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Negacionismo econômico.

Negacionismo econômico.

| Desfavor | | 10 comentários em Negacionismo econômico.

No dia 10 de novembro, em sua primeira visita à sede da transição de governo, Luiz Inácio Lula da Silva falou pela primeira vez sobre a condução da economia em seu terceiro mandato. De forma vaga, ele criticou a ideia de disciplina fiscal: “Por que as pessoas são obrigadas a sofrer para garantir a tal da responsabilidade fiscal deste país? Por que toda hora falam que é preciso cortar gastos, é preciso fazer superávit, é preciso cumprir teto de gastos?”. LINK


Sai o negacionismo científico, entra o negacionismo econômico. Desfavor da Semana.

SALLY

Todo mundo comemorando o fim do negacionismo científico, mas… será que alguém percebeu que agora o negacionismo é econômico?

Antes mesmo de vencer as eleições, o PT já deu indícios de bizarrices que nem mesmo um chimpanzé teria coragem de cogitar: dizer que imprimir mais dinheiro não causaria inflação, falar que o teto de gastos é uma bobagem, conversas sobre uma moeda única para transações comerciais com a Argentina e outros países da América Latina, colocar o “mercado” como um vilão a ser atacado e outras babaquices no estilo, que mostram como ainda vivem em um universo paralelo fantasioso onde, para posarem de super-heróis, escolheram o “mercado” como vilão.

Não deveria ser surpresa para ninguém que, depois de assumir, Lula só iria exacerbar essa postura. O discurso simplório do Lula sempre foi o de demonizar bancos, empresários e “o mercado” em geral. É esse recurso que ele usa para ressaltar o quanto se importa com o povo: dividir em dois lados, estabelecer que um é inimigo do outro e se colocar supostamente do lado do povo.

Tremenda babaquice, pois qualquer pessoa que tenha mais de dois neurônios vai te dizer que a economia de um país não sobrevive sem o malvado “mercado”. Mas polarizar dá certo, né? Enquanto der certo, ele vai continuar fazendo. Pega bem se colocar do lado do povo, mesmo que os atos indiquem o contrário.

O PT já está se comportando como se dinheiro fosse infinito novamente: inchando o funcionalismo público para acomodar seus apadrinhados, jogando dinheiro em republiquetas que violam direitos humanos apenas por serem “companheiros” (prontos para construir metrô na Venezuela?) e fazendo centenas de outras coisas que são um claro indício de que não aprenderam com seus erros.

Esse tipo de comportamento quando se pega a casa arrumada (pelo Real de Fernando Henrique Cardoso) e um momento econômico favorável (boom de commodities) é arriscado, tanto que Dilma colheu a merda que Lula plantou. Mas esse tipo de comportamento quando se pega a casa devastada (depois do imbecilóide do Bolsonaro) e um momento econômico tenebroso (ano de recessão, com guerra e pandemia) é um verdadeiro suicídio.

Existem duas hipóteses aqui: Lula está fazendo um discursinho de esquerda e no fim das contas vai abrir as pernas e afagar o mercado ou Lula vai prosseguir com a mesma imbecilidade de sempre e colher resultados muito, mas muito ruins. E ambos são tristes: um hipócrita escroto ou um burro do caralho não são bons líderes para uma nação.

E, mesmo que o discurso seja da boca para fora, para “ostentar” que prioriza pobre em detrimento do mercado (as pessoas podem melhorar de vida sem você chutar o mercado, por sinal, é a única forma), isso tem consequências. Esse discurso imbecil que expõe negacionismo econômico, mesmo que não seja colocado em prática, repercute na realidade.

Pode ser o investidor que lê uma estupidez e desiste de investir no Brasil, pode ser o mercado receoso, pode ser todo tipo de medo ou cuidado que vocês imaginarem. No mínimo, o Brasil deixa de ganhar investimentos, mas eu acredito que também irá perder.

Mas o que vale para o PT é o aparentar ser. Caga para mulher, fala coisas machistas, frita sem dó as poucas mulheres que conseguem se destacar na política, mas faz um discursinho lacrador inclusivo feministo do caralho! Então, essa é a premissa: dizer que é pai dos pobres, que o pobre vai voltar a ser feliz, que vai lutar contra o mercado malvado, afinal, todo herói precisa de um inimigo. Haja imbecilidade.

E a pior parte é: funciona. Funcionou por 20 anos e provavelmente vai funcionar novamente, pois o brasileiro foca mais no discurso do que na prática, talvez por não ter subsídios e cognição para compreender o que está sendo feito na prática.

Disse que vai lutar por mim? Gente boa, está lutando por mim! Mesmo que por debaixo dos panos a pessoa esteja sacaneando, a maioria vai acreditar que é um aliado. Não é à toa que tanto esquerda como direita se esforçam para manter um povo ignorante e polarizado: ele é muito fácil de manipular.

O pior é que os petistas nunca vão admitir o erro. Vou te adiantar o roteiro: nos próximos dois anos não tolerarão nenhuma crítica dizendo que “mas também ele pegou um país quebrado pelo Bolsonaro”. Tudo vai ser culpa do Bolsonaro. Inflação aumentou? Lula quebrou a perna? O cafezinho esfriou? Culpa do Bolsonaro, que acabou com o país!

Nos outros dois anos seguintes, se a coisa continuar piorando, o discurso vai ser “não é hora de criticar o PT, se não o Bolsonaro volta”. O esquerdista médio vai tomar a trolha que seja no meio do cu com medo da volta do Bolsonaro, ignorando o fato de que existirão outros dez candidatos como opção. A partir de 2025/2026 será proibido falar mal do Painho (se ele estiver vivo até lá).

Então, por mais que eu aprecie um discurso defendendo ciência e educação, eu sei que 1) provavelmente vai ficar só no discurso ou 2) para prestigiar ciência e educação tem que saber gerir as finanças pois dinheiro não é infinito.

Não adianta votar em quem quer prestigiar ciência e educação se a pessoa não sabe manejar os recursos, o resultado vai ser o mesmo: ciência e educação sucateadas. Eu já tenho idade para saber que de boas intenções o inferno está cheio, então, zero esperanças neste governo. E sequer acredito que tenham boas intenções, é misto doentio de demagogia, hipocrisia e mentira.

O triste é ver o brazuca comemorando “o fim do negacionismo”. Não, meus queridos, o negacionismo continua, só que agora ele é econômico. E, spoiler: se sair do controle, é o pior tipo quando falamos de voto. O povo toma cloroquina, morre na fila do posto de saúde, se fode sem vacina, mas… se não puder comprar a cervejinha, pagar a conta no puteiro e compra seu celular ostentação, aí sim periga do povo nunca mais votar naquele político.

Tirem da cabeça de vocês que tudo vai melhorar. A equipe escolhida pelo Lula está mais alinhada com a Era Dilma do que deveria: pessoas que já provaram que fazem um péssimo trabalho e que são incapazes de se atualizar. Para fazer qualquer melhora no país (inclusive na ciência e educação) tem que saber gerir os recursos em vez de gastar com os seus, esbanjar e bancar republiqueta com ditador.

O negacionismo só está começando…

Para dizer que vai passar a usar o termo “negacionismo econômico”, para dizer que somos de direita (não somos) ou ainda para dizer vai usar o texto sobre projetos para sair do Brasil: sally@desfavor.com

SOMIR

Respondendo ao Lula: por que o dinheiro não é infinito e o país precisa ter recursos para pagar suas contas. Mas ele sabe disso. Tanto sabe que no seu primeiro governo, quando o complexo de Deus ainda não estava totalmente instaurado, delegou a economia para gente que tinha essa preocupação básica com sustentabilidade financeira da máquina pública. Com o passar dos anos, o poder subiu à cabeça e chegamos nos dois governos Dilma, que fizeram o que fizeram com a estabilidade financeira do Brasil.

Pelo visto, a narrativa do “golpe” entrou tão fundo no subconsciente do petismo que parecem acreditar que o único problema da condução da economia nos tempos de Dilma foi a falta de continuidade. Tanto que muita gente voltou daquele tempo, e a turma do primeiro mandato de Lula ficou escanteada depois do apoio na reta final das eleições.

Podemos estar enganados, torcemos para estar enganados, mas os sinais não são dos melhores. O “mercado” está preocupado por um motivo, e a resposta do governo parece ser demonizar as elites gananciosas, criando um vilão no setor financeiro para justificar as críticas que recebe dele.

Pode colar para a turma dele, mas não cola conosco: o “mercado” não é uma entidade maligna, nem mesmo benigna. Os investidores estão nessa para ganhar dinheiro, e podem ter certeza de que o mercado não vai perder dinheiro. O humor dele descrito por jornalistas como positivo ou negativo nada mais é do que a estratégia de ganhar dinheiro da vez.

O mercado ganha dinheiro se a economia brasileira for boa ou ruim. A única coisa que muda é a estratégia para ganhar esse dinheiro. Se o PT estiver guiando a economia para um lugar seguro, ganham dinheiro com investimentos no crescimento do país. Se o PT estiver “dilmando” de novo e começar a torrar dinheiro que não tem na expectativa de que vai compensar no futuro, ganham dinheiro especulando com volatilidade e juros altos.

O mercado não está feliz ou triste, o mercado está ganhando dinheiro. E lutar contra o mercado é uma estupidez imensa. Ele vai ser reorganizar ao redor de qualquer ideia que o Lula tiver, sempre pronto para receber mais e mais em troca de seus investimentos. Se vão investir em empresas brasileiras ou se vão investir em exploração da dívida do país, só depende de como as coisas se desenrolarem.

E por mais limitado que seja o discurso de Lula, eu já acredito que ele sabe disso também. Discursar como se o mercado fosse a representação de uma elite exploradora contrária ao aumento da qualidade de vida do povo brasileiro é maniqueísmo barato, mas na era do polarização, parece que cola! Como a Sally bem disse, está na cara que vai ser tudo culpa do Bolsonaro, e quando isso não funcionar mais, vão ser as “elites de olhos azuis” de novo.

Tudo o que motivar a base eleitoral. O projeto petista não é sobre o Brasil, é sobre o poder. Sim, eu sei que tem muito idealista no partido, mas mais de uma década no poder tornaram muitos de seus líderes numa espécie de “centrão pró-gay”, o mesmo fisiologismo com um discurso de igualdade para enfeitar. Se isso for o suficiente para manter mais da metade da população votando neles, é exatamente isso que vão fazer.

Lula pode até não tentar reeleição, mas vai querer colocar mais um poste no lugar, para não perder mais o poder. Até porque a experiência foi traumática com anos de cadeia da última vez. O inimigo mais eficiente ainda é o Bolsonaro, mas se os bolsonaristas se transformarem em outra coisa (provavelmente pior ainda), ele vai mudar o discurso e usar o negacionismo econômico (adorei a expressão) com ainda mais força.

Não vai ser erro do PT, vai ser conspiração do mercado. Gente que acorda de manhã e pensa em jeitos de tirar dinheiro dos pobres! Eu diria que só um povo muito otário para acreditar nisso, mas é o povo teve certeza durante duas eleições que só podia votar em Bolsonaro ou Lula (em 2018, o poste dele). É possível que acreditem nisso também.

E enquanto houver apoio popular o suficiente, Lula pode continuar empurrando uma teoria keynesiana desatualizada na segunda década do século XXI. Explicação curta: a ideia dessa teoria é que o Estado estimula a economia com gastos públicos, o que fez muito sentido durante uma boa parte do século passado, mas que já está sendo revisto por causa dos efeitos colaterais de máquina pública inchada. É melhor ter uma teoria do que não ter nada como bolsonarismo? É. Mas não ajuda nada ficar para trás no bonde da história. Tem que rever o plano e adicionar as justas preocupações com a solvência do Estado no meio desse processo. É isso que o mercado está vendo: gente parada no tempo teimando com algo que já foi atualizado para gerar melhores resultados.

O mundo já viu essa teoria econômica funcionar e já viu ela falhar. O mercado realmente não liga para o bem estar dos pobres por definição, ele só quer mais retorno no seu investimento; a questão aqui é que ele não tem como controlar o governo, ele vai só indicar com suas escolhas o que está enxergando no futuro do país. O mercado não vai se mexer para ajudar ou atrapalhar o pobre. Na verdade, ele vai até ficar feliz se a classe média do país aumentar, afinal, isso gera muito mais oportunidades de fazer dinheiro.

A polarização alimenta o negacionismo, o negacionismo alimenta a polarização. Fico muito feliz que o governo atual não seja inimigo do conhecimento científico, mas não podemos fingir que não estamos vendo um risco de entrar no governo Dilma III. Negacionismo econômico é perigoso também.

Espero não estar reclamando de uma crise econômica horrível daqui há alguns meses ou anos, mas o risco parece bem alto. Como quase sempre aqui, espero estar muito errado.

Para dizer que eu fui pago pelas elites (são todas pão-duras), para dizer que é culpa do Bolsonaro, ou mesmo para dizer que pelo menos vai ser uma palhaçada mais diversa dessa vez: somir@desfavor.com


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