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Pagando caro…

Pagando caro…

| Desfavor | | 2 comentários em Pagando caro…

Depois de forte reação do mercado, o governo federal voltou atrás na tentativa de tributar aplicações de fundos nacionais no exterior e manteve a alíquota de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em 0% para essas operações, horas depois do anúncio oficial, nesta quinta-feira, 22. No entanto, o Decreto nº 12.466/2025 ainda segue em vigor com uma série de outras mudanças — estas, mantidas — e que elevam de forma expressiva a carga tributária sobre operações de crédito, câmbio e previdência privada. LINK


Saímos de um governo desastrado para outro. E a grande dúvida do brasileiro parece ser qual incompetente vai eleger para continuar fazendo a mesma coisa. Desfavor da Semana.

SALLY

Todo mundo viu o que aconteceu, certo? Não precisa de explicação nem de introdução. Todo mundo está vendo isso acontecer desde que o atual governo assumiu, certo? As cagadas, a má gestão, as chamadas “falhas de comunicação”, sobre as quais já falamos e não são em nada falhas na comunicação.

Pois bem, não vamos ficar aqui nos repetindo do quanto esse governo é bosta e do quanto é absurdo que exista alguma chance, ainda que não seja uma certeza, de que vençam as eleições novamente no ano que vem. Vocês já sabem. Queremos ir um pouco além e sair da reclamação cíclica.

Enquanto argentina, tenho lugar de fala para conversar um pouquinho com vocês sobre tudo que aconteceu para que o país desemboque no Milei. Gostemos dele ou não, somos todos forçados a concordar que ele foi uma terceira via que despontou de um partido sem expressão e venceu os dois grandes partidos e nomes que alternavam poder há décadas.

Milei não foi uma “sorte” ou um “azar”. Não foi um fenômeno da natureza. Não foi algo aleatório. Para que Milei vença os dois grandes nomes, os dois grandes partidos, os dois grandes lados, certas condições foram imprescindíveis. Entre elas, uma raivosa rejeição aos dos principais “lados” da polarização política argentina.

Uma terceira via não surge magicamente, ou por um milagre, ou por uma confluência de astros. É preciso espaço para que surja. E se o povo não rejeitar cavalarmente os dois lados que normalmente alternar o poder, essa terceira via nunca tem espaço para se criar. Enquanto o brasileiro for fã de político e defender um lado em detrimento do outro, não vai surgir terceira via.

Enquanto brasileiro defender qualquer um dos dois lados, ficará preso apenas a esses dois lados. Não adianta pedir por terceira via, ter esperança de terceira via ou dizer que não surge pois “não tem ninguém”. Tem sim. Vocês é que não permitem. É como plantar várias sementes em areia e esperar que brote algo. É como plantar várias sementes na terra e nunca regar. Vocês têm que fazer por onde.

Acho que essa ideia não está muito clara na cabeça da maioria das pessoas por esse mecanismo de esperar sempre coisas caídas do céu, dadas de cima para baixo, sem qualquer mérito ou participação popular. Os políticos brasileiros realmente conseguiram convencer o povo de que ele não tem nenhum poder e o melhor a fazer é torcer por um salvador. Passou da hora de corrigir esse pensamento.

Participar do cenário político do país não é apenas ir à urna votar. É muito mais. É um processo diário. E cada pequeno ato conta. Uma postagem em rede social conta. Mas o povo insiste em negar ou não reconhecer o poder que tem, pois é aquele esquema Homem Aranha: com grandes poderes, grandes responsabilidades.

A esperança do brasileiro, por um misto de desesperança e exaustão, é que as coisas se acomodem sozinhas, se resolvam de forma mágica ou que alguém se encarregue disso. E, para isso, estão dispostos a transigir demais. Se acomodam com o político de estimação merda que tem, pois é o “menos pior”, não se envolvem em política ou se convencem que tanto faz, sempre vão se foder, não importa o que aconteça.

O primeiro grande passo para que se abra espaço para um novo nome é uma violenta rejeição por parte do povo a tudo isso que está aí. Atual esquerda e atual direita. Lula e anexos. Bolsonaro e anexos. Hora de mudar o slogan para “Eles Não” e se fazer ouvir. Não precisa ir para a rua. É uma época privilegiada, você pode fazer muito do sofá da sua casa.

“Mas Sally, quem disse que, só porque aconteceu na Argentina, daria certo no Brasil?”. Isso aconteceu com a Dilma, que, por sinal, caiu por muito menos. A rejeição cavalar abriu espaço para um candidato inexpressivo de partido pequeno. E Bolsonaro se elegeu.

Se o brasileiro massivamente começar a rejeitar os dois lados, isso tem consequências. Aprendam uma coisa: todo mundo tem inimigos. Quanto mais importante a pessoa, mais importantes costumam ser os inimigos.

Lula, por exemplo está cheio de inimigos. Talvez o povo sozinho não consiga mudanças, mas… o povo não está sozinho. E o Bolsonaro, sempre bom lembrar, além de inelegível, está com sérios problemas de saúde, então, esse aí a própria vida se encarregou de neutralizar.

Eu não estou pedindo que tracem um plano para resolver a situação. Estou pedindo que rejeitem. Que façam uma campanha de rejeição sem precedentes. Isso o povo sabe fazer, e muito bem. O brasileiro é uma máquina de moer reputação, de atormentar em rede social, de falar mal sempre que tem oportunidade. Apenas isso. Detonem esse governo. Abram espaço para algo novo.

Abrir espaço para algo novo é um exercício, seja na política, seja na sua vida. Se você não abrir espaço, o novo não consegue chegar nem entrar. Não é esperar o novo aparecer e acenar para aí abrir espaço. Não é assim que a vida funciona. Primeiro se abre espaço sem nada em vista, e depois o novo chega.

Provavelmente não vão acertar de primeira, provavelmente a terceira via não será a ideal, mas ao menos se exercita a quebra desse monopólio, dessa alternância de poder. Política do café com leite é coisa do passado, chega de dois lados se alternando no poder. Acho muito necessário que o brasileiro seja treinando e apenas a sair desses ciclos destrutivos.

Eu só peço isso, como primeiro passo: aprendam a rejeitar ambos os lados e a fazer com que essa rejeição seja ouvida. Esse é o primeiro passo para abrir espaço para uma terceira via e também para botar algum freio nesses políticos bostas que abusam do povo sem qualquer constrangimento.

Político brasileiro perdeu o medo até de falar merda. Um imitou paciente com falta de ar morrendo em plena pandemia, o outro disse que Deus mandou a seca no Nordeste para que ele possa dar água. Vocês estão em uma relação abusiva. Se separem, mesmo que ainda não tenham outro pretendente à vista.

SOMIR

O governo Lula passa por uma fase terrível de desconfiança com o brasileiro médio. Quase metade já tinha votado no Bolsonaro eleição passada, e a outra metade demonstra paciência mínima com as ideias lançadas pelo presidente e sua equipe. O povo desconfia, com razão, que o governo quer enfiar a mão no seu bolso sem entregar nada em troca.

E ao mesmo tempo, pesquisas sobre cenários eleitorais para ano que vem dão Lula como favorito, embora de forma apertada. O que diabos está acontecendo? Como o mesmo povo que desconfia de um governante ainda sim pensa em votar nele de novo?

A história do IOF é só mais uma numa lista de tentativas frustradas do governo de mexer na forma de arrecadação e tendo uma reação furiosa da população. É justo porque na campanha para sua eleição, Lula disse que não ia aumentar impostos. Mas se formos realistas, nunca fez sentido considerar a turma do PT como alguém que faz cortes na máquina pública para arrumar as contas do país.

Se você tem algum conhecimento histórico sobre Lula e Dilma no poder, sabe que eles acreditam justamente no oposto: aumentar os gastos estatais para aquecer a economia, nunca foi sobre cortes, sempre foi sobre apostar em arrecadar mais para botar as contas em dia. E quando não tem algo como o boom da commodities dos primeiros governos de Lula injetando dinheiro no país, a coisa não funciona: com a mentalidade de não controlar os gastos públicos, só resta aumentar impostos ou cobrar os que o cidadão costuma sonegar.

O brasileiro talvez não seja muito atento a essas questões de filosofia econômica da esquerda nacional, mas é meio difícil acreditar que agora, durante o governo Lula agindo exatamente dessa forma, não consiga perceber. O povo está sobrecarregado de impostos, não aguenta mais, e por isso não está no clima de políticas desenvolvimentistas baseadas em maiores gastos públicos. Mas se perguntado sobre quem pretende votar em 2026, muitos dizem Lula de novo.

Talvez em 2022 o povo tenha se enganado, mas com um mandato inteiro do PT tentando arrancar mais dinheiro do cidadão por impostos? Não faz sentido achar que Lula vai agir diferente. Mais pessoas pensam em votar no Lula do que pessoas consideram seu governo bom. Como um país pode funcionar se isso acontece?

Estou dizendo que a solução é o candidato de Bolsonaro? Eu realmente espero que não. Não só tenho horror da ideia de dar mais poder para os estelionatários evangélicos que se uniram ao movimento da direita brasileira, como na prática o bolsonarismo não foi consistente nem nessa parte de responsabilidade fiscal; lembrem-se que ele criou uma dívida horrível no final do seu mandato na tentativa de subornar pessoas a votar nele para a reeleição.

O brasileiro parece querer algo de Lula e de Bolsonaro na presidência, provavelmente o populismo que promete prosperidade sem nenhum esforço, mas na prática nenhum dos dois consegue entregar suas supostas vantagens. No governo de Lula não ganhamos mais justiça social e cuidado ambiental, no governo de Bolsonaro não ficamos mais seguros e honestos. As grandes vantagens que ambos dizem ter simplesmente não se materializam. E isso tem motivo: o que Lula e Bolsonaro vendem são características imaginadas pelos seus eleitores.

São candidatos virtuais cujos predicados existem só na cabeça de quem os defende. E isso está tão definido na cabeça do brasileiro médio que parece que não existe mais nada a se fazer entre escolher um ou o outro. E se pararmos para pensar, a única coisa impedindo que um ou o outro sejam esquecidos como presidenciáveis é a relação adversarial.

O meu ponto aqui é que já nos provamos como povo que não gostamos nem de um nem de outro. As reações negativas ao governo Lula e a incapacidade de Bolsonaro conseguir articular um candidato oposto são provas que nenhum dos dois agrada. Mas é tanto medo criado na cabeça das pessoas que tem certeza de que o mundo acaba se não votarem contra o que parecem gostar menos.

O povo está sequestrado por duas forças políticas das quais dá sinais claros de não gostar. Mas há uma dificuldade imensa de lidar com a realidade por causa das campanhas de medo criadas por ambos os lados. O brasileiro não está sendo convencido pelos políticos, está sendo chantageado. Falta mais gente falando isso com todas as letras: não queremos nem um nem outro. Queremos tentar outras coisas, porque as que estão aí não vão para lugar nenhum.

É útil para quem está no poder que o povo só os enxergue como opções. Não importa se não gostam de verdade, importa que mantenham seus cargos e poderes pelo máximo de tempo possível. Se você não quer um nem outro, você é a maioria: o povo age como se não confiasse no Lula ao mesmo tempo que realmente considera se é melhor manter ele do que trazer alguém do lado bolsonarista de volta. Se um dos dois realmente gerasse alguma confiança, já estaria basicamente garantido em 2026.

Para ter uma terceira via, a primeira coisa a se fazer é rejeitar as outras duas. Tudo bem ser contra os dois, é o que a maioria das pessoas pensa de verdade, mas precisamos falar isso em voz alta, senão as outras pessoas vão acabar de novo se sentindo obrigadas a escolher entre o menor dos males por medo de que todo mundo seja maluco.

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