*insira música do filme Tubarão aqui*

Vocês votaram, eu obedeço. Hoje é dia de Eu, Desfavor.

Ictiofobia. É esse o nome de quem, como eu, tem fobia de peixes. “Mas… de PEIXE, Sally?”. Sim, de peixe, porra. “Mas peixe não faz nada… é um bicho limpinho, vive na água, blá blá blá”. Fobia é um medo irracional. Eu tenho fobia de peixe, dá licença? Hoje está controlada (alou?, dez anos de terapia?) mas na época era mil vezes pior do que o meu medo de lagartixa.

Não é uma coisa que eu saia contando por aí quando começa a sair com alguém, primeiro porque a pessoa vai me achar maluca (não que eu não seja, é que eu prefiro que descubra mais tarde, quando já gosta de mim) e segundo porque vai ficar com esse discurso tentando me convencer que peixe é inofensivo e eu vou mandar tomar no cu. Tem que manter toda uma finesse no começo, né? Só no começo. Depois eu mando tomar no cu por qualquer merdinha.

Enfim, estava saindo com um Zé Ruela. Era bem interessante o Zé Ruela. A coisa estava começando a ficar séria. Eu estava realmente interessada no Zé Ruela. Estava naquela fase nojenta onde você sai sempre com a pessoa mas ainda não tem verbalização, e vocês sabem, essa fase me deixa surtada. Eu queria uma verbalização.

Um belo dia, o Zé Ruela me liga e começa uma conversa estranha. Disse que achava que precisava conversar pessoalmente mas antes queria saber uma coisa, para decidir se a gente iria conversar pessoalmente ou não. Perguntou se eu ainda gostava do meu ex-namorado, porque era um término recente e ele queria saber onde estava pisando. Eu disse que não, claro que não, que era um relacionamento falido etc. Ele disse então que queria conversar comigo naquela noite.

Desgraçou meu dia, o infeliz. Primeiro que fiquei tão nervosa que nem comi, e mesmo que não estivesse nervosa, não teria tempo de comer porque meu intervalo para almoço foi usado para fazer mão e pé, que estavam em um estado lastimável, uma coisa vermelha descascada medonha.

Enquanto fazia mão e pé ligava para as minhas amigas, histérica, especulando sobre o que ele iria conversar comigo. Porque eu sempre acho que vou levar um fora. Eu tenho TOC com fora quando estou nesse período quase-namoro. Fiquei me perguntando se viria a verbalização ou um fora.

Saí do trabalho voando para casa, tomei banho e me arrumei em tempo recorde, daquele jeito que só mulher apaixonada faz: enquanto passa maquiagem veste a calça ao mesmo tempo e ainda confere no celular se ele não ligou. Dez mil coisas ao mesmo tempo.

Daí, claro, tive meu ataque de “não quero ir” já narrado em outros textos meus. Fiquei gritando que não queria ir até que ele ligou dizendo que estava me esperando na porta da minha casa e uma amiga minha me empurrou porta afora me mandando parar de ser frouxa.

Entrei no carro dele, gelado (porque todo homem deixa o carro feito uma geladeira, caralho? Vocês suam enquanto dirigem?). O desgraçado não deixou transparecer nada, ele parecia normal. Eu pensei “eu devo ser muito doente mental para me abalar tanto com uma simples saída, o sujeito ta aí, numa boa, blasé, e eu quase vomitando de nervoso… eu sou uma loser”.

Perguntei onde iríamos e ele disse que era uma surpresa. Travei no banco do carona. Mulher sabe muito bem o que essa “surpresa” costuma significar. Comecei a pensar em um jeito educado de escapar da “surpresa” e comecei a sondar. Tentei ser discreta, mas não é o meu forte:

Sally: “Que surpresa? Eu sou curiosa, não gosto de surpresas!”

Zé Ruela: “É surpresa”

Sally: “Ahhh… dá uma dica…”

Zé Ruela: “É um lugar que a gente vai para comer”

Normalmente, eu saberia interpretar que estava sendo levada para um restaurante. NORMALMENTE. Mas, na emoção do momento, completamente transtornada, me subiu um troço e eu soltei sem pensar:

Sally: “mas… você diz… para comer como?”

Zé Ruela: “comer”

Sally: “comer alguém?”

Vocês jogam The Sims? Eu jogo. Sabe quando os Sims estão conversando e começam a se desentender e aparece um sinal de menos (subtração, para ser mais precisa) no alto da cabeça deles? Pois é, juro que vi um “menos” vermelho saindo do alto da cabeça do Zé Ruela. Perdi pontos nesse momento. Isso me desestruturou. Bem, os homens não devem ter entendido o que senti, porque macho que é macho não joga The Sims (ou não admite). Imagina que seu time entra numa final de campeonato e toma um gol nos primeiros cinco minutos. Foi isso que eu senti.

Depois da minha lastimável pergunta ele riu e disse que iríamos a um restaurante japonês que eu já tinha dito que queria conhecer. Fiquei roxa de vergonha e disse com a maior cara de pau “Eu sei, bobo! Estava brincando!” (estava nada, estava é descontrolada, isso sim).

Chegamos no restaurante japonês, que hoje nem existe mais. Era daqueles chiquerésimos, cheio de frescuras. Eu já fico meio intimidada em ambientes assim, cheios de gente rica. A situação só piorou. Se eu já estava apavorada e nervosa, agora estava apavorada, nervosa e em pânico.

Seguiu-se um dos maiores vexames em matéria de jantar que eu já protagonizei. Pior do que um jantar fino onde eu tentei cortar uma lagosta de plástico no prato (porra, como eu ia saber que a lagosta era aquela merda daquele purê mastigado que estava no canto?). Vou contar para vocês, que são meus amigos. Não espalha não.

Na entrada do restaurante havia um grande lago com carpas, aqueles peixes MEDONHOS, ENORMES E COLORIDOS que japonês cria. Era preciso cruzar uma pontezinha de merda de madeira, por cima das carpas para entrar. Para piorar, o CHÃO da porra do restaurante era de VIDRO, então, as carpas ficavam passeando debaixo do seu pé!

Cá entre nós, Amigo Leitor, independente da minha fobia de peixe, vocês não acham de péssimo gosto expor os animais que você vai comer? Vamos combinar, alguém iria em uma churrascaria que tem vaquinhas te olhando do lado de fora? Alguém comeria uma feijoada com um monte de porquinhos passeando do lado? MAU GOSTO. MAUS GOSTO DO CARALHO.

Vi aquilo e fiquei congelada. Como disse, minha fobia era descomunal, a ponto de não conseguir entrar em um recinto que tivesse um aquário. Uma ponte separava a gente do restaurante, por baixo dela carpas passeavam. Digo mais: eu vi uma carpa pular, apesar de todo mundo me dizer que carpas não pulam. EU VI!

Ele me puxou pela mão e disse “Vamos?”. Sabe mula quando empaca com as quatro patas no chão? Era eu. Travei. Simplesmente travei, não me mexia. Travei e sorria. Fiquei sem reação. Ele olhou meio espantado e deu meio que um puxão no meu braço. Eu continuei travada. Travada e sorrindo. Parecia uma maluca (parecia?). As pessoas que estavam nas mesas do pátio do restaurante começaram a olhar.

Ele começou a ficar impaciente e disse “Algum problema?”. Eu pensei que se falasse que tinha medo de peixe ele ia me achar maluca, além disso iria arruinar a surpresa que ele tinha preparado e quem sabe ele ficasse meio broxado e desistisse da verbalização. Eu queria muito aquela verbalização. Fiquei pensando em um jeito de inventar alguma coisa que me fizesse parecer menos doida varrida e que não fizesse parecer que ele deu uma bola fora com a surpresa dele.

“Algum problema, Sally?” – ele repetiu. Essa era a hora de me jogar no chão e fingir uma convulsão, mas eu não tive essa presença de espírito. Vocês sabem que desgraça vem em bandos, né? Nesse momento eu vi que alguém acenava para mim de uma mesa. Era meu ex. Estava ali com um grupo de amigos. Realiza: QUE HOMEM VAI A UM JAPONÊS COM AMIGOS?

Tudo bem que o Rio de Janeiro é um ovo e tem apenas uma meia dúzia de bons restaurantes, a gente acaba se esbarrando com todo mundo mesmo, mas porra, era muito azar.

O Zé Ruela estava virado para mim, de costas para as mesas, não viu meu ex acenando. Eu, no desespero de fazer com que ele não olhe para trás e veja, comecei a agarrar ele, do nada. Para sair dali, eu disse no ouvido dele “Quero sair daqui JÁ, não agüento mais esperar um minuto!” e fiquei agarrando ele. Curiosamente, ele me disse que primeiro iríamos jantar, porque ele tinha uma coisa importante para dizer. PORRA! Homem tenta me comer o tempo todo, na hora em que eu precisava, o desgraçado queria conversar!

Quando ele virou, meu ex tinha parado de acenar. Ele me puxou em direção da ponte. Eu continuei travada. Ele me perguntou o que estava acontecendo, bastante irritado (sinais de menos subindo novamente). Eu estava sem reação, não tinha conseguido pensar em uma boa desculpa. Eu apenas disse “Desculpa, mas eu não quero entrar aí”. Ele, cada vez mais irritado, me perguntou o motivo e eu disse que não queria e pronto: “Não quero, por favor, vamos embora?”.

Ele ficou muito chateado. Primeiro me perguntou se eu estava maluca e depois me mandou parar com a frescura. “É por causa da roupa? Você acha que a roupa não está boa?”. Eu estava com aquela cara ridícula de criança logo antes de começar a chorar e ele estava cada vez mais irritado. Chegou a um ponto em que ele disse “Chega disso, você vai entrar!” e me pegou e me colocou no ombro dele, de cabeça para baixo, e foi entrando comigo à força. Eu, na minha condição patológica de fobia aguda, comecei a gritar de pavor. O restaurante todo parou.

Meu ex levantou da mesa e foi na direção dele. Pararam os dois frente a frente no meio da ponte, com as carpas quicando no calcanhar logo abaixo e eu berrando feito uma sirene:

Zé Ruela Ex: “Tá maluco, Mermão? Não ta vendo que ela não quer? Solta ela!”

Zé Ruela: “Não se mete, dá licença que a gente vai entrar”

Zé Ruela Ex: “Aqui você não vai entrar não, só se ela quiser”

– isso tudo eu berrando, de cabeça para baixo, com o nariz quase enfiado nas carpas –

Zé Ruela Ex: “Me erra! Agora que você viu a gente resolveu se meter?”

Zé Ruela: “Seu imbecil, eu to vendo ela se recusar a entrar faz meia hora!”

Sally: “PELO AMOR DE DEUS, DISCUTAM FORA DA POOOONTEEEEEEE”

Garçom: “Os senhores estão assustando os clientes…”

Zé Ruela Ex: “COLOCA ELA NO CHÃO!”

Sally: “NÃÃÃÃÃÃOOOO! SAIAAAM DA PONTE CARALHOOOOO!!!”

*silêncio

*todo mundo me olhando

Saindo da ponte, pedi para meu ex voltar lá para dentro, disse que estava tudo sob controle.

Zé Ruela: “Agora eu entendi porque você não queria entrar! É porque seu ex está aí e você ainda gosta dele, não queria ser vista comigo!”

Sally: “NÃO! NÃO! JURO QUE NÃO!”

Zé Ruela: “Você ainda está saindo com ele, né? É por isso que ele não podia saber da gente?”

Sally: “AI MEU DEUS! NÃÃÃO! NÃO É NADA DISSO!”

Zé Ruela: “EVIDENTE QUE É!”

Sally: “Não! Não! Não entrei porque eu tenho medo de peixe!”

Zé Ruela: “Hã?”

Sally: “ME-DO-DE-PEI-XE! MORRO DE MEDO DE PEIXE!”

Zé Ruela: “Desses peixinhos aqui?” *apontando para as carpas

Sally: “éééééé!”

Zé Ruela: “Você não tinha uma mentira PIOR para inventar não?”

Sally: “Eu juro que é verdade! EU JURO!”

Zé Ruela: “Já entendi. Tchau. Seja feliz com ele.”

Virou e foi embora. Não fala direito comigo até hoje.

Para me dizer que riu da minha desgraça, para me dizer que peixe é um bicho bonzinho que não vai me morder e para dizer que minha psicoanalista vai para o céu em função do milagre que ela fez comigo: sally@desfavor.com

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Navego pela internet desde 1996. Municiado de meu Pentium 70Mhz e seu indefectível modem de 36.600Bps, navegava por vários minutos nas madrugadas. Considerando a minha idade na época, não demorou mais do que um “fechar de portas” para tentar achar alguma mulher pelada na rede.

Algum tempo depois, descobri a maravilha dos chats públicos. Foi amor à primeira vista. Já estava irritando e provocando pessoas antes mesmo de saber o que significava o termo “troll”.

Pode-se dizer que passei boa parte do meu tempo online caçando pornografia e contatos anônimos com outros seres humanos. Era de se esperar que eu tivesse pulado de cabeça na onda do sexo virtual, não? Pois é… Não foi o que aconteceu. Mesmo com as fases de não pegar nem gripe na vida real, toda a idéia de sexo virtual parecia ridícula demais… até para mim!

E quando eu falo de sexo virtual, eu realmente quero dizer fingir que está fazendo sexo de verdade com uma pessoa distante de você. Todo mundo fala suas sacanagens eventualmente. Mas aquele ponto, o RPG pornográfico de descrever o que está fazendo com a outra pessoa… Isso era impensável para mim. Talvez eu não me julgasse no direito de ser TÃO nerd assim. (Hoje em dia eu acho patético mesmo.)

Mas acabou chegando o dia onde a curiosidade venceu o senso de auto-preservação de auto-imagem. (Ou algo assim…)

Estávamos na época do ICQ. Toda essa história de webcams ainda não fazia parte da realidade dos ninfomaníacos virtuais. Você tinha que confiar que era mesmo uma mulher do outro lado. Foi na base dessa confiança que comecei minhas conversas com uma tal de Mary. Ainda estava engatinhando na arte do “bico doce”, mas consegui abrir meu caminho rumo a um pouco mais de intimidade com a suposta garota. (No ICQ, você pesquisava entre as pessoas que estavam online ao mesmo tempo que você e SE VIRAVA para ganhar a atenção delas… Nesse ponto era mais divertido e desafiador que o MSN, mas ainda sim, uma nerdice sem tamanho…)

Conversa vai, conversa vem, um belo dia (até aquele momento) eu acabo vencendo as defesas morais de Mary e consigo que ela me descreva como estava vestida. Segundo ela, uma camisola e nada mais. (Na imaginação, camisolas são curtas e sexys, e não camisetas largas e sujas com desenhos infantis, ok? Não me julguem.)

Sinto aquele prazer da vitória. A garota sempre foi jogo duro e agora estava me dizendo que estava sem roupa-de-baixo? Eu com certeza estava seguindo um bom caminho. Mesmo sem grandes prospectos sobre o destino.

Mais algumas daquelas bobagens que dizemos quando estamos no assunto desejado e ela me devolve a pergunta. É nesse momento que eu percebo que teria de escolher entre realidade e fantasia…

Realidade: Uma camiseta surrada e manchada de molho de tomate, completada por uma bermuda antiga comicamente menor do que o normal e uma cueca azul que além de furada, ainda estava com o elástico estourado.

Fantasia: Apenas uma cueca preta. E meus poderosos músculos.

Escolhi a fantasia. As coisas começam a sair de controle nesse exato momento. Começo a perceber que não poderia tratar o assunto como um voyeur textual. Teria que participar daquilo de corpo e alma.

Mas jogar fora meus avanços? Talvez se eu mandasse bem ela topasse mandar uma foto ou mesmo um encontro às cegas. Mas… e se ela fosse uma baranga? E se ela estivesse tirando sarro com a minha cara? E se ela fosse um homem?

Não dava tempo para devaneios, ela me responde dizendo que gostaria que eu estivesse perto dela naquele momento. Eu que não poderia deixar por menos, afinal, tinha procurado por isso. Escrevi que se ela estivesse por perto não se arrependeria. (Falando sem pensar: Por Somir.)

Ela dá o próximo passo perguntando o que eu faria com ela.

É uma das primeiras vezes que eu percebo que minha paranóia sobre quem está do outro lado do computador era capaz de me deixar terrivelmente inibido, mesmo anônimo. “Ela está me sacaneando, eu sei… Deve ter umas dez pessoas lendo isso… Todos rindo de mim.” Os meus próprios crimes contra otários na internet tinham se voltado contra mim. Eu não confiava em mais ninguém formado de bits e bytes.

Mas revelar isso seria muito “viadinho”, penso eu. Tinha que continuar no comando da situação. Naquela sanha estúpida de auto-afirmação, digo que arrancaria aquela camisola dela.

Lembro bem: Ela responde com um “hihihihi”. (Risadinha tímida pré “rsrsrs”. Outros tempos, desfavores…)

Pronto! Estava no controle novamente. Ela que estava tímida. Poderia dormir em paz sabendo que eu tomei a dianteira e deixei-a sem graça com minha testosterona em forma de pixels. Claro que eu ainda resolvo tirar onda perguntando se ela ficou com vergonha. (Claro…)

Ah, Somir, por que você escreveu isso?

Ela diz que sim, mas que é porque só ela que está pelada agora. Quando o “eu faria” se torna “eu estou fazendo”, não tem mais volta. Eu estava prestes a ter minha primeira vez de mentira. E pior, sem nenhuma proteção.

Vacilo um pouco. Penso se eu realmente quero continuar com aquilo. Ela me pergunta se eu que estava com vergonha agora. Maldita pessoa sem rosto da internet! Você me conhecia melhor do que eu mesmo. Óbvio que eu não admitiria isso.

Fantasia: Digo que também estava tirando minha roupa.

Realidade: Mais um gole de refrigerante.

Se serve de consolo, ela que abre a sessão pornográfica de vez, fingindo espanto com o tamanho do que acabara de ser descoberto pela cueca preta. Eu entro no jogo, de forma totalmente mecânica e previsível. De uma certa forma, estava “enfiando dobrado”.

Aquilo já não tinha muita graça. Era puramente virtual, sem a menor indicação de que se tornaria realidade. Estava sendo usado.

Ela me descrevia em detalhes como estávamos fazendo sexo. Eu concordava. Completamente incapaz de entrar no clima e me sentindo violado, comecei a torcer para gozar logo. Não na vida real, o único líquido prestes a sair de meu corpo era mesmo aquele copo de refrigerante. Eu queria terminar logo aquela sessão de sexo virtual, era vergonhoso. Não só pelo fator RPG sexual já citado, mas também porque no final das contas, acabou sendo uma broxada.

Meu o eu fantasioso continuava suas proezas sexuais, contanto.

Se você é mulher, já deve ter percebido que é um tanto quanto suspeita essa descrição sobre a súbita empolgação e assertividade de Mary com o assunto. Quisera eu ter percebido algo de errado ali. Mas até aquele momento, ela parecia a típica mulher fresca que eu estava tão acostumado a ver por aí.

Mary começou a me pedir para descrever meu “gran finale”. E não era para proteger os olhos ou evitar uma gravidez indesejada, Mary queria que chegássemos ao clímax juntos.

Veja bem, apesar de estar numa das fases mais onanistas de minha vida, nunca tinha cronometrado quanto tempo demorava para ir de um ponto ao outro da masturbação. E como estava fingindo até isso, tive que colocar um prazo mental de uns três minutos para avisá-la. Parecia justo.

Enquanto isso, aproveitei e fui me livrar daquela tubaína. (Ainda não era viciado no ácido ortofosfórico…)

Voltando, vi algumas mensagens de incentivo na tela e constatei que estava na hora de gozar. Finalmente! Ela pareceu satisfeita também. Ainda me sentindo sem graça por ter fingido um orgasmo numa sessão de sexo virtual, continuei conversando com ela por mais alguns minutos, dizendo que tinha adorado a experiência.

Ela me disse que precisava dormir. Eu pensei que apesar da estranheza do que acabara de fazer, talvez aquela situação se convertesse em algo mais real depois. Ah, a vida é de quem se arrisca! E pelo menos ela era safada!

No dia seguinte, converso com ela novamente. Ela já abre a janelinha do ICQ me perguntando se estava com saudades. Eu digo que pensei nela a noite toda. (Pensei mesmo. Aquilo tinha sido ridículo.)

Ela parece surpresa. Me pergunta porque eu pensei nela a noite toda. Eu respondo que era por causa da noite anterior.

Ela me faz outra pergunta. “Porque eu não estava aqui?” (traduzido do miguxês arcaico)

Eu respiro fundo… e pergunto onde ela estava na noite anterior. Ela me diz que havia saído com as amigas. Eu fecho a janelinha e apago ela da minha lista.

Até hoje eu não sei com quem tive minha primeira relação sexual virtual. E sinceramente… Não quero saber.

Para me perguntar o que eu estou vestindo, para dizer que eu sou um broxa virtual ou mesmo para dizer que é a Mary e estava só tirando uma com a minha cara: somir@desfavor.com

Tenho fobia de insetos voadores. Quando era pequena, uma libélula se enroscou no meu cabelo e ficou se debatendo entre meu cabelo e minha cabeça, acho que isso me causou algum tipo de trauma. Além disso, esses insetos voadores como libélulas, cigarras e cia, são completamente desnorteados, ou são cegos ou são muito burros, porque voam de forma imprevisível, inclusive para cima das pessoas.

Isto posto, posso contar o que me aconteceu na farmácia perto da minha casa. Sim, erro número um: ir na farmácia perto da minha casa! Na verdade a farmácia fica bem em frente, não tem como não passar por eles todo santo dia quando vou trabalhar. E é daquele tipo de farmácia sem portas, aberta diretamente para a rua, ou seja, não tem como passar sem ser vista. Porque eu acho um erro frequentar a farmácia em frente à minha casa? Acho excesso de intimidade. Não acho que pessoas que podem me ver todo dia tenham que saber se eu estou tomando remédio para diarréia, supositórios ou comprando absorventes! Sempre preferi frequentar farmácias distantes, onde a pessoa não me conhece e nunca mais vai me ver!

Enfim, naquele dia infeliz eu fui tomar uma injeção na farmácia em frente à minha casa. Por ser injeçã, me levaram para um quartinho que fica nos fundos da farmácia. Entrei e abaixei as calças. O sujeito começou a aplicar a injeção (sim, essa tem que ser na bunda). Como é uma injeção muito dolorida, tem que ser aplicada lentamente. Lá estava eu, de pé, tomando uma injeção lentamente, quando o pior aconteceu.

Não me perguntem como, mas entrou uma libélula no quartinho da injeção. Começou a se debater contra a parede. Comecei a suar frio e disse para o popular da farmácia “Moço, termina isso rápido porque eu tenho pavor desse bicho”. Ele, como todo homem, começou a dizer aquelas frases babacas: “não tenha medo, é um bicho bonzinho” + “ela não morde não” + “ela tem mais medo de você do que você dela”. Até parece! Esses bicho são frenéticos, descompensados! Saem voando sem o menor critério e acabam encostando na gente. Para fechar com chave de ouro, ele soltou a seguinte pérola: “Se você não mexer com ela, ela não vai mexer com você”. Quando alguém te disser isso, duvide. Duvide muito.

A libélula começou a voar baixo e eu me mexi para tentra me desviar dela. Foi o bastante para o sujeito se sentir no direito de me dar um esporro: “Olha, Dona, essa agulha aqui é afiada, ela corta na horizontal, entende? Se a Senhora se mexer, vai se machucar!”. Tem gente que nunca vai entender o que é uma fobia. Eu não tinha a opção “ignorar libélula”

Claro que a libélula veio voando na minha cara e evidente que eu, descontrolada que sou, não consegui ficar parada. Arrebentei a portinha corrediça do quartinho e sai berrando “ELA ESTA EM MIM! ELA ESTÁ EM MIM!” de CALÇAS ARRIADAS, feito um pinguim, com uma injeção espetada na bunda. Todo mundo viu a minha bunda, inclusive os transeuntes, já que a farmácia era daquelas abertas para a rua. Para piorar minha situação, ainda havia uma obra da Prefeitura naquela calçada, o que só aumentou minha platéia.

Hoje, quando passo em frente à farmácia, tenho certeza que todos lembram do episódio. Eles devem me chamar de “A maluca da libélula”.

Sim, sou solidária até no vômito.

Acredito que eu não seja a única, mas quando alguém vomita eu vomito junto. E vomitar para mim é um sofrimento, eu sou daquelas que vomita e chora tamanha a humilhação. Quando vomito tenho um colapso estético. Só vomito trancada no banheiro e de luz apagada. Não entendo porque a mãe natureza nos sujeita a isso.

Certa vez estava viajando com meu namorado. O cachorro estava conosco, ia no meu colo no banco da frente. Cabe ressaltar aqui que, contrariando as ordens do veterinário, eu me recusei a deixar o cachorro sem comer horas antes de viajar, porque achei cruel. Fui advertida que ele poderia passar mal, mas enchi a boca para dizer “Ele não faria isso comigo, tadinho”.

Estavamos na estrada. Depois de um tempo, o cachorro começou a golfar (ou gorfar, tanto faz). Fiquei desesperada e mandei parar o carro. O inútil ao volante disse algo sobre não poder parar no meio da estrada. Pensei em jogar o cachorro pela janela, pois estava antevendo o que iria acontecer.

Sou um ser humano que preza a estética. Não gosto sequer de ser vista comendo. E lá estava o cão, prestes a arruinar anos de estética impecável. Nunca tinha sido vista cortando unha do pé, pintando o cabelo, escovando os dentres, passando maquiagem… Era bom demais para ser verdade.

O pior aconteceu. O cachorro vomitou EM MIM. Eu estava de short. Senti aquela coisinha quente nas minhas pernas. Em uma fração de segundos, tentei me acalmar e vencer a maldição do vômito solidário. Mentalizei um campo florido, ar puro e belas paisagens. Foi quando senti aquela sensação de atração-repulsa. Você tem nojo, você não quer ver, mas você olha. Faço isso em atropelamentos também. E quando tem um bicho morto. Eu sei que vai ser nojento, mas é mais forte que eu, eu olho. Abri um dos olhos e dei uma rápida olhada nas minhas pernas. Foi fatal.

Claro que vomitei. Não contente, na tentativa de vomitar da forma menos visível possível (não sei como alguém poderia fazer sexo comigo novamente depois de me ver vomitar) acabei vomitando NO cachorro. Era um cão pequeno, ele foi totalmente coberto pelo meu vômito. Ficaram apenas os olhos de fora, parecia uma cena de desenho animado. O inútil ao volante começou a gritar comigo, como se eu já não tivesse sido suficientemente castigada sendo obrigada a vomitar na frente dele: “EU NÃO FALEI QUE NÃO ERA PARA DAR COMIDA PRO CACHORRO?”

Andamos mais uns dez minutos até chegar a um posto de gasolina. O cão estava putíssimo, nem olhava na minha cara. Acho que ele se sentiu traído por eu ter vomitado nele. No meio do caminho ele ameaçou lamber o vômito, o que me deu mais nojo e me fez vomitar novamente. Nele, claro. Daí pra frente ele apenas deitou e bufava. Não respondia mais quando eu falava com ele.

Paramos no posto e o inútil ao volante disse “Olha o que você fez no meu carro!” e eu gritei “ELE COMEÇOU!” apontando para o pequeno cão vomitado. Os populares locais se aproximaram para olhar, imagina se eles poderiam perder um barraco desses… Perguntei para um funcionário se tinha um chuveiro e ele riu. O inútil ao volante disse que a limpeza ia ser na base da mangueira mesmo. Eu juro, na hora achei que era brincadeira.

Quando ele veio com uma mangueira de lavar carro na mão, fiquei preocupada, mas achei que era para o cachorro. Quando ele começou a gritar “Eu não falei que não era para dar comida para o cachorro?” eu comecei a desconfiar que havia uma ponta de ressentimento. Mas foi só quando tomei um jato de água que percebi que aquilo estava acontecendo. Os populares começaram a bater palmas.

O cachorro, que estava acostumado a tomar banho de banheira com água quente e shampoo de baunilha, se sentiu afrontado (talvez mais que eu) ao tomar um jato de água gelada nos cornos. Ficou mais puto ainda. A cara magoada dele me partiu o coração e resolvi pegar ele no colo. Ele vomitou em mim de novo, e eu nele. Mais jato de água para todo mundo. E os populares batendo palmas.

Ao final, eu estava esteticamente arruinada. Molhada, descabelada, maquiagem borrada e com cara de bunda. O cachorro não olhava mais para a cara de ninguém, passou duas semanas de mal, dentro da casinha. Só saía para comer e fazer suas necessidades. Nunca mais quis subir em um carro na vida.

Se alguém souber de algum truque para controlar o vômito, por favor, deixe um recado. Não quero passar por isso novamente. Nunca mais.

NOTA: Sim, esta postagem é original do blog “Sally Surtada”, mas foi escolhida para estrear a sessão. Se você já leu, entende o motivo. A cada quinze dias Sally e Somir vão se revezar contando histórias desfavoráveis de suas vidas. Afinal, somos todos desfavores uma hora ou outra…