FAQ Desfavor – Varíola dos Macacos 2

A OMS decretou emergência sanitária global por causa da varíola dos macacos. O que isso significa?

Segundo designação da própria OMS (Organização Mundial da Saúde) uma doença pode ser considerada emergência de saúde pública de importância global quando há “um evento extraordinário que constitui um risco à saúde pública de outros Estados através da disseminação internacional da doença”. O que isso significa na prática? Vamos lá.

Um aviso inicial: a OMS pediu que a doença seja chamada de Monkeypox e não de “Varíola do Macaco” por uma série de questões que já explicamos em FAQs anteriores, então, é assim que vamos nos referir, não por sermos esnobes e sim para evitar que idiotas fiquem tacando pedra em macacos.

A OMS dividiu os países em quatro grupos de risco e fez recomendações específicas para lidar com a doença em cada um desses grupos. Quanto maior o risco, mais cuidados ela pede. Não vou falar sobre cada grupo pois seria corta-cola do Google, vocês podem pesquisar isso facilmente. Vamos falar apenas do Brasil, que a OMS já disse, expressamente, ter uma situação “muito preocupante”.

Na prática, para conter a doença de forma eficiente, seriam necessárias duas linhas de combate simultâneas: 1) Conscientização e 2) Teste, atendimento, medicação e rastreio de contatos. O que a OMS fez foi formalizar o tamanho do problema para, com isso facilitar seu combate, simplificando burocracia, colocando os países em contato e orientando sobre quais medidas são necessárias.

No que diz respeito à conscientização, o que o Brasil deveria fazer não se resume a comunicar à população que o problema existe. Deveriam, além das campanhas de conscientização, fazer campanhas de prevenção, informando à população exaustivamente como se dá o contágio e os cuidados que devem ser tomados para que a pessoa não se exponha à doença (falamos sobre isso no último FAQ sobre o assunto), campanhas informando o que fazer em caso de suspeita da doença e campanhas para mitigar outras condições/doenças que tornem a pessoa mais vulnerável à Monkeypox.

Também seria importante fazer campanhas retirando os estigmas ruins que são vinculados à doença, incentivando que todos aqueles que tem sintomas procurem atendimento médico e se isolem. Sabemos que no Brasil a doença está atrelada a uma série de premissas falsas. Por exemplo, se diz que é uma doença “de homossexuais” a qual se pega fazendo “sexo gay”, o que sabemos que não é verdade, pois há casos relatados até mesmo de crianças infectadas.

“Mas quase todos os infectados têm pústulas no ânus, portanto…”. Desculpa a grosseria, eu não sou disso em colunas técnicas, mas quero relembrar-lhes que mulher também tem cu. Então, parou com essa ignorância de vincular orientação sexual com doença. Não aprenderam nada com a postura imbecil que foi adotada por anos com HIV? Fazendo isso só se estimula que a pessoa não procure ajuda se adoecer, por medo ou vergonha.

O certo seria que a pessoa não tenha medo nem vergonha de procurar atendimento médico caso apresente sintomas. Os principais sintomas são sensação de gripe, dor de cabeça, moleza, dor no corpo, dor muscular, cansaço e manchas na pele, que evoluem para bolhas/pústulas que com o tempo arrebentam e se tornam feridas. É bem desagradável não vou entrar em detalhes aqui, basta ir ao Google e procurar por fotos de cada um dos estágios das bolhas (que vão mudando de cor).

Campanhas explicando as formas de contágio são igualmente importantes. Não sei se o Brasil está fazendo ou não, mas a julgar pelas buscas que andam aparecendo por aqui, imagino que não.

Vi muita busca que caiu aqui no Desfavor sobre não poder sentar no mesmo assento do ônibus de outra pessoa, sobre não poder comer na rua e outras que indicam que o brasileiro não sabe bem como se pega. Hoje, o que se sabe é que 95% dos contágios ocorrem pela via sexual, portanto, é preciso ter cautela em outras situações, mas o grande risco não está nem no assento do ônibus nem no restaurante.

Ninguém perguntou, mas eu sei que muita gente vai incorrer nesse erro, então, desde já vamos relembrar que, quando falamos em Monkeypox, não adianta fazer sexo com camisinha, não te protege, a menos que a camisinha seja no corpo todo. O contato com qualquer fluido ou secreção do corpo da pessoa infectada pode te contaminar: suor, lágrima, etc.

Também é necessário um plano de combate à doença, para que todos os médicos do país saibam o que fazer, como fazer e quando fazer. Para não ver a vergonha que vimos com Covid, que, dependendo do médico, te tratava com remédio para cavalo, remédio para malária ou batia na sua cabeça com uma folha de arruda, é preciso que sejam estabelecidas diretrizes claras, com medicamentos comprovadamente eficientes.

Chegou um paciente com suspeita de Monkeypox? Tem que existir um passo a passo a seguir, uniformizado em todo o país. A doença piorou? Tem que ter um tratamento (cientificamente comprovado) a ser adotado. E tudo isso tem que estar bem documentado em relatórios diários apresentáveis, para ser compartilhado com a comunidade científica internacional.

Além disso, seria necessário que agentes de saúde façam o rastreio de contatos, isto é, que entrem em contato com todas as pessoas que estiveram com o paciente durante o período em que a doença era contagiosa para que os mesmos sejam testados, atendidos e, se necessário, medicados e colocados em isolamento.

E, ocorrendo uma incidência muito grande em alguma região, seria indicado fazer uma barreira vacinal, isto é, vacinar todas as pessoas daquela região e de regiões próximas para evitar que esse surto se espalhe. Vamos imaginar o seguinte: no seu prédio teve um caso. A pessoa é isolada e medicada. Tudo sob controle. Mas, no prédio vizinho ocorreram 50 casos. Algo acontece ali, e se deixar correr solto, pode passar para os prédios ao lado. Por isso, todas as pessoas desse prédio deveriam ser vacinadas, de modo a protegê-las e proteger todos os prédios do entorno.

Agora pense nisso de forma nacional, no quinto maior país do mundo, com governante e Ministro da Saúde que enviam caixa de vacinas para os estados errados por confundiram AC com AM. Complicado, muito complicado. O Brasil tem condições de fabricar essa vacina? Se não tem, está se mexendo para comprar? Seria bom, pois duvido que dessa vez o Dória tenha ânimo para fazer alguma coisa.

Me corrijam se eu estiver errada, mas a condução do Brasil está sendo péssima (e os números apontam para isso), portanto, assim como Covid, você tem que cuidar de você mesmo e dos seus, o Governo não vai ajudar e provavelmente vai atrapalhar.


Como está a situação mundial? E do Brasil?

Até a data desde texto, mais de 16 mil casos já haviam sido reportados, em mais de 75 países. Porém, até onde se sabe, só ocorreram 5 mortes em função da doença. Quando falamos em números mundiais, são números baixos (tanto o de contágios como o de mortes) mas a doença está crescendo acima do esperado para o seu padrão, por isso se entendeu ser necessário adotar medidas para tentar contê-la.

Ao contrário do mecanismo que rege o Brasil, no resto do mundo se dá alarme de preocupação quando algo ainda não saiu do controle, mas tem potencial para sair. No Brasil e na cabeça do brasileiro, se a coisa ainda não está totalmente descontrolada, caótica é letal é frescura, alarme falso ou histeria. Pois bem, a situação não está fora de controle, o alerta é justamente para tomar providencias agora, enquanto ainda é mais fácil, para que não saia do controle.

As palavras literais do Diretor Geral da OMS não foram de pânico e sim se cautela: “Com as ferramentas que temos agora, podemos interromper a transmissão e controlar esse surto”. O risco de contágio no mundo é classificado como “moderado” e “alto” na Europa.

Porém, uma frase dele chamou a atenção: “Então, em suma, temos um surto que se espalhou rapidamente pelo mundo, através de novos modos de transmissão, sobre os quais entendemos muito pouco e que atendem aos critérios do Regulamento Sanitário Internacional”. Ênfase nos “novos modos de transmissão”, sobre os quais não posso falar, pois se a OMS entende muito pouco, imagina eu. Estamos de olho.

O Brasil, por sua vez, vai muito mal obrigada. Está no Top 10 de mais casos (e subindo posições) e sabemos que nem todos estão sendo reportados, pois as pessoas não estão sendo testadas. Então, se considerarmos os casos reais, talvez esteja até em primeiro lugar.

Na semana passada, o Brasil estava na casa dos 500 casos e ontem já tinha 813 casos registrados. Se nada for feito, o Brasil pode tranquilamente chegar ao primeiro lugar e ter mais essa vergonha para ostentar.

Até onde eu sei, e me corrijam se eu estiver errada, só existe um laboratório em todo o Brasil habilitado para fazer o diagnóstico da doença. Um laboratório para mais de 200 milhões de pessoas. Parece seguro para você? Você está vendo alguém fazendo algo para mudar essa realidade?

A situação do Brasil está se deteriorando rápido e o país está destoando dos vizinhos, com casos muito acima da média. Ministro pode ir a público dizer que o país está preparado e que “fez o dever de casa”, mas os números mostram o contrário: o país está cometendo os mesmos erros que cometeu (e comete) contra covid. E, sendo muito sincera aqui, o povo também tem culpa. É uma doença que só se torna contagiosa quando os sintomas (desculpa o trocadilho) estão na cara e, mesmo assim, as pessoas não se cuidam.

Há sintomas visíveis, pústulas, bolhas, erupções ou feridas e o brasileiro ainda assim vai lá e faz sexo com a pessoa. Francamente, parem de se comportar como animais e tenham um mínimo de bom-senso. Ninguém está te pedindo para fazer quarentena desta vez, é só não se esfregar em gente visivelmente doente!

O que precisa ser feito para conter esse estrago está na resposta anterior – e o Brasil não está nem perto disso, tanto Poder Público como cidadão. Faltam testes, falta vacina, faltam medicamentos, falta consciência e senso de preservação nas pessoas, mas, acima de tudo, falta planejamento, informação e vergonha na cara por parte dos governantes. Então, tomara que estejamos enganados, tomara mesmo, mas a tendência é ver essa porcaria crescendo no país.


Agora isso vira pandemia?

Não. Continuamos firmes e fortes na nossa posição: com os dados que temos até aqui, não é provável que isso vire uma pandemia, pois o contágio não é fácil (não é pelo ar). Porém, as palavras meio ambíguas do Diretor Geral da OMS indicam que pode haver nova forma de contágio e, se isso se confirmar como sendo uma nova modalidade de transmissão, o jogo muda. Não parece provável, não é esperado que esse vírus mute assim, desta forma e tão rápido.

Falando de posse das informações que temos hoje, nada leva a crer em uma pandemia. E o fato de a OMS ter declarado emergência global de forma alguma quer dizer que haverá uma pandemia. A OMS declarou emergência global de outras doenças e elas não terminaram em pandemia.

Nos últimos 20 anos, a OMS declarou emergência global para cinco doenças e apenas uma delas se tornou pandemia: Influenza H1N1 (em 2009), Poliomielite (em 2014 e talvez seja declarada novamente nos próximos anos pois os níveis vacinais estão péssimos), Zika (em 2016), Ebola (uma em 2014 e outra em 2019) e Covid-19 (em 2020). Apenas Covid virou pandemia. Então, a regra é que o ser humano consiga conter a doença.

Mas, cá entre nós, pouco importa o nome que se escolha dar. Se é pandemia ou não é pandemia, eu não quero pegar e não quero que nenhuma pessoa querida pegue. Então, pode ser que só 100 pessoas em todo o país peguem, mas se uma delas for você, vai ser péssimo do mesmo jeito. Por isso eu te digo: se cuide. Não por ser uma doença perigosa – o perigoso é o brasileiro.

99% das buscas sobre a doença que caem aqui são sobre pessoas que parecem ter os exatos sintomas de Monkeypox mas estão procurando formas de escondê-los (maquiagem, manga longa, etc.) pois não querem ser colocadas em isolamento. Esse é o problema do Brasil, não o político A ou B. A falta de responsabilidade, de senso coletivo.

O Brasil está repleto de pessoas assim, por isso, deixo aqui meu conselho: viu alguém com manchas vermelhas, bolinhas, espinhas, pústulas, feridas ou qualquer coisa suspeita na pele, principalmente nas mãos, rosto, genitais e pés, não se aproxime e não compartilhe objetos de uso pessoal com a pessoa. Vai no Google, procura como são essas bolhas em todos seus estágios, memoriza e não chega perto de quem estiver com a pele assim.

“Mas Sally, você está estimulando o preconceito!”. Eu só estou te pedindo para não se esfregar em pessoas doentes, isso é preconceito? Em um país precário como o Brasil, com um povo egoísta, sem consciência e sem senso de coletividade, eu estou estimulando é a proteção das pessoas com as quais eu me importo. Não estou dizendo que é para perseguir a pessoa com tochas e foices, apenas estou te pedindo para você não se esfregar nela.

Olha, nem que seja pela futilidade de não querer ficar com o rosto e o corpo todo coberto por cicatrizes, que muitas vezes deixam a pessoa deformada (principalmente se ela tiver tendência a queloide, o que boa parte da população brasileira tem), tomem um pouco mais de cuidado.

Não querer fazer quarentena eu discordo, mas compreendo: a pessoa tem que trabalhar, a pessoa precisa sair. Agora evitar de se esfregar em outra pessoa com alterações na pele isso eu não entendo não. Desculpa, mas isso não implica em um grande sacrifício. Qual vai ser a desculpa do brasileiro dessa vez para não se cuidar?

Para dizer que com certeza o Brasil chega ao primeiro lugar, para dizer que mais uma doença global e o mundo já pode pedir música no Fantástico ou ainda para dizer que enquanto a coisa não tomar uma proporção assustadora você não vai mudar uma vírgula na sua vida: sally@desfavor.com

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Comments (14)

  • “Então, parou com essa ignorância de vincular orientação sexual com doença.”

    https://g1.globo.com/saude/noticia/2022/07/27/homens-sexo-homens-oms-variola-macacos.ghtml
    O diretor da Organização Mundial de Saúde (OMS) aconselhou, nesta quarta-feira (27), que homens que fazem sexo com homens – como gays, bissexuais e trabalhadores do sexo – reduzam, neste momento, o número de parceiros sexuais para diminuir o risco de exposição à varíola dos macacos (monkeypox).

    Se a própria OMS está dizendo, quem somos nós pra questionar…

    • Todo o argumento gira ao redor de explicar pela enésima vez para o ser humano que vírus não escolhem pessoas por orientação sexual. A AIDS explodiu porque muita gente achou que o simples fato de transar com gente do sexo oposto evitava a transmissão da doença. Deu a merda que deu. Não mistura política com ciência, porque passa mensagem errada e esse povo, infelizmente, é burro feito uma porta. Eles REALMENTE vão achar que ser hétero te torna imune à doença.

  • No Brasil não se consegue nem não estuprar as pessoas, quem dirá parar de se esfregar em perebas…

    Não se tem consideração por consentimento, quem dirá bom senso de evitar contato enquanto doente…

    Pólio, pffff. Brasileiro médio tem mais medo do que sai do armário (nem 5% da população) do que de pulmão de metal.

  • Monkeypox é algo com que nós devemos nos preocupar e o que mais aborrece nisso tudo é ver que o Brasil está repetindo os mesmos erros que cometeu durante a pandemia de covid, que AINDA NÃO ACABOU. É como você disse, Sally, para se prevenir de mais esta doença contagiosa que já se espalhou pelo mundo, a gente vai ter que cuidar sozinhos de nós mesmos e dos nossos entes queridos porque, quem dirige esta pocilga, para variar, não só não vai nos ajudar como provavelmente ainda vai é nos atrapalhar. É cada um por si e o governo contra todos.

    • As pessoas parecem ter desistido de se cuidar aí no Brasil. É explosão de casos de HIV, é gente esnobando vacinas… Nem com os filhos se preocupam, tem região do Brasil onde apenas 40% das crianças receberam vacina contra polio, ou seja, tem mais criança não vacinada do que vacinada. Uma doença que havia sido erradicada do país! Acho que em alguns séculos esse período vai ser visto como a nova idade das trevas.

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