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Sensação artística.

Sensação artística.

| Desfavor | | 80 comentários em Sensação artística.

Cada forma de arte tem suas peculiaridades. Sally e Somir discutem sobre o impacto dos sentidos ao internalizar os significados de uma obra. Os impopulares analisam cuidadosamente o enunciado; e julgando-se dignos de acrescentar algo à discussão, assumem os riscos de fazê-lo.

Tema de hoje: A multisensorialidade limita a experiência artística?

SOMIR

Evidentemente. Estivéssemos discutindo sobre expressão artística eu até estaria mais inclinado a concordar, mas nosso foco é a experiência. Se somos todos prisioneiros de uma realidade fabricada pelos nossos sentidos, a comunicação não deixa de ser um processo essencialmente isolado, o paralelismo apenas como uma ilusão desejável.

Toda experiência é internalizada. Através de receptores instalados em diversas partes de nosso corpo, o cérebro humano produz – ao seu próprio modo – formas de arte multisensorial! Nada mais mundano que nossos esforços diários de compreensão do espaço que nos cerca. Se o que os sentidos produzem é ilusão na qual embutimos significados, a arte nada mais é do que realidade qualificada.

Um pedaço de nosso universo particular que por qualquer motivo atrai a atenção e estimula análise aprofundada. Arte como comunicação tem um caráter mais enigmático: os processos de internalização de significados são assíncronos. A mensagem do artista – independentemente de sua intencionalidade – impacta o público através de um terceiro elemento: a obra.

A obra que se configura de tantas formas! Sete artes, sete meios. E estamos apenas considerando as clássicas. Cada mensagem codificada numa obra torna-se parte de um universo alheio à medida que é desvendada. Você vê uma pintura… mas você a enxerga? Artes cujo foco seja apenas um de nossos sentidos apresentam desafios intrínsecos à internalização de seus significados.

Ou, em termos mais simples: permite que a obra seja completada pela sua mensagem ao invés de sua percepção. A multisensorialidade limita a comunicação quando tira do apreciador um ou mais sentidos virtuais em prol dos físicos. Se há limites claros em nossa percepção sensorial de carne e osso, o mesmo não pode ser dito de sua representação no campo das ideias.

Uma foto é capaz de te trazer um cheiro há muito esquecido. Uma música pode te fazer lembrar de uma pessoa querida. Mas não como mero conjunto de fótons capturados… quando você a vê sem reforço da visão física, é seu conceito “etéreo” que preenche a lacuna. A imagem do sentido virtual sorri com o calor de uma boa recordação, numa combinação sinestésica impossível para a maioria de nós.

Tenho muito apreço pelo cinema, não estou aqui tentando diminuir o valor da última convidada ao clube. Estou apenas defendendo a ideia de que não é uma arte de experiência, e sim de expressão. O impacto sobre mais sentidos coloca-nos muito mais presos ao papel de espectador. E se de tempos em tempos não há nada de errado em se deixar levar pela visão artística alheia, não podemos ignorar suas limitações.

Não se compara tão negativamente o filme ao seu livro original à toa. Os sentidos virtuais tão excitados pela literatura tornam qualquer representação física pálida em comparação. Não se reduz o número de dimensões de um signo sem perdas consideráveis de profundidade. Paradoxalmente, a multisensorialidade achata o conteúdo no campo de nossas limitações física, tornando-o menos abrangente.

A multisensorialidade limita sim a experiência artística. Não há como ser diferente diante do funcionamento do cérebro humano. Quanto mais informações físicas entrando em seu universo pessoal, menor a possibilidade de gerar conclusões independentes. Arte não se percebe com significados enlatados de guia de museu, e sim com o encontro (por mais breve que seja) de duas realidades únicas.

Não há experiência artística genérica. Quanto mais se percebe sobre uma obra, maior a experiência. E quanto maior a experiência, maior o número de variáveis possíveis para torná-la única. Não deixa de ser uma questão matemática: quanto mais sentidos virtuais na experiência, menos limitada ela é.

A não ser que você dependa de inputs sensoriais alheios para perceber a realidade (ou a ilusão dela), não vejo como discordar do ponto apresentado aqui. Francamente, espera-se que qualquer adulto minimamente bem educado já tenha ao menos considerado a relação entre percepção física e virtual, mesmo que com outros nomes.

Aguardo ansiosamente seu comentário.

Para usar o truque de achar tudo “sério demais”, para usar o truque de “concordar com os dois”, ou mesmo para usar o truque de “fingir que se posicionou”: somir@desfavor.com>/h3>

SALLY

Conforme avisado, acabou o amor: quem se adaptar e acrescentar com comentários inteligentes fica, quem não se adaptar, adeus.

A multisensorialidade limita a experiência artística? Não, a engrandece.

Os sentidos humanos se complementam, estando alguns interdependentes entre si. Isto quer dizer que, todos presentes, potencializam experiências sensoriais que ficariam empobrecidas com a supressão de um ou de vários deles. Logo, sua coexistência, a percepção do mundo usando o máximo de recursos possíveis, sempre será mais rica e mais bem aproveitada. Não é a toa que se chama de “deficiente” a pessoa que lhe falta a visão ou a audição. PNE – Portador de Necessidades Especiais, esse eufemismo para “deficiente”, não tem lugar aqui no Desfavor.

Em um experimento científico voluntários foram chamados para provar três pratos de comida e classifica-los conforme o sabor. Provaram o mesmo prato de olhos vendados, depois de olhos descobertos e, por fim, de olhos descobertos e com alimentos tingidos de azul. Eles não sabiam, mas os três pratos eram exatamente iguais no sabor, retirados da mesma panela.

Todos acharam mais saboroso o prato com olhos descobertos de coloração normal e mais desagradável o prato com olhos descobertos de cor azul, uma cor que na mãe natureza significa “não me coma, sou venenoso”. O prato de olhos vendados teve um resultado oscilante entre o mais ou menos e o ruim. Ou seja, ao experimentar a sensorialidade plena, o sabor ficou mais agradável, o que havia de bom foi potencializado. A expressão “comer com os olhos” não vem do nada, é uma realidade.

Isso mostra como a combinação sensorial pode tornar uma experiência mais prazerosa (ou, muito pelo contrário), ou seja, potencializa um efeito que existiria se apenas um dos sentidos fossem acionado. E não estamos falando só de gastronomia, o mesmo vale para as artes. Quanto mais estímulo sensorial, mais rica será a experiência e mais ela conseguirá “tocar” quem a vivencia.

Um exemplo típico do meu ponto de vista: veja um filme de terror sem som. Não provoca o mesmo medo, muitas vezes fica até risível. Isso mostra que a multisensorialidade promove uma experiência plena, mais completa e mais intensa. Uma música isolada, uma cena silenciosa isolada ou uma imagem isolada dificilmente promoverão o mesmo impacto do que se forem apresentadas, em harmonia, todas juntas.

Se a mãe natureza quisesse que nossos sentidos funcionassem de forma separada, um suprimiria o outro: quando ouvíssemos um som perderíamos o olfato (o que seria uma mão na roda em se tratando de peidos, mas não vem ao caso), por exemplo. Mas não, eles atuam em conjunto e um complementa o outro. Experimente realizar atividades rotineiras suprimindo alguns deles de cada vez e perceba como o conjunto fica prejudicado.

Nesse ponto o cinema, chamado de sétima arte, é imbatível: ele estimula vários sentidos de uma única vez, reunindo várias formas de arte (música, imagens, dança, etc) em uma única obra. Oficialmente, as artes são classificadas em sete categorias: 1) música; 2) dança ; 3) Pintura ; 4) Escultura/Arquitetura ; 5)teatro ; 6) literatura e 7) cinema. (até existem outras, mas podem ser inseridas nestas).

Pense em uma música que te comove. Agora pense em um filme que te comove e me diga qual dos dois acrescentou mais à sua vida. O cinema pode reunir todas as outras artes em uma só. Você pode até tentar defender o teatro, mas em matéria de escultura e arquitetura, o cinema pode te levar onde ele quiser: museu do Louvre, Coliseu, Estátua da Liberdade… Ele te permite “conhecer” qualquer uma das outras seis artes e de quebra te apresenta uma sétima forma de nutrir a alma.

Claro que nada impede que se aprecie cada uma destas formas de arte em separado. Eu tiro momentos do meu dia para cada uma delas. O fato de admitir que a multisensorialidade NÃO LIMITA e sim engrandece a experiência artística não quer dizer que não se goste ou se possa apreciar cada modalidade em separado. Cuidado, premissa errada leva a conclusão errada. A multisesorialidade não limita a expressão artística, a complementa, a engrandece. Mas as artes isoladas também tem o seu valor. Não estamos discutindo gosto, não me venha com “eu gosto de…” nos comentários. Não queremos saber o seu gosto, vá contar seu gosto no seu facebook. Queremos saber se você acha que a multisensorialidade limita a experiência artística.

Repetindo a resposta: a multisensorialidade não limita a experiência artística. A menos, é claro, que estejamos falando de mentes limitadas. Mas eu não escrevo para mentes limitadas, não mais. Gente que não consegue ver um filme legendado porque não consegue prestar atenção no que acontece e ler a legenda ao mesmo tempo, sabe? Pois bem, para gente assim, realmente, melhor fazer uma coisa de cada vez: escuta música, depois olha uma fotografia ou uma pintura, depois vê uma apresentação de dança. Porque se fizer tudo ao mesmo tempo o imbecilóide não vai apreender nada.

Mas não é o caso. Aqui sobrou a nata, a elite da elite da faxina que eu tenho feito no último mês. Se você clicar no botão “comentar” e seu comentário for enviado (estará aguardando moderação, mas será enviado) é porque você TEM CAPACIDADE de compreender o que estamos dizendo. Eu confio muito na minha capacidade de ser intolerante, o banimento cantou de tal forma que se você ainda está aqui, pode ter certeza que não é um idiota que não consegue apreciar mais de uma arte por vez. E também não é um idiota ao quadrado que concorda com os dois, porque estamos antagonizando aqui, concordar com os dois é impossível. Fica a dica.

A multisensorialidade é fruto da evolução. No começo, nas cavernas, o pequeno macaco pelado com cérebro do tamanho de uma noz só conseguia desenhar nas paredes. O tempo foi passando, o macaco pelado evoluiu e foi aprimorando a experiência artística, até chegar ao auge, a aquela capaz de te fornecer o máximo de experiência sensoriais juntas: o cinema. Você pode até, por questões pessoais, ter outra forma de arte como favorita, mas não por esse argumento, não porque a multisensorialidade limite nada, mas sim por gosto pessoal.

Entre todas as artes, a mais apreciada no mundo todo é o cinema (hoje também na forma de televisão). Porque será? Mesmo em países desenvolvidos, é através de filmes, seriados e cia que as pessoas mais se comovem, mais se prendem, mais se interessam. Se a multisensorialidade atrapalhasse, cinema e cianão fariam tanto sucesso. Não é por nada que esta arte fascina tanto o ser humano.

Não se esqueça, ninguém quer saber o que você gosta, qual arte prefere ou o que você acha do Somir ou de mim. A pergunta é curta, a pergunta é clara. O que está sendo perguntado é: A multisensorialidade limita a experiência artística? Para evitar o pior, sugiro que cortem esta frase e a colem no começo da resposta, de modo a evitar devaneios e irritação:

Eu acho que a multisensorialidade________________ (limita ou não limita) a experiência artística porque __________________ (justificativa)

Já vimos que devanear esquecendo do que foi perguntado não dá certo, né? Para bom entendedor…

Para ficar apavorado e não comentar nada, para detestar essa nova fase babaca e nunca mais voltar aqui ou ainda para comemorar que finalmente arrumamos a casa: sally@desfavor.com


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