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Sally Surtada: Doentes!

| Sally | | 102 comentários em Sally Surtada: Doentes!

Semana passada recebi um pedido especial:

“Um texto em que não falasse das mulheres como se fossem todas umas mocinhas indefesas e em que os homens não fossem em sua maioria uns escrotos safados e porcos que não querem largar o osso da sociedade patriarcal de outrora”.

Vocês sabem, podendo escrever sobre o tema, eu não recuso pedidos. Segue um Sally Surtada que não fala das mulheres como se fossem todas umas mocinhas indefesas e em que os homens não são retratados em sua maioria como uns escrotos safados e porcos que não querem largar o osso da sociedade patriarcal de outrora.

Tem coisa mais patética que homem doente? Sim, ter que cuidar de um homem doente. Amiga Calcinha, você não se sente um misto de enfermeira, psicóloga, assistente social, babá e idiota de plantão quando é obrigada a cuidar de um homem doente?

Você chega em casa e está lá o animalzinho deitado na cama com cara de sofrimento extremo. Você se preocupa por meio segundo achando que é algo grave mas depois de dois minutos de conversa percebe que é apenas uma gripe. Ele fala com a voz arrastada, meio rouca, uma espécie de Don Lazaro Venturini sussurrando… só falta pedir melão: Não estouuu me setindo beeem”. A criatura está jogada na cama tal qual um saco de batata. Daí você se lembra que da última vez em que ficou gripada foi trabalhar, limpou cocô do cachorro e ainda fez jantar. Mas a Madame que casou com você deu perda total por causa de uma gripe. Se queixa e faz cara de sofrimento e você compreende, porque vai, temos que tentar compreender os menos evoluídos.

Você ajuda, porque afinal, são uns coitados. Você vai na farmácia, compra um remédio para ele se sentir melhor. Você escuta as reclamações dele, agüenta todo o mau humor que vem junto com a gripe e quando ele pede que você prepare uma canja de galinha você prepara. Quando ele diz que não vai tomar porque está com a garganta “arranhando muito, não desce nada” você sorri, manda um palavrão mental e guarda a canja de galinha. Ele tosse como se o mundo fosse acabar. Olha, que coisa irritante homem com aquela tosse “veja como estou mal”. Pessoas decentes enfiam o focinho nas profundezas do travesseiro para tossir após as 22h. Mas ele não, ele tosse com fé, te acorda cada vez que tosse. Quando ele espirra, o quarteirão todo escuta. Ele reclama que o remédio que você deu o fez suar, quando justamente esta é intenção, para baixar a febre. Ele acha que o remédio é uma merda e decreta que não vai mais “tomar essa merda”.

Isso supondo que seja algo leve, pois se for algo mais sério será preciso mobilizar os bombeiros, SAMU, a mãe dele e o Papa. Porque homem é assim: adia a ida ao médico para fazer checkup, não toma remédio porque diz que “não gosta” (a gente adora, né? a gente toma por diversão!) e quando o caldo entorna se comporta como se aquilo fosse totalmente inesperado e injusto. Os Zé Ruelas se recusam a ler as placas de “Pare”. Sente uma queimação no estômago um dia e ignora. Sente novamente e bebe um copo de leite. Vai levando, vai levando até que um dia a gastrite bate forte para ficar e ele não entende como aquilo aconteceu, afinal, ele estava bem. “Foi de uma hora para a outra”, ele diz ao médico. Você dá um tapa na própria testa e lê novamente meu Desfavor Explica sobre budismo para tentar acalmar sua mente e não enfiar uma porrada no elemento.

Sabe o que acontece, Amiga Calcinha? No segundo que um homem sente dor, ocorre uma regressão mental de pelo menos 80% da sua idade. Susto, medo, dor e outras emoções violentas são desencadeadas pelo infeliz evento que o fez lembrar, ainda que rapidamente, que ele não é imortal. Terrível para a cabeça de um homem lembrar que não é eterno e indestrutível. Nessa hora de retardamento da idade mental a mulher mais próxima é alçada à condição de mãe e será incessantemente paunocuzada enquanto durar o transtorno. Nada contra, todos nós temos nossas fraquezas, o problema nem é esse comportamento fraco e patético, o problema é o comportamento sobre o qual falaremos mais adiante.

Quero ressaltar que pesquisas realizadas no Instituto Sally Somir de controle de Zoonoses constataram que o tamanho do faniquito masculino é proporcional ao mal estar ou dor que estejam sentindo e não ao perigo efetivo ao qual estão expostos. Uma batida com o dedo mindinho em uma quina ou um corte bem dado com uma folha de papel podem desencadear reações mais violentas do que uma crise alérgica, por exemplo. Daí se concluí que o faniquito é, predominantemente, impaciência com a situação de ter que suportar dor somada ao baque emocional de lembrar que não é Wolverine. A intolerância à dor e ao desconforto tem caráter infantil.

Quando for uma coisa realmente grave e dolorosa, o piti toma proporções cinematográficas com direito a achar que vai morrer, exigir ser atendido na frente de outros pacientes ainda que estes estejam em situações piores ou até mesmo escrever uma carta de despedida. Quem já viu um homem tendo uma cólica renal sabe do que eu estou falando. Eu sei que dói, eu sou veterana em cólica renal, mas nunca entrei em um pronto-socorro berrando que ia morrer nem fiz escândalo até me passarem na frente de uma pessoa baleada que estava na fila. Eu já escrevi um Siago Tomir contando como foi quando ele teve uma cólica renal? Se não fiz, tenho que fazer.

Ok, homens tem menos resistência à dor do que mulheres. Mas ainda assim, lidar com a dor de uma forma digna seria uma possibilidade. Pena que quase sempre os homens a ignoram. É aquilo que eu sempre falo, muito faniquito por pouca merda. Vai depilar a virilha com cera quente para ver o que é dor nesta vida. E finalmente após anos de embates, encontrei uma pessoa que pode me dizer o que é pior: perguntei não a um, mas a QUATRO nadadores que são obrigados a depilar o corpo todo o que dói mais: um chute no saco ou depilar a virilha com cera quente. Unanimidade. Todo mundo prefere levar um chute no saco. Os relatos foram tão engraçados que dariam um Desfavor Convidado.

Voltemos ao tema. A paunocuzação masculina pode durar semanas quando seu desconforto se prolonga. Quem já esteve com um homem que fraturou algum membro sabe disso, sobretudo se foi no verão. Vira um coitado full time incapacitado de fazer qualquer coisa que reclama como se o seu sofrimento fosse o pior do mundo. Quando o gesso coça, se comporta como um menino de 3 anos de idade e enfia diversos objetos do lado de dentro, mesmo havendo recomendação médica para não fazê-lo, pois não é capaz de suportar a coceira. Na verdade, em termos gerais, eles não suportam porra nenhuma: desconfortos, restrições, basicamente nada que não os agrade. Alguns mais descontrolados nem mesmo cumprem o prazo estipulado e retiram o gesso ou a tala em casa mesmo, antes do tempo.

E o fato de estar doente é um passaporte para o ócio dentro de casa. No trabalho não, porque afinal, ele não pode demonstrar que é um bocó para seus colegas, em seu ambiente de trabalho, mas em casa é super ok se comportar como um pamonha e não mexer um dedo sob o pretexto de estar doente ou acidentado. O Zé Ruela tá lá, há 25 dias com gesso no braço, calo ósseo super formado, braço desinchado e sem dor, mas continua usando a carta da fratura para conseguir o que quer, seja um copo de água, seja se livrar de alguma tarefa. Novamente, tudo bem, gente fraca é assim mesmo, fica desestruturada quando confrontada com dor e com sua própria mortalidade. Dos problemas, a paunocuzação é o menos. O problema maior são as questões que se seguem.

Vocês devem estar se perguntando qual seria o grande problema então. Eu explico. Todo esse sofrimento intenso e passional poderia ter algum lado bom, se servisse para assustar o filho da puta e ele passasse a se cuidar melhor antes depois do evento. MAS NÃO SERVE. É uma crônica da paunocuzação anunciada à qual temos que assistir em silêncio, porque nada que a gente diga vai mudar o pequeno cérebro de caroço de uva do idiota com o qual coabitamos.

Falemos do antes. Homem só vai ao médico quando acha que algo muito grave e insuportável, quase incapacitante, está acontecendo. Se procurasse o médico aos primeiros sintomas, aos primeiros sinais de desconforto, provavelmente não chegaria ao ponto onde chegou e o tratamento seria mais fácil e mais rápido. Se fizesse um check-up anual que fosse poderia evitar muitos problemas. Mas ir ao médico é demérito. Ir ao médico é para os fracos, os fortes tem fator de cura mutante. Daí o filho duma puta fica passando mal progressivamente e você mandando ele ir ao médico. Ele, por sua vez, dizer que a) não tem tempo b) não precisa porque ele se sente melhor (apesar de estar visivelmente pior) c) não gosta de ir ao médico ou d) todas as respostas acima seguidas de uma tromba e um “me deixa em paz”.

Afinal, o problema é dele. Não é como se você fosse afetada de alguma forma por ter um adulto de cinco anos de idade mental chiando o dia inteiro dentro de casa, podendo inclusive te contaminar se essa porra que ele tem for contagiosa. O problema é dele e você só insiste para que ele vá ao médico porque você é uma chata que sente prazer em encher o saco dele. Sim, ele é assim tão importante, você dedica sua vida a encher o saco dele. Essa mania que a gente tem de tentar argumentar de forma racional com animais irracionais, isso tem que acabar.

Daí fica doente e é aquele drama. Vai ao médico contrariado (como se fosse sua culpa ele estar doente), se medica contrariado (como se tomar remédio fosse questão de gostar de tomar remédio) e anda fica de mau humor com você. Após algum tempo ele começa a melhorar e a coisa se inverte. É tudo muito rápido: ou está sofrendo terrivelmente as seqüelas de sua doença ou acidente ou então se sente óteeeemo (mesmo sem estar) e quer sair por aí escalando montanha, correndo na chuva e pulando de avião sem pára-quedas, só para ter mais emoção. No minuto em que ele se sente bem o bastante para sair, quer sair e fazer o que quiser. Porque restrições só fazem sentido quando ele está fisicamente incapacitado.

A babaca que ficou cuidando dele, aturando toda a paunocuzação que se foda se ele tiver uma recaída ou se machucar. Assim que ele se sentir bem novamente ele vai voltar a fazer tudo que quiser, mesmo que esta data não coincida com a alta médica. E nem adianta pedir que faça repouso porque o médico mandou, a resposta será uma só: “Mas eu já me sinto bem!”. Porque a forma como ele se sente é mais importante que séculos de estudos médicos e pesquisas científicas sobre a forma correta de proceder, se ele se sente bem, nada pode dar errado, é hora de desobedecer o médico.

Se a chapa esquentar muito, periga ainda ele acabar dizendo que é problema dele, que quem vai passar mal, no caso, é ele. Ok. Mas quem será paunocuzado com o chororô, as reclamações e os pedidos infantilizados serão as mulheres que estarão ao lado deles. São as mulheres que dormem mal porque Fulano está tossindo, são as mulheres que tem que ajudar Fulano a tomar banho porque está com gesso na perna, são as mulheres, são sempre as mulheres, que pagam o pato quando um homem está doente ou se acidenta. Faz parte, tudo bem, na saúde ou na doença (apesar de que, poderia haver um botão mute para a fase da doença). O problema é a falta de consideração de se colocar novamente em uma situação de dependência da mulher por não ter aprendido nada com seu último erro e a total desconsideração com o trabalho que vai dar à infeliz que está a seu lado.

Eu não gosto de dar trabalho para quem está do meu lado. Eu cumpro as ordens médicas, até porque, não sou arrogante de querer saber mais do que o médico nem de me achar diferente do resto de pacientes que ele já tratou com o mesmo problema. A partir do momento que um Zé Buceta decide que ele é fodástico e já pode fazer o que quiser porque se sente bem e contraria uma ordem médica de repouso, ele sujeita não apenas a si mesmo a um risco, como também à sua parceira e às pessoas que o cercam. Não acho que seja por filhadaputagem, eles são idiotas o bastante para acreditar que estão ótimos e nada vai lhes acontecer. O problema é ignorar a voz da razão que tenta te chamar para a realidade nessa hora. Infantilidade, imaturidade, falta de cérebro. Homem quando quer muito alguma coisa fica cego e acha que nada vai dar errado.

“Ficar na cama é muito chato, eu não agüento mais!” ou “Não agüento mais ficar dentro de casa!”. Queridos, existem coisas que ninguém gosta mas que você TEM QUE FAZER, gostando ou não. Bacana esse mundinho, a Retardadolândia, onde só fazemos o que gostamos! Não gostar não te exime de fazer. Ninguém gosta de ficar na cama, de ficar trancado em casa, de ficar em um hospital. Mas se é necessário, tira forças do seu cu e faz, de preferência sem chorumelas. “Eu não gosto” não é argumento nesses casos. “Eu me sinto bem” também não. É possível que a pessoa se sinta muito bem mas que ainda existam riscos grandes se ela descumprir as orientações médicas.

Sim, eu sei, nós somos fortes, muito mais fortes do que eles e vamos agüentar quanta paunocuzação seja necessária, mas esses imbecilóides bem que poderiam nos poupar um pouco e não correr riscos desnecessários, porque no final das contas, sobra para a gente. Sabe, mesmo quando não há qualquer problema, o período que se segue é trabalhoso. É preciso lembrar/convencer a ir/levar o Zé Ruela ao médico para fazer uma revisão, mas fatalmente ele não vai ter tempo para ir e vai dizer que não precisa ir porque está se sentindo bem. Se sentir bem é diagnóstico 100% certo de cura total e ausência de qualquer problema, pois não existem em todo o mundo complicações assintomáticas. Ok. É aquele conceito do “tem que ser feito”. Se tem que ser feito, tem que ser feito e pronto, todo o resto é menos importante e se arruma tempo. Vê se alguém não escova os dentes porque diz que não tem tempo?

E quando tem que fazer exames para constatar se está de fato tudo bem depois do tratamento? Olha, se tem uma coisa que homem odeia mais do que ir ao médico é fazer exames. Que palhaçada… Parece que tem um sentimento meio imbecilóide do tipo “melhor não procurar, se não vou achar”, como se o fato de não saber fizesse com que o eventual problema não fosse capaz de prejudicá-lo. A maior parte dos problemas de saúde, quanto detectados precocemente, são de mais fácil solução, mas homem tem tanto medo de descobrir ou relembrar que não é imortal e indestrutível, que prefere não saber. Tem uma auto-enganação infantil que os faz acreditar que estão bem e pronto. Mecanismo poderoso e auto-destrutivo que se não for devidamente neutralizado por uma mulher que cuide deles, pode acabar matando.

Então, realiza a cena: Zé Pinto Pequeno passou duas semana com uma pneumonia agonizando, reclamando e tossindo. Tossindo muito. Você, Amiga Calcinha, não dorme direito há duas semanas, porque quando está quase pegando no sono, seu digníssimo parceiro começa a tossir feito um cachorro velho. Você está exausta, tendo que trabalhar o dia todo enquanto ele está de licença médica em casa. Você ainda tem que ouvir as reclamações e cuidar daquele saco de batata que tosse na sua cama. A tosse se arrastou por semanas porque o imbecilóide se recusava a procurar um médico, te tirando preciosas horas de sono por nada, já que tudo podia ter sido resolvido na primeira semana. Um belo dia, depois de ser levado debaixo de porrada ao médico e devidamente medicado, a magia dos antibióticos dá as caras e ele acorda se sentindo bem melhor. O que ele faz?

Agradece por toda a dedicação e diz que aprendeu a lição e vai sempre procurar um médico assim que se sentir mal? NÃÃÃÃÃO, claro que não, porque ele é um retardado mental de merda. Ele calça um par de chuteiras e vai jogar futebol com os amigos, NA CHUVA. E se você reclamar, é porque você o odeia, é uma bruxa, é incapaz de entender que ele está faz duas semanas sem jogar, morrendo de vontade de jogar e já se sente muito bem. O problema é dele, ele vai se ele quiser e quem tentar impedi-lo é pau no cu. Periga, minha Amiga Calcinha, esse débil mental até te chamar de egoísta. Pode bater. Dá nele. Certeza que o Júri vai te absolver. Mas dá até matar, porque se não matar é o Juiz quem vai te julgar.

É isso, o cara vai e depois piora dez vezes mais e a gente passa por todo o processo novamente: não quer voltar ao médico, não admite que piorou… Daí mulher joga água fervendo no ouvido do marido enquanto ele está dormindo e é o que? É louca, é descontrolada, é escrota. Vão todos à merda, não sem antes imprimir este texto (que não fala das mulheres como se fossem todas umas mocinhas indefesas e onde os homens não são tratados como escrotos safados e porcos que não querem largar o osso da sociedade patriarcal de outrora), enrolar e enfiar nos seus cus, cambada de imbecilóides!

Para dizer que curtiu essa nova forma de depreciar homens chamado-os de retardados infantilóides, para dizer que esse descuido com a saúde será providencial quando a praga do câncer peniano pegar ou ainda para dizer que está com ciúmes do Hugo e vem brigar comigo nos comentários para que eu escreva um texto só para você também: sally@desfavor.com

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