Autor: Sally

Para quem achava que isso não existia e eu estava inventando, apresento a prova de que é sim chumbo trocado.

Postagem da modelo e atriz e Letícia Birkheuer em seu Twitter: “Atendimento da TAM em Buenos Aires péssimo, no embarque. Quem manda contar com esse povinho de merda daqui?”

Além da vírgula, tem mais coisa incorreta nesta frase.

Eu acho que Letícia Birkheuer tem o sagrado direito de achar os argentinos um povinho de merda e de falar que acha os argentinos um povinho de merda, mesmo sem conhecê-los em profundidade para tal. Só queria saber o que teria acontecido se uma modelo argentina fizesse uma postagem em seu Twitter chamando brasileiro de “povinho de merda”.

Queria perguntar se não vão gritar que tem processar ela por algum crime, ou acusá-la de bullying ou racismo alguma coisa do tipo, porque se fosse o inverso, a histeria punitiva já estaria dando as caras. Quem fica indignado, fica indignado com A ATITUDE, e não com o prejudicado, certo?

Ah, sim, uma última coisa: barraquear no Twitter e dizer que o perfil foi roubado para negar autoria é ainda mais vergonha alheia, espero que ela não faça isso. Ainda mais vindo de alguém que tem histórico em barracos via Twitter.

Para perguntar pelo Somir e dizer que isto aqui tá ficando uma bagunça, para dizer que brasileiro pode xingar o quanto quiser mas não pode ser xingado de volta se não é racismo ou ainda para alegar que a pior parte do barraco dela foi exaltar os deficientes físicos: sally@desfavor.com

Pela primeira vez foi autorizado o casamento civil entre duas pessoas do mesmo sexo, hoje, por um juiz de São Paulo. Vai dar o que falar, então, você, Leitor do Desfavor que não tem saco para correr atrás do que se passa neste país, ganha agora toda a polêmica mastigada. Quando dá o que falar, queremos que o leitor do Desfavor fale!

Quem: O reconhecimento partiu do Juiz da 2ª Vara de Família e Sucessões de Jacareí, que curiosamente se chama Fernando Henrique PINTO! Piada pronta não tem graça, vamos deixar passar. Os noivos são cabeleireiro Sérgio Kauffman Sousa e o comerciante Luiz André Moresi

Quando: A decisão saiu hoje mesmo, dia 27 de junho de 2011

Como: O casal homossexual não se casou naquela forma de casamento convencional que a gente conhece, o que lhes foi permitido foi CONVERTER uma união estável que já existia em casamento.

Porque: A lei prevê que se as partes desejarem, a união estável pode ser convertida em casamento sem maiores formalidades. Como o STF reconheceu que pessoas do mesmo sexo podem ter uma união estável, o Juiz (para este eu uso letra maiúscula) entendeu que eles tem todos os direitos inerentes à união estável, inclusive o direito a convertê-la em casamento. Perceberam a malemolência? É como se houvesse uma promoção no Mc Donald´s dizendo “Ao comprar um Big Mac você ganha o direito a um biscoito!”, assim, de forma genérica. Daí você vai e compra especificamente uma promoção contendo um Big Mac, uma batata frita pequena e uma Coca pequena e pede o brinde. Inicialmente o atendente estranha e diz que o brinde é só para quem comprar Big Mac, mas, depois de alguns argumentos, ele percebe que TODOS AQUELES que comprarem o Big Mac, não importa a forma, na forma individual ou de promoção, devem ter direito a ganhar o biscoito.

É definitivo? : Não se sabe. Pode ser anulado, pode haver recurso. O Ministério Público foi favorável à decisão do Juiz, então, ao que tudo indica, existem chances reais deste casamento ser mantido.

Como chamar? : União homoafetiva, casamento homoafetivo ou casamento entre pessoas do mesmo sexo. Mas, o ideal é que a gente comece a se condicionar para chamar só de casamento mesmo, afinal, somos todos iguais, não?

O que isso indica?: Se esta decisão se consolidar, deverá ser aceito o casamento entre pessoas do mesmo sexo, apesar de estar expresso na Constituição da República e no Código Civil que casamento deve ser entre pessoas de sexos opostos.

Qual é o valor histórico disto?: Mostra que mesmo que é possível mudar as leis e adequá-las a novas realidades sociais. ISTO SIM é avanço, é progresso, e não ficar na rua gritando que fuma maconha!

B ANANAS B B BANANASTiago Somir says
Estamos?

Sally Somir says
AEEEEEEE

Sally Somir says
voce viu o que aconteceu com o Roberto Carlos?
o jogador

Tiago Somir says
a cotovelada?

Sally Somir says
não
ele estava em campo, na Russia
e jogaram uma banana nele
ele simplesmente se ofendeu
e saiu de campo no meio do jogo

Tiago Somir says
ué?

Sally Somir says
abandonou o time, que ja tinha feito as tres substituições

Tiago Somir says
não era ele que dizia que não ligava para banana?

Sally Somir says
pelo visto, agora liga

Tiago Somir says
“porque não era preto”
sério, ele disse isso

Sally Somir says
a cara dele quando jogaram a banana foi impagável
se fosse preto teria que se importar, ne? então tá!
acabei de mandar um e-mail para meus primos mais hardcore
com uma detalhada narrativa de como os brasileiro se irritam com bananas

Tiago Somir says
hahahahahah

Sally Somir says
espere muitas bananas na Copa America, cortesia de Sally Somir
eles me prometeram!

Tiago Somir says
“uh, macaquitos!”

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Essa merda fica grande demais para a página inicial…

Hardoooooo Gay!Advertência: este texto não pretende ser ofensivo aos gays, e sim aos heteros que praticam condutas homossexuais e falam mal dos gays, ou seja, dedicado aos hipócritas mal resolvidos.

Ainda não falamos sobre nenhum tema desagradável nesta semana. Já estava na hora de ser desagradável, não é mesmo? Vamos lá. Vamos falar de forma leviana sobre a sexualidade alheia. O que é considerado gay e o que é considerado hetero nestes dias de hoje? Com certeza o conceito social de homossexual não é o mesmo de trinta anos atrás e, consequentemente, isso reflete no conceito de hetero. Por mais errado que seja, é utopia pensar que podemos viver sem estes conceitos.

Sejamos grossos: o que te dá o direito de chamar alguém de “viado”? NADA. Excelente resposta. É medíocre classificar um ser humano por sua sexualidade. MAS… vivemos em um mundo escroto onde neguinho classifica mesmo, então, que pelo menos classifiquem de uma forma mais correta, pode ser? Vejo uma enorme confusão na cabeça dos brasileiros acerca de rótulos envolvendo sexualidade.

A facilidade com que muitas vezes se chama alguém que não é gay de viado e a dificuldade em aceitar que uma pessoa notoriamente homossexual seja de fato homossexual me deixam confusa algumas vezes. Por exemplo, existe um consenso implícito entre algumas pessoas de que se um homem faz sexo com outro homem e é o ativo, ele não é considerado homossexual, gay, bicha, viado ou o termo que se queira usar. Não compreendo esta lógica. Fez sexo com uma pessoa do mesmo sexo e pelo visto gostou, porque se não, não tinha procurado por alguém do mesmo sexo ou não tinha consumado o ato. Não é viado por causa DE QUE? Na verdade, eu acho até que o ativo é mais viado que o passivo. E ainda tem marmanjo que come o rabo de outro homem e fica esculhambando a comunidade gay!

Não entendo o critério do brasileiro para determinar quem é “tecnicamente viado”. Ao que parece, retirado o lacre do cu, a pessoa vira viado. Se comer o rabo de outro macho mas permancere com seu brioco intacto, não é viado. O critério para se considerado socialmente viado seria apenas o dar o cu? Complicado, né? É uma teoria falha. Um homem estuprado seria viado então? Um homem que tenha feito sexo uma única vez com outro homem para experimentar e não tenha gostado é viado? Um homem que tenha enfiado um vibrador no seu próprio rabo é viado? Um homem que peça para a namorada fazer fio-terra é viado?

Eu sei, eu sei. Não adiantra repetir que sexualidade não é algo tão simples que se possa classificar usando um ato isolado. Mas, já que existe um grupo que classifica com esta facilidade tirando o seu da reta, fiquei com vontade de praticar um exercício argumentativo para mostrar que, mesmo dentro da lógica desse grupo, seu argumento não se sustenta. Se estão partindo da premissa que quem dá o cu é viado e ponto final, eu respondo dizendo que quem come é muito mais. É uma argumentação audaciosa, já que eu não tenho pênis, mas vamos lá: Para dar a bunda o homem não precisa estar com vontade de dar a bunda. Não precisa estar excitado. Não precisa sentir atração sexual pelo outro homem. Basta ficar parado e, literalmente, tomar no cu. Não prova nada, não indica nada.

Mas, em contrapartida, quem come precisa gostar do que está fazendo, caso contrário não terá uma ereção (eu avisei que o texto seria incômodo e desagradável – e vai ficar pior). Olhar para uma bunda masculina cabeluda e ficar de pau duro indica muito mais afeição pelo mesmo sexo do que simplesmente ficar parado e levar uma trolha no fiofó. Hoje em dia tá cheio de vagabunda querendo dar em tudo quanto é canto, o homem que recorre a outro homem o faz por preferência (excetuando situações atípicas, como presídios ou prostituição, por exemplo). Trabalhemos com a regra geral: hoje há disponibilidade de mulher, mesmo que se tenha que pagar, apesar de achar que sempre tem uma vadia doida para dar de graça.

Mesmo sem ser um homem, até onde eu sei, é preciso que exista um estímulo sexualmente atraente para que ocorra uma ereção. Ver outro homem nu, sentir o cheiro de macho suado, ouvir uma voz grossa e como reação ter uma ereção e MANTER esta ereção enquanto faz sexo com esse homem me parece mais prova de viadagem do que simplesmente ser penetrado. O grande problema da minha teoria é que teriamos muito suposto machão sendo classificado de viado. Talvez por isso aqueles que fazem sexo de forma ativa com outros homens sejam “absolvidos”: porque são muitos! Até mesmo heróis nacionais, como Pelé, por exemplo, que confessou que sua primeira vez foi com um homem. Perigoso, né? Vai ter muita gente quicando com esta teoria.

“Mas Sally, homem mete em qualquer coisa, em bananeira, em galinha e em cabra, para eles tanto faz, qualquer homem é capaz de comer outro homem”. Para começo de conversa, não acredito que isso seja verdade. Eu conheço histórias de pessoas que tentaram fazer sexo com outros homens e simplesmente não conseguiram. Suas palavras forma esclarecedoras: “Não adianta, Sally, não sobre”. Depois, ainda tem o fato da escolha, porque um homem escolheria fazer sexo anal com outro homem com tanta mulher disponível?

Já que nossa sociedade insiste em classificar a sexualidade de alguém, não seria mais óbvio adotar o critério do INTERESSE SEXUAL? Não é um daqueles textos onde eu afirmo algo porque acredito nisso, é um daqueles textos onde eu pergunto porque não sei a resposta.

Não custa esclarecer que a intenção aqui não é rotular, e sim aprender a identificar. Com a crescente aceitação social da homossexualidade, mais e mais homossexuais estão se assumindo e com isso, eventualmente se faz necessário aprender a identificá-los para fins de flerte. Tanto para saber com quem flertar como para saber com quem não flertar. Sem contar que sempre podemos cruzar com um parceiro que está, digamos, indeciso ou que ainda não percebeu sua própria homossexualidade. Chegamos ao ponto de confusão em que homossexualidade é relativa, o que é gay para uma pessoa pode não ser gay para a outra. E agora, comofas, miguxos?

O que é gay para você? O limite é muito pessoal. Se o seu namorado te fala que sente atração sexual por outro homem, você acha gay? Se ele pedir para enfiar um vibrador no seu roscofó você vai achar ele gay? Se ele pedir para fazer sexo a três com outro homem e ficar se esfregando pelado neste outro homem ele é gay? Se ele pedir para te chamar por um nome masculino durante o sexo ele é gay? Se ele tiver um orgasmo por estimulação anal você vai achar ele gay? Bissexuais são gay + hetero ou são uma categoria separada que não tem nada de gay? Metade dessas eu não sei responder, mesmo pensando bastante sobre o assunto.

Antes tinhamos o preto e o branco, o gay e o hetero. Hoje tem essa enorme zona cinzenta com várias derivações difícieis de assimilar. Conheço uma pessoa casada com um homem que dentro de casa se veste de mulher (salvo engano, cross-dresser), com direito a batom e tudo. Eu não sei se eu suportaria isso e eu não sei se isso é ser gay. Ele gosta de mulher, só faz sexo com mulher, não tem atração por homem, mas se veste como mulher: cabelos longos, saia, meia calça, depilação e batom. Mesmo sem fazer sexo ou sentir atração por outros homens ele é gay? Eu acho que não, mas com certeza muita gente vai discordar.

Na minha cabeça faz mais sentido se observar o que desperta a atração sexual da pessoa para tentar dizer se é ou não gay. Se um homem se sente sexualmente atraído por outros homens, faz sexo com mulheres fantasiando estar com homens, se masturba pensando em homens mas nunca teve coragem, por preconceito, se fazer sexo com outro homem, ele seria gay? Este homem me parece mais gay do que um que eventualmente tenha feito sexo com outro homem e não tenha gostado. Mas o fato de também fazer sexo com mulheres, mesmo sem gostar tanto, o tira da categoria gay e o coloca na categoria hetero? É o fazer sexo com ambos ou o gostar de sexo com ambos que classifica alguém como gay ou bi?

Confesso que estou confusa e que não tenho uma opinião fechada sobre o assunto. Atualmente penso que o determinante para dizer se homens ou mulheres são gays é a atração sexual: se sente por ambos os sexos é bi e se sente apenas pelo sexo oposto é gay. Mas posso (e acredito que vou) mudar de idéia, ainda estou refletindo sobre isso e quero a opinião de vocês.

Nesta linha de se levar em conta a atração sexual, minha teoria de que é muito mais gay comer do que dar encontra validação. Para dar o fiofó não é preciso se sentir sexualmente atraído por outro homem, ao menos não naquele exato momento. Para comer é preciso que algo desperte excitação sexual. Para procurar um homem para fazer sexo, quero dizer, para fazer a opção de um homem em detrimento de uma mulher, é preciso que a idéia de fazer sexo com um homem seja, no mínimo, convidativa. Para manter uma ereção durante todo o ato, enquanto roça em outro homem suado, é preciso que aquilo não cause repulsa.

O que acontece, e, mais uma vez, é apenas uma teoria minha, não tenho a pretensão de ter razão (não desta vez) é que muitos homens tem tanto pavor de admitir que podem ser gays, bissexuais ou tantas outras classificações que não sejam o padrão Hetero Machão, que criam as desculpas mais esfarrapadas para se convencer e convencer os outros de que, apesar dos pesares, existe outra explicação para esta preferência. Com o tempo, falsas premissas que incobrem viadinhos, como a de que quem come é macho e quem dá é gay acabou sendo socialmente aceita e até mesmo tida como verdadeira. Está na hora de refletir sobre esses conceitos e atualizá-los, não importa a idade que você tenha. Só muda de idéia quem as tem.

Neste ponto você deve estar se perguntando qual é a razão de ser de uma classificação. Não seria mais fácil cada um fazer o que quer e o que se sentir bem? Não seria mais simples amar seres humanos independente da forma como estas pessoas escolhem para ter prazer sexual? Seria, mas infelizmente para viver em sociedade é necessário estabelecer algumas classificações. Em um mundo ideal isso não seria necessário, mas vivemos em um mundo de merda, não em um mundo ideal.

Existe ex-gay? A pessoa pode ter interesse sexual em pessoas do mesmo sexo em parte de sua vida e depois mudar sua preferência sexual e passar a se interessar apenas por pessoas do sexo oposto? Essa pessoa que já teve interesse por pessoas do mesmo sexo mas que atualmente só se relaciona com pessoas do sexo oposto é tecnicamente gay apenas por causa do seu passado?

Anseio pelo dia em que os documentos de identidade conterão apenas um quadradinho no que diz respeito ao gênero da pessoa: ser humano. Mal posso esperar que esses conceitos de masculino ou feminino se tornem obsoletos, quem sabe assim passamos a reparar em outros aspectos mais importantes das pessoas, em vez dessa fixação de saber se ela goza metendo no cu ou na buceta. Sério, o que isso diz sobre alguém? NADA.

Para dizer que pela minha teoria, “tem um amigo seu” que é viado, para se incomodar tanto com o assunto a ponto de nem comentar ou ainda para dizer que gosta de textos que trazem respostas, porque de dúvidas sua vida já está cheia: sally@desfavor.com

Já aconteceu...Siago Tomir nunca escondeu de ninguém que tem um lado nerd e que é viciado em video-game. O que ele esconde é o GRAU doentio de dedicação e seriedade com os quais encara esta atividade. De coração: eu não odeio video-game. Eu jogo video-game. Só que eu sou uma pessoa normal, eu aceito interromper um jogo, eu sei que existe vida lá fora e eu sei que jogar por muitas seguidas é exagero. Siago Tomir não sabe. Siago Tomir é uma criança tamanho GG. Siago Tomir esquece de comer quando está jogando, se não tiver um adulto responsável por perto periga morrer de inanição, desidratação ou passar três dias comendo Doritos e sem tomar banho.

Se normalmente já é assim, imagina o que acontece com Siago Tomir quando compra um novo video-game. Pois é. Ele tinha acabado de adquirir um recém lançado video-game, top de linha, sonho de consumo de todas as crianças e do Crianção que eu namorava. Para piorar a situação, conseguiu emprestado por um final de semana um dos jogos mais cobiçados deste video-game, na época ainda indisponível no Brasil. Era sábado pela manhã quando ele chegou com o jogo debaixo do braço. Ele teria que devolver o jogo no domingo, ao final do dia.

Eu nem esperava receber muita atenção naquele final de semana, porque afinal, era uma oportunidade única de um jogo inédito. Não se pode pedir coerência a uma pessoa viciada, não saem rosas de um pimenteiro. Só não esperava o que estava por vir. O episódio ficou marcado na minha vida (e no meu tapete) porque foi a única vez que Tomir ameaçou terminar comigo. Nem nas piores brigas ele tinha chegado a esse ponto. Ele realmente saiu do sério.

No começo, fiquei observando. Eram dez horas da manhã quando ele começou a jogar. Juro que eu acho que vi lágrimas em seus olhos quando a abertura do jogo começou. No começo até que foi bacana, eu já conhecia o jogo pois já tinha jogado uma versão anterior, de um video-game menos evoluído. Fiquei ali, torcendo, dando palpites e assistindo por um tempo. “Por um tempo” entenda-se uma ou duas horas, o que a meu ver é um tempo bem razoável. Depois disso fui cuidar das minhas coisas.

Por volta de uma da tarde achei que seria necessário alimentar Siago Tomir, que se encontrava jogando, gritando e xingando. Como eu sei que não adianta falar enquanto ele se encontra nese transe hipnótico de jogo, resolvi apenas preparar um prato de comida e levar sem consultá-lo. Siago Tomir é uma criatura peculiar, via de regra, se passa mais de quatro horas sem comer começa a ficar mal humorado, dar patadinhas, responder de forma monossilábica até chegar ao ponto de dar grandes foras nas pessoas mais próximas. Ele não consegue identificar que a razão do seu mau humor é fome. Ele nem ao menos admite que a razão do seu mau humor é a fome. Pior: ele nem mesmo admite que esteja de mau humor. Mas quando come vira um amor. Com Siago Tomir é assim, a idade biológica não corresponde à idade mental.

Mas toda regra tem exceção. Naquele dia Siago estava sem comer por mais de quatro horas e não apresentava sinais de mau humor. Pensando bem, não apresentava nada, se fizessem um eletroencefalograma acho que o resultado seriam várias linhas retas, como em uma espécie de transe. Normalmente o simples cheiro de comida bastava para Siago querer comer, tipo o tubarão Bruce do filme “Procurando Nemo” quando sente o cheiro de sangue. Desta vez ele não esboçou reação ao cheiro de comida. Apenas disse que não estava com fome, sem piscar, sem desviar os olhos do jogo e sem mover um músculo da face. Parecia um ventríloquo falando.

Deixei Siago Tomir quieto. Quando começou a anoitecer, tentei oferecer comida novamente. Observem que eu não estava pedindo atenção, não estava pedindo para ir ao cinema nem estava pedindo para ele discutir o relacionamento comigo, eu apenas estava tentando que ele coma após quase 12 horas de jejum. A resposta foi a mesma, ele grunhiu um “nãoestoucomfome” quase incompreensível. Foi quando eu percebi que ele tinha regredido 25 anos e precisava de uma figura materna, e me prestei a um papel ridículo:

Sally: Siago, não quero saber se você está com fome, você tem que comer

Siago: Agora não

Sally: Siago, você não comeu durante o dia inteiro, você tem que comer

Siago: Deixa eu passar desta fase e eu como

Sally: Não, eu conheço essa conversa

Siago: Eu não vou parar agora

Sally: Eu jogo pra você enquanto você come

Siago:

Sally: Há?

Siago:

Sally: Você acha que eu não sou capaz de jogar bem?

Siago: ACHO

Sally: Isso foi altamente ofensivo!

Siago fez um gesto mostrando a palma de uma das mãos parcialmente fechada que simbolizava “veja minhas rugas de preocupação”, sem tirar os olhos da tela nem mudar sua expressão facial. A campainha tocou.

Sally: Tá esperando alguém?

Siago: Não

Sally: Deixa eu ver quem é…

Siago: Só o Beto, o Jão e o Alicate

Uma dúvida me aflige até os dias de hoje: se os amigos do Tomir são retardados mentais OU se os amigos do Tomir, quando se juntam com ele, viram retardados mentais. Acredito que seja a primeira opção, pois o Beto já foi hospitalizado porque comeu Vick Vaporub “para ver como era”, o Jão tem esse apelido porque não consegue pronunciar seu próprio nome (que seria João, encontro vogal dificílimo) e o Alicate. Bem, o Alicate é o pior de todos. É aquele amigo que toda namorada odeia. O Alicate vai ter um Siago Tomir só pra ele.

Resumo da situação: Siago Tomir se recusava a comer, não tinha olhado pra minha cara o dia todo e ainda tinha chamado seus amigos debilóides para ver o brinquedo novo dele. Sinceramente, não entendo qual foi o objetivo de tornar aquilo um evento social, porque de “social”não tinha nada. Três imbecilóides que poderiam estar fazendo sexo em um sábado à noite foram até a casa de outro imbecilóide que também poderia estar fazendo sexo em um sábado à noite assistir este imbecilóide jogar video-game. Não custa esclarecer: era mais fácil Siago Tomir deixar que os amigos pegassem na minha bunda do que naquele video-game. Eles foram apenas para assistir MESMO.

Em poucos minutos os amigos entraram em transe também. Lá estavam, os quatro, prostrados, boca semi-aberta, olhos vidrados, sem piscar. Podia apagar um cigarro no umbigo deles ou depilar o saco com pinça que eles não se mexeriam. O tempo foi passando e Siago Tomir continuava sem comer nada. Tive que apelar e começar a oferecer coisas que eu rotineiramente proibia:

Sally: Vocês devem estar com fome, querem uma pizza?

Siago:

Três Patetas:

Sally: Bom, se não querem comer, querem pelo menos beber um refrigerante?

Siago:

Três Patetas: ….

Sally: QUER UMA COCA, SIAGO?

Siago: Fazendo que não com a cabeça

Sally: NÃO?

Siago: Fazendo que não com a cabeça

Sally: Porque você não quer beber Coca-Cola?

Siago: Se eu beber vou ter que levantar para mijar

Alicate: Mija na própria garrafa vazia, Mano! Assim não tem que levantar

Siago me olhou como quem ponderava a idéia. Eu me retirei do recinto e bati a porta do quarto. Tanto faz, podia ter colocado fogo nas cortinas que a reação, ou melhor, a não reação, seria a mesma. Os Três Patetas e o Patetão Master continuavam ali, petrificados. No máximo soltavam um grito de emoção em uma fase difícil ou um grito de desespero em coro quando o personagem perdia uma vida. Resignada, fui dormir pensando que quando a falta de comida ou bebida afetasse o organismo de Siago Tomir ele perceberia e daria dez passos em direção à geladeira. Sabe como é, eu sou romântica, eu achei que mais cedo ou mais tarde ele comeria. Fui dormir.

No meio da madrugada levantei para beber água. Lá estavam eles, na mesma posição em que os deixei, no mais completo escuro. Quando perguntei a Siago se eles tinham comido, todos responderam ao mesmo tempo. O problema é que esqueceram de combinar a resposta: dois deles disseram que sim e dois disseram que não, ao mesmo tempo. Neste ponto eu já estava meio irritada. Siago Tomir tem gastrite e ficar um dia inteiro sem comer não era muito recomendado. Além disso, quando ele passava mal, quem sofria era eu. Coloquei a mão no plug que ligava o video-game e ameacei desligar. Um grito de terror em uníssino tomou conta da sala, a ponto de um vizinho vir perguntar se estava tudo bem.

Sally: Vai comer ou eu vou ter que desligar essa bosta?

Siago: Nããããããããooo! NÃÃÃÃÃÃÃÃOOOOO!

Sally: Siago, se acalma, eu não desliguei, apenas estou perguntando se…

Siago: NÃÃÃÃÃÃÃÃOOOOO!

Sally: EU NÃO DESLIGUEI!!!

Siago: *hiperventilando

Sally: VAI COMER?

Siago: Fazendo que sim com a cabeça enquanto uma lágrima ameaçava cair
Preparei comida de fácil ingestão, que pudesse ser comida com as mãos sem atrapalhar a dinâmica do jogo: canapés, batatinhas fritas, pastéis. Deixei em cima da mesa com uma garrafa de Coca-Cola. Melhor do que isso só se deixasse a Scarlett Johansson pelada em cima da mesa. Tanto faz, Siago Tomir não teria encostado em nenhum deles. Fui deitar novamente, mas antes de dormir fui acordada por um telefonema.

Sally: Siago, o telefone está tocando, você não está ouvindo?

Siago: Fazendo que sim com a cabeça

Sally: E você não vai atender não?

Siago: Fazendo que não com a cabeça

Era a namorada do Alicate, uma pobre criatura que tentava manter um relacionamento com ele e, entre indas e vindas, ainda não tinha se conformado que ele era um escroto imbecilóide indigno de sua confiança.

Sally: Alô?

Namorada do Alicate: Sally? Desculpa, te acordei?

Sally: Não

NA: Sally, preciso da sua ajuda

Sally: Fala

NA: Eu sei que vou te colocar em uma situação difícil, mas preciso te perguntar uma coisa… por favor, não minta para mim!

Sally: Fala

NA: O Alicate está aí?

Sally:

NA: Está?

Sally:

NA: Eles estão jogando vídeo-game?

Sally: Tão

NA: Até agora?

Sally: É

NA: Eu achei que ele estivesse me traindo!

Sally: Não

NA: Nem sei o que é pior…

Sally: Quer falar com ele?

Alicate fazendo que não com as mãos

NA: Não, não precisa não

Alicate: *sussurrando* Diz que eu não estou! Diz que eu tô em um puteiro!

NA: Só quero te pedir um favor

Sally: Fala

NA: O Alicate tem epilepsia, não deixa ele ficar muito perto da TV nem jogar por muito tempo, tá?

Sally: HAHAHAHAHAHA

Desliguei o telefone enquanto ria, sem me despedir. Mais fácil me pedir para fazer uma tartaruga voar. Eu não conseguia nem cuidar do MEU, quem dirá cuidar do homem dos outros. Olhei para o Alicate. Ele estava com o rosto a dois dedo da TV, olhando fixo. Fiquei observando a cena.

Fui para a cozinha pegar aquele copo de água que tinha me tirado da cama originalmente. Evidente que eu encontraria aquela situação de sempre na geladeira: quatro jarras de dois litros cada com apenas UM DEDO de água. Porque Siago Tomir não bebe toda a água da jarra para não ter que enchê-la. Siago Tomir não tem caráter. Siago Tomir é inconvivível. Quando uma jarra está quase vazia, ele bebe da outra e assim vai, até deixar as quatro com um dedo de água cada, para que a babaca aqui seja a que vai acabar com a água e tenha o dever moral de encher as jarras.

Muito puta da vida, tirei as quatro jarras da geladeira e comecei a encher. O barulho da água enchendo as jarras despertou a bexiga de alguém na sala, só ouvi alguns trechos do diálogo deprimente:

Panaca 1: Fudeu, vou ter que mijar

Panaca 2: Tô falando, o negócio é usar aquelas fraldas que meu avô usa
Só de sacanagem abri a torneira da pia.

Quando estava voltando para o quarto para tentar dormir, observei que a comida que eu tinha preparado estava intacta. Foi subindo toda uma putez. Como pode alguém ser tão débil mental? Quando tem crise de gastriste fica paunocuzando as pessoas à volta e gritando que vai morrer, mas na hora de comer para evitar a crise, faz cu doce. Parei na frente da TV, o que fez com que o personagem do video-game morra e perca mais uma vida.

Siago começou a ficar com a cara vermelha. A veia da testa começou a pular. Um dos olhos latejava. Talvez essa tenha sido a vez em que ele chegou mais perto de me bater.

Sally: Você não comeu

Siago: Alicate, fala para aquela mulher para ela sair da frente da TV
Porque Siago quando ficava muito puto comigo não falava diretamente comigo, apesar de saber que eu estava presente no recinto e que eu estava escutando. Se quem faz é debilóide, mais debilóide ainda é quem se presta a ser o intérprete:

Alicate: *em tom formal * Sally, o Tomir mandou dizer que é para você sair da frente da TV

Sally: Eu sei, EU OUVI

Siago: Alicate, fala para esta mulher que eu só tenho mais 12 horas para zerar este jogo e que depois vou ter que devolver

Alicate: *em tom formal* Sally, o Tomir mandou dizer que…

Sally: EU OUVI

Siago: Alicate, diz para essa mulher que…

Sally: Quer saber, Siago? FODA-SE VOCÊ

Siago: *sorrindo

Sally: FODAM-SE VOCÊS TODOS

Siago: Fazendo dancinha da vitória com os braços

Sally: Morra de gastrite! *apontando para o Tomir

Sally: Mijem nas calças! * apontando para o Beto e o Jão

Sally: Morra de epilepsia! * apontando para o Alicate

Saí da sala bufando e bati a porta do quarto.

Quando acordei, pela manhã, eles ainda estavam ali. Passei por eles como se nada. Estava sentada na mesa da cozinha lendo jornal quando tudo começou.

Alicate começou a ficar meio torto e os outros não perceberam. Eu tentei chamar o Tomir mas ele me ignorou. Eu gritei e o Tomir continuou me ignorando. Alicate começou a ter uma convulsão. Tomir com uma das mão segurava o controle e com outra tentava segurar a cabeça do Alicate.

Sally: LARGA ISSO SOMIR!

Siago: NÃO!

Sally: SALVA E LARGA!

Siago: Não dá para salvar, ainda não cheguei no Save Point

Sally: No que???

Beto correu para o banheiro, não sei se foi mijar, vomitar ou ambos. Alicate, ainda em convulsão, mijou ali mesmo, no nosso tapete. Antes tivesse realmente usado as fraldas do avô do Beto. Jão olhava petrificado.

Sally: SOMIR, LARGA ISSO! TEMOS QUE LEVAR O ALICATE PARA UM HOSPITAL!

Siago: NÃO!

Puxei a televisão da tomada

Siago: NÃÃÃÃÃÃOOOOOO!

Tomir ficou de pé em um salto. Talvez com a intenção de me bater, não sei ao certo. Só sei que não é uma coisa inteligente a se fazer quando se está sem comer e sem beber nada por muito tempo. Ele me lançou um último olhar de fúria (sabe aquela cara de mormaço?) e caiu desmaiado em cima do próprio braço. Jão, como sempre, foi de uma ajuda inestimável:

Jão: FUDEU! FUDEU!

Sally: Jão! JÃO!

Jão: FUDEU! FUDEU! SOMIR MORREU!

Só não dei um tapa na cara dele porque estava segurando a cabeça do Alicate.

Sally: JÃO! CALA A BOCA PORRA!

Jão:

Sally: LEVANTA, PEGA O TELEFONE E LIGA PARA AQUELE NUMERO QUE ESTÁ NA

GELADEIRA, PEDE UMA AMBULÂNCIA

Jão ligou. Tomir começou a acordar.

Sally: Tomir?

Tomir me olhava meio tonto

Sally: Tomir, você bateu com a cabeça?

Tomir olhava meio desnorteado, parecia estar tentando lembrar o que tinha acontecido.

Sally: Tomir… fica calmo, vai ficar tudo bem…

Foi quando Tomir voltou a si:

Siago: PUTA QUE PARIU SALLY! VOCÊ DESLIGOU MEU JOGOOOOO!

Sally: NÃO! Eu desliguei A TV, SEU IDIOTA! É só religar a TV!

Foi quando o Tomir vomitou um líquido muito esquisito no tapete. Quando ele foi se limpar percebeu que tinha algo errado com seu braço.

Sally: Não mexe! Pode estar quebrado!

Alicate começou a acordar:

Alicate: Eu morri?

Sally: Não, mas já já eu vou providenciar isso

A ambulância chegou.

Sally: Tomir! NÃO LEVANTA, você não sabe se bateu com a cabeça!

Tomir soltou um palavrão e ligou a TV na tomada. Quando viu que o jogo continuava ali, sorriu aliviado. Foi quando baixou a adrenalina e ele começou a sentir a dor no braço. Se jogou no chão e ficou gemendo de dor. Alicate vomitou nesse meio tempo, e eu me despedia mentalmente do meu tapete.

Mandei tirarem o Tomir em uma maca porque não sabia se ele tinha batido com a cabeça nem se conseguia andar sem cair novamente. Enquanto isso peguei o celular e comecei a ligar para a namorada do Alicate. Começaram a retirar o Tomir de maca.

Agora vem aquela parte que todo mundo acha que é mentira, mas é a mais verídica de toda a história: enquanto estava sendo retirado de maca, Tomir virou para um dos paramédicos e gritou desesperado: “PAUSA O JOGO ANTES DE SAIR! PAUSA O JOGA ANTES DE SAIR!”. E não é que o paramédico foi até o controle e deu um pause antes de levar Tomir para o hospital? As últimas palavras dele foram: “Sally, se você tirar do pause eu termino com você!”

Para dizer que já viu coisa pior em matéria de vício em video-game, para dizer que acha um absurdo mas no fundo seria capaz do mesmo ou para pedir o nome real do Alicate porque acha que ele também é amigo do seu namorado: sally@desfavor.com