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Ele disse, ela disse: A escolha deserta.

| Desfavor | | 123 comentários em Ele disse, ela disse: A escolha deserta.

Situação hipotética: Você está prestes a ser deixado numa ilha deserta sem nenhuma promessa de ser resgatado(a). A sua única escolha nesse caso é sobre quem vai te acompanhar… Ou uma pessoa bem “paunocu”, ou apenas os seus próprios pensamentos. Para definir melhor: Você não sabe qual o sexo dessa pessoa, ela não é especializada em sobrevivência além de não ser muito inteligente ou fisicamente apta (não mais do que você). Além do já supracitado caso crônico de paunocuzisse.

Ele escolhe ficar sozinho, ela escolhe a paunocuzação. E os impopulares não ficam à deriva: Também podem escolher e justificar sua escolha.

Tema de hoje: Numa ilha deserta, é melhor ficar sozinho(a) ou ter uma companhia desagradável?

SOMIR

Esse negócio de colaboração humana é supervalorizado. Coisas de uma sociedade onde cada vez mais o seu número de contatos vale mais do que sua capacidade pessoal. Agora é moda que todas as empresas preguem interação entre funcionários como um dos mandamentos do evangelho corporativo, mas a verdade ainda é que não adianta só juntar pessoas, elas tem que funcionar juntas. E isso depende demais dos indivíduos.

Começo assim para defender que não escolho ficar sozinho na ilha deserta só porque tenho pouca paciência com gente chata e paunocu, é também uma escolha calcada na capacidade de sobreviver até um possível resgate. Não é garantido, claro, mas é algo no que se segurar.

Nada garante que ter mais uma pessoa na ilha vai dobrar sua capacidade de encontrar alimentos, construir abrigos e se proteger de eventuais ataques de predadores ou intempéries naturais. Mas é garantido que essa companhia VAI dobrar a necessidade de alimento, abrigo e proteção! E isso é essencial nessa conta… se não conseguir vencer o problema entre oferta e demanda de subsídios para continuar vivo, ou um morre, ou os dois morrem mais devagar.

Reforçando: Dobra a demanda, mas não necessariamente dobra a oferta. Pescar, caçar, coletar e plantar são atividades bem alheias ao urbanóide médio… A experiência de trafegar com um carrinho dentro de um supermercado não te torna capaz de buscar alimentos num ambiente selvagem. É bem provável que nos primeiros meses de ilha você sofra até mesmo para conseguir abrir um coco caído na praia, quiçá encontrar vegetais comestíveis, fisgar um peixe ou abater uma ave numa das copas das árvores.

Duas pessoas incapazes não equivalem a uma capaz. Mas são dois estômagos roncando. Numa situação onde a fonte de alimento é escassa, é mais seguro depender da sorte para alimentar um do que dois. E mesmo fora do espectro alimentar, ainda sim é mais negócio ter que montar só um abrigo do sol ou uma fogueira mais modesta numa noite fria. Recursos e disponibilidade. Matemática simples.

Pode-se dizer que na ocasião de você se machucar ou ficar doente, é bom ter alguém por perto. Mas… é uma ilha deserta. E você não caiu nela num avião com um médico “de TV” tipo um Jack do Lost. Você VAI morrer se pegar uma infecção, você VAI morrer se o seu corpo não conseguir parar um sangramento sozinho, você VAI morrer se alguma doença tropical te pegar de jeito… Nesse tipo de situação, você depende de prudência e sorte, porque a farmácia mais perto está (com sorte) a algumas semanas de nado.

E não vamos esquecer que a outra pessoa é uma paunocu! O senso de justiça, honestidade e desprendimento dela com certeza é afetado pelo mesmo mecanismo de auto-engano que a torna imune à dura realidade de como ela é chata e desagradável. O mesmo tipo de cabecinha que taxa toda crítica de “enveja” pode interpretar ações inocentes como ameaças contra sua integridade. Gente burra e limitada reage de forma exagerada, intempestiva e ilógica. Não é alguém que você quer por perto numa situação onde não existem mais amarras sociais. E nem adianta ser forte ou esperto, eventualmente você precisa dormir.

A pessoa paunocu passa sua vida racionalizando (diferente de agir de forma racional) seus erros e enganos de forma a jogar a culpa sempre nos outros. Atenção: Esse tipo de gente não precisa ser “má” para te fazer mal. Eles acreditam piamente que estão sendo justos.

É melhor ficar sozinho(a) NESSE CASO por uma questão de recursos e por segurança mesmo. Mas ainda dá para ir mais longe nessa argumentação: Tem a questão do convívio. Mesmo que a ilha tenha recursos básicos abundantes, uma pessoa chata assim piora a qualidade de vida. E vamos convir que numa situação extrema dessas, cada GOTA de qualidade de vida conta muito.

Uma pessoa paunocu dificilmente vai ter interesses parecidos, dificilmente vai ser boa de conversa, dificilmente vai te agregar muita coisa nesse aspecto de interação intelectual. Gente muito diferente é interessante em interações de curto prazo, mas os anos vão se passar. Das duas uma: Ou essa pessoa vai se equilibrar com você, o que é chato porque acabam as novidades, ou pior, você vai se equilibrar com ela. Estupidez pega! Sem contar que sem formar laços de afetividade, todo mundo é chato depois de muito tempo. As pessoas meio que se repetem. Imagine isso numa pessoa paunocu! Imagine ouvir as mesmas histórias e opiniões paunocu dia após dia por anos! Aquela infecção fatal vai começar a parecer uma boa ideia.

É chato ficar sozinho, mas pelo menos você vai tentando se ocupar. O que deve ser útil para quem sempre precisa tirar da cartola a próxima refeição. Sem contar que a mente humana é poderosa, você pode criar o seu Wilson! Com a vantagem de poder escondê-lo quando estiver sem saco para isso.

Não podemos esquecer que você não vai virar monge só porque está na ilha. Se estiver sozinho, vai ter que ficar na base da mão/criatividade com frutas locais, mas apesar de parecer triste, é até uma vantagem em relação às possibilidades de estar acompanhado por alguém… paunocu. A principal é que a expressão paunocu não se torna literal. Se você estiver preso na ilha com a pessoa “errada” para suas preferências sexuais, mesmo que você não dê espaço para a tentação, dá pra garantir que a outra pessoa vai também? Pior: E se dois homens ou duas mulheres tentarem fazer sexo e só uma parte gostar? A merda está feita. Ou se a relação homossexual der certo naquele ambiente, como faz se for resgatado? Assume ou bota na conta do desespero?

E no caso de ser um casal heterossexual (lembre-se: a outra pessoa pode muito bem ser feia, no máximo vai ser média), a coisa é ainda mais paunocu. Não sei se vocês tiveram essa aula na escola, mas quando papai e mamãe se amam muito… A mulher VAI acabar engravidando. Camisinha e pílula não dão em árvores. E vamos concordar que aborto já é complicado em hospital? Vai fazer o quê na ilha? Ilha deserta com paunocu é uma coisa, ilha deserta com paunocu e cria com paunocu? Se mata de uma vez! Claro, as mulheres podem definir que só vai ser paunocu literalmente, se elas acharem essa uma boa solução. Mas aí seria escolher tomar no cu tendo a possibilidade de não o fazer. Gosto é gosto e eu respeito a decisão de Sally! Hahahaha.

Antes só do que levando no rabo.

Para dizer que é mulher e nem consegue voltar para casa sozinha, para dizer que é gay e não viu nenhum problema com minha argumentação sobre sexo, ou mesmo para dizer que só concordaria comigo se eu fosse a pessoa que te acompanhasse: somir@desfavor.com

SALLY

O que seria pior: ser jogado em uma ilha deserta sozinho ou ser jogado em uma ilha deserta com alguém muito pau no cu?

Melhor ser jogado com uma pessoa chata. Por mais chata que uma pessoa seja, ela pode ajudar a encontrar comida, te arrastar para um abrigo se você cair e se machucar ou colaborar de qualquer outra forma para a sua sobrevivência. É ruim conviver com gente chata? Sim, quando temos a opção de escolher com que convivemos. Porém em uma situação atípica, em um ambiente inóspito, abrir mão de todos os recursos necessários para sobrevivência em nome de não conviver com um chato me parece uma desproporção.

Por mais que todos nós gostemos de um belo momento de solidão, ficar sozinho O TEMPO TODO não deve ser agradável. Sobretudo em uma ilha deserta, um local onde uma mão amiga (ainda que chata) pode fazer toda a diferença. E, vamos combinar, nesse contexto de ilha deserta a situação social é outra: é uma questão de sobrevivência, não de preferência.

Além disso, acredito que da mesma forma que uma pessoa feia não pareça mais tão feia se for o único ser humano que você tem acesso por meses, uma pessoa chata não vai parecer tão ruim depois de meses sem contato com outro ser humano. Não tem tu vai tu mesmo, um dito medíocre para uma vida em sociedade, mas muito verdadeiro para uma hipótese ficcional de uma ilha deserta. Antes conversar com uma pessoa chata do que estar na mais completa solidão sem poder conversar. Sem contar que, por mais insuportável que uma pessoa seja, sempre tem ALGUM assunto sobre o qual dá para conversar com ela.

Adoramos tirar onda de autossuficientes, mas a verdade é que o ser humano é uma criatura social, não vive bem solitário. Precisamos de gente por perto física e psicologicamente, mesmo que chata, se esta for a única opção. Eu não gosto de gente chata, mas eu gosto menos ainda de morrer. Quando falamos em sobrevivência, acho que aturar uma pessoa não tão agradável é um preço baixo e acredito que com o passar do tempo longe do convívio social, aquela pessoa vira sua referência de comportamento e você passe a acha-la cada vez mais tolerável. É como viver na porta de um esgoto: fatalmente um dia o cheiro de merda vai parar de te incomodar.

Além de tudo, o fato da pessoa se ver em uma situação limite, em uma ilha deserta, tendo que lutar pela sua sobrevivência, acaba interferindo em sua postura e até mesmo na sua personalidade. Não tem muito como ser insuportável quando se está faminto procurando alimento ou quando se está fugindo de predadores. Ainda que não fosse uma situação com perrengues e perigos, acho que você pensa duas vezes quando percebe que está irritando o único ser humano que existe pelas redondezas para conversar. É muito fácil descartar gente quando se tem bilhões de seres humanos para socializar, porém a coisa muda de figura quando existe apenas uma opção. E, vamos lá, é raro, mas eventualmente pessoas melhoram, principalmente quando passam por situações limite.

A coisa fica ainda mais grave se você não for bem dotado fisicamente, como é o meu caso. Se for uma pessoa fraca, branquela, sem habilidades e sem força, tem que estender o tapete vermelho para qualquer um que possa ajudar. Mesmo que  seja burro ou chato, vai ser uma mão a mais na hora de levantar um peso. Cada pessoa costuma ter aptidão para algumas coisas específicas, basta saber usar as aptidões do outro a seu favor. Quem não é McGyver não pode se dar ao luxo de abrir mão de uma ajuda, qualquer ajuda, em uma situação dessas. Acidentes acontecem, imprevistos acontecem, por mais foda que você seja em algum momento pode precisar de colaboração. É arrogância cega achar que você dá conta de tudo sozinho em uma ilha deserta. Melhor ser atazanado e ter ajuda para se manter vivo ou para viver com o máximo de dignidade possível do que poupar seus lindos ouvidinhos e ter que fazer tudo a prova de falha, porque se der merda, ninguém vai te socorrer.

Neste ponto você pode estar pensando que uma pessoa chata daria trabalho. Pode ser, gente chata e burra dá trabalho mesmo. Porém, todos os seres humanos tem instinto de sobrevivência. Gosto de acreditar que em uma situação limite uma pessoa, por mais pau no cu que seja, vai deixar o instinto de sobrevivência falar mais alto. Exemplo: “Eu não vou subir nessa árvore para pegar uma fruta porque está suja e vai sujar a minha roupa” é uma frase plausível para quem está passando um final de semana no sítio dos avós, mas que provavelmente nunca seria dita se a pessoa estivesse passando fome em uma ilha deserta, com a certeza que ninguém lhe traria comida. O que quero dizer é que em uma situação limite, não sobra muito espaço para isso. O instinto vai falar mais alto.

Mas, ainda assim, vamos pensar em uma pessoa chata ao extremo, cujo prazer em atormentar o outro é tamanho que a faz colocar em risco a própria sobrevivência. Se for este o caso e a pessoa não tomar jeito, você sempre tem a opção de abandonar a mala sem alça e seguir seu rumo sozinho na ilha deserta. Vira as costas e larga o chato ali. Ao menos levando o chato com você, você tem a opção de jogá-lo para escanteio se as coisas se tornarem insustentáveis. Talvez depois de ser abandonado o insuportável reveja algumas posturas e melhore.

Por mais foda que você se ache, ninguém é autossuficiente, especialmente em uma situação complicada como a hipotética ilha deserta. Qualquer ajuda é bem vinda quando falamos de sobrevivência. A “falta de paciência” com outra pessoa não é motivo para majorar suas chances de morrer. Mesmo que o chato seja um zero à esquerda em matéria de sobrevivência, é mais uma pessoa para tentar ajudar. Isso pode fazer toda a diferença. Que porra de escolha é essa onde para não ser chateado você topa diminuir suas chances de sobrevivência? Eu gosto demais da minha vida para isso.

Para dizer que você gosta demais de você para se obrigar a conviver com gente chata, para perguntar se eu aguentaria ficar em uma ilha deserta com um pastor pregando no meu ouvido ou ainda para me chamar de fraca: sally@desfavor.com

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