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Colunas

Golpezinho.

A operação da Polícia Federal deflagrada nesta terça-feira (19) apresenta, com riqueza de detalhes, como os militares das Forças Especiais utilizaram técnicas avançadas do treinamento militar para tentar executar ações como a captura e o assassinato do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes. Chegaram a colocar em prática um dos planos, posicionando militares perto da casa do ministro, mas cancelaram de última hora a ação. LINK


Então a coisa foi séria mesmo? Na nossa opinião, foi só o Desfavor da Semana.

SALLY

Hoje Desfavor completa 16 anos de vida. E para festejar a data, vamos fazer o oposto de qualquer comemoração: ser antipáticos. Começa hoje a “Semana Antiviral”, com postagens cujos temas e/ou abordagens são exatamente o oposto do que seria necessário para fazer sucesso e viralizar.

E, vejam bem, não quer dizer que a gente não vá ser sincero ou escolher temas que não gostamos. Muito pelo contrário, quanto mais somos sinceros e escolhemos temas e abordagens que moram no nosso coração, menos sucesso fazemos. Desfavor: 16 anos voando abaixo do radar. Por mais 16 anos assim.

Vamos falar da sequência de notícias que surgiram esta semana, curiosamente após uma gafe monstruosa da Primeira-Dama e do vazamento de algumas isenções para pessoas muito ricas e muito amigas do governo: uma suposta tentativa de golpe cujo plano foi deixado por escrito e não deu certo, entre outras coisas, por não terem conseguido pegar um táxi.

Todo Desfavor da Semana começa com um resumo da notícia, para situar o leitor. Na Semana Antiviral não. Vamos direito ao assunto.

É indiferente para mim se teve tentativa de golpe, se não teve, se estão mentindo, se estão falando a verdade. O que sempre defendemos permanece intacto: não são capazes, mesmo querendo. Como de fato não foram. Não teve golpe algum. Pensa num ridículo de ter medo do que não aconteceu, principalmente quando não aconteceu por uma incompetência galopante dos que tentaram.

Se é necessário repetir, vamos lá: não vai ter golpe. Ao menos não nesse modelo tosco de força, violência e brutalidade. Golpe de década de 60 é inviável no Brasil atual, e se você não pode ver isso, precisa ser medicado. Qualquer golpe que dê certo daqui para frente será muito mais sutil e revestido de “preocupação com o povo” ou de “salvar a democracia”.

O que preocupa não é se existiu ou não uma tentativa de golpe nos termos que a mídia está noticiando, pois qualquer pessoa com cérebro sabe que um golpe nesses termos não se sustenta no Brasil. Só causa preocupação em dois tipos de pessoas: nas que tem a cabeça oca e nas que querem defender seu lado às custas de botar medo nos demais.

O que preocupa e o que é o grande golpe está debaixo do nariz de todo mundo há mais de uma década e ninguém está vendo: dividir para conquistar. Um povo dividido, polarizado, que trata quem pensa diferente como inimigo. Isso é o golpe. Isso é a garantia de que político e Judiciário podem fazer o que bem entenderem, revestindo seus argumentos no combate “ao mal”, ao outro lado e a todos os perigos que ele supostamente representa. Esse é o aval para cometer qualquer abuso sob aplausos de metade da população. E esse será o argumento para “regular as redes sociais” com regras que são até piores que um golpe.

Estão mudando a linha do que é aceitável de lugar todos os meses. Vale descondenar condenados, réus confessos, de processos que conseguiram reaver milhões em dinheiro fruto de corrupção. Sim, o réu confessou o crime, dinheiro foi apreendido, mas juiz diz que o crime nunca aconteceu. Vale encerrar investigação sobre filho de Bolsonaro claramente bandido. Vale tudo. Corrupto, bandido, criminoso, sai impune no Brasil se souber jogar com a polarização.

E não é sobre o PT, todos os partidos já tiveram corruptos condenados e todos foram descondenados. Essa divisão esquerda e direita só existe no imaginário popular, na hora de sacanear o povo, embolsar dinheiro e praticar todo tipo de corrupção estão todos juntos. Não se engane, o perigo não é um lado ou o outro, são ambos juntos, de mãos dadas, tentando te convencer que um deles é perigoso e o outro é melhor. Pela enésima vez: são a mesma merda. Grita aí “falsa simetrinha” nos comentários…

O povo compra essa suposta divisão de lados, na qual um lado é o virtuoso, o correto, o salvador e o outro é tudo que há de ruim. O povo é burro. Mesmo aqui, que supostamente há uma pequena seleção pela quantidade de texto, aparece alguém nos comentários para chamar o Somir ou a mim de “isentões”. Não tomar lado entre dois lados filhos da puta pra caralho é demérito para esse povo que tem titica de sabiá amarelo na cabeça. Não pode querer que todo mundo se foda, tem que aderir a um lado. Quem só entende polarização acha qualquer coisa fora dela ruim.

Agora o povo está todo alvoroçado com “Bolsonaro preso amanhã”. Vocês parece que se esquecem em que país vivem e como as coisas funcionam. Permita relembrá-los: preso e condenado não significa mais nada, um político pode ser solto e descondenado no minuto e que isso se tornar conveniente. E, tendo em conta que em um eventual segundo turno o Lula só consegue, talvez, ganhar com tranquilidade do Bolsonaro, não convém ao próprio PT que ele esteja preso e condenado.

Mas convém queimá-lo, isso vão fazer. E muito bem queimado está. Nunca vamos esquecer o que ele fez na pandemia. Vai explodir notícia horrorosa sobre ele, sobre aliados dele, sobre a família dele (e nós vamos adorar assistir), mas, não se engane com a pirotecnia. É todo mundo aliado e convém deixar o inimigo por perto. É teatrinho. É circo. E se você levar a sério, o palhaço é você.

Digo isso pois tem muita gente com cabeça de pudim caindo no jogo do medo, achando que a democracia está ameaçada e que só vai se sentir seguro se essas pessoas forem presas e condenadas. Talvez isso não aconteça. Talvez aconteça e seja desfeito. Caso não aconteça, seria uma pena que vivam com medo, por causa desse cirquinho de quinta categoria muito mal encenado.

Quer ter medo? Quer focar em algo para melhorar o país? Quer tirar poder de político que você acha ser uma ameaça? Só tem um caminho: parem com a divisão, as brigas, os lados. Se fazem questão de um Nós x Eles, que seja o povo contra os políticos. Enquanto vocês continuarem brigando entre si, terão uma alternância de bostas no poder e, de quatro em quatro anos continuarão se perguntando como isso pode acontecer.

A única ameaça à democracia é um povo desunido, polarizado, onde uma metade trata a outra metade como inimigo. Não é um juiz, não é um político, não é um militar. É a desunião. Contra um povo unido, ninguém pode.

E nessas horas sempre vem um vira-lata debochar, como se fossemos iludidos ou algo do tipo. Pensa que triste: uma argentina tendo mais fé no povo brasileiro do que o próprio brasileiro. É por isso que metade de vocês caga em vala, vocês se recusam a exercer o poder que têm e duvidam quando alguém afirma que o tenham. Mais fácil deixar o poder nas mãos dos outros, né? De político, de juiz, de Presidente. Assim a responsabilidade também fica na mão dos outros.

Parem de se envolver nesses factóides, de comprar essas narrativas de ameaça, de acreditar no bem contra o mal, se não a saúde mental vai perecer. Se quer fazer alguma coisa, não participe da polarização. Se não quer fazer nada, não consuma esse tipo de conteúdo.

Quer saber quem está são? Pessoas sãs estão com pipoca na mão comemorando a prisão de qualquer político de qualquer lado. Pessoas que não estão sãs estão no medo achando que a democracia está ou esteve ameaçada por algum dos dois lados, que na real, são amiguinhos, unidos no propósito de foder vocês.

Feliz aniversário para todos nós.

Para deixa sugestões de temas para textos antivirais, para dizer que golpe é direcionar todas as narrativas para regulação de redes sociais ou ainda para apenas nos parabenizar por 16 anos de conteúdo diário e gratuito: comente.

SOMIR

É a minha semana de brilhar! 16 anos consciente ou inconscientemente escolhendo os temas menos chamativos, celebrados em uma série de textos que você provavelmente não leria em nenhum outro lugar. Ficamos tão bons nisso que tem gente que vem ler todo dia para dizer que não gosta da gente.

Um dos motivos pelos quais eu defendo a manutenção do formato de blog é a falta de opção: tem o tema do dia e pronto. Ou lê ou não lê, não tem mil coisas brilhantes disputando sua atenção. Você começou este parágrafo e agora é estranho não terminar, né? A lógica é bem parecida no quadro geral. Especialmente se você é um dos nossos leitores mais novos, fica a dica: muita coisa interessante na vida está depois de um pedágio de aparente chatice. Nós mais velhos não éramos mais inteligentes, só tivemos a “sorte” de ter menos opções no nosso consumo de cultura (útil ou não).

Dito isso, vamos fazer o trabalho de tirar a graça das notícias sobre a tentativa de golpe violento no Brasil. Porque por detrás das manchetes bombásticas sobre um grupo de elite do exército brasileiro tramando o assassinato de figuras importantes, tem a realidade quase cômica do que configura um grupo de elite brasileiro…

Se você quer revoltas violentas baseadas em ideologia, o Brasil não é lá um lugar muito interessante para fazer essa pesquisa. Claro, tivemos sim um número de momentos sangrentos na história nacional, mas considerando o tamanho do país e a grande população, era de se esperar muito mais. Não só terminamos a colonização (oficial) com um grito às margens de um rio, como terminamos o império e até mesmo a ditadura em acordos relativamente pacíficos.

O Brasil é um país mediano, essa é a realização que pouca gente tem: ou são ufanistas descontrolados, ou acham que somos a mesma coisa que qualquer outro Estado falido ao redor do globo. Não é nem uma coisa nem outra. Estamos numa democracia moderna relativamente estável, nosso índice de desenvolvimento humano não é tão feio assim, e temos uma economia viável que fica sempre próxima das dez maiores do mundo.

O problema do Brasil não é ser o pior país do mundo, nem de longe. O problema é que o potencial é muito mais alto que a realidade. Uma série de fatores faz com que o país fique abaixo da sua capacidade real, alguns até são geográficos e históricos por causa da colonização, mas é o povo que realmente está muito atrás da curva. Tem uma mentalidade pervasiva no país de acomodação que é resultado direto da riqueza natural do país e a “tranquilidade” militar das Américas.

Os EUA tem que se preocupar com suas intervenções globais e uma população extremamente armada, os japoneses com um entorno de países que os odeiam, os alemães literalmente têm que se preocupar com a volta do nazismo… todo país desenvolvido tem alguma pressão séria para lidar. O Brasil sofreu da última vez por um golpe militar que foi basicamente entregue pronto pelos americanos e executado com a bênção do maior exército do mundo. E mesmo assim, saímos dessa situação num acordão de anistia que basicamente dizia para deixar tudo para lá.

Nossa última grande ameaça à estabilidade democrática? Um grupo de militares malucos que aparentemente não conseguiu um táxi a tempo. A última informação que temos é que Bolsonaro tentou convencer os chefes das forças armadas uma última vez no dia em que atacariam Alexandre de Moraes, mas como só um de três topou, não quis seguir em frente.

Não é inconsequente que o líder da Marinha topou dar o golpe, ele e todo mundo que tramou precisa ser punido, mas se você tem a mínima memória do que o Brasil passava naquele final de mandato do Bolsonaro, sabe que não havia clima para um golpe militar de verdade. A cúpula militar nem queria. E os bolsominions de uniforme ao redor do país estavam esperando alguma chance de ganhar sem chacoalhar demais a ordem das coisas.

É a mentalidade do acordo de novo. Nos atrapalha na hora de tentar mudanças reais entre os inúmeros atrasos civilizatórios que nos infestam, mas também tem um lado positivo: não está na alma do brasileiro se matar por uma ideia política. Muitos nem entendem muito bem a ideia da vez, para ser honesto. O bolsonarismo gira muito ao redor da ideia de que os bandidos estão matando os cidadãos de bem, não necessariamente que precisamos de uma nova organização política. Porque, como dito anteriormente, isso é um pouco mais complexo do que a média de Q.I. nacional permite.

Gostem ou não, é confortável estar no poder dentro do nosso Estado Democrático de Direito: semblante de normalidade e justiça com liberação para roubar dinheiro público à vontade. A minha teoria da conspiração é que Bolsonaro, apesar de ver todos os movimentos golpistas ao seu redor, não queria a trolha de ser ditador de verdade. Ele esperava que as coisas se assentassem de tal forma que mantivesse seu cargo sem lidar com a reação interna e externa de uma ruptura do tipo.

E tirando os cachorros-loucos que tramavam envenenar Lula e atirar no Xandão, a maioria dos elementos desse golpe estavam na mesma vibração de fazer do jeito menos trabalhoso. O brasileiro não pensa meia vez antes de matar numa discussão de bar, mas é justamente o não pensar que faz o povo ser violento: quando por algum motivo é obrigado a calcular as probabilidades e pensar nas consequências, volta a mentalidade de comodismo. Se golpe militar fosse algo viável no Brasil com apenas um arroubo de desinteligência emocional, trocaríamos de ditador toda semana.

Mas não é assim que funciona. Tem uma estrutura muito confortável para nossos líderes do jeito que a coisa está, quem pensa apenas no próprio lucro percebe rapidamente que rende mais ganhar eleição e manter o sistema de acordos e esquemas que enriquece corruptos com baixo índice de problemas.

É totalmente compatível querer que Bolsonaro e cia. sejam presos pelo que tramaram ou toleraram tramar ao seu redor e ao mesmo tempo acreditar que a democracia brasileira nem passou perto de ser ameaçada. Quem te diz isso está tentando conquistar voto ou clique. A verdade é chata. Este é o país da anistia, do grito sem luta, de soltar um bandido porque não gosta do bandido concorrente.

O Brasil real está nas sombras. E essa frase tem todos os sentidos que você pode tirar dela. Nada acontece, feijoada. A tendência é continuarmos pulando entre populistas com bandeiras de cores diferentes até a inteligência média do povo permitir algum avanço nesse sistema. E enquanto o Brasil continuar imprimindo dinheiro para bandidos carismáticos, para quê mexer na ordem das coisas?

Não é à toa que a melhor estratégia contra o crime organizado é secar suas fontes de renda.

Para dizer que ficou com sono, para dizer que está desmoralizado, ou mesmo para dizer que um dia vai acontecer alguma coisa e vai vir aqui sacanear a gente: comente.

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16 anos, golpe, política, Semana Antiviral

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