Skip to main content

Colunas

Arquivos

Pior burocracia.

Pior burocracia.

| Desfavor | | 18 comentários em Pior burocracia.

Que burocracia é um inferno, Sally e Somir concordam. Porém, na hora de definir quais formulários preencher, os dois não conseguem dar andamento no processo. Os impopulares enviam três cópias autenticadas para participar…

Tema de hoje: qual a pior burocracia no Brasil?

SOMIR

Eu vou com retirar um carro apreendido do pátio. Difícil não escolher o poder público nessas horas, um misto de processos antiquados, funcionários preguiçosos, expectativa de corrupção e a ruim e velha bagunça tupiniquim colaboram para essa experiência demoníaca.

Para ser justo, esse processo todo começa com alguma burrice sua: existem regras para se manter um carro legalizado no Brasil, e se você esquecer de fazer as coisas necessárias como licenciamento, porque não consegue parar de trabalhar para pagar impostos, e como os serviços públicos são terríveis, para pagar pelos mesmos serviços, só que da iniciativa privada. Dá raiva, mas é algo evitável. Então, durante todo o calvário de recuperar seu carro, você vai se lembrar de que começou com uma cagada sua. O que, pelo menos pra mim, torna tudo ainda mais irritante.

A coisa já começa na apreensão: o policial preenche um pedaço de papel com qualidade de papel higiênico duplicado com papel carbono, gerando um documento precário que fica borrado ou rasurado com qualquer contato com os elementos. Eu honestamente não posso reclamar de truculência ou abusos policiais, pois tenho o combo homem branco no interior de São Paulo ao meu favor. Essa parte deve ser extremamente pior para quem não lida com basicamente o ambiente ideal de contato com a polícia no Brasil. O máximo que eu posso reclamar é da chatice de tirar a CNH do plástico para entregar para eles. Mas outras pessoas em outros lugares devem lidar com maus tratos, tentativas de suborno e baixarias em geral.

E como tecnicamente o carro está ilegal, precisa ser levado embora. Não sem antes o policial vistoriar o carro em busca de qualquer probleminha, para garantir uma maior arrecadação (eles são explicitamente instruídos a tirar o máximo de cada um que param). Não é zelo porque você pode levar um carro com saco de lixo no lugar do vidro em vistoria e ainda passa, o funcionário de lá não ganha nada além de trabalho extra se te barrar. Eu lembro de fazer isso na época dos extintores, e é claro que ficou condicionado levar um novo extintor para pode tirar o carro. Bônus: meu estepe estava careca. Meu fuckin’ estepe. Adivinha se o otário não teve que levar um novo também?

E se isso acontecer numa sexta-feira (o dia preferido desse tipo de ação policial), prepare-se para não ter a menor chance de reagir. Detrans, Ciretrans e simpatizantes trabalham das 10:45 às 11:23 de segunda a sexta, menos em feriados, dia do professor, dia da bandeira, dia do cavaco… só horários e dias perfeitos para quem está desempregado. E como eles amam papel mais do que tudo, pode ter certeza que não vai resolver porra nenhuma pela internet. Até porque quando lançam serviços no site, ou o site não funciona ou não serve para os casos mais comuns.

Lá vai você pegar a certidão de batismo da sua bisavó, atestado de comparecimento ao Rock in Rio 2003, documento de comprovação de serviço militar para cegos e toda palhaçada que te pedem só na hora que você entrega os documentos que fazem sentido e descobre que não servem, porque a segunda via não está autenticada pelo III Cartório de Boa Vista, RO. Se você não precisar fazer duas viagens para qualquer Ciretran porque não levou os documentos certos da primeira vez, já recebe a ficha de inscrição do sindicato dos despachantes lá mesmo.

Sem contar que é serviço público: além dos horários terríveis, a pessoa responsável quase sempre está ocupada com alguma outra coisa ou está fora mesmo. Parece que sincronizam os atrasos para ter certeza que se por um milagre te atenderem corretamente, não dê tempo de você ir para qualquer outra repartição pública. Todo erro de documentação é motivo para perder mais um dia. E os custos do seu carro no pátio continuam acumulando. Que coincidência…

Você passa por toda essa confusão, perde metade da sua semana, mas finalmente consegue a liberação do carro. Fica fácil agora, né? Não! Porque os carros são levados para o mesmo bairro em todas as cidades: a Vila Puta que Pariu, na rua de terra sem número, sem placa de identificação e que nem as pobres almas que moram por perto sabem te dizer onde fica. Sem contar que você está de carona, porque o transporte público inexiste nas proximidades de qualquer lugar onde Estado guarda carros apreendidos. Você coloca o endereço no GPS e a voz responde com uma risada e um ícone de dedo do meio. Aposto que os cornos subornam os moradores locais para não informar onde eles ficam, para ganhar mais uma horinha de pátio.

Por um milagre você chega no lugar, com um quilo de papel e todas as merdas que o policial escreveu que seu carro precisava para ser liberado. Pneu, extintor, triângulo do modelo novo que toca música da Anitta, capa de cinzeiro roxa e dadinhos de pelúcia para o retrovisor… e descobre que o pessoal do pátio está cagando e andando para tudo. Quer dizer, para tudo menos o pagamento. Adianta levar seu cartão? Não! Porque os filhos da puta só trabalham com dinheiro, embora nunca tenham troco. Depois de se foder todo para tirar o dinheiro, e o caixa mais próximo está do outro lado do mundo, de aceitar que a pessoa não vai ter troco, mas você pode voltar outro dia… você paga e um funcionário que parece sempre cansado de existir se move vagarosamente até seu carro. Seis meses depois ele aparece com o carro, do meio da montanha de carros enferrujados (que gente com menos vocação para tortura abandonou), e ninguém se importa se tiver um corpo no banco traseiro. Depois de pagar o preço absurdo de dias e mais dias de armazenamento precário no chão de terra sem cobertura, você finalmente recupera seu carro.

E entende de coração porque tem gente que oferece suborno para policial nessas horas. Não gostou? Vai morar em outro país.

Para dizer que a culpa foi minha, para dizer que tem certeza que eu nunca mais esqueci de licenciar carro, ou mesmo para dizer que tem que privatizar o Brasil inteiro: somir@desfavor.com

SALLY

Qual é a pior burocracia no Brasil?

Mesmo vivendo em um país onde a prestação de serviços públicos deixa a desejar, eu dou este prêmio para a iniciativa privada: tentar resolver pelo telefone algum problema com a NET. Para qualquer coisa.

Em um país onde serviços de telefonia, bancos e planos de saúde tratam seus clientes da pior forma possível e imaginável, uma empresa se destaca: a merda da NET. Uma empresa que faz de tudo, com visível má-fé, para que seu atendimento seja o mais sofrido, demorado e desagradável possível. Tentar se comunicar com a NET, mesmo que seja para dizer que você quer doar um milhão de reais para eles, é desumano, deveria configurar crime de tortura o que eles fazem com seus clientes.

Mesmo em um país onde não se respeita o consumidor para nada, elas conseguem ser um ponto fora da curva. Ninguém é tão incompetente, canalha e filho da puta como a NET. Desde a musiquinha de espera escrota até os trocentos passos e digitações para, após 40 minutos, ser atendido por um call center que não sabe nada, tudo é uma tortura.

Não há qualquer chance de que você consiga o que quer, mesmo que o que você pede seja benéfico para a empresa, como por exemplo, colocar a conta em débito automático ou pagar uma conta. As pessoas que te atendem estão visivelmente enraivecidas, talvez sejam pessoas escravizadas, amarradas com correntes no fundo de um porão, só isso explica.

O que quer que você solicite, será feito o contrário. O que quer que você diga, a pessoa que te atende entenderá errado. O que quer que você peça, será negado alegando que o sistema está fora do ar. Se uma visita técnica for agendada, existem três possibilidades: 1) o funcionário não comparece, 2) o funcionário comparece no dia/hora errados ou 3) o funcionário comparece e não resolve o problema.

Qualquer retorno de ligação que você faça sobre contato preexistente, por mais que você tenha o número do protocolo, será permeado por desinformação e incompetência, que vai te obrigar a reiniciar o que quer que seja que você pediu do zero. E se você pedir para falar com algum supervisor, será passado para um colega ao lado do ser humano que está te atendendo, tão ou mais desinformado, com má vontade e baixa cognição quando o primeiro.

Quando existe um posto de atendimento, você pode ir até lá, prensar um funcionário, fazer plantão e se recusar a sair enquanto não for atendido ou até falar com um superior. Por telefone não, foda-se. Os atendentes desligarão na sua cara, fingindo ter caído a ligação e não retornarão. Os atendentes dirão que não podem ajudar e tudo que você pode fazer é ficar gritando do outro lado.

“Mas Sally, pode contratar outras empresas”. Pode? Onde eu moro, que é uma região central e bairro nobre do Rio de Janeiro não pode. A Vivo, por exemplo, não chega aqui. Basicamente o Rio é uma espécie de capitanias hereditárias fatiado por grandes empresas. Onde eu estou é NET, é pegar ou largar. Não é a toa que traficante carioca presta esse serviço em paralelo, apelidado carinhosamente de “GatoNET”. Eles sabem que não há qualquer possibilidade da empresa original atender direito.

Por sinal, o suporto e atendimento do GatoNET é infinitamente melhor do que a empresa original. Curioso ver que um bando de traficantes sem escolaridade consegue atender e dar suporte técnico melhor do que os “profissionais” da NET. Sim, a NET perde muito cliente classe média (no Rio ninguém tem ressalvas em fazer isso) para traficante analfabeto, pois eles são mais competentes e educados. Provavelmente até uma criança conseguiria ser. Um bonobo bêbado, uma ameba autista ou basicamente qualquer ser vivo.

Ligar para a NET suga sua energia vital, tira a vontade de viver, te coloca em um estado de irritabilidade antes mesmo de você acabar de discar. Você sabe que não vai resolver, você sabe que serão necessários milhões de novos contatos, você sabe que vai ser prejudicado (ficar sem serviços, cobranças indevidas, etc) e, ainda assim, você tem que se sujeitar a isso, pois não tem outro jeito. É basicamente uma vaca indo para um matadouro com uma musiquinha de fundo muito, muito, muito irritante.

Se houvesse um atendimento da NET ao vivo, pessoalmente, eles não chegariam a esse ponto de descaso. É certo que ao menos uma vez por dia alguém armado ou em meio a um surto psicótico desencadeado por eles entraria ali atirando, sejam tiros de uma arma de fogo, sejam fezes. Se fosse possível atingi-los ao vivo, eles tomariam mais cuidado, pois massacres seriam rotineiros.

Naquela gravação escrota que te faz esperar 40 minutos antes de falar com qualquer atendente deveriam incluir o telefone pessoa e endereço da pessoa que vai te atender (e de seu supervisor também!), assim, quem sabe, as pessoas teriam medo de ser tão preguiçosas, incompetentes e escrotas. Tinha que passar RG, endereço da escola onde os filhos do atendente estudam, tudo. E se você pensa que os atendentes são coitados que apenas estão ali fazendo o que a empresa manda, você nunca ligou para a NET. Mal educados, frustrados, grosseiros.

A NET tem uma coisa que o Poder Público não tem: certeza da impunidade. A NET não. A NET é uma empresa do mal que tem capital suficiente para se manter, mesmo sendo uma merda. A NET aprendeu a funcionar no modo “sacaneando o cliente o mais que posso” e, ainda assim, se mostrou lucrativa e funcional. É o que eles são, não vão mudar, não vão melhorar, não importa para quem tenham sido vendidos. Só se demitir todo mundo e recomeçar do zero com muita vigilância.

Com servidores públicos dá para lidar, de um jeito ou de outro. Com os filhos da puta da NET, que estão enchendo o rabo de dinheiro e lucrando enquanto sacaneiam os clientes, não.

Para divulgar o endereço da sede da NET na esperança de melhorar esse quadro, para divulgar nome/endereço/telefone de qualquer funcionário da NET na esperança de melhorar esse quadro ou ainda para se perguntar o que acontece quando um funcionário da NET vai ao DETRAN: sally@desfavor.com

Comentários (18)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.