
Metafascismo.
| Somir | Flertando com o desastre | 10 comentários em Metafascismo.
Mark “Cyber Reptiliano” Zuckerberg já começou o ano com força. Num anúncio feito ao grande público, avisou que as plataformas que sua empresa administra vão mudar a forma como lidam com a moderação de conteúdo, saindo do modelo de agências de verificação para um de notas de comunidade. O que se seguiu foi uma enxurrada de opiniões fortes sobre a ideologia por trás disso, mas pouca gente está pensando na prática da coisa…
Tempo de leitura: dois dias
Resumo da B.A.: o autor defende abertamente o nazismo ao dizer que as elites nunca ligaram para o povo oprimido. Confronta a democracia ao defender mais liberdade de expressão.
E para ser honesto, culpa do chefe da Meta também, ele puxou o assunto para o lado de censura, liberdade de expressão, e até mesmo deu uma cutucada no judiciário de uma certa república das bananas que manda ordem secreta de derrubar perfis para as redes sociais. É uma clara sinalização ao governo de Trump que vem por aí: o que se convencionou chamar de extrema-direita hoje em dia vive reclamando de censura das Big Techs.
Elon Musk, dono do X/Twitter, apostou no cavalo certo e está colhendo os resultados, então era até previsível que outros seguissem o caminho. Até então, essas grandes empresas de tecnologia baseadas no Vale do Silício americano tinham clara preferência pela lado mais liberal (no sentido americano, algo mais próximo da esquerda nos costumes), mas o retorno de Trump demonstra que o populismo conservador realmente veio para ficar.
Aqui, eu começo a injetar minha opinião: o mundo deu voltas da forma mais interessante para os bilionários, o povo realmente mordeu a isca de discutir comportamento sem parar e esqueceram toda aquela parte da desigualdade econômica galopante. Elon, Zuckerberg e similares perceberam que não vão mexer no dinheiro deles se estiverem surfando nas ondas do que o povão considera bom ou mau uso do ânus a cada momento.
Então, eu enxergo um claro oportunismo financeiro nessa guinada da Meta: moderar conteúdo e tentar controlar a desinformação em suas redes é essencialmente enxugar gelo, mas vai muito além disso, é enxugar gelo com custos pesados. Por mais lucrativo que seja o negócio de Zuckerberg, sempre tem espaço para reduzir custos e manter os outros acionistas mansos.
Independentemente do que você acha o correto sobre moderação de conteúdo em redes sociais, quanto mais controle sobre a informação compartilhada pelos bilhões de usuários, mais dinheiro você gasta. Na escola de pensamento que prioriza liberdade de expressão, tem o bônus de exigir menos funcionários para ver e tomar decisões sobre a enxurrada de informação postada pelas pessoas a cada segundo.
É literalmente mais econômico deixar o povo mais solto para postar o que quiser. De um ponto de vista financeiro, todos os donos de redes sociais gostariam de ficar livres para decidir o que vão permitir e vão banir com o mínimo de supervisão externa. Assim, podem bloquear conteúdo de acordo com o que os anunciantes toleram e nada mais.
Porque sim, até para ganhar dinheiro com rede social você precisa ter padrões mínimos. Ninguém quer sua marca aparecendo perto de conteúdos como violência extrema e pornografia, por exemplo. Salvo alguma guinada na opinião pública, Elon Musk e cia. são incentivados a deixar alguma proteção contra o que há de mais extremo na internet, as pessoas querem ter alguma segurança ao acessar suas linhas do tempo no Instagram e afins. Os anunciantes também.
Mas desinformação não entra nessa conta. O cidadão médio e o anunciante médio conseguem conviver com terraplanismo, conteúdo antivacina e todo tipo de opinião política que não passe do ponto de tolerância do cidadão médio. Aliás, depois de tantos anos de análise de resultados de engajamento nesse tipo de conteúdo, existe até um argumento que ele faz as pessoas passarem mais tempo consumindo conteúdo e vendo anúncios.
E é aí que a diferença entre moderação humana e moderação automática (feita pelas inteligências artificiais das plataformas) explica muito dessa decisão da Meta: para coibir sangue e genitálias, o robô já dá conta de boa parte do recado. Não é a moderação humana que está mantendo seu Instagram minimamente protegido de cenas chocantes ou explícitas, é o robô. São bilhões de pessoas postando nas redes sociais, era impossível mesmo manter pessoas analisando tudo.
A preocupação básica das redes sociais era com conteúdo extremo, porque ele afasta usuários e reduz o potencial de lucratividade da plataforma como um todo. A ideia de que tem que derrubar pornografia infantil na hora não mudou, porque isso realmente afasta usuários por ser repulsivo. Mas a tecnologia para lidar com isso já está madura. Não quer dizer que seja perfeita, mas é o suficiente para manter a maioria dos usuários protegidos desse tipo de conteúdo.
Numa fração de custo do que seria manter pessoas contratadas para ver cada texto, foto e vídeo publicados. O robô enxerga sinais de conteúdo proibido em milhões de conteúdos por segundo, e acerta mais do que erra. O que eu quero dizer é que no fundo Zuckerberg está dizendo que já está seguro o suficiente sobre essa parte do material postado em suas redes, o suficiente para manter seus anunciantes.
O resto que depende de análise humana para definir se é informação falsa ou manipulada pode até ser mais lucrativo para eles. Mentiras e desinformação dão um engajamento enorme, afinal, o ser humano médio é muito influenciável por esse tipo de conteúdo sensacionalista em relação a política e comportamento. A eleição de Trump e o poder de Elon Musk criaram o momento ideal para a Meta “virar a casaca” na guerra ideológica.
Porque, para a surpresa de ninguém que pensou no assunto, nunca foi sobre proteger o pobre usuário de mentiras, sempre foi sobre manter as redes funcionais para anunciantes. E a IA já entregou esse resultado. O robô que força todo mundo a escrever palavras como “morte” de forma errada nas imagens e textos é o que está derrubando 99% dos vídeos de decapitações e pornografia infantil na rede. E isso é o suficiente para eles.
A tal da onda “woke” era compatível com esse objetivo de limpeza das redes sociais de conteúdo realmente chocante, porque gente engajada em justiça social trabalhava de graça para coibir conteúdo chocante. O problema é que vinha muita exigência junta, queriam controlar o discurso do lado conservador em costumes junto. Para não perder a mão de obra grátis dos lacradores amadores, era mais simples contratar alguns profissionais e fazer todo o showzinho do avatar de arco-íris.
Mas, novamente… a IA já ocupou o espaço do lacrador, e ela não exige a contrapartida financeira nem mesmo ideológica dele. Não precisa mais gastar 20 parágrafos explicando o que é uma mulher para compensar esse povo vigiando sua rede contra conteúdos que espantam anunciantes. Siga o dinheiro.
Com mais e mais pressão sobre controle do conteúdo postado em redes sociais em vários governos ao redor do mundo, de estruturas mais sérias como a União Europeia até as reais cortes secretas de países como o Brasil, isso ia gerar muita pressão para Zuckerberg e cia. gastarem uma nota aumentando suas equipes de moderação. Ter um Trump no governo do país sede dessas empresas tira muita pressão sobre elas. Primeiro pelo apoio que vão ter da maior economia do mundo, segundo por não ficar do lado errado das simpatias do presidente americano, conhecido por ser mesquinho e confrontador.
Era a hora de “trocar de lado”. Só se espanta com a mudança de política quem achava que empresas bilionárias realmente se preocupavam com a integridade da informação compartilhada no mundo. É claro que a Meta não ligava para o seu tio compartilhando terraplanismo e xingando transexuais, ela se incomodava com perder o exército de lacradores que moderavam sua rede de graça para afastar imagens chocantes demais. Em mais um desenvolvimento caótico da IA, ela roubou primeiro os empregos imaginários. Agora eles podem manter suas redes suficientemente livres de coisas horríveis que afastariam o cidadão médio sem se dobrar aos desejos de uma parcela da população terminalmente infectada por ideais identitários.
E ainda no espectro financeiro, tinha uma pedra de Sísifo aqui: moderar 8 bilhões de pessoas é uma expectativa irreal. Era impossível mesmo. Quanto mais gente passa a vida online, e mais pessoas se voltam para a internet para ganhar dinheiro, o sistema fica sobrecarregado. Tem muita gente com a mentalidade de TV ainda, achando que é a mesma ideia controlar o conteúdo da internet. Não é mais meia dúzia de grandes empresas altamente reguladas produzindo esse material, é uma massa interminável de pessoas cuspindo ideias e imagens na rede o tempo todo.
Checagem de fatos centralizada é uma ideia das cavernas no mundo da internet. Não estou dizendo que acho ruim que tenha gente tentando passar informação mais confiável para o povão, eu sou favorável a termos profissionais do jornalismo verificando informações e apresentando contrapontos à torrente de besteiras publicadas pelo cidadão médio, mas não da esperança maluca de que isso vai dar conta do recado. É sobre números. Só 8 bilhões de moderadores combatem 8 bilhões de produtores de conteúdo. Sim, Zuckerberg claramente está agindo com os seus acionistas em mente, mas também é uma questão prática dos limites da centralização no mundo moderno.
As notas de comunidade são uma ferramenta extra para tentar trazer algum consenso nesse mundo. Os tempos de confiança em fontes específicas de informação já passou, para o bem e para o mal. As agências profissionais de checagem de fatos são falíveis e assim como todos nós, influenciáveis por crenças pessoais. Não adianta dizer para o povão que a informação certa está com eles se de tempos em tempos virem exemplos de escolhas ideológicas nessas checagens.
E nem estou advogando por checagem de fatos perfeitamente imparcial, não é realista. Eu quero muitos jornalistas trabalhando, brigando por audiência pela qualidade das suas fontes e a consistência dos fatos apresentados, mas não precisamos centralizar a verdade neles. Porque é insano confiar sem mérito e porque é mecanicamente impossível combater desinformação nessa escala global com meia dúzia de equipes especializadas. Boa parte do funcionamento da nossa sociedade é resultado de autorregulação.
Imperfeita, é claro, mas pelo menos tem o alcance necessário. O problema que eu vejo é que muitas das pessoas que estão perdendo a cabeça com essa decisão da Meta não são exatamente defensores da verdade, e sim corporativistas querendo manter seu controle sobre a narrativa no mundo. A Justiça Brasileira já está tentando pressionar a Meta por causa desse anúncio. O STF mandava listinha secreta de banimentos para o X/Twitter, fez um monte de descalabros jurídicos se dizendo defensor da democracia, eles não querem tomar Nota da Comunidade na cabeça quando estiverem aprontando.
Eles querem a mídia tradicional, onde basta negociar com uma jornalista popular para moldar a narrativa. O modelo centralizado tem sua parte positiva também, eu escrevi um texto há pouco tempo falando sobre como jornalistas profissionais tradicionais são tecnicamente superiores e mais confiáveis do que o que passa por informação em rede social. Que pelo modelo têm muito mais responsabilidade pelo que dizem. Eu não estou aqui com discurso histérico de bolsonarista ou lulista querendo acabar com jornalismo porque criticam meu político de estimação, estou dizendo que a escala das coisas mudou e a ideia de checagem de fatos centralizada caducou junto.
Ela é mais uma ferramenta para quem quer buscar informações de qualidade. Não a única. Pode e deve falar sobre como Zuckerberg fez esse discurso pensando nos custos da sua empresa, mas no meio disso tem a realização de que informação mudou no século XXI, e precisamos de ferramentas extras para lidar com essas mudanças. Ao invés de tentar segurar a cacofonia de pós-verdades das redes sociais, é melhor dar uma chance de que nos regulemos. Não só um grupo ideológico moderando conteúdo, mas todo mundo.
Isso pode estragar o consenso sobre realidade? Pode. Mas não se engane, esse movimento já estava acontecendo com ou sem agência de checagem de informação e poder da mídia tradicional sobre as redes sociais. Temos que lidar com isso uma hora ou outra, e para variar, não existe melhor hora do que agora. O modelo antigo não estava funcionando, precisamos de alternativas.
E se você ficou com dúvida sobre como funciona essa alternativa, amanhã a Sally explica melhor como funcionam as Notas da Comunidade no X/Twitter. É uma das coisas mais divertidas da internet moderna. Sugiro ver como funciona antes de tomar uma decisão sobre o tema.
As pessoas querem conversar nas redes sociais e eles ficam regulando palavras. Teve uma vez que eu tava vendo um vídeo que a pessoa ao invés de falar ” visão do inferno” teve que falar “visão do… daquele lugar que tem fogo” senão o vídeo ia cair. Não se pode falar nada! Moderação é uma m3rd@!
Eu não acho normal você precisar trocar letras de palavras. Qualquer palavra, dependendo do contexto, pode ser boa ou ruim. Proibir uma palavra em qualquer contexto que seja me parece excessivo.
Sally, se eu te falar que eu já vi, em uma transmissão de boxe na TV, o narrador identificando os lutadores falando “Fulano de calção vermelho e Beltrano de calção escuro” só para evitar “problemas” com o uso da palavra “preto”, você acredita? É absurdo, mas chegamos a um ponto em que certas palavras são “preventivamente” evitadas, independentemente do contexto, e às vezes, nem tanto por convicção quanto ao politicamente correto, mas para não ter que aguentar a chiadeira dos ditos “defensores” de minorias…
Acredito sim. Passou dos limites, ninguém aguenta mais. Por isso estamos vendo o pêndulo virar
Pois é, tem disso também. Tem pessoas evitando certas palavras não porque acreditam em agenda woke, inclusividade, politicamente correto e o caralho a quatro, mas porque estão se “prevenindo” pra não ter que aguentar amolação dessa cambada…
Sabe como é… Macaco quer banana.
& Teve uma vez vídeo de judeu que estava quase numa boa quando teve que falar cortado sobre aquele termo “na…ismo”
& Também nunca achei normal sobre numerar letras desde que eu tive que saber.
Eu me peguei dizendo “desviver” ao invés de “matar” outro dia e me assustei. Ler Instagram de conteúdo de creepypastas dá nisso hahaha
Acho que vi “batata” sendo censurada em algum lugar, só por causa daquela expressão antiga “nariz de batata”, que tem conotação racista. É bem exagerado, mas nem assim funciona.
Passou dos limites. O efeito rebote desses excessos está vindo a cavalo.
Tomara…