Murphy está morto.

Hoje comemoramos o Dia de Murphy na República Impopular do Desfavor, e com ele, a constatação de que no Brasil Murphy não se cria. Para quê se preocupar com a ideia de que se algo pode dar errado vai dar errado se o brasileiro está se certificando de fazer tudo errado? Murphy é obsoleto em terras tupiniquins. Desfavor da Semana.

SALLY

Hoje celebramos o Dia de Murphy, em homenagem à Lei de Murphy, famosa premissa de que o universo é um sacana e está sempre a favor da falha. Por mais que você tente fazer tudo certo, se algo puder dar errado, dará. O que Murphy não sabia é que existe uma força mais poderosa do que universo quando se trata de falhas: o brasileiro.

Quem pode falar em Lei de Murphy atualmente são países como Austrália ou Nova Zelândia, que, mesmo tomando todas as restrições possíveis, acabam tendo novos casos de covid-19. Por mais que controlem imediatamente a situação, há eventos em que ninguém consegue entender como foi que o vírus chegou ali.

O Brasil? Pfffff… No Brasil parece que o brasileiro olha para a Lei de Murphy e fala “Eu posso fazer pior”. O país está se encarregando de criar as piores condições possíveis para o vírus faz mais de um ano.

Vamos dar um passeio rápido pelas informações que temos: 1) hoje, apenas 15% da população brasileira está vacinada com duas doses da vacina (ou seja, está de fato imunizada) e 2) estão surgindo novas variantes que não são paradas por apenas uma dose da vacina. Qual seria a medida adequada? Tentar retardar o máximo possível a entrada dessas variantes no país, até que a maior parte da população esteja imunizada.

Lei de Murphy seria se o Brasil tivesse fechado as fronteiras, testado e isolado casos suspeitos de novas variantes, controlado ao máximo a mobilidade da população e, ainda assim, por um infortúnio um imigrante vindo escondido no porão de um navio causasse o contágio. Aí dá para botar na conta do universo.

Mas não. O Brasil fez Copa América, ciente dos problemas que a Variante Lambda (Variante Andina) está causando na América do Sul. Uma competição basicamente com países sul-americanos. Se nem o Chile, com mais de 60% da população vacinada, está se saindo bem ao enfrentar a Lambda, era hora de importar essa novidade?

O país também deixou as fronteiras arrombadas (essa é a palavra, “abertas” é um grau menos do que o Brasil fez), permitindo a entrada da Variante Delta (Variante Indiana), que, além de ser muito mais transmissível, ainda consegue burlar uma única dose de vacina, sendo necessárias duas doses para proteção. E não só deixou entrar, como deixou ficar, pois não tem teste nem rastreio de contatos para isolar quem chega com ela e impedir que ela se dissemine. Já tem transmissão comunitária.

Deu ruim. A Delta entrou e se instalou. O que seria indicado fazer? O máximo de medidas de prevenção possíveis. O que o Brasil está fazendo? Reabrindo a porra toda. Dá para culpar o universo se der problema? Obvio que não, o universo não teve nem tempo de operar uma situação de azar que comprometa o país, o próprio Brasil se encarregou de criar as piores condições.

Ondas de covid que vem e vão há mais de um ano não serviram para que o brasileiro perceba que, quando os casos afrouxam, não quer dizer que o vírus acabou. É como se uma pessoa que está no mar revolto relaxasse depois que passa uma onda. Não percebeu que logo depois vem outra não? Nem depois de tomar três ondas na cara?

Nesse momento, os casos estão afrouxando (apesar de que 1700 mortes por dia não me parece pouco) e provavelmente todo mundo vai relaxar ainda mais, mesmo com uma única dose de vacina no braço, mesmo com novas variantes circulando. É como ver um acidente de carro.

Não há aprendizado. É assustador. Ainda se fala em tratamento precoce, ainda se acredita que fazer um PCR nos seus convidados te permite fazer uma reunião/evento/festa em segurança, sem risco de contágio. Ainda se tem a coragem de dizer que covid não é tão grave e que há exagero da mídia.

Sinto muito, Murphy, o Brasil não precisa mais de você, ele encontrou um jeito de favorecer o erro, a danação e o pior cenário sozinho. Não precisa de azar, o Brasil se certifica, por A + B, de que o pior cenário aconteça. E isso não é perigoso apenas para fins de coronavírus, eu vejo algo maior aí: parece estar virando uma forma de funcionar do povo.

Essa premissa “foda-se, nada vai me impedir” é quase que uma birra infantil: incapacidade de reprimir um desejo por não ter discernimento para vislumbrar as consequências negativas desse ato a longo prazo. Assim como uma criança é capaz de comer 300 balas sem antever que vai ter uma dor de barriga depois, o brasileiro parece ter adotado esse modo “eu faço o que eu quiser e que se foda o mundo” como estilo de vida.

Agora, o elefante branco está na sala, tomando toda a atenção. Mas, quando o coronavírus estiver minimamente controlado, essa postura egoísta vai repercutir em outros setores. Uma sociedade onde os membros aprenderam que podem fazer o que querem em detrimento do bem-estar coletivo pode ter inúmeros problemas. Acho muito difícil que um povo com essa mentalidade consiga construir relacionamentos saudáveis, criar filhos com uma boa cabeça e progredir como sociedade.

A involução causada pela pandemia é uma realidade mundial: economias estão sendo prejudicadas, expectativa de vida caindo, educação retrocedendo… mas tem algo além acontecendo no Brasil. É uma involução social. É o povo se portando cada vez mais como um bicho e cada vez menos como humano. Sei que estou me repetindo, mas o brasileiro está perdendo sua humanidade, e isso tem um preço caro a longo prazo.

Quando o comportamento de uma nação supera e se sobrepõe à Lei de Murphy, é hora de refletir sobre o que está acontecendo e como reverter a situação. Se as escolhas de um povo geram consequências piores do que a lei máxima a favor da falha, o futuro desse povo não parece promissor.

E, como todo povo que faz péssimas escolhas, estão apontando o dedo uns para os outros e designando culpados fora. Não seja essa pessoa. Corrija a você. Revise seus atos e melhore onde pode melhorar. Observe se o que você diz é coerente com o que você sente, com o que você fala e com o que você faz. Pense no outro, no bem-estar da coletividade, pois se apenas alguns estiverem bem, ninguém estará bem.

Para dizer cagou, para dizer que não pode fazer nada pois não é coveiro ou ainda para dizer que é só uma gripezinha: sally@desfavor.com

SOMIR

Ano passado, comemoramos a data com uma lista de notícias mostrando o caminho da pandemia desde seu começo na China. A análise, naquele momento, era que o mundo tinha dado sopa para o azar e feito valer a lei de Murphy. Cada vacilada das autoridades levava a um novo avanço da doença, e toda vez que esperávamos dar sorte, não havia sorte disponível.

Um ano depois, ainda podemos falar da pandemia, porque ela continua em atividade no mundo todo. Mas fica complicado colocar isso na conta da lei de Murphy, especialmente no Brasil. Pode-se dizer que algo deu errado se você fez exatamente o necessário para chegar nesse resultado? Ainda não conseguimos entender o motivo, mas em lugares como o Brasil, parece que a quantidade absurda de mortes pelo coronavírus foi o plano dando certo.

Se você quisesse que uma doença altamente contagiosa se mantivesse circulando entre a população, basta seguir os passos brasileiros: fingir distanciamento social, atrasar o máximo possível a vacinação e criar o extrema confusão na mente do povo com remédios sem função. Como dizer que as coisas deram errado se fizemos tudo direitinho para chegar nesse resultado atual?

O governo Bolsonaro desenvolveu e praticou o maior plano de preservação viral do mundo, permitindo o desenvolvimento e espalhamento de novas variantes mais e mais contagiosas. Como estamos vendo com o avanço das investigações da CPI, num misto de ideologia furada e um bando de safados tentando lucrar em cima das vacinas, o poder público brasileiro não pode ser considerado azarado: contribuiu ativamente para alcançar o resultado de mais de meio milhão de mortes.

E o povão não deixou de fazer sua parte: festas e aglomerações sem máscara para todos os lados; teimosia, desonestidade, curandeirismo e ignorância seletiva garantindo que o vírus nunca ficasse sob controle e que tudo relacionado à vacinação fosse mais complicado do que deveria. Como é que se olha para esse povo e diz que foi o resultado da lei de Murphy? Ninguém foi pego de surpresa, principalmente quando falamos de 2021.

É como se no começo da pandemia o brasileiro tivesse olhado para o vírus e dito: “duvido que você mata todo mundo”. Desafio vencido! Realmente, o coronavírus não tem força para exterminar a humanidade, nem mesmo em países com pouca infraestrutura como o Brasil. O brasileiro encarou a pandemia de peito aberto, certo de que estava diante de possibilidades pequenas de pagar o preço por isso. Para a imensa maioria da população, a aposta deu certo. A doença pegou de forma leve, ou se matou alguém, talvez tenha matado uma pessoa que não era muito próxima.

Agora estamos numa tendência de baixa de mortes, mesmo que o número continue bizarro, o que provavelmente começa a dar mais confiança para muita gente se convencer que o plano de não ter plano deu certo. Eu conheço o tipo de gente que vai aparecer nos próximos meses falando que nem foi tão grave assim: são as mesmas pessoas que enfrentam o medo com ilusões ideológicas baseadas em conspirações no resto do tempo.

“Viu? Não foi nada demais. Morreu um velho ou outro…”

E eu não duvido que essa vá se tornando a narrativa prevalente na memória de muita gente que não foi diretamente impactada por uma perda de pessoa próxima ou muito querida. Estatisticamente, serão a maioria. Perto de mais de 200 milhões, 500 mil não é tão devastador. Estamos torcendo aqui para que essa seja a última grande marca numérica, prefiro escutar o chorume da turma do “não foi tão grave assim” do que bater um milhão de mortos, com certeza! Espero que as próximas ondas sejam cada vez menores e as vacinas realmente segurem o número de vítimas fatais, como parecem estar fazendo ao redor do mundo.

Mas mesmo felizes pela pandemia acabar sendo controlada, ainda teremos que lidar com as repercussões disso. Quanta gente não vai sair dessa experiência com a certeza da impunidade? Ainda mais se rolar um acordão entre os três poderes para livrar a cara do Bolsonaro e seus asseclas militares… o povo não vai ter nem a conclusão de uma das maiores irresponsabilidades de um governante na história recente da humanidade.

Vai parecer que foi uma tempestade que veio e passou. Mas a vitória do brasileiro contra a lei de Murphy vai continuar lá, influenciando as próximas decisões desse país. Não é que cometemos alguns erros e fomos pegos de surpresa por dificuldades acima do esperado, é que durante a pandemia, o brasileiro (público e privado) resolveu ajudar a doença ativamente e teve um sucesso estrondoso. Isso é, se você considera o número de mortos em relação à população total um sucesso.

Assim como se reescreve a história de um dos governos mais corruptos da história num PT que surge como salvação contra Bolsonaro, é muito provável que se reescrevam esses anos de pandemia como um contratempo para o qual não se tinha solução, e não como uma das campanhas mais bizarras de autossabotagem de saúde pública do mundo.

Não foi Murphy, foi o brasileiro. Não deu errado, deu certo. Só não sei qual a vantagem de matar tanta gente… mas se era o plano, parabéns, Brasil! Murphy está obsoleto.

Para dizer que cansou de avisar faz um ano, para dizer que já acabou porque você já pegou (vai nessa…), ou mesmo para dizer que quando ativarem os chips que vamos ter problemas: somir@desfavor.com

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Comments (6)

  • E as sequelas? Um resto de vida cagada e fodida, impactando todos ao redor, econômica e psicologicamente negativa.
    Não precisa morrer pra ver Deus…

  • …pra quem não morreu, sobram sequelas que nem a medicina consegue mensurar, um combo de problemas que vai se arrastar pro resto da (pobre) vida, impactando a vida dos sequelados e dos co-dependentes dos sequelados.
    Não precisa morrer pra ver Deus, né?

  • Inclusive o apelido que eu dei para a “Quarentena à brasileira” foi de PLANO CRUZADO da saúde pública.
    Semelhanças entre esse malfadado plano econômico e a ação reativa contra o Covid? Bem, tem aos montes.
    Tomaram medidas heterodoxas que não iam ter sustentação a médio prazo confiando que ia ser suficiente e ainda que se tenha contido a situação temporariamente, foi chegar num momento de acomodação que a situação saiu do controle.
    O brasileiro lida com isso com relativa tranquilidade porque em tempos normais o atendimento a saúde já é precário, seja por meio do infame SUS, seja pelos malfadados “planos de saúde”, que eu chamo de “consórcio-doença” porque você e principalmente os mantenedores dos “planos” torcem para não ter a contemplação por algo que exija acompanhamento médico na prática.
    Para os “planos” aqui, paciente bom é paciente que não usa o convênio, o que aliás, acaba sendo contraproducente com quem precisa de atendimento e não tem recursos suficientes pra gastar com um acompanhamento médico a sério.

  • O tal do Murphy só fez essa teoria aí, porque não conhecia os brasileiros. Do jeito que BR não liga pra nada, já era pra ter virado um deserto isso aqui, estamos até no lucro. Bozo e Luladrão são a cara do Brasil, por isso só tem eles na pesquisa. O Bozo por ser ignorante não ligar pra nada e o Lula por ser um bebum ladrão.

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