Fator externo.

Sally e Somir concordam que relacionamentos não são mágica, dependem de muita dedicação de ambas as partes. Mas, quando consideramos fatores que não dependem só da vontade do casal, eles se separam. Os impopulares fazem a DR.

Tema de hoje: qual é o fator externo mais importante para que um casamento dê certo?

SOMIR

Eu votaria na estabilidade financeira. Não estou falando de riqueza, ninguém precisa ter muito dinheiro para ser feliz, muito menos para manter um casamento (ou relacionamento de longa duração se você for mais esperto) funcionando bem; agora, um mínimo de dinheiro faz muita diferença para dar paz suficiente para essa relação florescer e dar seus frutos.

Por isso, começo esse argumento definindo o que considero estabilidade financeira: é o casal ter uma quantia de dinheiro e fontes de renda suficientes para que dinheiro não se torne um problema. Tem gente que só precisa pagar as contas para ter essa paz, tem gente que precisa de uma boa reserva no banco ou em investimentos para não ficar nervosa. No final das contas, é uma combinação da visão das duas pessoas sobre o aspecto financeiro. Se os recursos do casal derem conta de fazer a pessoa mais exigente sentir que está no caminho certo, eu já considero estabilidade financeira. Pode ser com uma renda de 2.000 reais por mês, pode ser com uma renda de 200.000…

Mas amor é mais importante que dinheiro, certo? Certo. É tão mais importante que deve ser protegido do dinheiro! Amor é possivelmente o sentimento mais poderoso do ser humano (depois da vontade cagar quando você está quase chegando em casa), mas não é imune a interferências. Amor te dá uma resistência incrível aos perrengues da vida a dois, mas pode acabar sufocado por problemas recorrentes, e poucas geram dores de cabeça mais recorrentes que um ciclo de problemas financeiros: até mesmo doenças acabam passando, mas questões de dinheiro vão piorando quase que infinitamente se não forem tratadas.

E elas vão ocupando o espaço de todo o resto na vida. É o jeito como a nossa sociedade funciona: você precisa de dinheiro para dar cuidar de todas suas necessidades básicas e boa parte das mais elevadas. Problema na base dessa pirâmide de necessidades atrapalham todo o resto. Agora, no sentido contrário: quando o casal consegue controlar essa parte da vida, dali pra frente encontra uma base de sustentação poderosa. Repetindo: não precisa ficar milionário, é só ter o necessário para continuar comprando o que precisa ser comprado e ter a capacidade de fazer planos para o futuro.

Quando você passa muito aperto financeiro, sua capacidade de planejar vai se esvaindo junto com o saldo bancário. E não podemos fazer pouco da importância de ter projetos conjuntos numa relação saudável: casal que não consegue se coordenar para alcançar metas futuras é casal que perde boa parte da graça e até mesmo do valor de uma parceria dessas. Estar abaixo da estabilidade financeira significa na maioria das vezes manter um foco forçado no futuro imediato. Nem tem a vantagem de viver no presente ou pensar no longo prazo, porque já almoça pensando em como vai conseguir jantar… ou, em como vai pagar a próxima conta, como vai renegociar suas dívidas.

Não dá para curtir direito a outra pessoa, não dá para relevar problemas pequenos em prol de uma meta conjunta, o casal acaba preso num ciclo de problemas, com a sensação que o sofrimento está na próxima esquina o tempo todo. Isso é veneno até para quem está sozinho. Agora, imagina só isso com a complexidade necessária para manter uma relação funcionando direito. Brigar por dinheiro ou ficar decepcionado(a) com a incapacidade do(a) parceiro(a) de ajudar é uma sensação muito ruim que vai se acumulando com o passar do tempo.

E em alguns casos, é especialmente cruel: imagina que você encontra uma pessoa que tem quase tudo certo para você, mas que é um problema na hora de fazer as finanças funcionarem. Gasta muito, não tem muito potencial de fazer dinheiro, não se importa com isso numa medida compatível com a sua… é terrível saber que é “só” uma questão de dinheiro e mesmo assim tornar sua vida insuportável. Se pelo menos uma pessoa do casal conseguir fornecer essa estabilidade para os dois, desse mal o casal não morre. Claro que o ideal é que os dois trabalhem em conjunto em prol da estabilidade financeira, mas mais do que isso, é ter o dinheiro mesmo, porque cobre até mesmo essas possibilidades.

E espero que fique claro com o meu argumento aqui que não sou um hippie selvagem que acha bonito dividir banheiro, mas considero um problema mais contornável. Um casal esperto vai encontrar formas de evitar vários dos males do banheiro compartilhado (cagar só no trabalho, operação cata-pentelho após cada banho, etc.), e se tiver estabilidade financeira, provavelmente vai arranjar uma solução para conseguir uma casa com mais um. Mesmo que não consigam imediatamente, concordam que é mais fácil tolerar um cheiro de merda no banheiro se você tem o prospecto de se mudar no futuro? Quando você pode pensar que “ainda vamos rir disso”, os perrengues ficam mais fáceis de encarar.

Sem contar que só gente decente tem problema com banheiro compartilhado. Você pode ser indecente e encontrar o amor da sua vida em outra pessoa indecente. Pronto, problema resolvido! Agora, quando falamos de dinheiro, não tem dessa de ser bárbaro, encontrar uma outra pessoa selvagem e estar tudo resolvido. Dinheiro não está nem aí para seus gostos e vontades: ou você tem o suficiente, ou vai passar pelos problemas da insuficiência, simples assim. Mesmo um casal que liga muito pouco para isso ainda precisa comprar comida, pagar aluguel, transporte e contas em geral. Não dá para se acostumar ou mesmo relevar um despejo… ou tem ou não tem.

Muito relacionamento acaba ou se torna um zumbi (pessoas vivendo juntas sem nenhuma vontade de continuarem juntas) porque não conseguiram resolver o problema do dinheiro. Não é ser interesseiro(a), é ter suas expectativas de qualidade de vida estraçalhadas por um fator que não depende exclusivamente de vontade (às vezes a pessoa dá azar mesmo) e ver esse incômodo se tornar tão grande ao ponto de sufocar o sentimento. Cada um tem sua medida. Tem quem releve viver numa favela, tem quem encare numa boa andar de ônibus, mas tem quem se sinta terrível sem ter um dinheiro para lazer ou mesmo sem uma reserva para imprevistos. Pessoas tem medidas próprias do que consideram estabilidade, e se a relação não atingir pelo menos a necessidade básica da pessoa que exige mais, o amor não resiste.

Então, claro, trate bem a pessoa amada, mas não esquece de manter um saldo positivo no extrato…

Para me chamar de capitalista selvagem, para dizer que depois de ler o da Sally deixou de concordar comigo (eu vou tolerar sua escolha), ou mesmo para dizer que quer ser rico para ter um banheiro com duas privadas: somir@desfavor.com

SALLY

Qual é o fator externo mais importante para que um casamento dê certo?

Banheiros separados. Por sinal, isso deveria ser uma regra entre humanos civilizados, sejam eles um casal ou não. O banheiro, assim com a escova de dentes, é individual e intransferível. Não sei quem foi o porco nojento que inventou essa convenção de compartilhar vaso sanitário.

Provavelmente muitos de vocês vão concordar com o Somir hoje. A ilusão da estabilidade financeira ainda convence. Muita gente acha que dinheiro é o principal fator de resolução de problemas, mas, acreditem, quando se fala em relacionamento, não funciona. Tanto é que casais ricos se separam na mesma proporção que casais pobres. Dinheiro, por si só, não facilita a convivência, a menos que a pessoa saiba como usá-lo para preservar uma relação.

Um casal milionário que divide banheiro tem menos chance de permanecer casado do que um casal classe média que usa banheiros separados. A barbárie de dividir o banheiro destrói o amor mais do que boletos. Dívidas são reversíveis, o desgosto de escutar o outro cagando ou de não ter total privacidade ao cagar, não pode ser revertido.

Não é apenas sobre o excesso de intimidade, é sobre minimizar conflitos. Compartilhar banheiros fatalmente gera desgostos, atritos e decepções. É um espaço extremamente privado tornado público a outra pessoa. É permitir que terceiros interfiram nos momentos mais íntimos da sua vida. Desde xixi no chão até um pentelho no sabonete, cada invasão tóxica na sua privacidade mata um pouco da magia do amor.

Banheiros separados permitem que seus momentos mais íntimos (cagadas, mijadas, banhos, depiladas etc) ocorram do seu jeito, sem surpresas e sem interferência. Você não tem que apressar o processo para ceder o banheiro ao outro, você faz tudo do seu jeito sem se preocupar com o espaço do outro, você mantém privado tudo que acontece da porta para dentro, pois ninguém vai encontrar cabelos no ralo, cheiro de merda ou qualquer outra pista do que aconteceu ali.

Relacionamentos com coabitação impõe uma convivência excessiva, por premissa. É necessário ter um refúgio, um santuário, um respiro. O banheiro individual te permite isso. Ali é o seu pequeno reino particular, onde ninguém vai intervir, onde tudo será do seu jeito, onde não é preciso ceder. É fundamental para o equilíbrio de uma convivência diária que ninguém interfira quando você estiver realizando suas tarefas mais íntimas, ou, em bom português, se nem cagar você pode em paz, fica difícil.

Os americanos têm uma expressão chamada “Me Time”, que, em uma tradução muito simplificada, significa “tempo para mim”. Todo mundo precisa de um “Me Time” por dia. Por isso muitas pessoas gostam de ficar acordadas depois que todos na casa foram dormir, para ter algum tempo de qualidade sozinhas com elas mesmas. Porém, isso nem sempre é possível e a falta de “Me Time” acaba minando silenciosamente as relações.

Um banheiro individual assegura algum “Me Time” por dia. Assegura que você possa fazer rituais diários obrigatórios no seu tempo, do seu jeito, sem preocupações. Parece pequeno, mas, faça as contas de quantas horas por dia se gasta no banheiro, entre necessidades fisiológicas, banhos e demais afazeres. Pelo menos uma hora por dia, suponho eu.

Um dia tem 24h, você provavelmente passa 10 a 11 horas fora entre trabalho e deslocamento para o trabalho e tarefas fora de casa, outras 8 a 9 horas dormindo. Isso significa que sobram mais ou menos 4 horas para ficar em casa. Dessas 4 horas, pelo menos uma por dia você usa em rituais de banheiro, ou seja, 25% do seu tempo em casa.

Garantir que 25% do seu tempo em casa seja de total sossego, do seu jeito, com total paz e zero interferência alheia é muita coisa. É um refúgio. É um templo à individualidade. Fora, é claro, não ter que cheirar merda alheia, não ter que encontrar barba na pia, tapete encharcado e tantas outras coisas que, a longo prazo, chateiam bastante.

Banheiro individual é um suspiro de privacidade em uma condição onde privacidade decai bruscamente (morar junto). Não adianta ter todo o dinheiro do mundo, contas pagas, privada de ouro, se você não usa isso para assegurar um “Me Time”, se você se relaciona com uma pessoa grudenta que quer estar colada em casa momento (banho é faxina, deixem as pessoas em paz na hora do banho), se você não tem um refúgio para ficar com você mesmo.

Além disso tem o próprio constrangimento, que, se você não for uma pessoa das cavernas, vai sentir ao perceber que seu parceiro está te escutando cagar. Nada pior do que suíte, um banheiro dentro do quarto, que te obriga a cagar a poucos metros de distância do outro, no silêncio da noite e depois espalha o cheiro pelo quarto. Quem em sã consciência quer passar por isso? Eu não quero que me escutem cagar, nem meu parceiro, nem ninguém. Chama-se privacidade, intimidade.

Eu acredito que para tudo na vida existe um “ponto de não retorno”. Por exemplo, a pessoa está engordando, ela está incomodada com aquilo, ela vai tentar reverter a situação, mas… depois que passa de um certo peso, a pessoa desiste e se entrega, está tudo cagado demais para ser mudado, é o ponto de não retorno. Dali para frente ela entrega os pontos e apenas engorda. O mesmo acontece com relacionamentos.

Existe um cuidado diário, no trato, na dinâmica, em todos os relacionamentos. Tentamos tratar o outro o melhor que podemos, tentamos poupar o outro de certas coisas. Se não formos vigilantes, a intimidade acaba aos poucos com esse cuidado básico no trato, pois ele dá trabalho. Parece futilidade mas esse cuidado é fundamental para preservar uma relação. Pode acontecer da coisa descambar a ponto de se perder totalmente o cuidado, começar a tratar o outro de uma forma não tão carinhosa, não tão respeitosa e, depois de aberta essa porta, vem o ponto de não retorno, onde se desiste de qualquer cuidado e tudo piora.

Banheiros compartilhados são estopim desse ponto de não retorno. Se alguém te escutou cagar, viu um tolete seu que não foi embora com a descarga, viu seu pentelho no sabonete… bem, o que mais há para preservar? O pior dos lados já foi exposto, não há mais motivos para “cerimônia”. Não há mais motivos para se preocupar tanto com depilação, não há mais motivos para trocar de cueca todo dia, não há mais motivos para não falar com o outro aos berros, da cozinha…

O grande problema é: o inimigo é invisível. As pessoas não têm esse mecanismo claro em suas cabeças. Apenas percebem que algo desandou e pronto. Para que o excesso de intimidade se torne falta de respeito basta um segundo. O pilar de sustentação que mantém esse cuidado entre casais é não abusar da intimidade e a forma mais fácil de fazê-lo é não compartilhar o local onde normalmente estes abusos acontecem.

Certas portas não se abrem, pois acabam gerando uma esculhambação geral. Por mais que morar junto seja um grande compromisso com intimidade, é preciso manter alguns cuidados, para que o relacionamento não caia na falta de civilidade. E a melhor forma de evitar isso são banheiros separados.

Para dizer que seu desejo por estabilidade financeira é tanto que prefere ela mesmo que não salve sua relação, para dizer que estabilidade financeira compra um novo amor ou ainda para dizer que agora está com nojo de compartilhar banheiro com outras pessoas: sally@desfavor.com

Se você encontrou algum erro na postagem, selecione o pedaço e digite Ctrl+Enter para nos avisar.

Etiquetas:

Comments (11)

  • Estabilidade financeira com certeza, cresci observando os atritos de meus pais por conta disso. Conheço mulher que esconde compras do parceiro ou cara que gasta horrores no bar compromete orçamento da casa não há como manter relacionamento assim.
    Acho o fim usar banheiro junto mas ao dividir o espaço é possível manter tudo limpo e estabelecer regras.

  • Tô com o Somir nessa.
    Nunca tive problemas com banheiro compartilhado, se cada um respeitar o outro e não deixar nada emporcalhado acho que é tranquilo de conviver. Já a falta de grana ocasiona mais stress entre o casal.

  • Olha, eu até entendo o ponto da Sally no quesito intimidade e cada um ter seu espaço. Realmente, pra um relacionamento dar certo, precisa que cada um respeite seu espaço e seu tempo sozinho as vezes. Já tive um namoro em que o sujeito era super grudentinho, não me deixava ter o “me time”, e acabou não dando certo por isso. Mas, quanto ao problema do mesmo banheiro, acho que é algo muito específico da Sally mesmo, não tenho lá problema com isso.

    No mais, concordo com o Somir nessa até porque já passei por situação parecida em que o relacionamento desanda justamente por falta de grana, ou por uma diferença gritante na situação financeira de cada um. Infelizmente, dinheiro é alto que pesa num relacionamento sim, não dá pra negar. E quando a diferença é gritante, tem que ter muito saco, paciência e amor pra aguentar.

  • Estabilidade Financeira e não só isso … o mesmo ritmo de crescimento. Estou sempre buscando coisas novas , gosto de investir no mercado financeiro, fico de olho nas oportunidades de imóveis, de viagens bacanas . Pra mim a pessoa q não tem condições de acompanhar meus gastos financeiros fica pra trás e mesmo gostando é questão de tempo para perder o interesse. Tbm não quero ninguém me puxando pra baixo.
    Se eu fosse rica provavelmente não seria um problema nem dinheiro , nem privada.
    Nunca tive problemas com o compartilhamento de banheiro ,na verdade nem tinha pensado nisso. Vou refletir mais para saber se deveria mesmo ser um estresse rs.
    Mas por hora 100% com Somir.

  • Geraldo Renato da Silva

    Concordo com os dois.
    Quando se tem uma estabilidade financeira, isto proporciona, em grande parte, uma boa convivência, pois o dinheiro funciona como um amortecedor para o stress do cotidiano. E ter um tempo sozinho é fundamental, para cada qual se conhecer e analisar como está a sua vida. E por fim, para amarrar tudo isso, é importante uma vida sexual satisfatória.

  • Creio que o problema do banheiro compartilhado ainda dê pra “resolver” se a pessoa trancar a porta durante o “Me Time” ou se os dois, de comum acordo, estabelecerem regras para amenizar a situação e os “estragos” lá dentro. Mas sem estabilidade financeira não dá. Amor infelizmente não põe comida na mesa.

  • No meu caso, o mais importante são cozinhas separadas. Eu surto com alguém mexendo nos meus materiais alquímicos. Banheiros eu gosto do conceito de “banheiro” separado da “casa de banhos”. Acho que funciona às maravilhas. Mas nunca tive problemas dividindo – talvez por conta de diferenças de horário. Viver em turnos distintos de certa forma equivale a viver em casas separadas.

Deixe um comentário para Geraldo Renato da Silva Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Relatório de erros de ortografia

O texto a seguir será enviado para nossos editores: