Jogando fora.
O presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, voltou a defender nesta quinta-feira, 12, a antecipação da proibição do uso de cartões de crédito para o pagamento de apostas esportivas eletrônicas, feitas nas chamadas bets. De acordo com ele, os bancos estão preocupados com o comprometimento da renda das famílias que esse uso pode trazer. LINK
É por isso que não podemos ter coisas boas. Desfavor da Semana.
SALLY
Esta semana a FEBRABAN (Federação Braseira de Bancos) fez uma advertência muito séria sobre o impacto das bets no Brasil. A questão é muito mais complexa do que isso, mas como é um texto de duas páginas, vamos fazer uma simplificação grosseira: o volume de apostas irresponsáveis (quando a pessoa aposta o que não tem ou comprometendo dinheiro essencial para sua subsistência e de sua família) chegou a um patamar tão bizarro no Brasil que está criando uma bolha de endividamento que pode até quebrar a economia do país.
Quando era apenas o setor de comércio gritando, a gente não deu bola, afinal, o comércio quer que as pessoas comprem, gastem dinheiro com eles, quando o gasto vai para outro lado, quem é prejudicado reclama. Mas agora não é uma parte interessada em um gasto específico, são bancos avisando que a economia vai emburacar.
Só no mês de agosto, e só os beneficiários do bolsa família, “gastaram” (na real, perderam) 3 bilhões de reais com apostas. Vou repetir: em apenas um mês, um grupo selecionado de pessoas que de forma alguma representa todo o país, perdeu 3 bilhões de reais para apostas. Não tem economia que suporte isso. Mas, quando se fala em proibir bets, muita gente pula: e a minha liberdade?
Estou respirando fundo para não escrever uma saraivada de xingamentos. Vamos tentar. Fé. Vamos tentar.
Primeiro que vocês não têm liberdade no Brasil. Nem a porra do Twitter vocês podem usar e todo mundo enfiou o galho dentro caladinho. Não pode falar mal do STF que entra em inquérito, não pode falar mal do Lula, não pode falar mal do PT sem correr o risco de ser indiciado. E contra isso ninguém faz nada, mas é só ameaçar empresa picareta, estelionatária, que está fodendo com a saúde mental do povo, destruindo famílias, que brota esse “minha liberdade?”. Vai bem tomar no cu.
E aqui os grandes protagonistas são os bolsonaristas. Os mesmos imbecilóides que achavam que quarentena feria liberdade. A liberdade de ir para a rua, pegar um vírus, morrer e ainda contaminar outras pessoas. Arrombados. Quando uma liberdade individual coloca em risco o bem-estar coletivo ela pode e deve ser tutelada pelo Estado.
Essa é e sempre foi a regra no ordenamento jurídico brasileiro, não tem nenhuma novidade aqui. Ou por acaso vocês acham proporcional deixar quebrar a economia para que Janderson, morador de Jaú, três filhos três divórcios, tenha o direito de jogar no tigrinho? Vai bem tomar no cu novamente.
“Mas o Estado que mandar no cidadão”. Queridão, você mora no Chimpazil, um país no qual caneta de lotérica tem que ter correntinha para as pessoas não roubarem, um país onde banheiro tem placa pedindo para não cagar no chão. Se o Estado não colocar limites muito bons e muito claros, vira um caos social. Eu acho que o Estado coloca é pouco limite se a gente for pensar no que é o brasileiro médio, as pessoas deveriam sair de focinheira na rua.
Aposta nesse grau é vício. E vício só se resolve proibindo. Você não estipula uma quantidade mensal de uso para um viciado em cocaína. É fundamental que as pessoas entendam as alterações cerebrais que apostas provocam em viciados, pois só assim vão compreender que medidas extremas como proibição não são cerceamento de liberdades individuais e sim proteção para o viciado e para toda a sociedade.
Eu não tenho esperança que isso seja compreendido tão cedo. Tudo que chateia o brasileiro vira censura, virou um discurso automático. Até aqui, neste micro cosmos insignificante isso acontece: a pessoa viola as regras do blog, é banida, não tem seu comentário aprovado e volta chorando sobre censura. Foda-se que ela violou as regras, se não aprovar o comentário é censura. Tudo é censura. Tudo é fascismo. Tudo é ditadura. Que povo idiota que brasileiro virou.
“Ain mas por causa de viciado eu também vou sofrer proibições?”. Silêncio, o brasileiro está descobrindo o ordenamento jurídico brasileiro. É basicamente o embasamento de todas as leis, então sim, sempre que algo causa problemas de saúde, de segurança pública e à economia, todos sofrerão restrições. Ou se sugere que deixe a economia quebrar para que você não se sinta tolhido, pequeno alecrim dourado?
“Proíbe só quem é viciado”. Curioso esse discurso, na hora em que você tentar transladar ele para drogas e pessoa vai pular. Na hora em que você disser que então tem que permitir aborto e só faz quem quer a pessoa vai pular mais ainda. “Mas aborto tira uma vida humana”, o sujeito dirá. Sabe quantas vidas humanas serão arruinadas se a economia quebrar? Sabe quantas crianças não tem o que comer pois os pais gastaram tudo em bet? Preocupação seletiva me enerva.
As pessoas parecem não ter a menos consciência da realidade do país no qual vivem. Metade do país caga em vala pois não tem esgoto, o país bate recorde mundial de câncer de pênis pelo fato das pessoas não se lavarem água e sabão, mas vamos tratar o Brasil como se fosse primeiro mundo. Infraestrutura nota zero + brasileiro médio? Vamos ignorar. Vamos dar autonomia e liberdade para a população sim e deixar eles perderem bilhões todos meses, pegar dez empréstimos e continuar apostando. O que pode dar errado?
Vocês querem liberdade? Então se eduquem primeiro, pois não dá para dar liberdade para símios que roubam caneta da lotérica, que apostam o dinheiro da comida das crianças e que não sabem lavar o pinto. Muito bonitinho ver macaquice libertária em rede social, mas nada mais é do que uma dupla desconexão com a realidade: de não saber que se der liberdade para o brasileiro médio ele implode o país e de não saber que se é brasileiro médio quando até ontem estava acreditando em intervenção federal para reverter as eleições. Os símios são sempre os outros, né?
Vamos aprender a ter uma noção de mérito? Liberdade se conquista e a julgar pela paumolescência de vocês no episódio do Twitter, ninguém merece liberdade aí não. Governo socando imposto no cu de pobre, floresta pegando fogo, doença sem vacina e os símios ficam militando pelo direito de apostar? Vai bem tomar no cu sucessivas vezes.
O povo mal sabe ler e escrever, acredita que o Brad Pitt está flertando com a pessoa via whatsapp e transfere dinheiro para ele, as pessoas não têm nenhuma noção de nada e não conseguem fazer uma porra de uma escolha informada e consciente e vai o símio bolsonarista e me fala em liberdade para bet? Vai chamar nave espacial com a lanterna do celular, vai filho. Não há qualquer condição disso no Brasil, a economia vai colapsar.
Não dá para dar liberdade sem antes assegurar educação, respeito e civilidade. Simplesmente não dá. E o brasileiro médio não tem nenhum dos três. Então, se querem liberdade, comecem a pleitear os requisitos mínimos para que ela possa ser instaurada sem criar um caos social e econômico.
Repito o que sempre digo aqui: por mim brasileiro não deveria ter autorização nem para usar garfo e faca, deveria comer com colher, para não acabar apunhalando o colega do lado. Parem de se comportar como se fossem civilizados e merecessem liberdade.
Para se ofender, para me chamar de petista ou ainda para dizer que ninguém tem discernimento só você: comente.
SOMIR
Neste tema, Sally e eu temos uma desavença sobre o quanto o Estado deve interferir na liberdade pessoal. Tanto que vai virar tema de “Ele Disse, Ela Disse” no futuro. Porém, no âmago da questão a gente concorda que o brasileiro médio é incapaz de lidar com bets ou basicamente qualquer coisa que possa viciar. É um problema com o qual precisamos lidar, e o que vemos do poder público até aqui é na melhor das hipóteses ignorante, na pior malícia deliberada.
O que me emputeceu é que diante da percepção que os brasileiros estão se afundando financeiramente por causa de apostas e outros jogos de azar online que passaram pelas brechas da legislação, a grande ideia foi querer regular o Bolsa Família. E essa grande ideia só apareceu por causa da notícia que o brasileiro médio dependente do auxílio governamental estava torrando o pouco que tinha com jogos.
Que pobres são mais vulneráveis a todo tipo de vício e especialmente frágeis contra promessas de riqueza imediata não é novidade. Até mesmo se você for o legislador mais analfabeto possível, é impossível não receber essa informação de alguém ao seu redor quando está falando de apostas e jogos. É fato consumado: pobres perdem mais dinheiro em apostas e golpes no mundo inteiro, e esse fato aparece em qualquer estudo sobre o assunto.
Não é achismo, nesse ponto da história é basicamente lei da física: quanto mais vulnerável socialmente uma pessoa, mais propensa a perder dinheiro com loterias, apostas e jogos de azar. Nem a explicação é complexa, essas pessoas têm muito mais barreiras para subir na sociedade por outros meios. Ganhar uma bolada por sorte é basicamente tudo o que lhes resta.
Digo isso porque é impossível que nossos políticos tenham percebido agora o problema que vem junto com acesso fácil a coisas como apostas esportivas. Você não chega num desses cargos sem ter por perto pelo menos uma pessoa que possa te dizer isso. Então, esses arrombados sabiam que daria nisso. Colocaram essa armadilha na frente do povão porque daria muitas oportunidades de ganhar dinheiro.
E quando o cerco se fecha neles pela escolha deliberada que fizeram, porque o governo Bolsonaro liberou mas o governo Lula teve todo o tempo do mundo de transformar em pauta e não fez, a solução genial é criar uma barreira para quem recebe Bolsa-Família e literalmente tratar só do sintoma que a imprensa divulgou. Primeiro que cria uma classe de párias sociais que não podem fazer algo legal para o resto da população, e segundo, mais importante ainda, só criaria um mercado negro de lavagem de dinheiro de benefício social.
O crime organizado vai montar lojas de fachada para transformar dinheiro de Bolsa-Família em aposta, criando brokers ilegais que vão oferecer empréstimos cobrados com sangue. Se era para evitar que o pobre jogasse, ele vai continuar jogando e vai se endividar mais ainda tomando golpe do PCC e similares. Eu concordo com a Sally que o problema é o brasileiro, mas não concordo que o Estado consiga evitar que ele faça merda desse jeito, vide a criminalidade absurda no país.
Enquanto as apostas forem legais e muitos dos caça-níqueis online estiverem em uma zona cinza de legalidade, o brasileiro vai jogar dinheiro fora nisso. Vai. Cassinos só não rendiam tanto assim na ilegalidade porque era chato conseguir ir em um por ser proibido, e óbvio, precisava ir até lá para apostar. A versão online fácil de acessar e entender muda o jogo, literalmente. É outro buraco, mais profundo.
Então, eu só consigo enxergar duas possibilidades mais lógicas: ou não deixa ninguém jogar, ou deixa todo mundo jogar. E as duas opções são uma merda, porque faz parte do sistema democrático esse tipo de escolha complicada. Alguém vai ficar puto, alguém vai sofrer, alguém vai se sentir injustiçado. Não tem como ter uma lei por cidadão, somos regulados pelos menores denominadores.
Eu não quero dar uma saída simples para os filhos da puta que liberaram apostas e jogo do tigrinho para ganhar um dinheiro rápido. Porque a saída rápida não funcionaria e porque eles teriam que pagar com a própria imagem pelas decisões que tomaram. Se o Brasil começar a ficar com a economia (mais) quebrada por causa das apostas, podemos contar com o povo jurando que não tem culpa de nada e querendo tirar o couro dos políticos.
O que não me parece um mau negócio. É tudo ruim, é tudo um desfavor, mas o jogo é esse. Não tem passe de mágica para fazer um povo pobre e ignorante parar de sabotar, demora, demora muito para educar. Acho que demora umas duas gerações de gente fodida por causa de vício em jogo para o brasileiro médio começar a perceber a besteira que está fazendo.
E a parte que eu discordo da Sally é que essa criança precisa queimar a mão para aprender. Queimar a mão e aí sim começar a aprender sobre os perigos do fogo. Gente com baixo Q.I. não consegue entender conceitos abstratos, e gostemos ou não, o brasileiro médio beira ao diagnóstico clínico de atraso mental. Não tem explicação sobre como o fogo é perigoso sem que essa gente coloque a mão no fogo. Não tem. Não adianta nem proibir ou bater na mão dessa criança antes dela colocar no fogo, você vai olhar para o lado e ela vai tentar de novo, e de novo, e de novo… mãos serão queimadas antes desse país ter uma chance.
E nem sei se aprendem depois disso, mas com certeza vão ficar muito putos com quem acendeu o fogo. Melhor do que nada.
Para dizer que é desesperador, para dizer que eu desisti (não, só corrigi o tempo das minhas expectativas de evolução), ou mesmo para dizer que são todos otários e você vai ganhar muito dinheiro: comente.
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Etiquetas: apostas, Brasil, brasileiro médio, política, vícios
Anônimo
Vai proibir de apostar via cartão de crédito porque é vicio, mas e os outros vícios? Deveriam proibir pagar bebidas e cigarros no crédito também. Esses outros vícios acabam igualmente com a vida dos dependentes.
Ge
Eu achei que vcs iriam falar sobre esse negócio de bets já na semana passada, em que saiu essa notícia tensa aí de que gastaram 3 milhões do bolsa família em bets.
É aquela coisa, quando até os bancos estão reclamando e alertando, é sinal de que a coisa deve estar feia mesmo, para além de estar doendo no bolso deles. Triste também notar que o brasileiro nem assim aprende, repetindo incessantemente essa falácia da liberdade individual.
Gui
Trabalho em instituição financeira, e o cenário é teratológico: muitas pessoas estão contratando empréstimo atrás de empréstimo pra continuar jogando. A previsão é de uma explosão na inadimplência entre essas pessoas. A alta administração da instituição para a qual eu trabalho ainda não deu sinais de alguma atitude no sentido de bloquear transferências, Pix, etc. De dentro deste setor, é como ver um acidente de carro em câmera lenta. Não vai ser legal o desdobramento disso aí.
Torpe
Ganhar dinheiro nessa merda de pais é fácil, o que impede é a ética de cada um. Poderia virar pastor ou político, mas não tenho estômago pra isso.
UABO
Faço minhas as suas palavras.
Paula
Eu não tinha noção de quanto problema essas bets estavam causando até conversar com um amigo psicólogo e ele me dizer que se tornou um problema de saúde pública. Achava que era só não baixar, não jogar e bloquear as contas que tentavam me dar golpe em redes sociais, mas pelo que meu amigo mostrou, o jogo é inteiro feito para viciar e fazer o usuário perder dinheiro. é pior do que jogos de cassino. Tem que proibir sim, é pro próprio bem das pessoas. Se drogas como crack e cocaína são proibidas, bets também têm de ser.
Estão pipocando manchetes de pessoas que perderam o único teto que tinham por causa do tigrinho e dá vontade de chorar de pena pela família. É triste que inocentes tenham que sofrer porque o responsável pelo sustento da família se tornou um viciado.
Esther
Vocês já leram a hipótese da contaminação por chumbo?
Somir
Não… como assim?