Voto aleatório!
| Somir | Anula Eu! | 5 comentários em Voto aleatório!
A democracia é o melhor sistema de governo possível dadas as limitações do ser humano médio, mas não existe sem seus defeitos. Em todos os cargos eletivos brasileiros, temos basicamente o mesmo problema: a maioria das pessoas que vota num candidato não conhece muito bem a pessoa que está colocando lá para representá-la.
Talvez em cidades bem pequenas, candidatos a vereador e até mesmo prefeito sejam mais conhecidos pelos cidadãos, mas eu apostaria que isso só vale para cidades bem pequenas mesmo. Acho complicado que isso seja possível em cidades com mais de 100.000 habitantes. Só nas 20 maiores cidades do país, vivem mais de 40 milhões de pessoas.
É muita gente que lida com candidatos que praticamente nunca ouviu falar na vida, decidindo por representantes sem nenhuma conexão real com eles. E sejamos honestos: o grau de politização do cidadão médio sugere que nem mesmo em pequenas cidades as pessoas se importem tanto assim com seus votos para vereador. Imagine só um cidadão de São Paulo decidindo em quem votar para presidente?
Podemos bater muito na falta de interesse do brasileiro em eleger boas pessoas para cargos públicos, mas temos que ser realistas: as chances de alguma dessas pessoas que se candidatam terem alguma relação com você são quase nulas. É uma questão de números. Pode ter um vereador da cidade morando no seu prédio e você nunca ficar sabendo. Se você mora num bairro pobre, as chances são quase nulas de ver um político fora de período eleitoral.
E mesmo assim, a mente humana tem limites de quanta gente consegue manter relevantes a cada momento. Na média, esse valor não costuma passar de umas 100 pessoas, que é o “valor mágico” do tamanho de tribo humana. Não é definido por popularidade ou vontade, é bloqueio mental mesmo. O cérebro não é obrigado a lembrar de tanta gente, e pode ter certeza de que não vai fazer.
Grupos mais próximos então? Pouco mais de uma dezena de pessoas cabem na nossa vida com alto grau de atenção. Quando a ideia de democracia se popularizou, vivíamos em sociedades muito menores. E toda essa coisa de voto direto como fazemos atualmente não era a norma. Eram várias limitações, a maioria delas evitando que mulheres, pobres e afins tivessem alguma voz.
Então mesmo em grandes cidades antigas com alguma versão de democracia, o grupo de pessoas que podia se candidatar era muito pequeno, e o grupo de pessoas que podia votar também. Foi uma injustiça corrigida no meio do caminho, mas que criou esse problema: um bando de desconhecidos disputando o voto de basicamente qualquer pessoa com um batimento cardíaco.
Hoje em dia, não votamos em pessoas de extrema confiança. Não votamos sequer em pessoas que temos alguma noção de quem são. Não é à toa que corridas presidenciais costumam ser mais populares: mesmo que de uma forma muito manipulada, você tem alguma informação sobre o candidato para decidir o que pensar dele. Mais ainda: você tem uma certa convivência com a imagem dele (ou dela) para se convencer que tem alguma ideia sobre quem a pessoa seja.
Não estou me contradizendo: a imensa maioria de nós não sabe bem quem é Lula, Bolsonaro, Ciro e cia.; o que temos é a ilusão de proximidade criada pelo foco que uma campanha para presidente gera e repetição o suficiente para formarmos uma imagem mental deles. Quando falamos de deputados, vereadores e coisas do tipo, a situação é mais honesta; aposto que a maioria de nós não vota com muita convicção para cargos menores.
Pudera… que são essas pessoas? De onde elas vêm? Normalmente só vemos uma foto e uma promessa, no máximo, da pessoa. O que diabos esperam que a gente depreenda das campanhas eleitorais? Ok, um candidato a presidente pode até ter uns minutos para falar, mas e os outros cargos, os mais importantes? A pessoa aparece na sua TV com cara de assustada, fala o próprio nome e se tudo der certo, o número.
Pode ser uma pessoa totalmente perdida que se candidatou por ilusão de grandeza ou mesmo por esquema do partido, mas pode ser alguém que realmente faria boas coisas se fosse eleita. Como saber? Às vezes aquela tiazinha que parece que viu um fantasma enquanto gagueja o próprio nome no horário eleitoral pode ser alguém que cuida de projetos sociais com dinheiro do próprio bolso há 30 anos!
O que eu acho desesperador é que por pura probabilidade, toda eleição tem gente decente o suficiente se candidatando para possivelmente melhorar sua cidade, estado ou mesmo o país. Se 90% dos brasileiros forem totalmente incapazes de cuidar do país, sobram 20 milhões de pessoas que prestam. Se 99% forem corruptos, dá pra ocupar quase todos os cargos públicos só com a gente honesta que restou.
E vou além: se mais da metade eleita for gente que presta, os corruptos e os incompetentes já começam a ter imensa dificuldade de fazer os esquemas funcionarem. Não é otimismo, é matemática aliada com mecanismos padrão de funcionamento do ser humano: você tem menor probabilidade de sujar um chão limpo do que um chão que já está sujo. Se você começar a bagunçar as conexões e os esquemas dos políticos que estão no cargo com mais e mais gente fora da “panela” deles, a confusão aumenta de forma exponencial.
Certeza de impunidade é a melhor amiga do corrupto e do incompetente. Quanto mais você conhece os seus colegas de poder, maior a probabilidade que você ande fora da linha, por acreditar que eles também têm coisas a esconder e não vão querer mudar o status quo.
Está ficando confuso, né? Vamos lá: eu argumento que a gente não conhece de verdade os políticos nos quais votamos, e que por uma questão de tamanho de país e população, a chance de conseguirmos votar em alguém que confiamos que vai fazer as coisas direito é minúscula. Se você tem a sorte de conhecer relativamente algum político que está tentando se eleger (conhecer de verdade, não conhecer por propaganda e repetição como Lula e Bolsonaro), a sua melhor aposta é votar nessa pessoa, é claro.
Mas, se você está tendo dificuldades de encontrar boas pessoas para votar, eu vou sugerir uma estratégia: caos. Caos eleitoral, votar em gente completamente aleatória, especialmente aqueles que tem tudo, menos cara de político. Não precisa votar nos candidatos malucos que a Sally exibiu nos seus textos, porque esses assumem que estão lá pra fazer porcaria nenhuma; mas define algum padrão mental pouco previsível: não votar em candidato de terno. Votar só em mulher idosa com cabelo pintado. Votar apenas em pessoas com sobrenome da Silva.
E acima de tudo: se você viu a foto ou a propaganda do candidato mais que uma vez, não vote nem a pau nele ou nela. Vote em quem os partidos não querem que sejam eleitos. Partidos definem verba entre os colegas que vão participar dos seus esquemas e os Zé Ruelas que estão lá só pra fazer número. Muitos desses Zé Ruelas são pessoas decentes, mas um pouco inocentes de achar que tem chance. O partido é seu inimigo. O que ele quer você não quer.
Parece que eu estou fazendo uma sugestão anarquista, mas até que tem ordem na insanidade: o brasileiro sempre achou que estava provocando os políticos mandando celebridades estúpidas para o poder, quando na verdade só estavam colocando gente com muito a perder ali. Subcelebridade eleita vira Tiririca (que não fede nem cheira) ou vira Frota (que só aparece para falar merda). Que tal colocar aqueles aleatórios que se levam minimamente a sério no Congresso ou mesmo no Senado?
A minha ideia só funciona se tiver adesão, é claro. Eu não vou conseguir mudar o Brasil votando assim sozinho, mas vai que eu consigo envenenar mais algumas mentes aqui? Talvez a gente não consiga aplicar a loteria eleitoral em 2022, mas a ideia pode ser aperfeiçoada até 2026. Talvez com um gerador de voto aleatório: selecionando da lista de candidatos a vereador os com a combinação de menos patrimônio e menos suporte do partido para garantir que vai ter um monte de gente inesperada assumindo os cargos.
Mas isso vai colocar gente despreparada no cargo? Sim, só que já elegemos gente despreparada. A maioria dos deputados só consegue propor feriado e trocar favores por votos. Mal ficam lá em Brasília, por exemplo. Não sabem mesmo o que tem que fazer. Se um dia alcançarmos uma massa crítica de aleatórios, pode ficar mais e mais difícil fazer esquemas. Os políticos brasileiros dependem de uma boa dose de eleições de conhecidos e amigos para manter tudo funcionando como gostam.
Candidatos deveriam aparecer de forma aleatória na população, mas quase sempre são as mesmas pessoas, das mesmas famílias, dos mesmos grupos de amigos… a nossa escolha é muito limitada se tivermos apenas o tamanho da campanha feita pelo candidato para nos guiarmos. Se recebe dinheiro do partido para ser eleito, boa coisa não deve ser. Se é ignorado solenemente pela legenda e só tem 3 segundos de horário político, ainda existe uma chance de ser alguém honesto (ou ruim de esquema, adoro corrupto incompetente também).
Está na hora de assumirmos que não conhecemos os candidatos e é tudo meio que um chute no escuro, que pelo menos a gente chute numa direção um pouco diferente. Eu já me comprometi a votar em gente sem apoio nenhum de partido. Candidatos que os políticos atuais não querem que sejam eleitos.
Repito: se você confiar ou conhecer minimamente um candidato, é a melhor opção. Mas se não souber em quem votar, vote em quem estiver fazendo a campanha mais humilde possível. É um dos melhores jeitos de sacanear quem vive te sacaneando. O horário político vai começar e eu vou escolher os mais perdidos (não subcelebridades) possíveis.
Viva a democracia!
Para dizer que vai aderir, para dizer que adorou mais vai pagar os 3 reais, ou mesmo para dizer que vai votar em quem errar o próprio nome no horário político: somir@desfavor.com
Voto aleatório? Nem tanto assim.
A disputa eleitoral é bem desigual e vem sendo costurada de forma que no geral quem já tem uma posição consolidada na área ou é aparentado de alguém que já tenha tal posição leva vantagem a outros aventureiros que tentam a sorte a esmo nesse campo.
Bolsonaro e Lula não me deixam mentir.
Tinha que ser um sorteio de cidadãos aleatórios, ou que tenham interesse em colocar seu nome no sorteio, que preencham alguns pré-requisitos tipo boas condições mentais e formação acadêmica de acordo com o cargo.
Obrigado por sugerir o que eu achei exagerado sugerir no meu texto. Eu acho que funcionaria (por um tempo).
As opções de candidatos estão tão ruins que não tá dando pra escolher nem na base da aleatoriedade. Diante de tanta ruindade, acho que nem vou aparecer pra votar e depois eu pago a multa.
Também não devo ir votar.