãe Tomir pedindo calma.

TOMIR: “Ok, agora passou a ser problema meu, minha mãe está em risco. Temos que saber se o que ele tem é Monkeypox”
SALLY: “Tomir,as chances são mínimas…”
TOMIR: “Eu não vou brincar com a saúde da minha mãe!”
SALLY: “Se você quer certeza, ele tem que ir a um médico”
ALICATE: “EU NÃO VOU”
TOMIR: “NO CU QUE VOCÊ NÃO VAI”
MAMÃE TOMIR: “Filho! Modos!”
ALICATE: “NO SEU CU! EU JÁ FALEI QUE NÃO SOU VIADO!”

Nova gritaria. Deixei o telefone em viva-voz para não ter que ficar segurando enquanto eles brigavam, de modo a poder continuar trabalhando (digitando). Alguns segundo depois, meu cachorro saiu do quarto assustado.

TOMIR: “Sally, ele não vai. Tem como obrigar? Eu vou na delegacia!”
SALLY: “Não, não tem como obrigar. Só se você encostar nele e levar à força, debaixo de porrada, mas pode ter consequências jurídicas para você, sem contar que você pode acabar contaminado”
TOMIR: “Então alguém vai ter que olhar e dizer se parece Monkeypox”
MAMÃE TOMIR: “Não serei eu a olhar o pau do Alicate…”
TOMIR: “MÃE!”
MAMÃE TOMIR: “O que foi? Vocês dois acabaram de falar isso também!”
SALLY: “Faço das suas as minhas palavras, eu não vou olhar”
ALICATE: “Não sabem o que estão perdendo…”
TOMIR: “Seu filho da put…”

Nova gritaria e confusão. Em consideração ao meu cachorro, mantive o telefone na orelha desta vez.

TOMIR: “ME AJUDA, SALLY! NÃO ESTÁ VENDO MEU DESESPERO?”
SALLY: “Vamos focar nos outros sintomas. Ele sente sensação de gripe, dor de cabeça, moleza, dor no corpo, dor muscular e cansaço?”
ALICATE: Sinto, mas eu andei bebendo bastante esses dias e sempre que fico de ressaca fico assim”
SALLY: “Sabemos que na maioria dos casos o contágio é pela via sexual, ele pode entrar em contato com a mulher com a qual ele está bimbando e perguntar se ela tem sintomas”
ALICATE: “AS MULHERES…”
Todos: *silêncio
ALICATE: “Alicate tem, né?” – fazendo sinal de dinheiro com os dedos – “chove mulher”
SALLY: “Ok, entre em contato com AS MULHERES e pergunte”
ALICATE: “Qual parte do eu andei bebendo bastante esses dias você não entendeu? Não lembro nem o nome delas!”
SALLY: “O período de incubação é maior do que alguns dias, entre em contato com as que você lembra. Quando foi a última vez que você saiu com uma mulher estando sóbrio?”
ALICATE: “Sei lá, no último mês…”
TOMIR: “O que mais pode nos ajudar?”
SALLY: “Ele tem lesões em alguma parte do corpo que está descoberta?”
TOMIR: “Não sei, Sally, é inverno, estamos vestidos”
ALICATE: “Esquece, Mano, essa mulher não quer ajudar…”
SALLY: “Não, não quero não, estou aqui deixando de trabalhar para escutar essa pá de merda por ser muito egoísta”
ALICATE: “Seguinte, tem que resolver isso logo, já vi que não vai por bem, então vai por mal! Tia, tapa os olhos!”

Seguiram-se gritos e muitos xingamentos de Siago Tomir

SALLY: “O que está acontecendo?”
TOMIR: “Esse filho da puta baixou as calças!”
ALICATE: “Baixei não, tirei! As calças e a cueca! Você teria visto se não tivesse tapado os olhos”
SALLY: *fechando o computador e desistindo de trabalhar
ALICATE: “Abre o olho, viado!”
TOMIR: “VIADO É VOCÊ QUE TEM MONKEYPOX”
SALLY: “NÃO DEPENDE DE ORIENTAÇÃO SEXUAL, CARALHO!”
TOMIR: “Alicate? Alicate? Que barulho é esse?”
ALICATE: “Estou me esfregando no seu sofá… PELADO”
TOMIR: “SALLY! ME AJUDA!”
SALLY: “O que você acha que eu posso fazer por telefone?”
TOMIR: “SALLY, O QUE EU FAÇO?”
SALLY: “Eu definitivamente queimaria o sofá, não por Monkeypox, que ele não deve ter, mas por todas as DSTs…”
ALICATE: “EU NÃO VOU VESTIR AS CALÇAS ENQUANTO VOCÊ NÃO OLHAR”
TOMIR: “SEU DOENTE, MINHA MÃE ESTÁ NA SALA!”
ALICATE: “Tia, você tá de olho fechado, né”

Um silêncio preocupante e longo deixou a todos apreensivos. A mãe do Tomir não respondia, e ela não era mulher de não responder. Não sabíamos se ela havia desmaiado, morrido ou apenas se trancado no banheiro. Siago Tomir enfrentava o dilema de abrir os olhos para localizar a mãe e ver Alicate pelado cheio de pereba ou tentar resolver a dúvida de olhos fechados.

TOMIR: “MÃE? MÃE? MÃÃÃÃÃEEEEE”
SALLY: “Alicate, você que tá de olho aberto, vê onde está a mãe do Tomir!”
ALICATE: “Não sei onde ela está, não está na sala”
SALLY: “Você viu para onde ela foi?”
ALICATE: “Não, eu estava me esfregando no sofá de barriga para baixo para…”
SALLY: “Ok, sem detalhes, por favor”
TOMIR: “Alicate, sinta o tom da minha voz… assim que você se vestir, eu vou te matar”
ALICATE: “Então eu vou ficar pelado para sempre… hahahahahaha”
SALLY: “Enquanto vocês brincam de Bird Box da DST meu trabalho acumula, posso deligar o telefone e voltar a trabalhar?”
TOMIR: “ME AJUDA, SALLY!”
SALLY: “Como?”
TOMIR: “DE QUALQUER JEITO! ME AJUDA!”

Por pior que fossem todos os envolvidos, eu vi que o desespero de Siago Tomir estava em um nível preocupante. Me concentrei para tentar pensar em uma solução para esse impasse bizarro.

SALLY: “Vamos fazer um meio termo, ok? Alicate, tira uma foto das lesões e envia para o telefone do Tomir. Tomir, sem olhar, vai enviar para um amigo meu que é médico e ele dá a opinião dele. Ele é do Rio de Janeiro, não faz diferença o que ele vai pensar de você, Alicate. Todos de acordo?”
ALICATE: “Tá… pode ser”
SALLY: “Me dá uns minutos para eu pedir este agradabilíssimo favor para ele antes…”
TOMIR: “Como vou receber uma imagem e repassar sem olhar para a imagem?”
SALLY: “Quer trocar de lugar comigo? Quer ligar para um amigo seu para pedir que ele olhe a foto do pau perebado de um amigo do seu ex?”
TOMIR: “Não…”

Liguei para o meu amigo, contei uma história um pouco mais amena e pedi se, como um grande favor pessoal, ele poderia analisar as lesões. Ele concordou.

SALLY: “Tudo pronto, podemos começar”
ALICATE: “Eu pego o celular do Tomir e tiro foto?”
TOMIR: “NÃO ENCOSTA EM NADA MEU!”
SALLY: “Alicate, você pega o seu celular e tira uma foto das lesões e envia para o Tomir por WhatsApp, ok? Mas tem que ser uma foto nítida, bem iluminada, para que o médico saiba para o que está olhando”
ALICATE: “Pronto, enviei para o whatsapp do Tomir!”
SALLY: “Muito bem, Tomir, estou te enviando o contato do meu amigo médico também por WhatsApp. Salva o contato dele, depois você envia a foto para ele, o infeliz já está avisado”
TOMIR: “Estou tentando enviar a foto sem ver…”
ALICATE: “Me dá que eu mesmo envio…”
TOMIR: “NÃO ENCOSTA EM NADA MEU!”
SALLY: “Ele está encostando em alguma coisa?”
TOMIR: “Não sei, estou de costas para ele, ele ainda está pelado”
SALLY: “Alicate, não quer se vestir?”
ALICATE: “Não, vai que ele pede mais foto para ver melhor?”
TOMIR: “Merda… merda… não vai… merda”
ALICATE: “Mano, você tá botando a mão na frente da tela toda! Assim não dá para ver nada…”
TOMIR: “Cala a boca, Alicate!”
ALICATE: “Mano, isso não vai dar certo…”
TOMIR: “VAI SIM”
SALLY: “Tomir, eu acho que quando O ALICATE diz que algo não vai dar certo é sinal de que…”
TOMIR: P-U-T-A Q-U-E P-A-R-I-U

Pelo tom de voz usado por Siago Tomir, percebemos que algo ruim tinha acontecido. Achei que ele tinha visto a foto sem querer, afinal, ver a foto do bilau perebado de alguém entra na categoria “algo ruim”. Mas era pior, muito pior.

SALLY: “Tomir, o que foi?”
TOMIR: “Errei, enviei sem querer para um cliente”
SALLY: “APAGA! APAGA RÁPIDO”
TOMIR: “Estou tentando apagar sem ver a foto!”
SALLY: “TOMIR, FODA-SE VER A FOTO A PRIORIDADE É APAGAR RÁPIDO”
ALICATE: “HAHAHAHAHAHAHA”
TOMIR: “Apaga! Apaga! Apaga caralho!”
SALLY: “Literalmente…”
TOMIR: “ACHO que apaguei”
SALLY: “Antes do cliente ver?”
TOMIR: “Não sei…”

Do nada, ouço a porta da casa se abrindo e Mamãe Tomir dando instruções

MAMÃE TOMIR: “É AQUELE ALI, AQUELE SEM CALÇAS”
VOZ: “Certo, deixa eu olhar de perto…”
ALICATE: “O QUE ESTÁ ACONTECENDO AQUI?”
MAMÃE TOMIR: “Você não quis ir até um médico, eu trouxe um médico até você…”
TOMIR: “Minha mãe… acaba de ver… o Alicate pelado…”
SALLY: “Sem as calças, né?”
ALICATE: “Não, eu tirei a roupa toda mesmo, para combinar”
MÉDICO: “Isso não é varíola dos macacos!”
ALICATE: “Não?”
MÉDICO: “Não”
ALICATE: “Que alívio…”
MÉDICO: “Antes fosse, seria mais fácil de tratar… Isso aí vai te dar um problemão, meu jovem”
SALLY: “Eu posso voltar para o meu trabalho, por gentileza?”
MAMÃE TOMIR: “Pode sim, minha filha, desculpa te meterem nessa baixaria”
SALLY: “Ótimo, adeus a todos e… Alicate, boa sorte quando seu membro ficar verde e cair”
ALICATE: “QUEEEEE”
SALLY: *desligando

Para perguntar a Siago Tomir se o cliente chegou a ver a foto, para perguntar a Siago Tomir qual é a doença do Alicate ou para perguntar a Siago Tomir o que ele fez com o sofá: sally@desfavor.com

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