De que lado você quer estar?

Este texto é para te perguntar: de que lado você quer estar nestas eleições? Mas calma, provavelmente você não entendeu a pergunta. Vem com a gente.

O fio condutor do texto é o evento envolvendo Roberto Jefferson, o bandido mais eclético do Brasil, que, depois de roubar horrores com Lula e Bolsonaro, protagonizou cenas lamentáveis no último final de semana. Ele recebeu a polícia federal, que foi até sua casa para prendê-lo, jogando granadas e dando tiros de fuzil.

Não vou entrar no mérito do que pensou ou sentiu Bob Jeff, ele está passando por uma doença horrível e só ele pode explicar essa reação. Mas sim entro no mérito prático: não adiantou nada fazer isso e ainda complicou muitíssimo a situação dele. Independente de alguém ter gostado, para ele, eu te garanto que não compensou. Mas, para o resto do Brasil, o que ele fez tem uma utilidade: servir de exemplo.

Bob Jeff estava realmente em uma posição difícil: prestes a ser preso, com câncer e com idade avançada. Como disse, não entro no mérito da escolha dele. Mas surpreende que pessoas que não estão na iminência de serem presas também estejam se comportando com semelhante descontrole, e achando bonito e honrado agir assim. É a glamourização da loucura – e ela não é privilégio de um único lado.

Pois bem, que este episódio lamentável sirva de exemplo para relembrar a todos que atos vindos desse estado mental não costumam ter consequências boas e ainda podem causar estragos irreversíveis na sua vida. Seja você de esquerda ou de direita, seria bacana se comportar como um adultinho, maduro e controlado. Vai acontecer? Não vai. A maioria vai se portar como um símio mesmo e, nesta semana, como um símio ao quadrado.

É gente… O Brasil enlouqueceu, e nesta última semana pré-eleições a coisa piorou. O que nos leva de volta à pergunta do texto: de que lado você quer estar? Não é do lado do candidato A ou B, é do lado da sanidade mental ou da insanidade mental.

A pergunta deste texto é: você pretende participar da loucura (ainda que seja permitindo que ela te afete) ou pegar um saquinho de pipoca e assistir com a gente, dando risada?

“Mas Sally, não tem como rir, é muito grave se __________ ganhar”. Tem como rir sim. Porém os dois lados polarizados tentarão te convencer de que, se você não sofre, se afeta e briga, você é um isentão sem valor algum. Fodam-se eles. Neste caso, sofrimento, briga e estresse são completamente inúteis – e ainda podem te levar a fazer bostas irreversíveis com o potencial de piorar sua vida.

O estresse, a raiva, o medo ou qualquer outro sentimento negativo libera cortisol e outras substâncias tóxicas no seu organismo, ou seja, isso te faz mal, não apenas psicologicamente, mas fisicamente. Eventualmente, pode ter sua função, por exemplo, se você precisa fugir de uma onça faminta: o estresse fará com que sua força aumente, você veja melhor, corra mais rápido, aumentando as chances de conseguir escapar.

Então, quando só depende de você, quando de alguma forma pode te ajudar, quando tem uma utilidade prática, sentimentos como medo, estresse e raiva compensam o preço de desgastar sua saúde física e mental: uma pessoa que não consegue fugir de uma onça não terá saúde mental para zelar.

Mas, quando falamos de situações que não dependem de você, o estresse, a raiva o medo ou qualquer outro sentimento que faça mal para seu corpo e sua mente são puro masoquismo, auto ataque e distração para não olhar para as coisas que realmente só dependem de você. E é o caso neste momento: você não pode influenciar o voto de 220 milhões de pessoas, nem ao menos deveria querer fazê-lo, pois a premissa da democracia é se sujeitar à vontade da maioria. Adianta se aborrecer?

Obviamente quem está arrancando os cabelos, brigando em rede social e dando importância a esta eleição vai revestir isso com algum manto nobre, e nós estamos aqui para removê-lo e pisar nele. Não tem nada de nobre em se aborrecer por algo que você não pode mudar, na verdade, é extremamente idiota. No mínimo essas pessoas deveriam estar tentando não se aborrecer em vez de se aborrecer com orgulho e ostentar isso.

“Mas não tem como não se aborrecer, pois o resultado das eleições me afeta”. Olha, eu fiz uma cirurgia uma vez para biopsiar um tumor e a biópsia demorou 20 dias para sair. Vamos dizer que se eu tivesse um câncer, isso me afetaria, provavelmente muito mais do que quem senta na cadeira de Presidente. Porém, não estava no meu controle a situação, portanto, tentei não pensar nisso, não me preocupar. Alguns dias consegui, outros não, mas jamais fiquei proclamando meu estresse como motivo de orgulho.

O que quero dizer é: o fato de algo te afetar não é justificativa para liberar o estresse, o medo, a raiva ou o que for. Às vezes não dá para segurar? Beleza, respira fundo e saiba que não é legal se deixar afetar (em vez de ostentar isso com orgulho como se te fizesse um virtuoso). Segura tua onda, te afeta, mas se estressar não muda em nada a realidade.

“Ao contrário de você, eu me importo”. Eu também me importo, porém já tenho bastantes anos vividos para saber que para se importar não é preciso infligir um mal a si mesmo. Existem formas úteis de se importar, existem formas não-destrutivas de se importar. Sei que é difícil colocar isso na cabeça de um latino, mas, vamos lá, podemos ser pessoas melhores.

Não se importa mais quem chora, arranca os cabelos, bate-boca. Isso não é se importar, isso é se descontrolar, se fazer mal, viver em desequilíbrio. Não seja macaquito de acreditar que, para demonstrar algo, precisa ser passional, intenso e gritar aos quatro ventos. Se você não é mais um adolescente, agir desta forma depõe contra você.

“Mas se o ___________ ganhar, coisas horríveis vão acontecer!” Primeiro que não sabemos o que vai acontecer. O Fulano pode cair morto amanhã, por exemplo. Segundo que “coisas horríveis” é um julgamento que você faz, com base na sua crença. O que é horrível para você pode não ser horrível para outras pessoas. Terceiro que, talvez, o país realmente precise de coisas horríveis, seja para acordar, para melhorar ou apenas para sair do buraco onde está. A maior parte das grandes mudanças históricas começaram com coisas horríveis.

Se essa for a vontade da maioria, aceite o desafio de encarar as “coisas horríveis” com a maior dignidade possível, a vida tem disso, coisas horríveis acontecem com todo mundo. E sempre tem a possibilidade de trocar de país. Na real, se qualquer um ganhar coisas horríveis vão acontecer, calhou de certas coisas horríveis serem mais assustadoras para você. Lide com isso sem faniquitar, sem brigar e sem encher os ouvidos de terceiros.

“Por isso este país não vai para frente, falta gente com coragem para lutar”. Olha, quem fala isso, geralmente, seria o primeiro a correr em uma situação real de combate. Estou esperando até agora a galera do “pegaremos em armas” de ambos os lados, que não pegaram em porra nenhuma.

Mas, abstraindo esse detalhe, não é pela “luta contra” que se consegue algo. Quando você “luta contra” algo só consegue criar mais simpatizantes para esse algo que você está combatendo pois 1) divulga esse algo, permitindo que mais pessoas o vejam e se interessem por ele e 2) atrai pessoas com ânimo bélico como o seu.

“É para o bem da pessoa”. Adoro essa. Os superiores dizendo o que fazer para o bem da pessoa. Quem sabe o que é melhor para a pessoa, é a pessoa. Você não conhece a fundo a vida da pessoa, os dilemas, os problemas e os sentimentos para escolher o que compensa mais para ela. Você pode imaginar que algo é para o bem da pessoa, mas não está dentro dela para saber o pacote completo do que se passa.

E, digamos que, mesmo que soubesse, ainda assim, é um sagrado direito da pessoa fazer uma escolha errada e, mesmo que demore muitos anos, em algum momento isso serve como um aprendizado. Qual é a dificuldade em respeitar as diferenças, mesmo que para isso você se ferre? Esse é o conceito básico de democracia, amigão. Pensa duas vezes antes de encher a boca para defender a democracia, pois você mesmo não parece muito democrático se não aceita esse conceito.

“É um direito meu tentar virar votos”. Não. É uma intromissão sua. Liberdade de expressão significa poder falar o que quiser em público, não em particular. Em uma rede social, em um blog, na casa de alguém, quem manda são os donos. Então, não, não é um direito seu ir no perfil de alguém em uma rede social, por exemplo, tentar convencer essa pessoa a algo, por sinal, existe uma ferramenta para isso, que é te bloquear ou te silenciar. Voto é escolha de foro íntimo, pessoal, você não tem que se meter.

Voto é como discutir se você gosta ou não de brócolis. Não tem que discutir: quem gosta come, quem não gosta não come, ponto final. Se você não gosta, mas convive com gente que goste vai ter que cheirar peido de enxofre, é o preço que se paga para não ser um ditador e tolerar diferenças.

“É o meu país e eu vou lutar por ele”. Não mete essa… Você está lutando por aquilo que VOCÊ quer e VOCÊ acha certo e elevar isso a uma verdade absoluta é de uma arrogância muito da escrota! Quer que seu país melhore? Ajuda a educar, a alfabetizar, leva informação… faça coisas que realmente melhoram qualquer nação. Tenha vergonha na cara, quem você pensa que é para decretar o que é melhor para um país? Não use “o país” para justificar os seus devaneios arrogantes.

“Eu não consigo não me importar”. Ok. Beleza. Se importe e faça um trabalho mental para, gradativamente, compreender e internalizar que seu sofrimento não tem qualquer benefício prático, a não ser elevar seu ego à posição de mártir/virtuoso/inteligente que realmente se importa.

Entretanto, é possível se importar de boquinha fechada, sem encher o saco dos outros, não é mesmo? Não consegue não se importar? Bem, calar a boca e respeitar o direito de escolha do outro você consegue. Abrir a boca não é um ato involuntário.

O que as pessoas não percebem é que, quando você analisa em profundidade, é tudo sobre elas e seus egos: não querem o bem do país, não querem um país melhor, não querem nada a não ser que seu candidato ganhe, tal qual um torcedor de time de futebol. Não querem nada a não ser desfilar superioridade. Não perdem uma oportunidade de encaixar atos e eventos em suas crenças e militâncias.

O caso do Roberto Jefferson também ilustra isso perfeitamente. Li várias vezes militonto dizendo que “se fosse negro estaria morto”. Meu filho, eu sou mais branca que um giz e se um dia recebesse a polícia federal no Brasil a tiro e granada eu também estaria morta. O sujeito teve o respaldo de um Ministro e isso alivia a barra de preto, branco e azul. Mas tudo é sobre cor da pele, não é mesmo? Tudo é pano de fundo para lacrar, militar, levantar a sua bandeira. Monotemáticos burros e limitados.

Por outro lado, vi gente defendendo a atitude de Bob Jeff. Meu anjo, não importa quantas ilegalidades existam, não importa o que esteja envolvido, não importa quão escroto seja o STF, receber polícia com granada e tiro de fuzil não merece aplausos, inclusive por ser ruim para a pessoa que faz isso. Nem a filha dele teve coragem de defender seus atos, haja paciência.

Ambos os lados estão cegos e insanos, pois ambos os lados estão movidos por raiva, medo, rancor, ressentimento, ódio, rivalidade, separação e intolerância. Então, eu te pergunto novamente: de que lado você quer estar nestas eleições? Do lado da sanidade mental, que reprova essa loucura, ou do lado dos malucos que estão se descabelando e fazendo disso o centro de suas vidas?

E, não me interpretem mal, eu não quero dizer que para estar do lado da sanidade é preciso votar nulo. Negativo. Você tem o direito a votar como quiser. Tapa o nariz, toma um Plasil para não vomitar e vota na merda que você acha menos merda, sagrado direito seu. Mas, por favor, não se misture com essa gentalha: fazer campanha, colocar logo de político em redes sociais, pedir voto, defender, brigar por política… Não. Apenas parem.

Fiquem do lado da sanidade. O Brasil está insano e isso não vai acabar com as eleições, isso vai continuar até as próximas eleições em 2026. Um passinho atrás, respira fundo e assimila que ficar brigando, permitir sentimentos negativos, se desgastar e se estressar não ajuda o país e ainda faz muito mal a você e aos que te cercam. Seja melhor, não vá para o lado da insanidade, uma vez lá dentro a coisa progride rápido e sem que você perceba.

Para dizer que esta semana promete, para dizer que a final da Copa do Mundo moderna vai ser neste domingo ou ainda para ficar repetindo que somos isentões como se fosse negativo não participar dessa insanidade: sally@desfavor.com

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Comments (18)

  • “O que as pessoas não percebem é que, quando você analisa em profundidade, é tudo sobre elas e seus egos.”

    Exatamente. Dos dois lados, só vejo gente repetir argumentos de militontos sem sequer entender o que está dizendo. Estou feliz por ter passado pelas eleições sem stress, mão vale mesmo a pena. É claro que coisas horríveis vão acontecer se Bozo/Molusco for eleito, coisas horríveis sempre estiveram acontecendo no BR e todo mundo sempre esteve cagando, isso não é novidade.

    • Não adianta se aborrecer. Não ajuda em nada, não melhora a situação. Mas as pessoas se aborrecem ou ostentam aborrecimento para mostrar virtude, ressaltar o quanto elas “se importam”. Deus me dibre de perder meu tempo construindo uma imagem para terceiros, que derrota!

  • Admiro o sangue de barata, mas infelizmente, não consigo não elevar o meu cortisol depois de uma pandemia que me fez ficar em casa por dois anos. Eu não consigo conceber como que uma pessoa que tripudiou tanto de pessoas que se contaminaram, que disse que não era coveiro, que não comprou vacina ainda seja eleito. Muita gente morreu perto de mim, gente que estava trabalhando, gente que já estava doente quando a pandemia começou e não sobreviveu porque se contaminou.
    Não dá para desconsiderar o jogo sujo que o fã clube do presidente faz. Outro dia, tive que ouvir que o Brasil tem três instâncias, depois ouvi que o Brasil tem 66 recursos. As pessoas acreditam em versões distorcidas da realidade. Não dá para ver tudo isso e fingir indiferença.
    Queria sim ser elevada espiritualmente e passar por esse turbilhão como se nada fosse me afetar pessoalmente, queria a indiferença, mas não consigo.

  • Esse texto me lembra daquele tempo que tinha certos babacas que ficavam “O povo quer Sapo Barbudo livre”, sendo que o povo no geral estava pouco se importando com o Sapo Barbudo, mas também, o que esperar de um pessoal que acha que democracia só quando seu político de estimação ganha a eleição, né?

  • Hosmar Weber Júnior

    Jamais vou perdoar o Bozo por me fazer votar no PT, sim o livre arbítrio é meu para escolher e eu quero ter ele para malhar o Lula nos próximos 4 anos

  • Como é bom ver uma ilha de lucidez no meio desse mar revolto de polarização! O que a Sally mencionou no texto sobre se estar “do lado da sanidade ou da insanidade” é o que eu também venho há tempos dizendo a todos os que tem tentando conversar comigo sobre política ultimamente. Só que parece que ninguém quer entender que os dois lados só estão se lambuzando mais e mais em uma “guerra de cocô” como a desta tirinha:

    https://preview.redd.it/s3z6mgqfaru91.jpg?width=960&crop=smart&auto=webp&s=64e170e70683c43045f0533093197c1ea8ed2d73

    E, pior: os militantes insistentes dos dois lados ainda ficam tentando de todo jeito me convencer a aderir às suas respectivas causas. Dentre esses “militantes insistentes” há inclusive gente que antes nem se importava com política e me chamava de chato quando eu tocava no assunto…

  • “O que as pessoas não percebem é que, quando você analisa em profundidade, é tudo sobre elas e seus egos: não querem o bem do país, não querem um país melhor, não querem nada a não ser que seu candidato ganhe, tal qual um torcedor de time de futebol.”

    A.K.A. : Gozar com o pau dos outros.

    • Não, acho que seja gozar com o pau dos outros não. É mais uma questão de ego mesmo: MEU candidato é o melhor, pois EU sou o mais inteligente e sei escolher MELHOR do que o outro.

      • Tanto lulistas quanto bolsonaristas acham que fazem perto de um seleto grupo de gente com QI de Einstein por supostamente estarem votando “no lado certo”, mas, na verdade, não chegam a sequer terem o nível de debilidade mental da dupla Beavis & Butt-Head.

  • Sanidade não se trata de uma opção ou outra. Sanidade se trata de como você conduz suas escolhas, independente de quais sejam.

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