Sobre o assassinato de Charlie Kirk…
| Somir | Des Global | 8 comentários em Sobre o assassinato de Charlie Kirk…
Dois dias atrás o ativista político Charlie Kirk foi assassinado num evento no estado de Utah, nos EUA. Foi tudo capturado ao vivo com diversas câmeras, numa imagem chocante que varreu o país. Um atirador o acertou diante de uma plateia incrédula que incluía sua mulher e filhos. Menos de uma hora atrás, o FBI divulgou que pegou o culpado.
Vamos primeiro estabelecer quem foi Charlie: a forma mais simples de explicar é dizer que ele era um ativista/influencer da direita americana que não fazia tanto barulho ao ponto de estar sempre na mídia, mas era conhecido ao ponto de ter um episódio recente do South Park tirando sarro dele. Boa parte dos americanos sabia quem ele era, e tinham opiniões prévias sobre a pessoa.
O negócio dele era muito focado em ir até universidades americanas para debater com o estudante lacrador médio. Fazia grandes eventos e abria o microfone para quem quisesse discutir com ele, num espetáculo de debate que parece meio alienígena no Brasil, mas faz muito parte da cultura de lá. Eles tem clubes de debate nas escolas, então as pessoas entendem esse tipo de evento de forma muito mais natural.
E é claro, uma pessoa de direita debatendo em universidades está quase sempre em território “inimigo”. Kirk fez sua imagem ao redor da ideia de “destruir os lacradores com fatos e lógica”. É uma indústria a essa altura do campeonato, suficiente para bancar muita gente que só faz isso da vida. Cristão devoto, Kirk repetia todos os pontos conservadores que já estamos carecas de ouvir, especialmente naquele combo direito de ter armas e proibição de fazer abortos.
Como sua morte foi um evento midiático enorme por lá, e como a internet fez com que quase todo mundo visse o vídeo horrível do tiro, a confusão foi enorme, especialmente nas redes sociais. Primeiro as reações de choque, e depois a coisa esquentou rapidamente com a turma da direita dizendo que “agora é guerra” e a turma da esquerda tirando sarro e dizendo bem-feito. E sim, teorias da conspiração por todos os lados.
O atirador ainda estava solto, e nesse estado de incerteza, foi chamado de profissional da Mossad a transexual de cabelo colorido. No meio tempo, vimos as pessoas simpáticas a Kirk e/ou sua causa começarem um movimento para basicamente cancelar todo mundo que tirou sarro ou disse que o ativista mereceu morrer. Tem lista online e tudo.
Para ser honesto, Kirk disse várias coisas em vida que facilitaram e muito a vida de quem queria ser crítico com a vítima: já havia dito que algumas mortes eram o preço a se pagar pela liberdade de ter armas. Como ferrenho defensor da Segunda Emenda (a parte da Constituição deles que permite armas para basicamente todo mundo) apareceu diversas vezes depois de tiroteios dizendo que não deveríamos tomar decisões políticas no calor do momento.
Kirk não era o tipo de maluco como Alex Jones (aquele que disse que crianças mortas num tiroteio eram atores e atrizes de uma armação do governo para tirar as armas das pessoas), da turma da direita local era um dos mais calmos e dispostos a conversar, mas suas opiniões não eram moderadas. É razoável que muita gente não gostasse dele. Eu mesmo discordo muito de quase tudo o que ele falava.
Então, tem uma zona cinza entre o que ele dizia de verdade e como se portava. Eu entendo quem disse que o atirador matou uma das vozes mais moderadas da direita, mas moderada em volume e violência: no final das contas o método dele era literalmente ir discutir com quem discordava. Não estamos falando de um centrista preocupado com excessos, ele era demonstravelmente de direita, muito conservador na parte de comportamento.
E se você está com seu alarme para hipocrisia e incoerência disparado agora, é normal: a turma que acha que piada é crime está tirando sarro na cara dura da morte chocante de Kirk, a turma que defende liberdade de expressão está tentando cancelar todo mundo que faz isso. Como de costuma, tudo depende de gostarem ou não da pessoa. Brasileiros que ganham em dólar, como a Sally sempre diz.
Morreu de tiro um defensor ferrenho do porte livre de armas, morreu assassinado por sua opinião alguém que discordou do lado que se diz da tolerância. A ideologia aqui é complicada, mas a percepção que é mais um crime da radicalização política recente não é. É claro como o dia, usando uma expressão americana.
Porque agora vamos para a parte atualizada nesta manhã: capturaram o atirador, aparentemente o próprio pai o denunciou para o FBI. E a coletiva de imprensa foi uma das coisas mais surreais que eu já vi. Começam falando como chegaram na pessoa, as evidências que os fazem acreditar que pegaram a pessoa certa, mas ninguém estava preparado para a descrição do que estava escrito nas balas.
“Notices bulge OwO, what’s this?”
“Hey fascist! Catch!”
“Oh bella ciao, bella ciao, bella ciao ciao ciao”
“If you read this, you are gay LMAO.”
Eu nem sei como explicar para quem não está terminalmente online o que estava ali, mas eram piadas de internet. A bala que matou Charlie Kirk tinha escrito “notices bulge OwO”, o que eu talvez definiria como uma frase gay infantilizada furry irônica… a frase que fala de fascismo é bem óbvia, a do “bela ciao” é uma música antiga italiana reconhecida como resistência ao fascismo, e a última é uma piada descarada: se você está lendo isso, você é gay.
Imagina ver autoridades tendo que ler isso para o mundo inteiro numa coletiva. E o chefe do FBI ainda terminou seu discurso dizendo que veria Kirk em Valhalla. Está puxado, viu? Caso não tenhamos nenhuma reviravolta, parece que o assassino realmente tinha motivações políticas, mas o curioso dessa vez é que até onde ficamos sabendo, não era uma pessoa problemática, daqueles tipos que falam sozinhos ou chamam a atenção de todo mundo por serem monotemáticos e conspiratórios.
O assassino era um rapaz de vinte e poucos anos, branco, de família americana genérica e interesse por armas como tantos outros. Até o senso de humor dele é típico de quem passa muito tempo online, as balas eram postagens imbecis que tantos fazem por aí. A diferença é que eram balas, e uma delas matou um famoso ativista político.
O que estamos vendo agora são pessoas mais “normais” entrando na questão política com uma visão violenta das coisas. A quantidade de pessoas alinhadas à esquerda americana que simplesmente comemorou o assassinato de Kirk demonstra como não há mais empatia. E adivinha só? Tem frase do morto dizendo que empatia é uma construção social inútil, respondendo a críticas sobre sua visão fria sobre vítimas de tiroteios.
Dado tempo suficiente, grupos políticos adversários se afastam o suficiente para desumanizar um ao outro. O que deveria unir as pessoas em uma percepção compartilhada das coisas não une mais. A mesma cena chocante de um homem morrendo na frente da família por suas opiniões não registra de forma parecida. O público americano está perdendo o pouco de bom senso que ainda tinha com essas coisas, porque não se pode esquecer quanta piada foi feita com George Floyd quando ele foi morto pelo policial, e quanta piada ainda é feita.
O que parte o coração de um é só uma cena de filme para outro. Longe de mim dizer que não pode fazer piada, eu acho um retrocesso a direita americana estar tentando cancelar quem riu da morte de Kirk. Infelizmente liberdade de expressão vem com isso no pacote. Mas existe uma diferença entre insensibilidade local e insensibilidade pública: eu não sei se o público moderno realmente entende que rede social é algo aberto, que é praça pública.
E que essa diferença é essencial na divisão política, porque tem coisas que é melhor não ouvir um do outro. E com tantos anos de rede social, já temos uma geração inteira de adultos que acham normal esse nível de conversa pública. Existe uma radicalização que é resultado de perder a sensibilidade sobre o que se diz, a pessoa não percebe mais que é ruim para ela criticar o morto diante da viúva no funeral! E na rede social você está fazendo isso.
A morte de Kirk foi uma piada para o assassino. Isso pode ser resultado direto de radicalização por insensibilidade. Prepare-se para ver os EUA discutindo um pouco mais sério a liberdade de expressão, porque estamos vendo uma troca de xingamentos no funeral dos amigos uns dos outros. A ordem de soluções burras começa com cancelamento e eventualmente chega na censura (a solução inteligente é educação e autocontrole para manter o direito de expressão vivo sem usar a força do Estado para controlar ideias). A direita americana mudou um pouco depois desse caso.
E essa mudança pode ser uma guinada ainda mais autoritária, porque acabaram de matar justamente o cidadão que por mais besteira que falasse, ainda acreditava de coração que dava para conversar. E cada dia que passa vemos o lado que crescemos vendo como iluminado e democrático regredindo para seus dias de revolução sangrenta. Estão matando a conversa na metáfora e na prática.
Não foi pouca coisa o que aconteceu, pode só parecer lacração de direita e esquerda agora, mas algo mudou no clima do país que sempre exporta sua política para cá. Isso é violência política normalizada. Tem um preço.
Vocês acham que já temos aí o Cisne Negro deste ano? Esse assassinato brutal do Charlie Kirk em público, ainda mais sendo quase que em seguida à morte também brutal da Iryna Zarutska em um trem… Ambos foram nos EUA – tão ou mais polarizados que o Brasil -, os desdobramentos dessa sucessão de desgraças ainda estão acontecendo e, claro, vão afetar o mundo inteiro…
Charlie Kirk não é o único exemplo de violência política nos EUA. Melissa Hortman, uma deputada estadual democrata, foi assassinada pouco tempo atrás também. O próprio Donald Trump sofreu um atentado durante a campanha. É hora de repensar um pouco algumas estratégias e posições, violência política não é algo a ser tratado como aceitável. Nem contra o Charlie Kirk, o Trump em pessoa ou a ex-primeira dama do Nepal, que foi queimada viva por manifestantes. Criar esse clima de “kkkkk bem feito” é desumano e extremamente desnecessário. As pessoas precisam começar a encarar outras pessoas como seres humanos, independente de gostar deles ou não.
Eu também não concordo com a maioria das posições de Kirk, na verdade. E espero que toda essa violência ainda possa ser contida, porque ver isso se espalhar e se agravar não será bom para ninguém.
“E adivinha só? Tem frase do morto dizendo que empatia é uma construção social inútil, respondendo a críticas sobre sua visão fria sobre vítimas de tiroteios”
Nesse trecho esse tal de “Sumir” realmente lacrou de verdade, como alguém que se informa pelo twitter, eu duvido muito que tenha assistido a live original onde ele diz isso (até porque só deve saber o português básico). guiou-se pelo “falaram” por isso, esse textinho desesperado por atenção é realmente um grande desfavor, trágico! trágico! Mas felizmente eu tenho completo aqui.
“Então, a nova estratégia de comunicação para os democratas, agora que sua vantagem nas pesquisas está entrando em colapso em todos os estados… está entrando em colapso em Ohio. Está entrando em colapso até mesmo no Arizona. Agora é uma disputa em que Blake Masters está a uma distância considerável. Kari Lake está indo muito, muito bem. A nova estratégia de comunicação não é fazer o que Bill Clinton costumava fazer, quando ele dizia: “Eu sinto sua dor”. Em vez disso, é dizer: “Você não está realmente com dor”. Então, vamos apenas a um pequeno clipe. Bill Clinton nos anos 1990. Era tudo sobre empatia e simpatia. Na verdade, eu não suporto a palavra empatia. Acho que empatia é um termo inventado, da nova era, que causa muitos danos. Mas é muito eficaz quando se trata de política. Simpatia, eu prefiro mais do que empatia. Esse é um tópico separado para outra ocasião”
E tem esse trecho do seu Twitter também
“As mesmas pessoas que lhe dão sermões sobre “empatia” não têm nenhuma pelos soldados dispensados por causa da vacina, pelas crianças mutiladas pela Big Medicine ou pelas vidas devastadas pelo fentanil que atravessa a fronteira.
Poupe-me de sua falsa indignação, de sua falsa ciência e de sua falsa superioridade moral.”
E caso ainda não tenha ficado claro, ele crítica quem abusa da palavra empatia para se vitimizar e para alimentar narrativas progressistas, ele não odeia a empatia em si, o quê é diferente porque agora fica claro que quem realmente odeia empatia não é quem teve a garganta explodida.
Muitos Brasileiros médios também partilham dessa opinião do Sumir, e depois fazem piada com 11 de setembro e são a favor da prisão do Léo Lins. Fazer o quê não é mesmo? O fato de alguém achar um ASSASSINATO justificável e uma opinião diferente não é um sinal que cada vez mais nos tornamos menos humanos, menos racionais.
Descanse em paz.
Eu não sei responder isso.
Porque em tese parece que a pessoa está atacando o que eu escrevi no texto e apontando um erro… mas não está. Apenas substancia o meu ponto com exemplos da retórica de Kirk. E é uma crítica por eu ter concordado com a forma como as pessoas debocharam ou comemoraram a morte de Kirk, o oposto do ponto do texto.
Com quem você está falando, cidadão? Tem certeza que é com o autor do texto?
Viram o Eduardo Bueno (vulgo Peninha) se manifestando sobre esse caso? Simplesmente repugnante! Eu literalmente VOMITEI depos de ver…
Eu já esperava esse tipo de posicionamento. Foi vergonhoso? Foi. Foi estúpido? Foi. E a reputação dele vai pra lama por conta disso.
Isso pode não se traduzir em grandes perdas no sentido de alcance porque é uma pessoa que se consolidou bem no ambiente de redes sociais, mas é uma trinca considerável na credibilidade do cara.
Olhando o jogo de cima e tendo atenção a big picture, posso dizer que daria para achar compreensível a motivação do Tyler Robinson (um LGBT+ num armário cada vez mais apertado convivendo com a falta de perspectivas pro futuro no seio de uma família religiosa e de uma comunidade que provavelmente não aceitaria bem o fato dele se colocar como parte na população LGBT+) e ainda assim considerar o ato reprovável.
Tem um bocado de paradas asquerosas sob o mando trumpista que estão passando abaixo do radar, mas se esse tipo de ação na linha da realizada contra o Kirk se tornar uma constante, isso fortalece a base trumpista e alimenta mais e mais o problema.
Para Robinson, a pena de morte é um prêmio. Em situações normais, uma pessoa em uma situação como a dele provavelmente tentaria suicídio.
Eu também senti esse asco, UABO. Tanto que nem quis mais falar sobre isso com as demais pessoas do meu convívio. Se alguém menciona ele em qualquer conversa comigo, eu já corto o assunto na hora, de tão enojado que fiquei…
Eu vi, eu vi o vídeo do sujeito jorrando igual um hidrante… apareceu na timeline da minha conta normie (conta que eu tenho pra fazer média com os normies, infelizmente quem não tem redes sociais não existe)
O gore realmente deixou de ser uma coisa obscura de deep web e virou algo comum. Eu sei que programas policiais sensacionalistas existem quase desde que a televisão existe, mas a mídia mainstream ainda se dá o trabalho de aplicar um borrado pra não ficar explícito. Hoje, em qualquer rede social, se você scrollar o bastante, vai encontrar coisas explícitas, com várias visualizações e comentários. O que me causa mais estranhamento é que em teoria estamos no período menos sanguinário da humanidade.