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Ele disse, ela disse: O curioso caso da batata-frita.

| Desfavor | | 28 comentários em Ele disse, ela disse: O curioso caso da batata-frita.

Hoje a coluna retrata uma briga real que aconteceu durante o namoro de Sally e Somir. Ambos garantem que estão certos e resolveram colocar isso à prova frente ao público do blog.

Quem está certo?

Eu tenho vários defeitos, admito. Todo mundo tem, certo?

Mas um que eu não tenho é ser egoísta. E já deixo claro aqui que considero egoísmo não querer dividir algo que você pode dividir. Sim, porque assim como um crime não justifica outro, ser excessivamente permissivo não é sinal de saber dividir.

Algumas pessoas, e um belo exemplo é a minha CARA companheira de blog e ex-companheira de relacionamento, enxergam o mundo em dois tons. Preto ou branco, sim ou não, certo ou errado… Para pessoas assim você é egoísta a partir do primeiro “não” que elas escutam. Sem contexto, sem motivação, sem lógica. Ou se faz TUDO o que essas pessoas querem ou você é um monstro insensível que as odeia profundamente.

E algumas pessoas como eu não tem o menor problema de fazer o papel de vilão se for para o bem da pessoa que elas gostam. Eu sei dividir, e saber fazer uma coisa não é fazer essa coisa em todas as chances que aparecem. Saber fazer uma coisa é fazê-la na hora certa.

A situação é a seguinte, e lembrem-se que EU vou usar o contexto para explicá-la:

Sally está numa de suas dietas especiais, não pode comer absolutamente nada que tenha sabor ou que remotamente pareça palatável. Apesar de não fazer muita questão que ela se esforce tanto pela aparência (nesse aspecto de definição muscular), eu sei que ela fica feliz quando um daqueles músculos impronunciáveis que só gente que malha muito conhece dá o ar de sua graça saltando triunfante de seu abdômen.

O humor dela não fica tão triunfante assim durante o processo, contanto. Conhecendo a minha namorada, eu sabia muito bem que enquanto ela não conseguisse o sucesso na sua empreitada muscular, crises aleatórias de mau-humor afetariam quem quer que estivesse no caminho.

Tenho vários defeitos, mas não digam que não sou companheiro. No papel que me cabia como namorado, sabia que seria uma das vítimas mais constantes desse mau-humor.

E estava sendo o caso naquele final-de-semana. Sally não podia agradar nenhuma de suas papilas gustativas sob o risco de estragar sua dieta, e isso estava afetando diretamente o humor dela. Tenho vários defeitos e um deles é ser um troll provocador com pessoas que eu realmente gosto. A combinação estava um tanto quanto explosiva e eu estava pulando em várias dessas granadas para não brigarmos por bobagem.

Ela me sugere que jantemos fora, eu pergunto se não vai ser um problema e ela me garante que não, que é só pedir a comida certa que ela vai ficar bem.

Ótimo! Fomos jantar então. No caminho ela ficou alterada porque eu distraí e entrei na rua errada. Relevei, já que se tivesse que comer verduras e saladas por semanas também ficaria irritado a ponto de esquecer que namorava com uma pessoa clinicamente distraída.

Preciso lembrar que realmente é uma situação rara, Sally é tudo menos chata. Nos poucos momentos onde ela começava a pegar no meu pé, aparentemente surgia também uma espécie de “black-out” na memória dela, tanto que ela sempre lembra dos fatos sem o contexto quando resolve implicar comigo por algo já acontecido.

Pois bem, chegando ao restaurante eu, que não estava de dieta, resolvi fazer um ato grandioso para mostra minha boa-vontade para com ela e ver se reconquistava a simpatia da minha namorada: Eu disse que pediria a mesma coisa que ela para não deixá-la passando vontade.

Egoísta, hein?

Ela riu de mim, disse que não precisava, que era forte, que eu podia pedir o que bem entendesse… Todo o pacote da pessoa orgulhosa da qual eu tanto gosto. Pedi um filé com fritas e ela pediu algo intragável do tipo “verduras no vapor”.

Chegam os pratos. Começamos a comer.
Tenham em vista que eu SEI que ela NÃO gosta dessas comidas naturais sem gosto e sem histórico de batimentos cardíacos. Nunca gostei que minhas mulheres ficassem de dieta, até por isso sempre fui muito mais generoso do que o normal com alguns quilinhos a mais. Eu sofro junto quando vejo alguém comendo algo que eu acho horrível.

Mas… É a escolha dela. É o que vai fazê-la feliz, certo? Vou valorizar o esforço e não vou ficar pentelhando como sempre faço quando vejo alguém deglutindo essas porcarias vegetarianas.
Eu já estava lutando contra a necessidade de demonstrar afeto por vias transversas dizendo como estava ótimo o meu filé com fritas. E, Gezuiz, eu gosto muito da Sally! Era quase insuportável não ficar provocando…

Aí acontece. Minha CARA repousa seus talheres, observa demoradamente uma vagem molenga que caprichosamente se molda aos contornos do prato. Eu sinto a dor dela como se fosse minha. Ela levanta os olhos, com a cabeça ainda abaixada, procurando pelos meus.

Meu coração fica apertado. Mal consigo mastigar o delicioso pedaço de carne que sangra seu sabor em minha boca. Estava no meu limite. Sally estica sua delicada mão até o meu prato e rouba uma batata-frita.

Ah, que se dane! Digo para ela pedir uma porção de batatas-fritas para ela, pelo menos para amenizar aquele sofrimento. Ela diz que não precisa, que vai comer a comida que pediu.

Penso comigo mesmo que não vou me render à vontade de forçá-la a comer algo que preste. Engulo o meu sofrimento, aceito o sofrimento dela e relevo o deslize que ela cometeu ao pegar a batata do meu prato. Não foi fácil, mas foi pelo bem de todos.

Sally pega outra batata. Eu insisto para que ela peça outra porção, já que não vai mais fazer tanta diferença e além disso, se continuarmos nessa ninguém vai aproveitar a refeição. Ela insiste que não vai pedir. Eu insisto para que ela tome uma decisão.

Ela decide continuar pegando as minhas batatas-fritas. Pronto, todo o clima de sofrimento até aquele ponto tinha sido desperdiçado. Ela saiu da dieta e jogou fora minha dedicação ao bem-estar dela até aquele momento.

E depois ficou furiosa quando eu joguei todas as batatas do meu prato no dela. Me chamou de infantil, egoísta e dramático.

Sally, você é um desfavor! Mulheres que roubam batatas-fritas dos pratos dos namorados mesmo estando de dieta, vocês são todas um desfavor!

Para me convidar para um jantar vegetariano e ser mandado plantar batata: somir@desfavor.com


Eu tive um casal de cachorros. Não eram muito espertos nem muito obedientes, mas era muito unidos. A fêmea comia mais do que o macho. Lembro que quando a comida dela acabava, ela ia na tigela dele comer. Ele abria um espaço e deixava ela comer junto com ele.

Como vocês podem ver, mesmo criaturas irracionais sabem que é recomendável dividir sua comida com a sua fêmea. Cansei de ver documentários sobre animais que dividem sua comida e muitas vezes até dão prioridade para que a fêmea coma em primeiro lugar. Gentil, cavalheiro e provedor.

Será que todos os animais são assim? Provavelmente. Exceto um animal chamado SOMIR.
Eu sempre achei que nossa pior briga se daria quando ele me visse dançando ou quando visse o tamanho das minhas saias. Besteira. Para tirar ele do sério basta meter a mão no prato dele e roubar uma batata. Ele leva para o pessoal.

“Eu te perguntei se você queria e você disse que NÃO. Se você quer, eu peço uma SÓ PARA VOCÊ”, foi a frase que ele resmungou rangendo os dentes. Eu realmente não queria uma porção inteira de batata, mas queria provar uma. Não achei que fosse ter problema, mas parecia que eu tinha limpado a minha bunda com a escova de dentes dele.

Realmente, quando fizemos o pedido eu não estava com vontade de comer batata-frita. Mas quando o prato dele chegou, a batata parecia tão gostosa que me deu vontade de experimentar. Uma pessoa que divide a cama com você supostamente dividiria uma batata sem maiores problemas. Mas não na Somirlândia, esse mundinho autista cheio de regras próprias onde ele vive.

Madame surtou. Puxou o prato feio um presidiário e ficou me fuzilando com o olhar. Não, não fez isso de brincadeira não. Era sério mesmo. Só faltou rosnar. Fiquei olhando com cara de espanto.

“Quer que eu peça uma só para você?” – ele repetiu. Deus sabe que eu sou uma boa namorada (e o palhaço do Somir sabe também), mas não gosto de ser provocada. Aquela voz de comando me aborreceu. “Não, não quero não, quero comer DA SUA” – respondi. A cara dele se contorceu de ódio, achei que ele estava tendo um AVC.

Onde já se viu um homem se aborrecer porque a mulher pega um pouco da sua comida? Madame ainda teima comigo dizendo que isso é perfeitamente normal. Quando sugeriu esse tema para o blog eu cheguei a aconselhá-lo a não divulgar isso, porque é algo tão bizarro que ninguém iria dar razão. Foi quando ele disse “Você é que está com medo de descobrir que isso é normal e compreensível”. Diante desta provocação, faço questão de que ele seja massacrado.

Uma vez ele chegou a tentar se justificar alegando algo ligado a “instintos”. Ok. Se fosse para seguir instintos, uma fêmea deveria fazer sexo com vários machos para procriar com aquele mais apto. Se o ser humano se deixasse levar por instintos, todo mundo comia todo mundo e todo mundo matava todo mundo.

Querem ouvir uma coisa engraçada? Não pode pegar comida do prato de Madame, mas Madame pode pegar comida do meu! Após meu olhar de reprovação, ele soltou aquela frase cretina “É diferente!”. É sim, é muito diferente. Ele pode tudo, os outros não podem nada.

Ninguém vai me convencer de que isso é normal. Não estamos falando de duas pessoas que passam fome. Estamos falando de territorialidade para cima da própria mulher. Além de detonar a imagem do homem provedor, ainda soa egoísta e mesquinho. Bela relação de cumplicidade e confiança aquela onde você não pode meter a mão no prato da pessoa e pegar uma batata-frita!

Quero deixar uma coisa clara: minha crítica principal não é ao fato do homem se importar, e sim ao fato dele verbalizar isso em tom recriminatório. Ele poderia se importar em silêncio e fazer de conta que não se incomodou, por ter consciência do quão ridículo é esse sentimento. Mas não! Não apenas se incomoda como ainda verbaliza! É muita falta de bom senso!

Não é pela batata-frita, é por não ter a liberdade e a intimidade de poder meter a mão no prato de uma pessoa que pode meter a mão na sua bunda. Vem no pacote quando você decide namorar alguém. Hoje não te deixa pegar uma batata-frita do prato… amanhã não te deixa mais sentar no sofá… quando você vai ver, está dormindo na área de serviço, no chão, em cima de um jornalzinho! Sai fora!

Para me oferecer batata-frita do seu prato, chamar o Somir de cretino e sugerir temas: sally@desfavor.com

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