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A Copa do Mundo é… de quem?

A Copa do Mundo é… de quem?

| Desfavor | | 16 comentários em A Copa do Mundo é… de quem?

Nós conhecemos nosso público, então vamos falar de algo que todos vocês adoram: futebol. 2022 é ano de Copa, e apesar de ambos estarem cagando cada vez mais para o esporte mais popular do mundo, Sally e Somir apostam nos futuros vencedores do torneio. Os impopulares jogam junto.

Tema de hoje: quem vai ganhar a Copa de 2022?

SOMIR

Se eu tivesse que apostar dinheiro, apostaria na França. Tem dois países atualmente que conseguem tirar jogador bom da cartola em todas as posições: um é o Brasil, o outro é a França. E aí é só pensar: um é o Brasil, o outro é a França.

Então quer dizer que eu acho que só a França pode tirar o título do Brasil? Não, nem um pouco. Eu acho que a maioria das grandes seleções europeias estão na frente. A Espanha pode ganhar, a Alemanha sempre é candidata. Até a Inglaterra pode fazer alguma mágica. Ei, na Copa passada, a fuckin’ Croácia chegou na final! A minha opinião informada sobre o tema é a seguinte: a era dos latinos parece ter acabado no futebol.

Brasil, Argentina, Uruguais e afins ainda produzem bons jogadores, pode-se argumentar que até os melhores individualmente, mas o futebol profissional mudou de fase há algumas décadas, isolando os europeus no topo. Futebol sempre foi algo que misturava técnica, tática e emoção. E como nosso povo sul-americano esbanjava técnica e emoção, conseguíamos disputar com força contra europeus (e raramente contra outros cantos do mundo).

Os gringos não tinham muito o que fazer quando Pelé, Garrincha, Maradona e cia. acordavam com o diabo no corpo. Iam driblando e enfileirando as cinturas duras dos europeus até chegar no gol. O craque era definitivo na Copa. Eram bandos de bons jogadores mais ou menos organizados, e quem tivesse alguém inspirado no dia tinha muito mais chances.

Dos anos 60 até os 80, brasileiros e argentinos deitaram o rolaram sobre os europeus com seus craques e seus brucutus raçudos. Boa sorte montando um esquema que lide com Maradona ou Pelé driblando metade do seu time. Os europeus perceberam o problema e começaram a se organizar melhor. A Argentina não tinha mais poder de fogo para combater a tática europeia, nem mesmo com Messi, muito sozinho. O Brasil ainda teve seus momentos depois, ganhando duas copas com coleções de craques com nomes começados em R, mas desde a “era Neymar”, a coisa desabou.

Voltando ao Messi, que é sem sombra de dúvidas um dos melhores de todos os tempos, ver a forma como ele fracassou seguidas vezes é a maior prova da mudança da lógica do futebol como um todo. Um craque absurdo não é mais o suficiente. Com o avanço das táticas e da inteligência específica de todos os jogadores no futebol, não é mais tão fácil deixar todo o time adversário perdido com uma sequência de dribles.

Os times europeus raramente têm um jogador desse calibre, mas eles compensaram com uma média muito alta. Não tem mais cintura dura, tem sim um monte de jogadores que sabem fazer tudo muito bem, mesmo que não sejam mágicos como nossos latinos reboladeiros. Não é mais aquela história do alemão travado que fica confuso quando leva um drible, até porque os europeus foram buscar na África o complemento ideal para seus jogadores mais travadões. A seleção francesa, por exemplo, se esconderia facilmente na Copa Africana de Nações.

E aí, minha gente… as coisas mudam de figura. Se todo o time é muito bom de tática, técnica e força física, não tem mais aquela diferença absurda de talento individual que tínhamos antes. Neymar, por mais mala que seja, é um jogador de habilidade ímpar. Em outros tempos, ele provavelmente driblaria o time adversário inteiro e só pararia dentro do gol, mas hoje em dia? Nem o Messi, que é provavelmente o maior driblador da história do jogo, consegue fazer isso com frequência.

Se passar pelo primeiro, já tem outro treinado para cobrir. E se não correr com toda sua capacidade, boa parte dos zagueiros modernos já conseguem te alcançar. Já perceberam que aqueles gols onde o atacante dribla o goleiro e entra com bola e tudo quase não acontecem mais? Não é à toa, o jogador de alto nível atual é uma aberração física em comparação com os jogadores de outrora. Sabe aqueles que o Maradona deixava perdidos algumas décadas atrás? Não existem mais nos grandes clubes e seleções. Agora ou é um zagueiro com mais fôlego que maratonista ou com mais explosão que um corredor olímpico.

A parte física já foi um grande diferencial dos sul-americanos, especialmente dos brasileiros. A seleção tupiniquim da Copa de 70 foi a maior concentração de talento num time na história do futebol, mas muito do seu sucesso tem a ver com a preparação física do time, que estava num nível mais alto que os concorrentes; ajuda ter o Pelé, mas ajuda mais ainda que ele não canse durante o jogo. Os gringos perceberam isso e saíram copiando os brasileiros desde então. O Brasil ainda é referência em preparação física, mas a distância diminui e muito.

Voltemos à França: o time tem uma mistura absurda de talento e força física, é jogador que corre 90 minutos e não cansa, e que além disso ainda sabe passar, chutar, atacar e defender de forma muito precisa, não se afobam, não entram em pânico. O Brasil não é muito diferente, mas o emocional é uma desgraça. E isso quebrou o Brasil em todas as últimas Copas. Toma um gol e desmonta.

E por mais que a escolha da Sally não seja ruim, o problema é muito parecido: em tese é uma das mais forte, na prática tem a estabilidade de uma criança hiperativa depois de tomar uma jarra de café. Pode ser espetacular, mas no minuto seguinte perder completamente o foco sem previsão de retorno. Os sul-americanos tem que correr atrás do trabalho mental dos europeus, porque a janela parece estar se fechando: eles estão muito próximos em talento, já equilibraram totalmente no físico, mas tem muito mais psicológico. A vantagem tática eles mantiveram, e só vem aumentando desde então.

Veja um jogo da Premier League e um do brasileirão na sequência: não tem comparação. Por mais que muitos dos jogadores de sucesso no mundo sejam brasileiros e argentinos, eles funcionam dentro do sistema dos europeus. Quando chega na seleção local e dão de cara com a bagunça, dá no que deu nas últimas Copas: domínio europeu total.

Vai dar França, a não ser que outro europeu esteja muito bem na época.

Para dizer que O HEXA vem, para dizer que torce para que o Japão ganhe e todo mundo se mate, ou mesmo para dizer que se o Brasil ganhar o Bolsonaro está reeleito: somir@desfavor.com

SALLY

Quem você acha que vai ganhar a Copa do Mundo de 2022?

Argentina. A seleção está boa? Não. O técnico é bom? Não. Messi joga bem quando joga pela seleção argentina? Não. Vai ganhar por tirar forças do fundo da alma para homenagear o Maradona, já que esta é a primeira Copa do Mundo após a sua morte.

Para aqueles que não estão familiarizados com a forma como o argentino encara o futebol, tente pensar como era o torcedor da seleção brasileira nas décadas de 70/80. Pegue isso e multiplique por dez. Esse é o torcedor argentino: apaixonado, passional, fiel. E Maradona é mais do que um ídolo, é uma divindade.

Estamos falando de um grau de devoção que (felizmente) o brasileiro desconhece no futebol. O corpo de Maradona precisa ser escoltado 24h por dia pois os torcedores cismaram que levar seu coração ao Catar vai trazer boa sorte para a seleção argentina e, tendo a oportunidade, tentam roubar o órgão. Estamos falando de uma torcida que não parar de gritar um segundo durando os 90 minutos de jogo e que não vaia sua própria seleção. Estamos falando de uma situação que, no Brasil, se equipara a essas pessoas fanáticas que tem “político de estimação”.

Imagina o quanto essas pessoas fanáticas que tem político de estimação dariam de si se as eleições presidenciais fossem decididas, por exemplo, em uma corrida. É isso que o jogador argentino está sentindo. Vão todos com uma missão: jogar pelo Maradona, vencer para homenagear o Maradona, levantar a taça em honra ao Maradona.

Eu sei que o fator emocional é uma faca de dois gumes, ele pode incentivar, mas também pode atrapalhar: o peso da responsabilidade de honrar el Diego, a emoção que descontrola, o nervosismo… sim, tudo isso pode explodir na cara da seleção argentina e ela ser eliminada nas oitavas de final. É uma hipótese.

Mas eu sei o quão doentes eles são pelo Maradona, eu acredito que esse grau de fanatismo doentio remova montanhas, tenha implicações metafísicas. É como a mãe que vê um filho debaixo das rodas de um caminhão e simplesmente levanta o veículo para tirar o filho de lá, evocando uma força inexplicável sei lá de onde (da adrenalina, provavelmente).

Parece um discurso exagerado, mas não é. O poder da mente, em um sentido científico mesmo, é enorme. Por exemplo, pessoas com psicose maníaco depressiva, quando estão na fase maníaca, não adoecem: correm pelados na chuva, fazem as piores coisas e o corpo segue firme e forte como se nada. E é esse o estado mental da seleção argentina, ao que tudo indica: maníacos.

Não mexa com ídolos de latinos. Não mexa com a honra de latinos. Latinos não vão se insurgir por um salário melhor ou por direitos fundamentais mas virarão feras se você mexer no seu ídolo de estimação: pode ser um político, um cantor teen ou um jogador de futebol, a pessoa vai remover montanhas por ele.

Já no velório de Maradona, onde a Argentina presenciou mais de um milhão de aglomerados em plena pandemia (em um lugar onde quem furava quarentena era preso) dava para ver o que estava por vir. Encerraram o velório no tempo regulamentar e, a multidão que ainda não tinha se despedido del Diego ficou tão enfurecida que espancou toda a força policial presente (e eram muitos), invadiu a Casa Rosada e depredou tudo. Não se mexe com ídolo de latino, se desperta um tipo de demônio que ninguém quer ver.

Desde então (Maradona morreu em 2020) não se fala em outra coisa além de conquistar uma Copa do Mundo em honra a Diego. Virou uma obsessão, um surto coletivo, uma doença. Isso me leva a crer que vão jogar em um estado de total psicose, daqueles que você corta a perna do cara e ele nem percebe, continua correndo com uma perna só. Meus queridos, em matéria de força e preparo físico, ninguém supera maluco.

Para vocês terem uma ideia de qual é o clima, vejam este comercial de uma cerveja argentina em 2021. Apenas uma alegoria comovente? Quem dera… muitos argentinos acreditam que, de alguma forma, el Diego vai se manifestar em campo quando a Argentina jogar.

Teve até vidente em programa sensacionalista pedindo para que as pessoas parem de evocar o espírito de Maradona por “bobagens”, já que ele estaria “reunindo forças” para se materializar em campo no Catar, em 2022, e fazer coisas como desviar a bola a favor dos argentinos.

Não há sanidade que possa competir em pé de igualdade com esse nível de devaneio. Se de fato a seleção argentina entrar em campo com a certeza de que seu maior Deus, el Diego, estará lá com eles e irá ajuda-los, eles serão imparáveis. E, como vocês sabem, o nível intelectual ou de inteligência de jogador de futebol não costuma ser muito alto, portanto, eles são extremamente influenciáveis.

Tudo isso é muito lamentável? Sim, é. Dos mais diversos aspectos: desde nutrir esse sentimento de devoção até o fato dele ser canalizado para um Rafael Pilha Argentino. Mas não estamos aqui para julgar, no final das contas, é menos humilhante adorar o Maradona do que um político, não é mesmo?

Não duvide nem do amor nem do ódio de um argentino, é um povo de extremos. A Copa do Mundo de 2022 não é uma oportunidade, é uma missão para prestar uma justa homenagem ao argentino mais amado de todos os tempos. Não vão jogar bem por terem habilidade, não vão correr muito por terem preparo físico nem vão dar a vida pela camisa. É tudo pelo Maradona. E, um plus: Messi era o xodó do Maradona. Periga até, vejam vocês, do Messi jogar bem com a camisa da seleção argentina.

Vai ser na total força da loucura, no surto psicótico, no tudo ou nada que a Argentina pode chegar lá. Pode não chegar, que fique claro – maluco é imprevisível. Mas, se a loucura for bem canalizada, eles serão invencíveis. Quanto mais intensa a loucura, maiores seus poderes.

Para dizer que não ousa contestar o poder de realização de maluco, para dizer que quem vai ganhar vai ser a Inglaterra ou ainda para dizer que simplesmente não se importa: sally@desfavor.com


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